sexta-feira, agosto 02, 2013

O rombo do petróleo MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 02/08

Mal deu para comemorar a alta da produção industrial de junho. Ela acabou sendo ofuscada pela notícia do forte déficit da balança comercial de julho. No semestre, a indústria cresceu 1,9%; de janeiro a julho, a balança comercial foi negativa em US$ 5 bilhões. A indústria cresceu puxada por veículos; o rombo da balança foi produzido pela importação de petróleo e combustíveis.

Não explica tudo, mas há relação entre o crescimento da indústria e a queda da balança comercial. Quem está puxando a produção industrial são os veículos automotores, que disparam 14,9% de janeiro a junho. Da alta de 1,9% do total da indústria no primeiro semestre, 1,4 ponto percentual é produção de veículos: automóveis, ônibus, caminhões e tratores. Somente no mês de junho, a produção de veículos subiu 2% em relação a maio e 15,4% sobre o mesmo mês de 2012. Em parte, resultado de todos os subsídios e incentivos do governo.

Mas o setor energético é hoje um dos principais gargalos do país. Como não há capacidade de refino de combustíveis e a produção de petróleo está estagnada com a manutenção de várias plataformas da Petrobras, o jeito é exportar menos e importar mais. Segundo o MDIC, a importação de combustíveis e lubrificantes cresceu 20% de janeiro a julho. Chegou a US$ 25 bilhões. A importação de petróleo, em julho, aumentou 180% sobre junho, pela média diária. Ao mesmo tempo, a exportação do óleo caiu 50% nos sete primeiros meses do ano.

Em parte, esses combustíveis alimentaram as térmicas. Em parte, foram combustíveis para os veículos. A deficiência do transporte público e os engarrafamentos que paralisam as cidades foram duas das razões dos protestos que tomaram as ruas desde junho. Mas, sem a produção de veículos, os números industriais teriam sido mais fracos. Uma pergunta inevitável é: por quanto tempo é possível que o motor industrial sejam os veículos, sem que as cidades fiquem mais intransitáveis e a balança comercial tenha um déficit ainda maior?

A notícia positiva de ontem foi que o resultado da indústria em junho foi bom. O crescimento superou as projeções; a taxa em 12 meses voltou a ficar positiva; e a produção de bens de capital cresceu fortemente. Tudo isso fez o Itaú reforçar sua projeção de 0,8% para o PIB do segundo trimestre, com chance de ser maior. Se confirmada, será uma aceleração sobre os 0,6% do primeiro tri.

O que preocupa é o sobe e desce dos indicadores industriais. A alta em junho foi de 1,9%, mas em maio houve tombo de 1,8%. Segundo o banco HSBC, a média mensal, no ano, é de 0,6%, de janeiro a junho. O banco estima que a indústria fechará 2013 com alta de apenas 1,6%. Um crescimento que não recupera a queda de 2,7% do ano passado. Para ver como o ritmo de recuperação é lento, basta saber que produção está 1,6% abaixo do pico atingido em maio de 2011.

Os bens de capital cresceram a uma taxa chinesa de 13,8% no semestre. Podem levar à impressão de que o país passa por um período de exuberância nos investimentos. Mas a produção de equipamentos para transporte distorce para cima o indicador. Houve crescimento de 26% na produção de caminhões, ônibus e tratores, que são classificados como investimentos. O IBGE explica que a base de comparação é muito baixa, porque no primeiro semestre de 2012 houve recuou de 18%. Quando se olha para as outras categorias de uso, as taxas são mais reais. Os bens de consumo duráveis cresceram 4,9%, mas também influenciado pela produção de automóveis, que cresceu 7,7%.

Há várias incertezas para o segundo semestre e por isso as projeções para o PIB deste ano continuam na faixa de 2%. A confiança dos empresários e dos consumidores caiu muito em julho e isso pode afetar os investimentos. Já houve muita recomposição de estoques industriais e de produção de caminhões, que ficou travada no ano passado com a mudança da legislação de motores.

Ontem, a agência de classificação de risco Standard & Poor"s disse que o país terá o terceiro ano seguido de baixo crescimento, com projeção de 2% para 2013. Alertou o governo de que novos incentivos fiscais podem provocar rebaixamento de rating, porque vão aumentar a dívida pública e reduzir a arrecadação.

Um déficit comercial hoje não tem tanto peso quanto no passado, mas a ironia é ser provocado pelo petróleo, no qual fomos declarados autossuficientes, numa bravata de campanha política.

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