segunda-feira, março 04, 2013

Discurso torto - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 04/03

Reza a lenda que, quando a economia vai mal, a política tem juízo. Por isso, à exceção da briga no Rio de Janeiro e entre PT e PMDB, a sensação geral é a de que na base governista o andor vai devagar perante o santo de barro, no caso, o PIB de 0,9%.

Diante desse cenário, Dilma faz juras de amor ao PMDB, enquanto Lula cuida de segurar o PSB, com reverências aos irmãos Gomes, Ciro e Cid, o atual governador do Ceará. É Lula também o adjunto encarregado de dar aquela enrolada básica no governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que por sua vez, também enrola o PT. Até quando, não se sabe.

Salvo os discursos da oposição tradicional, a base aliada não bate de frente com o governo, nem mesmo o PSB de Eduardo Campos, interessado em se colocar como alternativa. E isso tudo tem um motivo: os aliados já perceberam o mote do governo Dilma rumo a 2014 e ninguém até agora tem em mente como enfrentá-lo.

Dentro do governo e do PT (duas entidades que muitas vezes se confundem), o discurso para 2014 está pronto. É será colocado dentro da mesma estratégia que Lula usou em 2006, quando concorreu à reeleição. Só mudará o tema.

Para quem não se recorda, em 2006, o então presidente-candidato Luiz Inácio Lula Silva dizia que os tucanos iriam privatizar tudo, da Petrobras ao Banco do Brasil. O então candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, caiu na armadilha. Passou o segundo turno de capacete da Petrobras, e logomarca de bancos públicos, para mostrar que preservaria as instituições.

Enquanto isso, na pré-campanha

Desta vez, não será a privatização que tomará conta do discurso do governo. Até porque o PT não tem mais esse discurso. No governo Dilma, a concessão de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos é a saída para concluir obras que Lula deixou por fazer. Diante dessa realidade, o governo busca outra receita eleitoral, repetindo vários ingredientes de 2006 sobre as privatizações.

Essa nova especiaria que o PT usará na reeleição de Dilma é o pacote de programas sociais encabeçado pelo Bolsa Família. Da mesma forma que Lula disse que os tucanos iriam privatizar tudo, Dilma dirá que o PSDB e a oposição tradicional não gostam do Bolsa-Família, tampouco dos demais programas de transferência de renda.

Como me disse o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, há uma semana, existem discursos de oposicionistas chamando o Bolsa Família de Bolsa Esmola e cobrando um ajuste fiscal e menos gastos por parte do governo federal. Obviamente que as reclamações quanto aos gastos estão diretamente relacionadas ao número estratosférico de ministérios e sobreposição de funções, não com os programas sociais. Mas, na eleição, os petistas já imaginam inclusive o estrago que isso pode provocar se levado para o horário eleitoral.

Se os tucanos caírem nessa armadilha da mesma forma que entraram no redemoinho da privatização, gastarão um tempo enorme tentando passar a ideia de que foram eles que criaram os programas iniciais. E como Lula já faturou esses programas, dificilmente o PSDB conseguirá livrar o povo dessa chantagem na hora da eleição. Não por acaso, Aécio Neves discursará hoje em Goiânia tentando colar no PSDB o embrião dos programas sociais. Resta saber, se a vacina terá efeito.

E a vacina...

Aécio terá que dar várias doses dessa vacina ao eleitor. Afinal, se a economia não se recuperar até a campanha, a tendência do PT é chantagear, dizer aos brasileiros que o PSDB acabará com os programas sociais para vencer a crise. E o tucano que responda a um barulho desses. Afinal, todo mundo sabe que, no governo Fernando Henrique Cardoso, foi feito um forte ajuste fiscal e que o programa Comunidade Solidária, idealizado pela ex-primeira-dama Ruth Cardoso, consistia na sociedade tomar conta das suas mazelas, sem que o estado precisasse fazer tudo.

Enquanto isso, no Congresso...

O governo será forçado a negociar vetos esta semana, coisa que não acontecida há mais de cinco anos. Vamos ver como se sai no primeiro da fila, o do royalties do petróleo. Até ontem, os congressistas aliados ao Planalto tinham esperanças de que o PIB levasse o pessoal a refletir melhor sobre o tema e considerasse a proposta do governo. Difícil.

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