GAZETA DO POVO - PR - 20/08
Longas décadas de maus governos, inchaço da máquina pública, desperdício de dinheiro em privilégios do funcionalismo e corrupção crônica cobram seu preço
Até o início dos anos 90, o Brasil era visto pelo mundo como um país rico em recursos naturais, mas condenado ao atraso econômico e social. A pobreza sempre foi grande, os níveis educacionais considerados sofríveis, a violência urbana parecia não ter fim, a inflação parecia incurável, com leis complexas e instáveis, a Justiça funcionava mal e os governos locais eram conhecidos pela corrupção e ineficiência. Em certa medida, essa é a imagem que até hoje o noticiário internacional mostra sobre o Brasil.
Em 1989, após 28 anos sem eleições diretas, o país elegeu um presidente civil, e o que parecia ser o começo de um tempo de redemocratização e prosperidade econômica revelou-se um período traumático na história nacional. A hiperinflação seguiu renitente, a corrupção explodiu e o presidente foi deposto em 1992 após tumultuado processo de impeachment. O Brasil parecia destinado a não ter solução e seguir vivendo na pobreza e na instabilidade.
Em 1994, a realidade começou a mudar para melhor quando foi implantado o Plano Real e o país conseguiu debelar a inflação crônica. A redemocratização começou a se consolidar e foi dada a largada para um período de recuperação. O governo Fernando Henrique conseguiu a primeira grande vitória ao dar fim à inflação, fez importantes reformas e entregou o país ao sucessor em condições favoráveis para crescer.
Lula assumiu em 2003, desfez o medo de que seu governo pudesse dar uma guinada radical à esquerda, manteve as bases da política econômica, abandonou as teses socialistas do PT e conseguiu manter a estabilidade monetária. Com isso, o país aproveitou a boa situação internacional e a sequência de oito anos de elevação dos preços dos produtos exportados, melhorou significativamente as contas externas e promoveu políticas sociais de redistribuição de renda. O governo Lula teve sucesso na política de reduzir a desigualdade entre os mais pobres e as camadas superiores, cujo símbolo maior é o programa Bolsa Família.
A conjunção desses fatores levou o Brasil a obter melhorias internas tanto na economia quanto no desenvolvimento social, além de conseguir melhorar sua imagem internacional, a ponto de ser louvado como um dos promissores países dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China). Batizado como emergente, o país passou a atrair investidores internacionais e a receber demonstrações de confiança do mundo em suas regras e suas instituições. Parecia ter chegado a hora de um crescimento contínuo e sustentável, capaz de alçar o país ao clube dos desenvolvidos.
Todavia, em apenas três anos, aquilo que parecia um destino glorioso começou a apresentar sérios furos, sobretudo na estrutura econômica, culminando com as violentas manifestações deste ano. O mundo começou a perguntar o que, afinal, estava acontecendo com o país e a desconfiar de que toda aquela evolução era pura cortina de fumaça a esconder a histórica sina de atraso e subdesenvolvimento. Analistas estrangeiros voltaram a dizer que o Brasil é o país das eternas promessas, incapaz de usar suas imensas riquezas naturais para sair do atraso e se transformar em nação desenvolvida.
Embora possa haver exagero no pessimismo atual, tanto interno quanto externo – como também havia exagero na euforia e no ufanismo tão cultivados por Lula para glorificar a si e a seu governo –, o noticiário internacional sobre o Brasil é dominado por péssimas notícias sobre a política, a economia, a corrupção e a violência urbana. Tantas décadas de construção de imagem altamente negativa do país no exterior só poderiam resultar em fuga de turistas e de investidores, como se vê pelas estatísticas oficiais publicadas.
O atraso não é destino; é obra de longas décadas de maus governos, inchaço da máquina pública, desperdício de dinheiro em privilégios do funcionalismo, corrupção crônica no governo, incapacidade de fazer reformas, leis ruins e instáveis, baixo investimento em infraestrutura física (que é basicamente estatal) e lento crescimento da produtividade econômica. Essas são doenças que a sociedade brasileira tem de enfrentar. O país tem chance de frear a deterioração da economia e das instituições. Mas é preciso começar a agir agora, se não quiser, de novo, perder o bonde da história.
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