quarta-feira, janeiro 22, 2014

Reformas na China e precauções no Brasil - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 22/01

Para reduzir a dependência de exportações de commodities, o país precisa dar um choque de eficiência na indústria, abrindo-se às cadeias globais de produção



Tem sido quase um mantra autoridade brasileira explicar as agruras econômicas por supostas dificuldades ocorridas fora das fronteiras. Mas, com os EUA se movendo para sair do atoleiro, e a própria União Europeia com a boa notícia de que, pelo menos, parou de piorar, a justificativa das “causas externas” perde ainda mais veracidade. Não que o país seja blindado contra impactos de fora. Apesar da dimensão do seu mercado interno e do ainda relativamente baixo coeficiente de abertura da economia, o Brasil ou qualquer outro país estão imunes a impactos externos. Mas a inflação e a lentidão no crescimento, duas das graves mazelas nacionais, têm causas preponderantes internas, de erros na política econômica.

Ameaça externa a ser acompanhada é a derivada das mudanças em andamento na economia chinesa, a segunda maior do mundo, e o principal mercado para commodities brasileiras (minério de ferro, grãos, principalmente). No ano passado, a China liderou a lista de destinos das exportações brasileiras com 46% de tudo o que o país vendeu no exterior, à frente do mercado americano, com 24,9%.

A informação, dada segunda-feira, de que o PIB chinês cresceu “apenas” 7,7% em 2013 — mesma taxa do ano anterior —, o índice mais baixo em 14 anos, forçou a queda da bolsa brasileira.

Estima-se até uma retração de 1% nas exportações nacionais de commodities, em função da China. Mas um crescimento acima dos 7% não é uma catástrofe. O que alimenta preocupações diante da China são as inevitáveis trepidações decorrentes da profunda mudança de modelo de crescimento, atrelando-o mais ao consumo interno e menos aos investimentos — projeto estratégico a cargo da nova geração no poder, à frente dela o novo presidente, Xi Jinping. Nesta espécie de outra Longa Marcha, em que, acena Jinping, mais mecanismos de economia de mercado serão adotados, o governo chinês terá de manejar com uma parte do sistema bancário que opera submerso em sombras. Não se sabe ao certo o tamanho do risco que paira neste grande segmento financeiro.

Precisaria entrar na agenda de Brasília a necessidade de se reduzir ao máximo a dependência do mercado chinês, mesmo que não sejam amplas as margens de manobra. A questão reforça, para o Brasil, a necessidade de restaurar a competitividade das exportações de produtos manufaturados. A política industrial, portanto, terá de ser repensada, para o Brasil não perder o bonde da história das cadeias globais de produção, forma mais eficiente de absorver novas tecnologias e se manter competitivo no exterior — o que o Brasil deixou de ser na indústria. A precaução aconselha, então, uma economia menos protecionista, mais aberta ao mundo. Neste sentido, será inexorável resolver o impasse do Mercosul, para o Brasil poder tratar de acordos bilaterais sem amarras.

Não se trata de tema de campanha eleitoral. Mas ele estará à espera do próximo presidente, no dia 1° de janeiro, no Planalto.

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