Data marcada (terça-feira última), convites despachados, horas antes do jantar em que o presidente Luiz Inácio da Silva tentaria convencer os senadores do PMDB a desistir da presidência do Senado e deixar a vaga para o PT, o encontro foi cancelado.
Por orientação da própria cúpula pemedebista, que mostrou a Lula o tamanho da enrascada: terreno conflagrado, público astuto e jogo para lá de ambíguo. Por isso, não convinha contrariar a regra segundo a qual presidente da República só entra em conflito depois de tudo resolvido.
O caso, porém, é tão delicado que Lula precisará, mais cedo ou mais tarde, ele mesmo resolver a questão. Não daquele jeito de sempre, vendendo autoconfiança em público. De uma forma mais jeitosa, discreta, ritualística.
O roteiro da solução do atrito entre PT e PMDB na disputa pelas presidências do Congresso está sendo escrito na Esplanada dos Ministérios e já tem pronta a primeira cena: uma conversa de presidente para ex-presidente entre Lula e o senador José Sarney.
Segundo seus autores, Sarney compreenderia a dimensão do problema, pois conheceu ao longo da vida e durante o período na Presidência da República os caminhos, as pedras e as cobras.
Sabe que Congresso tumultuado e base de apoio parlamentar desorganizada é complicação na certa. No último período do último mandato pode ser fatal, custar a entrega do poder ao adversário.
Aconteceu com Fernando Henrique Cardoso em 2001, quando PMDB e PFL se desentenderam por motivos outros, a briga repercutiu na eleição para as presidências da Câmara e do Senado, o PSDB tirou do pefelê a vez na presidência da Câmara (foi eleito Aécio Neves) e, no ano seguinte, a aliança entrou no processo de sucessão toda desarrumada.
Lula não deve só a isso sua eleição, mas deve também. Portanto, foi aconselhado por personagens que acompanharam bem de perto aquela confusão a tomar agora suas precauções.
Não deixar o embate correr frouxo, como fez Fernando Henrique na época. Acompanhar de perto o suficiente para não perder o controle, mas de longe o bastante para não parecer interferência excessiva nem sofrer os efeitos de possíveis balas perdidas.
Entrar naquele jantar marcado para terça-feira passado munido apenas de uma dose cavalar de auto-estima seria um risco desnecessário. Daí o cancelamento.
A retomada do domínio seria a conversa entre Lula e Sarney. Nela, o presidente procuraria levar o senador Sarney a pôr na mesa algumas cartas. Suficientes para que possa compreender ao menos o nome do jogo.
Até agora o Palácio do Planalto só conseguiu vislumbrar por trás da insistência do PMDB em ficar com as presidências das duas Casas as digitais do senador Renan Calheiros.
Oficialmente, corre a versão de que Calheiros faz carga contra a candidatura do senador Tião Viana por mágoas restantes do processo que resultou na renúncia ao cargo de presidente do Senado. Renan Calheiros estaria inconformado com a posição excessivamente imparcial de Viana na época.
Não há, contudo, um só dirigente do PMDB ou uma só pessoa que conheça razoavelmente o senador alagoano que acredite nessa versão. Por absoluta impossibilidade de Renan Calheiros agir movido a sentimentos. Bons ou ruins. Sendo seu motor o interesse, a mágoa é motivação insuficiente.
Mais provável, se conclui, é que esteja atrás do prestígio perdido, da capacidade de movimentar pressões ao ritmo de sua vontade. Mas, como já não tem força própria para tanto, escora-se em José Sarney.
E o objetivo deste na história é o que interessa ao Palácio do Planalto esclarecer a fim de apartá-los e, assim, deixar Renan Calheiros se movimentar com seu próprio combustível.
Como Sarney não abrirá a guarda com ninguém do partido, a cúpula do PMDB não vê outra saída, a não ser Lula tentar diretamente, numa conversa franca, saber aonde quer chegar o ex-presidente: se pretende mesmo ser ungido à presidência do Senado como se diz, ou se isso já é página virada em sua vida, como ele diz.
Mas como abordar o assunto sem dar margem a tergiversações?
A sugestão é que Lula faça um apelo candente a Sarney para que pacifique o PMDB, leve o partido a aceitar a partilha do comando do Congresso ficando com a Câmara, deixando o Senado para o PT.
No lance definitivo, pediria a Sarney que assumisse a coordenação da campanha de Tião Viana. A suposição é a de que não poderá se recusar sem dizer o motivo ou assumir que defende o rompimento do equilíbrio de poder entre os dois parceiros.
Na hipótese de assumir a própria candidatura, assunto encerrado. Se hesitar, fica aberto o caminho para que diga, então, qual é mesmo o problema, cuja solução só Lula dispõe de instrumentos para encontrar.
Se aceitar, estará resolvido o primeiro dos três pré-requisitos - os outros dois são o andamento da crise econômica e a escolha da candidatura - para o PMDB decidir de que lado fica na sucessão presidencial. |
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