quarta-feira, janeiro 27, 2010

ANTONIO CARLOS MAGALHÃES JUNIOR

2009: a conta ainda não foi paga

FOLHA DE SÃO PAULO - 27/01/10


Ao que tudo indica, apenas o governo federal parece ter acreditado em suas próprias previsões de que o país sairia incólume da crise

OS NÚMEROS , indicadores e estudos que vêm sendo divulgados nos últimos dias apenas confirmam o que, infelizmente, já era esperado por aqueles que veem a situação econômica do país e acompanham as medidas que estão sendo tomadas e, principalmente, as decisões que deveriam estar sendo adotadas e não o são. Ao que tudo indica, apenas o governo federal parece ter acreditado em suas próprias previsões de que o país sairia praticamente incólume da crise mundial.
O desemprego, como se temia, aumentou no país. Segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), órgão do Ministério do Trabalho, a criação de novos postos em dezembro último (995 mil) foi a menor em quase cinco anos. Alguns setores econômicos tiveram desempenho pífio em 2009. A indústria abriu somente 10 mil vagas. Apenas no Estado de São Paulo, 98 mil vagas foram cortadas, e o horizonte de curto prazo não é muito animador: a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) prevê a recuperação desses postos apenas para 2011.
Sobrou para a juventude. Ou pior: faltou. Estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), recentemente divulgado, mostra que o desemprego entre jovens triplicou no período de 1987 a 2007 e aponta, como principal causa, a falta de investimentos na juventude.
A educação não é de qualidade, a evasão escolar é elevada e o índice de reprovação, segundo dados da Unesco, é o maior da América Latina. De outro lado, as oportunidades de emprego são poucas, de baixa qualidade, e os jovens acabam por se submeter a postos de trabalho sem carteira assinada, sem férias, sem o 13º salário, sem o FGTS, sem as garantias previdenciárias, enfim, sem os direitos trabalhistas básicos.
Junte-se a esse cenário o deficit da Previdência Social, que aumentou 12% no ano passado, alcançando R$ 43,6 bilhões, atingindo o patamar de 1,41% do PIB (antes, representava 1,2% do PIB), e teremos um futuro desolador para a população trabalhadora em geral, e os jovens em especial, caso o governo atual não modifique seu perfil de gastos, deixando de ser tão perdulário e temerário em suas despesas correntes.
Não é possível que o governo federal continue gastando como vem fazendo nos últimos anos, escorado em uma política tributária voraz, injusta, inibidora do investimento privado. Embora a conta de 2009 ainda esteja nos sendo cobrada, já estamos em 2010. Apesar dos sucessivos erros cometidos pelo governo, a retomada do crescimento que todos esperamos se avizinha e, certamente, exigirá uma infraestrutura de produção, de transportes, de comunicações e canais de exportação muito acima daquela atualmente oferecida pelo país.
O poder público precisa fazer a sua parte nesse esforço de quase reconstrução da infraestrutura nacional. Não será com inaugurações fictícias -como aquelas a que temos assistido quase todos os dias, cujo objetivo é, reconhecidamente, promover comícios e lançar factoides que permitam ao presidente da República apresentar sua candidata- que o Brasil passará a contar com estradas, ferrovias, portos, fontes de energia.
Chegou a hora -aliás, já passou - de o governo ter mais responsabilidade e trabalhar para o desenvolvimento do país, e não apenas fazer política eleitoreira. O governo precisa, também, deixar o empresariado fazer a parte dele. O malefício da excessiva carga tributária pode ser comprovado (como se ainda precisasse sê-lo) pelo bom desempenho apresentado pelos setores da indústria que foram desonerados.
Em toda a indústria de transformação, as empresas dos subsetores beneficiados voltaram a contratar e a fazer novos investimentos. Se o governo avança sobre as empresas, sangrando-as, elas deixam de investir. Se o governo recua de sua sanha arrecadadora, as empresas voltam a investir e o país cresce. A lição é simples, e o resultado, previsível. Falta só o governo tê-la aprendido e, finalmente, fazer o dever de casa, o que, até agora, não aconteceu, a não ser na publicidade oficial e nos comícios eleitoreiros, onde há apenas uma versão para os fatos.
Resta-nos torcer para que o crescimento de arrecadação nos últimos dois meses de 2009 não se traduza em aumento ainda maior nos gastos governamentais. Afinal, a tentação será grande em um ano eleitoral.

ANTONIO CARLOS MAGALHÃES JUNIOR, 57, professor universitário e empresário, é senador da República pelo DEM-BA.

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