quarta-feira, outubro 10, 2012

O convênio Petrobrás-CUT - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 10/10


Como outras empresas que necessitam de mão de obra qualificada não disponível no mercado, a Petrobrás tem realizado diretamente ou com a contratação de empresas especializadas cursos de formação e preparação de técnicos em vários níveis nas áreas de petróleo, gás e energia. A educação básica, porém, não tem nada a ver com a natureza da estatal e, para isso, já existem programas específicos do governo, sob a responsabilidade do Ministério da Educação (MEC). Não foram suas necessidades nem seus objetivos sociais que justificaram os convênios de R$ 26 milhões firmados em 2004 e 2007 com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT, e à sua coligada Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS), para alfabetização de 200 mil pessoas. Trata-se de área inteiramente estranha às atividades sindicais e aos objetivos definidos pelos estatutos da Petrobrás.

Se há algo surpreendente na decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) - tomada no último dia 26, de determinar a abertura de tomadas de contas especiais para calcular os prejuízos e identificar eventuais responsáveis por irregularidades, por não haver comprovação suficiente de que o trabalho tenha sido realizado em condições satisfatórias - é o fato de a providência ter demorado tanto. Além da CUT, são alvo de processos para apuração de danos três outras instituições, que receberam da estatal valores menores, mas também deixaram de apresentar os documentos comprobatórios exigidos. A área técnica do TCU havia proposto a aplicação imediata de multas aos dirigentes da estatal, o que não foi aceito pelo relator do processo, tendo o tribunal decidido avaliar antes as tomadas de contas especiais.

O relatório do TCU nota que os convênios foram firmados sem uma exposição de motivos ou documentos que permitam saber a razão pela qual a CUT e a ADS receberam os recursos da Petrobrás para um projeto do programa Brasil Alfabetizado, do MEC. Além de não ser equipada para proporcionar ensino básico, a CUT nunca mostrou preocupação especial com o tema. Sua cartilha é outra, versando, principalmente, sobre o direito de greve. Quanto à ADS, constituída em 1999, da qual também participam o Dieese e outras instituições, suas atividades têm sido orientadas, principalmente, para o fortalecimento de cooperativas e outros empreendimentos coletivos, sem vínculo, pelo que se tem conhecimento, com atividades na área de educação fundamental.

O relatório diz também que a Petrobrás não apresentou fichas de acompanhamento individual dos alunos, listas de presença, documentos sobre o acompanhamento das ações dos alfabetizadores e o número de alfabetizandos. Por isso, não é possível aferir se o dinheiro pago era compatível com as atividades previstas. A CUT alega ter cumprido todas as etapas da parceria e que apresentou comprovantes dos serviços prestados. A Petrobrás afirmou que não existem irregularidades ou beneficiamento político-partidário nos convênios firmados durante a gestão de José Sérgio Gabrielli, "o que será comprovado pela companhia no andamento do processo". Nem a CUT nem a estatal explicaram, no entanto, por que o MEC foi mantido inteiramente à margem desses convênios, já que, como assinala o TCU, a pasta deveria, no mínimo, atuar como fiscal dos projetos.

Parece longe de ser casual o fato de a Federação Única dos Petroleiros, que representa os funcionários da Petrobrás e com a qual a direção da estatal procura manter as melhores relações, ser filiada à CUT. Isso pode explicar por que a diretoria da empresa transferiu generosamente recursos para a central sindical petista, para um programa sem justificativas, pois não faz parte das suas finalidades, e cuja execução, como mostrou o TCU, não tem comprovação adequada.

Acertos financeiros motivados por interesses político-partidários ou ideológicos, como tudo indica ser esse entre a Petrobrás e a CUT, são condenáveis em quaisquer circunstâncias. Quando envolvem, como falsa justificativa, o déficit educacional do País, o "malfeito" é ainda mais grave.

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