sábado, abril 20, 2013

À deriva - MARIO KOSSATZ

O GLOBO - 20/04
Em um ambiente regulatório e legal de desnecessária complexidade, somos forçados a conviver com um vasto número de leis e de regulamentações ruins, inúteis, anacrônicas, socialmente injustas e em boa parte das vezes desconhecidas ou de difícil compreensão para a maioria daqueles que devem cumpri-las. Este é o solo fértil para que se desenvolva a burocracia e no qual prolifera a corrupção em nosso país. No indescritível emaranhado de leis e regras que atravanca indistintamente a vida de todos os brasileiros, cria-se o balcão de dificuldades onde se vendem as facilidades; e, na profusão de exigências, tira-se o foco do que é realmente importante, e o essencial acaba soterrado pelo supérfluo.

O Estado de direito se fundamenta na existência e na observância das leis e regras indispensáveis para regular e melhorar o processo social. Não há justiça no seu sentido universal sem boas leis. Boas regras são seguidas e se traduzem em benefício para a sociedade. Regras ruins acabam sendo descumpridas e enfraquecem o processo social, criando um quadro de indisciplina, instabilidade e insegurança nos relacionamentos sociais.

O gosto atávico pela burocracia, além de envenenar e prostituir as relações entre o Estado e a sociedade civil, atua para reduzir ainda mais a baixa eficácia operacional da máquina estatal. Modelando praticamente todos os seus processos operacionais sob a ótica do ritualismo e sem foco em resultados, o Estado brasileiro criou, para ele próprio, um tortuoso e imensamente caro caminho para realizar as mais simples tarefas.

Este é o contexto que gera um enorme custo de conformidade e estimula a busca de soluções na ilegalidade e na informalidade, favorecendo a corrupção. O "Custo Brasil" apresenta, assim, não só um componente de custo de conformidade, mas também um componente importante de custo da não conformidade. O problema não é só econômico, mas também ético e social. Pelo ralo burocrático, acabamos perdendo não só dinheiro, tempo e esforço, mas também o respeito pelas instituições públicas, o ânimo e a esperança. Ficamos com a sensação de que pouco ou nada podemos fazer para mudar a situação em sua essência. Todos conhecem algum "caminho das pedras" e é mais cômodo deixar tudo do jeito que está. "O país funciona assim", e anda para trás.

Somente uma efetiva mobilização da sociedade civil organizada será capaz de induzir mudanças paradigmáticas em nosso país. Precisamos de um corpo de leis e de uma regulamentação administrativa de melhor qualidade no seu conjunto, elaborados com mais inteligência e mais pertinentes a questões fundamentais.

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