sábado, outubro 17, 2009

ARTHUR VIRGÍLIO

Para a classe média, a conta


A classe média continua na mira do governo, que até já cogitou taxar as cadernetas de poupança. Neste mesmo espaço, condenei a malfadada idéia, que lembrava os tempos de 1990, quando a então ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, na gestão Collor, bloqueou as poupanças e os depósitos bancários dos brasileiros. Os números coincidem: lá atrás, bloqueio de tudo que passasse de Cr$ 50 mil; agora, taxação sobre o excedente a R$ 50 mil. Os governantes atuais, porém, parecem ter caído em si, talvez se advertindo da inconveniência de aplicar medida tão impopular justamente em ano pré-eleitoral. Ao menos por ora, a ameaça está engavetada.

Não dá para taxar a poupança? Então, retenham-se as restituições do Imposto de Renda da Pessoa Física, o que significa mais uma investida sobre as classes médias, onde está o maior grupo de pessoas com direito a restituição, porque pagaram de imposto mais do que era devido. Involuntariamente, diga-se, porque na maior parte dos casos – o dos trabalhadores e servidores públicos – o recolhimento é compulsório, efetuado na folha de pagamento. Quando fazem a declaração anual, em que se permite descontar as despesas com educação e saúde, muitos contribuintes verificam então que pagaram a mais e têm direito a que o excedente lhes seja devolvido. Este ano, segundo informações da imprensa, cresceu o número de declarações retidas pela chamada “malha fina” da Receita, fato que por si implica demora na restituição. Depois se revelou haver atraso deliberado. O próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, o admitiu, afirmando que o ritmo das devoluções “é moldado pela disponibilidade da receita”. E esta sofreu redução. Ou seja, o governo resolveu lançar mão do dinheiro de contribuintes para fazer caixa, o que foi classificado pelo jornal O Estado de S.Paulo de “estelionato fiscal”.

A Comissão de Assuntos Econômicos aprovou proposta minha para que o ministro da Fazenda seja convidado a prestar esclarecimentos ao Senado. Diante da reação da imprensa, do Congresso e da sociedade, o governo voltou atrás. O ministro declarou ter determinado que as restituições sejam feitas até dezembro. Mas isso não invalida o convite. Ele precisa explicar, no Senado, por que o governo, em vez de tentar sacrificar ainda mais a já penalizada classe média, não corta gastos de custeio como o bom senso aconselha. Qual a primeira providência que uma família organizada toma quando, por algum motivo, sofre redução de rendimentos? Corta as despesas consideradas supérfluas. Ajusta os gastos ao orçamento. É o que o governo deveria fazer. Ele tem muita “despesa supérflua” a cortar. Bastaria reduzir o escandaloso número de Ministérios (37); cortar pela metade o número de funcionários comissionados – em grande parte nomeados por motivos políticos e para aparelhar a máquina do Estado; parar de inflar a máquina pública e reduzir ao máximo as despesas com viagens e diárias.

Há, pois, muita gordura na máquina administrativa. É preciso poupar no custeio para aumentar a taxa de investimento público. Lamento que o governo prefira continuar com a gastança “supérflua”, sempre mandando a conta para as classes médias.

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