VALOR ECONÔMICO - 02/07
A crise econômica que abate a Europa não se restringe apenas aos países que se decidiram pelo euro como moeda única. Ao contrário, a própria ideia da Comunidade Europeia passa por sua pior provação e pode não sobreviver às consequências funestas que se seguiriam a uma implosão catastrófica da união monetária.
O desenrolar da crise tem mostrado que a arquitetura da governança da Comunidade Europeia, assim como das instituições do euro, não estão à altura dos desafios impostos por um processo de integração econômica e financeira que avançou até o estágio observado hoje na Europa. A inadequação dessa governança é mais óbvia na zona do euro, onde a moeda única não se apoia sobre os pilares de uma união fiscal e financeira que assegure a convergência das políticas macroeconômicas e regulatórias indispensáveis à convivência no seio de uma união monetária.
Comandados pela chanceler Angela Merkel, os alemães acreditam que teria chegado a hora de dar um basta aos excessos e de enquadrar os países "rebeldes" numa disciplina fiscal e financeira capaz de restaurar a capacidade de pagamento desses países. A Grécia, nesse sentido, seria o caso exemplar. Embora os números demonstrem o contrário, a recuperação de uma trajetória sustentável para sua dívida dependeria, daqui para frente, segundo a visão germânica, apenas de seu esforço próprio para gerar os resultados fiscais prometidos nos acordos com a "troika" (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e FMI).
A cada dia que passa, os mercados ficam mais nervosos e prisioneiros das incertezas; o desemprego aumenta.
Com base nessa visão, a Alemanha vem se opondo à revisão dos acordos com a Grécia, assim como se manifesta contrariamente a um maior ativismo do BCE na provisão de liquidez para os bancos europeus, com vistas a evitar o risco de um salvamento "pela porta dos fundos" dos países devedores, por meio do financiamento da autoridade monetária europeia. Na mesma toada, os alemães têm até aqui vetado a ideia de emissão dos eurobônus, títulos garantidos pela coletividade dos países integrantes da zona do euro, cuja captação serviria para financiar os países mais endividados do bloco.
A posição de Merkel tem suas justificativas, notadamente vinculadas a questões da política doméstica alemã. Há também o receio de que um resgate dos países devedores com poucas condicionalidades gere um intolerável "moral hazard" que pode levar a recorrentes crises fiscais no futuro, cuja solução pesaria inexoravelmente sobre os ombros alemães.
Felizmente, a julgar pela recente entrevista do ministro das finanças Wolfgang Schäuble à revista "Der Spiegel", os alemães apoiariam a evolução da zona do euro para uma verdadeira união fiscal, em que os países-membros abririam mão de sua soberania fiscal. Para Schäuble, sem uma união fiscal não seria possível para a Alemanha assumir a corresponsabilidade na emissão de um "eurobônus". No tipo de união imaginada pelo ministro alemão, o volume de gastos de cada país e seus limites de endividamento seriam decididos em Bruxelas, restando aos Estados-membros apenas a função escolher a distribuição dos gastos. Além disso, segundo Schäuble, seria igualmente necessário o estabelecimento de uma "união bancária", esta entendida como a criação de uma entidade supervisora bancária europeia.
Essas propostas, aliás, estão em linha com um recém-divulgado documento elaborado pelo presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, conjuntamente com os presidentes da Comissão Europeia, do "Eurogroup" e do BCE. Nele se propõe o fortalecimento, ao longo da próxima década, da atual união monetária, por meio de uma forte integração nos campos das políticas orçamentárias e financeiras.
De fato, tais ideias apontam na direção correta, muito embora a engenharia política necessária não seja trivial. A renúncia à autonomia fiscal exigiria a aprovação dos cidadãos dos países-membros, inclusive os da própria Alemanha, em votação plebiscitária cujo resultado é difícil de se prever, notadamente na conjuntura atual de severa crise econômica.
Ocorre que o relógio está correndo e não há tempo hábil para se esperar a reforma das instituições europeias na direção de uma maior integração. A cada dia que passa, os mercados ficam mais nervosos e prisioneiros das incertezas; o desemprego aumenta, assim como o desespero da população dos países afetados. A popularidade de seus dirigentes políticos é corroída dia-a-dia, tirando-lhes a legitimidade para liderar seus países.
Sendo assim, medidas eficazes de curto prazo devem ser urgentemente adotadas, sem se abrir mão do aprofundamento da integração na zona do euro. Isso significa inevitavelmente reforçar o caixa dos fundos de resgate europeus, permitir que eles emprestem diretamente para os bancos necessitados de capital, renegociar de novo a dívida da Grécia para dar um horizonte maior ao país e, não menos importante e assegurar que o BCE tenha um papel mais ativo na provisão de liquidez para os bancos. Para tanto, é necessário que a chanceler Merkel flexibilize sua posição, permitindo que a convergência para uma união fiscal se dê gradualmente, sem que os riscos de desintegração da zona do euro continuem tão elevados.
O desenrolar da crise tem mostrado que a arquitetura da governança da Comunidade Europeia, assim como das instituições do euro, não estão à altura dos desafios impostos por um processo de integração econômica e financeira que avançou até o estágio observado hoje na Europa. A inadequação dessa governança é mais óbvia na zona do euro, onde a moeda única não se apoia sobre os pilares de uma união fiscal e financeira que assegure a convergência das políticas macroeconômicas e regulatórias indispensáveis à convivência no seio de uma união monetária.
Comandados pela chanceler Angela Merkel, os alemães acreditam que teria chegado a hora de dar um basta aos excessos e de enquadrar os países "rebeldes" numa disciplina fiscal e financeira capaz de restaurar a capacidade de pagamento desses países. A Grécia, nesse sentido, seria o caso exemplar. Embora os números demonstrem o contrário, a recuperação de uma trajetória sustentável para sua dívida dependeria, daqui para frente, segundo a visão germânica, apenas de seu esforço próprio para gerar os resultados fiscais prometidos nos acordos com a "troika" (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e FMI).
A cada dia que passa, os mercados ficam mais nervosos e prisioneiros das incertezas; o desemprego aumenta.
Com base nessa visão, a Alemanha vem se opondo à revisão dos acordos com a Grécia, assim como se manifesta contrariamente a um maior ativismo do BCE na provisão de liquidez para os bancos europeus, com vistas a evitar o risco de um salvamento "pela porta dos fundos" dos países devedores, por meio do financiamento da autoridade monetária europeia. Na mesma toada, os alemães têm até aqui vetado a ideia de emissão dos eurobônus, títulos garantidos pela coletividade dos países integrantes da zona do euro, cuja captação serviria para financiar os países mais endividados do bloco.
A posição de Merkel tem suas justificativas, notadamente vinculadas a questões da política doméstica alemã. Há também o receio de que um resgate dos países devedores com poucas condicionalidades gere um intolerável "moral hazard" que pode levar a recorrentes crises fiscais no futuro, cuja solução pesaria inexoravelmente sobre os ombros alemães.
Felizmente, a julgar pela recente entrevista do ministro das finanças Wolfgang Schäuble à revista "Der Spiegel", os alemães apoiariam a evolução da zona do euro para uma verdadeira união fiscal, em que os países-membros abririam mão de sua soberania fiscal. Para Schäuble, sem uma união fiscal não seria possível para a Alemanha assumir a corresponsabilidade na emissão de um "eurobônus". No tipo de união imaginada pelo ministro alemão, o volume de gastos de cada país e seus limites de endividamento seriam decididos em Bruxelas, restando aos Estados-membros apenas a função escolher a distribuição dos gastos. Além disso, segundo Schäuble, seria igualmente necessário o estabelecimento de uma "união bancária", esta entendida como a criação de uma entidade supervisora bancária europeia.
Essas propostas, aliás, estão em linha com um recém-divulgado documento elaborado pelo presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, conjuntamente com os presidentes da Comissão Europeia, do "Eurogroup" e do BCE. Nele se propõe o fortalecimento, ao longo da próxima década, da atual união monetária, por meio de uma forte integração nos campos das políticas orçamentárias e financeiras.
De fato, tais ideias apontam na direção correta, muito embora a engenharia política necessária não seja trivial. A renúncia à autonomia fiscal exigiria a aprovação dos cidadãos dos países-membros, inclusive os da própria Alemanha, em votação plebiscitária cujo resultado é difícil de se prever, notadamente na conjuntura atual de severa crise econômica.
Ocorre que o relógio está correndo e não há tempo hábil para se esperar a reforma das instituições europeias na direção de uma maior integração. A cada dia que passa, os mercados ficam mais nervosos e prisioneiros das incertezas; o desemprego aumenta, assim como o desespero da população dos países afetados. A popularidade de seus dirigentes políticos é corroída dia-a-dia, tirando-lhes a legitimidade para liderar seus países.
Sendo assim, medidas eficazes de curto prazo devem ser urgentemente adotadas, sem se abrir mão do aprofundamento da integração na zona do euro. Isso significa inevitavelmente reforçar o caixa dos fundos de resgate europeus, permitir que eles emprestem diretamente para os bancos necessitados de capital, renegociar de novo a dívida da Grécia para dar um horizonte maior ao país e, não menos importante e assegurar que o BCE tenha um papel mais ativo na provisão de liquidez para os bancos. Para tanto, é necessário que a chanceler Merkel flexibilize sua posição, permitindo que a convergência para uma união fiscal se dê gradualmente, sem que os riscos de desintegração da zona do euro continuem tão elevados.
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