segunda-feira, fevereiro 25, 2013

Arquivo militar - ANCELMO GOIS


O GLOBO - 25/02

O Arquivo Nacional fez um acordo de cooperação técnica com o Superior Tribunal Militar. Vai treinar funcionários do STM para conservação de documentos. A parceria vai permitir a digitalização de 707 processos de opositores do regime militar. Eles estão em 543 rolos de microfilmes.

Bebel na ONU
A ONU vai lançar um hino para comemorar o Dia Internacional da Mulher, no dia 8. Bebel Gilberto, nossa cantora, a espanhola Concha Buika e a americana Beth Blatt são algumas das vozes de “Uma mulher”. A música poderá ser baixada na internet por 0,99 dólar. A renda vai para o programa ONU Mulheres.

Clássico brasileiro
A Orquestra Sinfônica Brasileira homenageará os 150 anos de Ernesto Nazareth no concerto de abertura da temporada, em março. “Suíte Nazareth”, encomendada ao compositor Paulo Aragão, terá regência de Roberto Minczuk. O violonista Yamandu Costa será o solista. Merece.

Escola Stuart Angel
Stuart Angel, estudante morto pela ditadura, em 1971, virou nome de escola estadual em Senador Camará, no Rio. Uma caravana de amigos, liderada pela jornalista Hildegard Angel, irmã de Stuart, estará na inauguração hoje.

No mais
O deputado Jair Bolsonaro, que saiu em defesa da blogueira Yoani Sánchez, é o mesmo que defende a ditadura implantada no Brasil em 64. Os militares brasileiros também censuraram e prenderam seus opositores. Democracia é melhor. 

FIM DE FESTA
Já virou tradição. Em dezembro, os comerciantes de lojas chiques de Ipanema e Leblon, na Zona Sul, colocam aqueles tapetes vermelhos nas calçadas para dar um ar mais glamouroso a seus negócios. A intenção é deixar o lugar mais bonito. O problema é que as festas acabam, e as marcas na calçada ficam. Veja na foto do arquiteto Miguel Pinto Guimarães, feita agora, em fevereiro, na calçada do Leblon. “Estamos praticamente em março, e as pedras portuguesas permanecem sujas de cola e com pelos vermelhos. Eles deveriam ser obrigados a restaurar as calçadas imediatamente”, defende Miguel. O arquiteto é contra a ideia do tapete vermelho. “É muito cafona. Quando chove, ele fica imundo e nojento. Não tem glamour nenhum. Ipanema e Leblon não precisam disso”, diz. Mas aí é outra história 

Hora da saudade
Os portugueses, castigados pela crise econômica, arrumaram um jeito criativo de protesto. Interrompem os discursos de ministros cantando “Grândola, Vila Morena”, de Zeca Afonso. A música, símbolo da Revolução dos Cravos, que pôs fim a ditadura em 1974, lembra, como hino de protesto, o nosso “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, contra a ditadura militar.

Por falar em Vandré...
A funcionária do ItamaratyAracy Moebius Guimarães Rosa (1908-2011), mulher do escritor Guimarães Rosa, homenageada em janeiro por Dilma por ter ajudado a salvar a vida de judeus na Segunda Guerra, escondeu Vandré em seu apartamento na época da ditadura.

Animação brasileira
A série “Nilba e os desastronautas”, animação infantil da produtora brasileira 44 Toons e da Fundação Padre Anchieta, foi vendida para o Starz, canal pago americano com 30 milhões de assinaturas. É a primeira vez que uma animação 100% produzida no Brasil é exibida na TV americana. A estreia é em abril.

Beleza na favela
Um médico tem subido a Rocinha para fazer preenchimento de rosto e aplicar Botox nas moradoras da favela. Cobra R$ 500.

Diário de Justiça
Um carioca vai ganhar R$ 1.800 por ter ficado preso por mais de uma hora em um dos elevadores do Centro Profissional Prima, no Recreio, quando ia para uma sessão de fisioterapia. A decisão, contra o condomínio do prédio e os Elevadores Ideal, é da 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Rio, que acolheu o voto do juiz Antônio Aurélio Abi-Ramia Duarte.

Celeiro de atores
A querida atriz Bibi Ferreira, 90 anos, estará hoje na Escola Técnica de Teatro Martins Pena, que comemora o centenário da primeira turma. O pai dela, Procópio Ferreira, formou-se lá.

Vida bandida
Veja só que baixaria. A filha toda-toda de um ex-jogador de futebol se envolveu numa briga no prédio onde mora, no Leblon, no Rio. Um pouco depois da meia-noite de quinta, ela e o namorado tiveram um arranca-rabo violento na portaria. O rapaz, enfurecido, quebrou a porta de vidro e acabou se machucando. O chão ficou cheio de sangue.

Muro da vergonha
O muro, na Vieira Souto, que isola os bacanas do Country, em Ipanema, está malcuidado. Tem sido usado até como banheiro por banhistas. Aliás, ontem, Danuza Leão, na “Folha”, abordou a decisão do clube de vetar o ingresso de Guilhermina Guinle em seus quadros. E concluiu que a querida atriz tem culpa “por querer pertencer ao clube mais gagá do Brasil”.
Calma, gente!

Jogo perigoso - JOSÉ MILTON DALLARI

O Globo - 25/02

Já é dado como certo que a inflação brasileira vai atingir um povo patamar este ano. Fechou 2012 em 5,84% e certamente ficará acima dos 6% em 2013, podendo até encostar no teto da meta estabelecida pelo Banco Central, de 6,5%. A alta dos preços fugiu das previsões mais otimistas feitas pelo Banco Central. E isso com vários aumentos sendo adiados para o fim do semestre, como a passagem dos transportes públicos em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro.

O número não assusta tanto em si. Sim, estamos longe dos tempos de hiperinflação quando os preços subiam 40% ou 50%. Mas o que está assustando é o grau de improviso nas medidas aleatórias implementadas.

Aparentemente, o Banco Central e o ministro Guido Mantega, da Fazenda, não têm falado a mesma língua. Enquanto o BC dá sinais de que busca um dólar mais fraco em relação ao real, para evitar que os produtos importados pesem sobre o índice, o ministro Mantega continua declarando que o dólar a R$ 2 veio para ficar. O real mais forte poderia baratear as importações melhorando os preços de alguns produtos no mercado interno. Mantega afirma que não usará o câmbio para conter pressões inflacionárias. Ele garante que o instrumento clássico de política monetária são os juros. Mesmo assim, o mercado vê o BC aceitando um câmbio abaixo de R$ 2 para evitar alta de preços.

Um dólar a R$ 2, um pouco mais ou um pouco menos, tem quase o mesmo efeito sobre os preços. O problema é que a moeda americana chegou a R$ 2,10, no fim de 2012, voltou para R$ 2,05 em janeiro, e neste início de fevereiro, bateu em R$ 1,95, a menor cotação desde maio do ano passado.

Essa foi a resposta do mercado para os desencontros entre Mantega e o BC. Como se sabe, são as oscilações bruscas do câmbio que atrapalham o empresário que faz planos ou até mesmo o viajante que está comprando dólares para suas viagens.

Não é sinal de equilíbrio um câmbio descer de R$ 2,10 para R$ 1,95 em pouco menos de dois meses.

Mesmo assim, o mercado já vê a possibilidade de uma elevação da taxa básica de juros, a Selic. Atualmente em 7,25%, seu menor patamar histórico, a Selic baixa é uma espécie de bandeira do governo de Dilma Rousseff contra juros escorchantes. Foi ela quem bancou a briga contra os bancos para que os juros do cheque especial, do cartão de crédito, dos empréstimos, fossem reduzidos para fazer a economia crescer em ritmo mais acelerado.

Dilma, e o BC, não cogitavam mexer na Selic pelo menos até dezembro. Quiçá, até 2014. Ou seja, pela provável falta de planejamento e improviso na condução da política monetária, talvez seja preciso esfriar a economia para conter a alta dos preços.

O Brasil começa 2013 com muitas interrogações. Não pode haver improvisos quando se trata de alta da inflação e ameaça ao crescimento econômico, pois, como o governo sabe, a inflação é o maior imposto a ser pago pelos pobres.

A boa escola - LYA LUFT

REVISTA VEJA
Meu brilhante colega Gustavo Ioschpe, uma das mais lúcidas vozes no que diz respeito à educação, escreveu sobre o que é um bom professor. Eu já começava este artigo sobre o que acho que deva ser uma boa escola, então aqui vai.

Primeiro, a escola tem de existir. No Brasil há incrivelmente poucas escolas em relação à necessidade real. Têm de existir escolas para todas as crianças, em todas as comunidades, as mais remotas, com qualidades básicas: não ultrapassar o número de alunos bem acomodados, e que eles não tenham de se locomover para muito longe; instalações dignas, que vão das mesas as paredes, telhado, pátio para diversão e recreio, lugar para exercício físico e esportes; instalações sanitárias decentes, cozinha para alimentar os que não comem suficientemente em casa; alguém com experiência médica ou de enfermagem para atender os que precisarem. Em cada sala de aula, naturalmente, uma boa prateleira com livros sem dúvida doados pelos governos federal, estadual, municipal. E que ali se ensine bem o essencial: aritmética, bom uso da linguagem, noções de história e geografia para que saibam quem são e onde no mundo se situam. Falei até aqui apenas de ensino elementar em escolas menos privilegiadas economicamente. Em comunidades mais resolvidas nesse sentido, tudo isso não será apenas bom, mas excelente, desde aparte material até professores muito bem preparados que sejam bem exigidos e bem pagos.

No chamado 2 o grau, além de livros, quem sabe computadores, mas - ainda que escandalizando alguns - creio que esses objetos maravilhosos, que eu mesma uso constantemente, não substituem um bom professor. E que, nesse degrau da vida, todos sejam preparados para a universidade, desde que queiram e possam. Pois nem todos querem uma carreira universitária, nem todos têm capacidade para isso: para eles, excelentes Escolas Técnicas, depois das quais podem ter mais ganho financeiro do que a maioria dos profissionais liberais. Professores com mestrado e se possível doutorado, diretores que conheçam administração, psicólogos que conheçam psicologia, todos com saber e postura que os alunos respeitem a fim de que possam aprender.

Finalmente a universidade, que enganosamente se julga ser o único destino digno de todo mundo (já mencionei acima os cursos técnicos cada dia melhores e mais especializados). Universidade precisa existir, mas não na abundância das escolas elementares. É incompreensível e desastrosa a multiplicação de faculdades de medicina, por exemplo, cujas falhas terão efeitos dramáticos sobre vidas humanas. Temos pelo país muitas onde alunos não estudam anatomia, pois não há biotério, não têm aulas práticas, pois não há hospital-escola. Essa é uma realidade assustadora, mas bastante comum, que, parece, se tenta corrigir. Dessas pseudofaculdades sairão alunos reprovados nas essenciais provas do CRM, mas que eventualmente vão trabalhar sem condição de atender pacientes. Faculdades de direito pululam pelo país, sem professores habilitados, sem boas bibliotecas, formando advogados que nem escrever razoavelmente conseguem, além de desconhecer as leis - e reprovados aos magotes nas importantíssimas provas da OAB. Coisa semelhante aconteceria com faculdades de engenharia mal preparadas, se existirem, de onde precisam sair profissionais que garantam segurança em obras diversas, de edifícios, casas, estradas, pontes. Vejam que aqui comentei apenas alguns dos inúmeros cursos existentes, muitos com excelente nível, mas não se ignorem os que não têm condições de funcionar, e mesmo assim... existem. Em todas essas fases, segundo cada nível, incluam-se professores bem preparados, muito dedicados, e decentemente pagos - professor não é sacerdote nem faquir.

O que aqui escrevo é mero, simples, bom-senso. Todos têm direito de receber a educação que os coloque no mundo sabendo ler, escrever, pensar, calcular, tendo ideia do que são e onde se encontram, e podendo aspirar a crescer mais. Isso é dever de todos os governos. E é nosso dever esperar isso deles.

Sementes do futuro - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 25/02

Por todo o Brasil, os prefeitos iniciantes arrumam a casa para mostrar serviço, enquanto os de segundo mandato tratam de organizar o jogo para a próxima eleição. Especialmente, nas capitais dos três maiores colégios eleitorais do país: São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Desses três, o único estreante é Fernando Haddad, do PT de São Paulo. Saiu vitorioso logo na primeira eleição que disputou e para administrar o terceiro maior orçamento do país.

Obtive o privilégio de entrevistá-lo na semana passada (os principais trechos estão publicados na edição de ontem do Correio) e nos tempos em que era ministro da Educação. As diferenças entre o ministro e o prefeito são visíveis a olho nu.

O ministro Haddad não costumava discorrer com desenvoltura sobre os temas políticos. Qualquer comentário nessa seara vinha precedido de avaliações citando o ex-presidente Lula, que o levou para o governo e à candidatura a prefeito. Também sempre citava Dilma. Não havia uma definição pessoal de Haddad sobre a política pura e seus movimentos. A voz para discorrer sobre essas temas não era tão firme ou ligeira quanto era ao falar sobre educação.

A poucos dias de fechar seus primeiros dois meses de governo, o prefeito Haddad demonstra uma desenvoltura nessa área que chama a atenção. Dispensa a citação dos padrinhos para fazer avaliações do processo político. Especialmente, quando se refere a São Paulo.

Quando perguntado sobre a candidatura do senador Aloizio Mercadante ao governo do estado daqui a um ano e cinco meses, responde que o PT não trabalha com o conceito de fila. E que, se fosse assim, ele (Haddad) não teria sido candidato a prefeito de São Paulo. Epa! Olha só o potencial cabo eleitoral petista ao governo de São Paulo jogando uma pedra de influência na condução do processo! E espinhos no caminho de Mercadante.

Haddad não menciona, afinal, está no começo de sua gestão. Mas tem plena consciência de que sua performance enquanto prefeito funcionará como cartão de visitas para o candidato a governador, seja Mercadante, Alexandre Padilha (ministro da Saúde), Marta Suplicy (Cultura) ou José Eduardo Cardozo (Justiça). Afinal, foi assim que Haddad conduziu sua campanha no ano passado, dizendo que a cidade precisava desfrutar do estilo de governo Lula-Dilma. Para o bem ou para o mal, seu desempenho até outubro do ano que vem terá importância na briga com o PSDB pelo governo estadual.

Enquanto isso, para o futuro…

Mais do que a influência da gestão de Haddad na próxima eleição estadual — e também presidencial, por causa do tamanho da cidade de São Paulo — o que torna o prefeito paulistano um personagem a ser observado com bastante atenção é o gosto que ele tomou pela política. O professor da USP aprendeu muito rápido. Podem escrever: tanto ele quanto o prefeito do Rio, Eduardo Paes, do PMDB, estão na pista, em aquecimento para o futuro. Paes, reeleito, deve ficar até o fim do governo, para marcar sua vida política como o prefeito da Copa e das Olimpíadas do Rio.

Quanto ao prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, do PSB, há ainda um dilema a resolver: se ele ficará ao lado dos tucanos, ou abraçará a candidatura Eduardo Campos, caso o governador de Pernambuco seja mesmo candidato a presidente no ano que vem. Hoje, nada indica que Eduardo não será.

Eduardo está convencido de que, por ser um personagem fora do eixo Rio, São Paulo e Minas Gerais, tem que entrar logo na pista a fim de se consolidar como uma opção viável, nem que seja para 2018. Afinal, no triângulos dos votos, as opções começam a trabalhar, as sementes estão germinando. Se vão vingar, o futuro dirá.

CANETA CARREGADA - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 25/02

O prefeito Fernando Haddad (PT-SP) demitiu quase 400 funcionários em pleno Carnaval. Boa parte deles estava na Secretaria de Coordenação de Subprefeituras. É nela que em geral são abrigados cabos eleitorais de vereadores distribuídos por diferentes regiões da cidade.

PRAZO ESTENDIDO
As exonerações foram assinadas por Antonio Donato, secretário de Governo de Haddad. Dias depois, novos funcionários começaram a ser nomeados. O troca-troca era intenso até a sexta-feira.

CHEGUEI!
Outras secretarias que tiveram numerosas baixas: Esporte, Lazer e Recreação e a pasta da Educação.

CANJA
Os vereadores ligados ao ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD-SP) estão de sobreaviso. Até agora, no entanto, as demissões não alteraram o espírito "colaborativo" deles com Haddad. Muitos não se animam nem a defender Kassab das críticas que recebe.

GANGORRA
O custo de vida na região metropolitana de São Paulo subiu 0,96% em janeiro, segundo a FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado). Em 12 meses, a alta acumulada atingiu 5,69%. As classes D e E foram as mais prejudicadas pela inflação, puxada pela alta de alimentos, transporte e gastos pessoais.

CANAL LIVRE
O filme "Família Vende Tudo", de Alain Fresnot, já teve mais de 750 mil visualizações no YouTube, onde foi postado na íntegra. Nas telas, em que os diretores dependem de distribuição, divulgação de mídia e tempo de exibição, o longa, que tem Caco Ciocler e Luana Piovani no elenco, levou 110 mil pessoas aos cinemas em 2012.

LADO A LADO
Elton John desembarca em São Paulo nesta semana cercado por seguranças -alguns são de sua equipe e outros são contratados no Brasil. Ele é "paranoico", de acordo com integrante da produção de seus shows, desde que John Lennon e Gianni Versace foram assassinados por psicopatas nos EUA quando andavam tranquilamente pelas ruas.

ESTUFA
O cantor deve trazer também no staff um funcionário que tem a missão exclusiva de cuidar das centenas de flores que manda colocar em seu camarim.

A MEDIDA É CERTA
Desde que assumiu a presidência do Palmeiras, há 31 dias, Paulo Nobre perdeu quatro quilos. Sem dieta.

TURMA
O cineasta Cláudio Assis já escalou os atores Dira Paes, Irandhir Santos e Conceição Camarotti e o diretor de fotografia Walter Carvalho para o seu novo filme. "Big Jato" é adaptação de romance de Xico Sá, colunista da Folha.

DDI
A viagem de Sean Penn a São Paulo está sendo articulada pelo embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Averláiz. Os dois são amigos -o americano é um defensor de Hugo Chávez. A ideia é que Penn faça surpresa para Ariel Goldenberg, ator com síndrome de Down que é estrela do filme "Colegas" -e fã do ator.

SEGUNDA TELA
Mariana Eva Leis, ex-MTV, está lançando uma rede social voltada para a TV. Enquanto assiste a um programa, a pessoa pode acompanhar numa "segunda tela", a de seu computador, todas as outras que estão no mesmo momento no Twitter e no Facebook escrevendo sobre ele. O portal TV Square seleciona só os comentários sobre a atração, facilitando a comunicação.

ESPELHO
O vereador Andrea Matarazzo (PSDB-SP) apresentou projeto de lei para mudar a Lei Mendonça, de incentivo à cultura. Ele propõe que a dedução de impostos permitida pela regra municipal seja ampliada para 100% do valor investido em programas da área. E que novos setores sejam contemplados, como economia criativa, design de moda, patrimônio e cultura digital. Diz que se baseou no Proac, programa do governo de São Paulo.

DOUTORA EM MODA
Ana Claudia Michels estuda medicina; Shirley Mallmann planeja abrir o próprio negócio na área da moda. Entre uma atividade e outra, as duas tops se juntaram pela primeira vez para uma campanha. Elas vão estrelar o lançamento da coleção de inverno 2013 da relojoaria Euro. O styling é de Raphael Mendonça e a maquiagem, de Saulo Fonseca.

LEITURA FASHION
O lançamento da coleção outono/inverno da C&A reuniu no hotel Unique as modelos Marcelle Bittar, Renata Kuerten, Paolla Rahmeier e Alicia Kuczman. Luciana e Marcela Tranchesi, Ucha Meirelles e Costanza Pascolato foram ao desfile.

UM OUTRO OLHAR
A abertura da mostra "Lady Dior as Seen By", com obras de David Lynch, Olympia Scarry, Laerte Ramos e Tunga, levou ao Instituto Tomie Ohtake a administradora Mariana Auriemo, a modelo Caroline Ribeiro e o presidente da Dior, Sidney Toledano.

CURTO-CIRCUITO
Ferreira Gullar lança o livro "Arte Contemporânea Brasileira" no Itaú Cultural, às 19h. Grátis.

Começa hoje a pré-venda de ingressos para o Restaurant Week, apenas para clientes MasterCard.

Ivo Pitanguy será homenageado no Simpósio Internacional de Cirurgia Plástica, de 15 a 17 de março.

Nem de esquerda, nem de direita, muito pelo contrário - EUGÊNIO BUCCI

REVISTA ÉPOCA
Se a rede de Marina não tem um lado, que posições tomará? Será ela um muro? Uma ameba apartidária?Nem direita, nem esquerda", afirmou a ex-Ministra Marina Silva no lançamento da Rede Sustentabilidade, em Brasília, no sábado 16 de fevereiro. Ela pretende transformar sua rede num novo partido político, que não será nem de situação, nem de oposição. "Se Dilma estiver fazendo algo bom, vamos apoiar. Se não, não. Parece ingênuo, mas não tem nada ingênuo."

Aí, você para e pergunta: como assim? Se essa tal rede não tem um lado, que posições ela tomará? Como pode um partido que não seja nem oposição, nem situação? Será um muro em cima do qual todos os ecologistas vão se aboletar? Ou será simplesmente uma ameba apartidária? Marina diz que não é nada disso. "Estamos à frente", diz. "Estamos indo para o mundo do paradoxo."

Se você não entendeu nada, espere um pouquinho mais. O mais espantoso na fala de Marina Silva é que ela pode ser, mais do que sincera, verdadeira. Um partido que não se deixe aprisionar por dogmas da esquerda ou da direita é possível. Mais ainda: um partido que não seja necessariamente de situação ou de oposição sistemática, e que saiba promover causa coletiva (o bem comum) acima de seus interesses imediatos, é necessário (ainda que pareça inacreditável). Não que a Rede Sustentabilidade seja um milagre, uma epifania verde. Está longe disso. Só afirmo que a intenção de estar à frente e acima dessa polarização pode conter uma novidade real, embora, de início, ela pareça apenas mais um eco da dissimulação ideológica tão característica dos palanques brasileiros.

Bem sabemos que a política pátria é feita por gente que vive dizendo não ser o que é. A começar pelos líderes de direita, que nunca se declaram de direita. Em 2011, o então prefeito paulistano, Gilberto Kassab, lançou sua nova legenda, o PSD, com um fraseado inesquecível. "O Partido Social Democrático não será de direita, não será de esquerda, nem de centro." Atenção para o detalhe: nem mesmo de centro. Em vez disso, seria "um programa a favor do Brasil". A favor do que mesmo? Em 2012, o PSD ensaiou apoiar a candidatura de Fernando Haddad para a prefeitura de São Paulo. Depois acabou apoiando José Serra. Em 2013, desenvolto e solto, se dá bem com o governo Dilma Rousseff e com o governador Geraldo Alckmin. O PSD está mesmo a favor do Brasil - e também das autoridades brasileiras e de tudo o mais. Eis aí um partido a favor de tudo.

Para Kassab, cujas origens estão no malufismo e cuja trajetória é bastante heterodoxa, os conceitos de esquerda, direita e centro acabam não fazendo grande diferença. Rigorosamente, ele não distingue uma categoria da outra. Por isso, tem legitimidade para dizer que não pertence a nenhuma das três.

Kassab, sejamos justos, não está sozinho no esporte de pular fora das ideologias. O PMDB está por cima e está cada dia mais prosa. Cazuza cantava que queria uma ideologia para viver. Com o PMDB, é o contrário: se lhe arranjarem uma ideologia, ele morre. O PMDB é a prova monumental de que esse negócio de se enclausurar na esquerda ou na direita não dá camisa a ninguém. O próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre fez piada com o assunto. Desde muito cedo, quando lhe perguntavam se ela era socialista, dizia: "Não sou socialista, sou torneiro mecânico". O bordão se desdobrou em variações: "Não sou de esquerda, sou torneiro mecânico". Ou essa: "Se você conhece uma pessoa muito idosa esquerdista, é porque está com problema".

Em resumo, Kassab não toma conhecimento da bifurcação histórica que separou a esquerda da direita. O PMDB milita para sepultar para sempre essa bifurcação. E Lula, ao caçoar dos esquerdistas, avisa que não reza pela cartilha de ninguém, que fará o que bem entende. Os fundamentalistas que se acomodem. Ou que se mudem.

Marina, voltemos a ela, achou melhor mudar. Deixou o PT, deixou o governo, disputou a Presidência da República em 2010 pelo Partido Verde e, agora, vem aí com a Rede Sustentabilidade, que ainda é uma incógnita. Quando ela diz que está além da esquerda e da direita, pode ser confundida com alguns dos discursos mais antigos da política brasileira. Num ponto, porém, pode ter razão: a poluição não é de esquerda, nem de direita; existe tanto na China como nos Estados Unidos. O princípio da tolerância não é de esquerda, nem de direita, e exige uma democracia em que ateus convivam com crentes e, também, em que gente de esquerda dialogue com gente de direita, sem que um precise eliminar o outro. Se estiver falando disso, Marina estará dizendo a verdade e poderá, quem sabe, nos desafiar a pensar além dos velhos formatos.

Fadiga eleitoral - PAULO GUEDES

O Globo - 25/02

À"esquerda", Lula, o Pai do Povo. À "direita", Fernando Henrique, o Pai da Estabilidade Econômica. Lula lança a candidatura de Dilma Rousseff à reeleição. FHC acusa Lula de se tornar o "presidente adjunto". "Nós não herdamos nada, nós construímos ( tudo no decênio glorioso sob a Presidência do PT )", alardeou a presidente Dilma. "Os petistas não podem mais falar de ética, porque têm o mensalão na testa", retruca FHC, que patrocina o lançamento da candidatura de Aécio Neves.

Mais uma vez, a tentativa de polarização da disputa entre tucanos e petistas. Caso funcione, completam seis mandatos, quase um quarto de século no poder. Gramsci estaria orgulhoso. Não há mais oposição, apenas uma velha "esquerda" hegemônica. "Não há mais disputa ideológica, basta saber quem comanda a vanguarda do atraso", confessou com extraordinária propriedade o ex-presidente FHC.

Poderia estar se referindo aos conservadores que lhe garantiram a emenda constitucional da reeleição. Agora não há mesmo oposição. Só a disputa pela gigantesca engrenagem estatal de comando centralizado que controla 40% do Produto Interno Bruto. Por isso a ferocidade das disputas. Por isso também o extemporâneo lançamento de candidaturas presidenciais. Por isso as degeneradas práticas políticas. Por isso a interrupção da agenda de reformas. E, como o primeiro a trocar o aprofundamento das reformas por um prolongamento do mandato, espero que se orgulhe FHC de ser também o pai dessa obsessão reeleitoral de presidentes passados e futuros.

A permanente batalha de PSDB e PT acabou cristalizando práticas políticas disfuncionais, alianças espúrias entre facções social-democratas e conservadores do Antigo Regime que lhes dão sustentação parlamentar. A Rede de Marina Silva pode ser uma novidade na política brasileira. Já o PSB de Eduardo Campos, situacionista que pode se tornar uma alternativa oposicionista, não se comportou bem em seus primeiros ensaios de questões nacionais, como a distribuição dos royalties do petróleo. E a imagem do partido só piora quando o governador cearense Cid Gomes, sempre às voltas com sua alegada preferência por jatinhos, atropela a Constituição na tentativa de desviar recursos dos royalties para financiar show de inauguração de hospital cuja fachada desabou.


Os acordos que o Brasil pode perder - SERGIO LEO

Valor Econômico - 25/02

É natural e legítimo o temor de que o Brasil fique à margem, e assista de longe a formação de um grande acordo transatlântico de comércio, anunciado pelos governos dos Estados Unidos e da União Europeia. Mas ainda há pouco conhecimento sobre a razão desse temor: o que são os acordos que, imagina-se, podem marginalizar o país.

"Muita gente está analisando essa negociação de um acordo do século XXI com paradigmas dos anos 70 do século passado, quando o acesso a mercados era o item principal", diz a professora Michelle Ratón Sanchez Badin, da Fundação Getulio Vargas, autora de dois esclarecedores estudos comparativos sobre os acordos de comércio que proliferaram nos últimos anos (disponíveis na internet, nos endereços is.gd/SsEfLM e is.gd/8ex04b).

É consenso que a principal expectativa com o acordo entre europeus e americanos não está no acesso a mercados - a queda de tarifas de importação -, ainda que ela seja capaz de gerar ganhos econômicos expressivos. O prêmio mais cobiçado é a remoção de barreiras não tarifárias, regulatórias, de padronização existentes entre os dois parceiros. Na prática, tanto EUA quanto os europeus já vêm estabelecendo seus próprios padrões, aplicando-os em seus acordos comerciais, em alguns casos harmonizando-os na organização para Cooperação e desenvolvimento econômico (OCDE), e no caso dos EUA, até influindo decisivamente nas regras da organização Mundial de Comércio (OMC).

Já na fracassada negociação da Área de Livre Comércio das Américas, na década passada, o Escritório Geral de Contabilidade (GAO, da sigla em inglês), órgão de apoio ao poderoso Congresso americano, apontava a remoção dessa barreiras e o estabelecimento de normas - para compras governamentais, serviços, investimentos e propriedade intelectual - como os resultados de maior potencial de ganho para as empresas americanas.

A recusa em aceitar os padrões americanos em temas como proteção a investimento e propriedade intelectual foi um dos pontos de atritos entre Brasil e EUA na ALCA. Falida a negociação, o governo americano conseguiu exportar seu modelo, já adotado no México, a dez países da região com quem firmou acordos de comércio. Ele inclui temas de difícil aceitação no Brasil, como o privilégio a investidores estrangeiros para contestar medidas de governo que afetem investimentos, ou regras de propriedade intelectual que restringem severamente a fabricação de medicamentos genéricos ou cópias de conteúdo em meios eletrônicos.

É essa a nova fronteira explorada nos acordos de comércio assinados pelos países ricos - e não só por eles: Badin mostra que China e Índia já começaram a incluir esses novos temas, como compras governamentais, em seus próprios acordos comerciais.

Nas negociações dessas regras nos acordos firmados com os EUA, alguns países, como o Chile, usaram ambiguidades no texto dos tratados para ter margem de manobra. Assim, regras duríssimas de propriedade intelectual foram amenizadas pela legislação chilena. Mas o resultado foi que os EUA mantêm há 17 anos o Chile entre as prioridades da lista de países candidatos a sanções por desrespeito à propriedade intelectual e direitos de autor, conhecida como Special 301 - da qual o Brasil foi retirado recentemente. Entre os pecados chilenos está a liberdade para digitalização de livros em bibliotecas públicas e a recusa em aceitar o chamado "notice and take down" que obriga provedores de internet a tirar do ar, mesmo sem ordem judicial, sites acusados de infringir direitos de autor.

"Recebi dez lobistas diferentes dos EUA quando negociávamos o acordo, doutores em química, em informática, gente ilustrada", ironiza o ex-negociador chileno do capítulo de propriedade intelectual, o ex-ministro Álvaro Diaz, ex-embaixador do Chile no Brasil, hoje na Cepal. "Aprendemos muito, essas negociações ficaram extremamente especializadas." A regulamentação chilena é fonte constante de atrito com os EUA e, hoje, nota Diaz, o governo americano tenta endurecer os termos do acordo de propriedade intelectual na negociação da Parceria Transpacífico (TPP). "A negociação está dura, ninguém quer ceder e, no Chile, será uma batalha política", prevê Diaz.

A especialização exigida para negociar esses novos acordos é lembrada também por Michelle Badin, que alerta para um aspecto significativo: os negociadores americanos e europeus tornaram-se especialistas em garantir exceções nos compromissos de liberalização, para atender aos grupos de interesse de seus países. Essas exceções são embutidas discretamente, em anexos e notas de pé de página dos acordos, às vezes nem percebidas no momento da negociação. São frequentes nos acordos de compras públicas, que deveriam impedir discriminação de exportadores dos parceiros devido a exigências de conteúdo local.

Os EUA, por exemplo, excluem de acordos de compras governamentais algumas licitações dirigidas a pequenas e médias empresas. "Eles têm estudos sofisticados de quais setores têm como fornecedores essas empresas de menor porte, e podem assim proteger esses mercados", comenta Badin. Enquanto o Chile conseguiu um acordo de compras públicas que abrange 30 Estados e o governo federal, o acordo com a Colômbia, mais recente, só inclui compras federais e de cinco estados.

Análises sobre efeitos do acordo EUA-UE sobre o Brasil terão de levar em conta que o país poderá se beneficiar de muitos dos resultados do embate negociador entre dois pesos pesados, como novas regras com mais transparência e agilidade nas alfândegas.

A difícil negociação para harmonizar regras e conceitos tão distintos quanto os europeus e americanos para alimentos, direito autoral e ambiente ressalta, porém, o quanto o Brasil está despreparado para esse novo cenário. A experiência mostra que, para firmar acordos comerciais, hoje, é preciso ter muita gente e ciência para saber exatamente o que se está concedendo e o que se está recebendo em troca.

Sem salvacionismo - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 25/02

É da natureza da política a aspiração ao poder. Nenhum problema — ao contrário — em persegui-lo. A questão é como fazê-lo. Há dias, a ex-senadora e ex-ministra Marina Silva, candidata à Presidência em 2010, quando atraiu surpreendentes 20 milhões de votos, executou um movimento com este objetivo, na criação do partido Rede.

Com um ar de modernidade implícito no nome, a legenda tem o claro objetivo de aproveitar a péssima imagem dos políticos e se apresentar como algo “novo”, capaz de furar a couraça da política estabelecida e fazer a revolução de costumes que se deseja.

Difícil aposta. A primeira questão mais ampla a ser colocada sobre o Rede é que ele vem agravar a distorção da excessiva pulverização partidária: será a 31ª legenda do país, deformação permitida pela ausência de uma cláusula de barreira efetiva, como em democracias mais desenvolvidas.

As regras de constituição do Rede, por sua vez, deixam transparecer conhecidos cacoetes da política partidária nacional, mais do mesmo. Não será fácil para os redistas — ou enredados ? — desfazer a ideia de que a legenda não passa de um projeto pessoal de Marina Silva, para disputar as eleições presidenciais do ano que vem.

Fixar como um dos requisitos para adesões que políticos não tenham mais do que 16 anos de mandatos, a soma dos dois cumpridos por Marina como senadora, reforçou a suspeita sobre o projeto pessoal.

A intenção de chegar à Presidência é legítima; já o método, inadequado. Como Marina Silva, ex-senadora petista, tem enormes dificuldades de se contrapor ao antigo partido, o polo mais forte das forças no poder, a nova legenda tende a desaparecer no nevoeiro da “terceira via”, sem muitas chances de chegar lá.

Afinal, para quem deseja o poder, o adversário a ser batido é o PT. O Rede faria aliança com o PSDB num eventual segundo turno no ano que vem? Em 2010, a ex-senadora não fez e liberou seus eleitores, forma dissimulada de ajudar no avanço de Dilma Rousseff para a vitória.

Fazer política com uma postura salvacionista contra a política não traz boas lembranças. Fernando Collor de Mello, político alagoano, embora carioca, surgiu como um meteoro russo, sem partido, esgrimindo contra a política tradicional. Também apostou no descrédito da vida pública e conseguiu derrotar Lula no segundo turno das eleições de 1989. Sofreu impeachment em 1992.

Políticos com mandato podem aderir ao Rede, sem incorrer na legislação sobre fidelidade partidária, por se tratar de nova legenda. Até fichas-sujas terão sinal verde no Rede. Não convence o argumento de que líderes de movimentos sociais podem ter sido condenados “injustamente”. Ou se respeita por inteiro as instituições republicanas ou não.

Não parece ter futuro esta mistura de intenções de modernidade com antigos cacoetes da política como ela vem sendo praticada.

Uma nova ciência moral - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 25/02

Imagine um livro chamado "Tipologia do Canalha: Como Identificar o Seu". Puro best-seller!


Ouvi uma dessas mulheres livres, dona de seu nariz e de seu corpo, dizer: "Que falta que faz um canalha!".

Recentemente, um grande especialista e prático da alma humana, um terapeuta, me dizia se escandalizar com o fato de que mulheres inteligentes e emancipadas falam em consultórios de psicanalistas que querem que os homens as chamem de cachorras e as tratem como vagabundas na cama.

Como se escandalizar com o óbvio? Quem foi que disse que as mulheres não gostam de se sentirem vagabundas no sexo? Só quem, mui catolicamente, imaginou que querer ser tratada como vagabunda no sexo fosse fruto de opressão machista. Risadas?

O que é um canalha? Refiro-me ao conceito de canalha. Um kantiano diria "o canalha em si".

Claro, kantianos são pessoas que pensam que o mundo é o que eles pensam que é; no fundo, o kantiano é um puritano da razão aos olhos de qualquer cético. Sua "crítica da razão prática" nada mais é do que um canto monótono semelhante aos cantos das igrejas calvinistas.

Qualquer um sabe que canalhas evoluem historicamente, como tudo mais. O grande personagem Palhares, do Nelson Rodrigues, esse filósofo brasileiro, é um tipo de canalha que não existe mais: o canalha romântico e sincero (que faz falta), apesar de que ele já identificara a necessidade de o canalha evoluir. Diriam os especialistas que Palhares tinha um claro "senso histórico".

Palhares mordeu o pescoço da cunhada caçula no corredor. E cunhadas gostosas são o segredo de um bom casamento. Palhares dizia que um canalha em sua época, os anos 1960, deveria evoluir para continuar a ser um bom canalha.

No caso dele, isso significava assimilar os avanços da psicologia, levando suas vítimas para terapias de nudez e também para reuniões do Partido Comunista. Um canalha, afinal, deveria estar em dia com a sua época.

Importantíssimo, no entendimento de nosso querido Palhares, seria um canalha entender que ser católico não ajudava mais ninguém a pegar mulher porque assustaria a presa. A sinceridade do Palhares estava no fato de ele se reconhecer canalha por vontade própria.

Hoje em dia, o canalha "avançou" muito. Ele identifica "causas externas" para sua condição de canalha, ou, melhor ainda, não reconhece sua condição de canalha; julga-se apenas um homem cumprindo seu "papel social".

Imagine um livro chamado "Tipologia do Canalha: Como Identificar o Seu". Puro best-seller!

Por exemplo, o livro descreveria o canalha institucional, que é o canalha que faz suas baixarias dizendo que é em nome do coletivo. Normalmente, adora a hierarquia e a burocracia.

É o tipo que, segundo o psicólogo americano Philip Zimbardo, autor do excepcional livro "O Efeito Lúcifer" (Record), se adaptaria bem às condições de horror em sistemas totalitários com justificativa institucional. Sentiria que o horror que causa é simplesmente fruto de respeito à burocracia.

Existem também os canalhas sociais. Estes são aqueles que justificam seus atos via condições sociais em que vivem, dizendo coisas como "a escola em que estudei fez de mim um canalha, por mim seria diferente".

Conhecemos também os canalhas democráticos. Estes são aqueles que justificam seus atos porque combatem em defesa do povo. Este tipo é aquele que, por exemplo, sustenta a corrupção do Estado dizendo que está lutando pela justiça social.

Primo de primeiro grau deste último é o canalha militante, este tipo que agrediu a blogueira cubana Yoani Sánchez, acusando-a de ser paga pela CIA. A marca deste é jamais ouvir nada que discorde de sua religião.

Há também o canalha científico. Este afirma que as neurociências provaram que ser canalha é função de certa área do cérebro, resultado de herança evolucionária e genética.

Um tipo especialmente "fofo" é o canalha livre. Suspeito ser este o mais avançado de todos.

Quando indagados acerca de seu comportamento, afirmam que agem do modo que agem porque sempre foram uma minoria oprimida e agora podem exercer sua canalhice livremente. A frase lapidar deste tipo de canalha é: "Todos têm direito de ser o que são; eu tenho o direito de ser canalha".

A qualidade contra a miséria - RENATO JANINE RIBEIRO

Valor Econômico - 25/02

Há poucos dias, o governo lançou mais uma etapa da luta contra a miséria, ou extrema pobreza. Nos anos Lula e Dilma, dezenas de milhões de brasileiros deixaram esse nível, subindo para o - ainda indesejado, mas mesmo assim melhor - da pobreza. Na pobreza, o ser humano repõe as energias, enquanto na sua versão extrema (ou miséria) são sensivelmente abreviadas a quantidade e qualidade de sua vida. Para usar a expressão do filósofo inglês Thomas Hobbes quando fala no estado de guerra, o miserável "não vive o tempo que a natureza normalmente lhe daria". É claro que essa distinção não torna a pobreza uma condição invejável. Aliás, a própria pobreza também abrevia a duração possível da existência, pelo menor acesso a cuidados bons de saúde, pela alimentação não tão boa, pelo desgaste a que se submete a pessoa num país que, na frase de Fernando Henrique Cardoso, é mais injusto do que pobre. E que, por isso, tem tanta gente na pobreza simples ou extrema.

A redução da miséria e da pobreza ocorreu em muitos países. Na América do Sul, deu-se com governos de esquerda, mas alguns de direita também reduziram a dívida social. No Peru, uma diminuição no porcentual de miseráveis data de governos anteriores ao atual - que não eram de esquerda. Parece que, assim como nos anos 1990 a inflação foi derrotada em quase todo o mundo, por governos de direita na maior parte, mas também de esquerda, desde o ano 2000 a injustiça social tem baixado em muitos lugares, pela ação da esquerda mas também de alguns governos liberais.

Isso basta? Preocupa-me que a maior parte dos comentários sobre a melhoria na vida das classes pobres, no Brasil, enfatize o aumento no poder de compra. O avanço na cultura e na educação, embora ocorra, não recebe a mesma atenção. Ora, aí está a diferença entre a necessidade e a liberdade, entre uma vida de carências e uma mais ativa.

A miséria é mais fácil de se perceber sob dois aspectos principais: a fome e a doença. Digamos que os gastos básicos das pessoas se dividam entre a alimentação, a vestimenta, o transporte, a saúde e a moradia. Todos esses gastos podem ser comprimidos, a um custo humano elevado - mas não dá para deixar de comer, de se vestir, de ir e voltar do trabalho e de cuidar da saúde. Penso que a mais sacrificada dessas necessidades básicas é a moradia. Assim entendo a pesquisa que o Valor divulgou na semana passada, revelando que 65% dos moradores de favelas pertencem à classe média. Eram 37% em 2002. Certamente hoje comem e se vestem melhor, parte tem carro, mas continuam morando muito mal. Resolver a questão da residência é mais difícil, porque mais caro, do que solucionar as outras necessidades que chamei de básicas, e que são evidentes, flagrantes, visíveis.

Mas para estas necessidades, justamente por sua visibilidade, foram definidas políticas públicas que funcionam. Nelas, há uma linha de corte entre a carência e a sua satisfação. Por exemplo, a saúde seria a não-doença. Se você tem um resfriado, a cura lhe devolve a saúde. Se está com fome, comendo, ela passa. E isso todos sabem na hora. Estou simplificando, até porque podemos melhorar cada vez mais a qualidade da roupa, da comida, da moradia e do bem-estar físico e mental - mas, em linhas gerais, vale esse recorte.

O que se enquadra mal nele são a educação e a cultura. Pode haver uma satisfação completa das necessidades de proteínas e carboidratos, de vitaminas e minerais - mas não há um equivalente em termos culturais ou educacionais. Não faz sentido dizer que, vendo cem filmes, lendo cinquenta livros, conhecendo mil canções, aprendendo uma língua e resolvendo equações, eu chegue ao patamar da pessoa "culta" ou "educada". Aqui, o céu é o limite. Ou seja, não há limite.

Tudo isso para dizer que, enquanto as carências físicas são fáceis de detectar e por isso constituem prioridades dos governos, e, em consequência, contam com políticas públicas testadas e que vêm funcionando, as deficiências em cultura e educação se mostram bem diferentes: quase intangíveis, são mais difíceis de perceber, impossíveis de saciar.

Mas o lado bom dessa diferença é que a ação pública pela educação e da cultura pode ir cada vez mais longe. Ela não tem um roteiro claro. Na verdade até tem algum, no caso da educação. Hoje dispomos de indicadores de sua qualidade. O Indicador de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) tem subido dez por cento, no Brasil, a cada edição - isto é, a cada dois anos. Esse progresso é notável. Mede certas capacidades básicas. Não pode medir tudo o que há na educação. É duvidoso que consiga aferir competências sofisticadas. Mas estas, por natureza, fogem à métrica. E, se a saúde é a cura da doença, a boa educação não termina quando acaba a ignorância. Ela pode melhorar cada vez mais.

E não será este o caso da cultura? Não será ela o glacê do bolo, o que há de mais precioso nele e, portanto, o que não pode ser medido?

Porque, no fundo, a questão é: o Brasil está superando as carências que limitam a duração da vida. A luta contra a fome, o aumento do poder aquisitivo, a construção de habitações populares - tudo isso está neste projeto que permitirá, em alguns anos, zerar nossa dívida social. Mas esse é o reino da necessidade, como dizem os filósofos. Outra coisa é a república da liberdade. Para chegar a ela, só com educação e cultura. E aí temos menos fios condutores. É da natureza delas serem mais livres, terem menos roteiros, serem mais abertas para a criação humana. É bom ter isso em mente sempre que discutirmos a luta contra a pobreza. Porque ela somente será vitoriosa quando também a cultura entrar em cena.


A indústria da transparência - GIL CASTELLO BRANCO

O ESTADO DE S. PAULO - 25/02

É conhecida a piada do sujeito que pediu dinheiro emprestado ao amigo alegando que a mulher estava grávida, prestes a ter o bebê, e ele, despreparado. O amigo, esperto, respondeu- lhe: "Se você, que já sabia disso há nove meses, está despreparado, imagine eu, que acabo de ser informado...".

A história vem à tona na ocasião em que algumas prefeituras estão reclamando da vigência plena da Lei Complementar n.° 131, que determina a divulgação das receitas e despesas na internet, de forma online e pormenorizada. A chamada "Lei da Transparência", de autoria do senador João Capiberibe, foi aprovada em 27 de maio de 2009, com prazos gradativos para a implantação dos portais. Até o momento, 612 cidades brasileiras com mais de 50 mil habitantes estão obrigadas a alimentar os seus sites com informações sobre a execução orçamentária. Daqui a três meses, entretanto, a norma abrangerá todos os 5.570 municípios do Brasil. Assim, novas 4.958 cidades, com população inferior a 50 mil habitantes, terão de construir ou aprimorar os seus portais. Como sabiam disso há quatro anos, é curioso que algumas prefeituras aleguem estar despreparadas.

Na verdade, os políticos gostam de muita transparência, mas nos governos dos adversários. Mas, se os recém-eleitos ou reeleitos quiserem mesmo ser transparentes, deverão colocar nos sites o orçamento previsto e a execução, a origem da receita, as dívidas, os pagamentos a pessoas físicas e jurídicas, os nomes dos funcionários públicos com os respectivos cargos e salários, o que foi comprado, por quanto, de quem, os bens adquiridos e os serviços prestados, as licitações, os contratos e os programas implementados, entre outras informações relevantes para a sociedade saber o que está sendo feito à custa dos seus impostos, taxas e contribuições.

Como desde a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), publicada em 4 de maio de 2000, os municípios encaminham à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) o Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO) e o Relatório de Gestão Fiscal (RGF), as informações existem. Agora é colocá-las na internet.

Para a lei ser cumprida, não bastará o site municipal conter o currículo e a foto do prefeito, o telefone do Corpo de Bombeiros e outras informações do gênero. O detalhamento será fundamental para que sejam multiplicados os "auditores", o que irá aprimorar as administrações públicas. Caso a Secretaria do Tesouro Nacional leve o assunto a sério, o descumprimento da legislação poderá implicar a suspensão das transferências voluntárias.

Em São Paulo, por exemplo, prefeitos de 518 cidades deverão inaugurar ou melhorar os portais existentes. Dentre essas localidades estão, por exemplo, Campos do Jordão, com população próxima a 50 mil habitantes, e, no outro extremo, o município de Borá, com apenas 807 cidadãos. E, a julgar pela análise que a Associação Contas Abertas realizou dos portais das cidades paulistas já abrangidas pela lei, a implantação dos sites nos demais municípios do Estado de São Paulo será uma odisséia.

Com base em 105 critérios estabelecidos por especialistas da Unicamp, FGV, Universidade de Brasília, Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará, Controladoria-Geral da União, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e da própria Contas Abertas, foi criado o índice de Transparência, que atribui notas de zero a dez para os municípios com menor ou maior clareza nas informações que prestam à sociedade.

A nota média de 3,97 dos 124 municípios analisados em outubro do ano passado demonstra a má qualidade dos portais das maiores cidades do Estado de São Paulo. Além disso, 70% dos municípios tiveram de contratar empresas de informática para a construção dos seus sítios. Quanto menor o município, maior foi a tendência de recorrer à iniciativa privada. Apenas três empresas desenvolveram os portais de 59 municípios. Existem portais praticamente idênticos em diferentes cidades.

Com o mercado multiplicado, está em funcionamento verdadeira "indústria de transparência". Representantes de empresas de informática rondam as cidades brasileiras para oferecer serviços.o que é legítimo. Na realidade, o problema não são os portais terem sido desenvolvidos por um órgão público ou privado. O crucial é que a qualidade deixa muito a desejar, inviabilizando o efetivo controle social.

Diante da amostragem dos 124 municípios paulistas, não é difícil imaginar o que poderá acontecer nas 4.958 cidades brasileiras que nos próximos três meses terão de colocar as suas contas na web. Em curto prazo, a atividade de confeccionar sites tende a ser altamente lucrativa para alguns empresários e extremamente onerosa para os milhares de cidades brasileiras.

Neste cenário, cabe aos Estados e às prefeituras de maior porte que possuem bons portais colaborar com os pequenos municípios. No fim do ano passado, o Conselho de Transparência da Administração Pública do Estado de São Paulo - formado por representantes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, além de entidades não governamentais - interessou-se pelo tema e sugeriu que os órgãos estaduais afins auxiliem na difícil tarefa a ser cumprida pelas cidades paulistas de menor porte. A idéia pode ser replicada em outros Estados. Afinal, se empresas de informática podem implantar o mesmo portal em várias cidades, o Estado poderá fazê-lo com melhor qualidade e menor custo para os contribuintes.

Há quase um século, o juiz americano Louis Brandeis disse que "a luz do sol é o melhor dos desinfetantes", referindo-se ao sistema financeiro americano. No Brasil, existe uma luz no fim do túnel e a transparência, aos trancos e barrancos, está a caminho. A criança precisa nascer em breve, forte e saudável, estejam ou não os pais preparados.


Rede de intrigas - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 25/02

PT e PP travam novo embate no Ministério das Cidades. Com o aval do ministro Aguinaldo Ribeiro, a Secretaria de Saneamento da pasta, comandada por Osvaldo Garcia, indicação de Paulo Maluf no período eleitoral, quer mudar a lei para permitir repasse direto de recursos do Orçamento da União a concessionárias do setor. Hoje, as empresas só podem receber empréstimos por meio do BNDES. Capitaneados pelo presidente da Caixa, Jorge Hereda, petistas são contrários à ideia.

Arbitragem O impasse, que motivou discussões em recentes reuniões no Planalto, será decidido pela área jurídica do governo. O secretário Arno Augustin (Tesouro Nacional) não está convencido a estabelecer esse repasse direto para grupos privados.

Recado Após o mal-estar com Michel Temer, Lula combinou com Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) que enviará mensagem a ser lida durante convenção do PMDB que reconduzirá o vice-presidente da República ao comando nacional da sigla, no sábado.

Pedagógico Escala da caravana do PT em Belo Horizonte, prevista para 13 de abril, tratará dos feitos de Lula e Dilma Rousseff na educação, área que motivou a mais aguda crise do mandato de Antonio Anastasia (PSDB). Em 2011, greve de 112 dias afetou escolas da rede mineira.

De olho... No discurso pró-Aécio Neves que fará hoje em Minas, FHC defenderá que o PSDB incorpore à plataforma eleitoral de 2014 a tese do "novo choque de capitalismo", cujos pilares seriam a busca do bem-estar social com gestão eficiente e a participação direta da sociedade.

... na classe C Para se contrapor ao que chama de "desenvolvimentismo sob impulso estatal" do PT, o ex-presidente pedirá aos tucanos prioridade à agenda da nova economia e à geração de emprego qualificado para as "classes emergentes".

Homeopatia Eduardo Campos (PSB) modulará sua retórica de gradativo descolamento do governo Dilma à política tributária federal. Em seminários e eventos públicos, o governador pernambucano tentará rotular a isenção do IPI e as desonerações como práticas que estimulam as desigualdades regionais.

Peneira 1 A CNB, corrente majoritária do PT, definirá hoje calendário interno de campanha para os candidatos à presidência da seção paulista do partido. Estão no páreo os deputados Vicente Cândido e Luiz Cláudio Marcolino e o ex-prefeito de Osasco Emídio de Souza.

Peneira 2 Diante da articulação de aliados de Lula em favor de coalizão liderada pelo PMDB, a promessa central dos três postulantes ao cargo passou a ser a candidatura própria petista ao governo do Estado em 2014.

Pela raiz Além das panes regulares em semáforos, tira o sono de Fernando Haddad a frequência de quedas de árvores em períodos de chuva na capital. São 160 por dia, em média. O petista quer mapear todas, identificando espécies, tempo médio para poda e eventuais doenças.

Conselhão Em gestação há dois anos, o Conselho de Desenvolvimento Econômico de Geraldo Alckmin sairá do papel no dia 6 de março, em evento para empresários e líderes sindicais no Bandeirantes. Na ocasião, o tucano pretende empossar os 50 componentes do colegiado.

Bumerangue Em seu périplo para enfraquecer Carlos Lupi (RJ) no comando nacional do PDT, Brizola Neto (Trabalho) procurou, sem sucesso, os dirigentes da Força Sindical. Pedetistas que controlam a central disseram ao ministro que preferem acordo com o presidente da sigla.

Tiroteio
"Antecipar a eleição só interessa à oposição. Quem está no governo tem que fazer campanha com realizações no mandato."

DO PRESIDENTE DO PT-SP, EDINHO SILVA, criticando, durante seminário
da Juventude Petista, a precoce largada da disputa presidencial de 2014.

Contraponto
Minha asa, minha vida
Dilma Rousseff voltava a Brasília após viagem ao Nordeste, quando forte temporal atingiu a área de desembarque. Tão logo o avião pousou, ministros saíram pela porta traseira enquanto a presidente usou a dianteira, amparada pela comitiva, que a protegia da chuva. Gastão Vieira (Turismo) e Pepe Vargas (Desenvolvimento Agrário) esperavam carros oficiais sob a asa da aeronave.

Ao observar a cena, Dilma saiu da zona coberta, caminhou em direção à dupla de auxiliares e disse, para desespero do seu estafe:

-Se eles podem ficar aqui, eu também posso!

À sombra do autoritarismo - MARCELO COUTINHO

O GLOBO - 25/02

Duas décadas após o fim da Guerra Fria, tornou-se lugar comum dizer que a democracia virara um regime consolidado em toda a América Latina, com exceção de Cuba. Não haveria mais golpe preventivo de direita, e a esquerda finalmente aderira ao regime democrático.

Episódios como o golpe de Fujimori no Peru e de Chávez na Venezuela, ambos em 1992, seriam os estertores de um passado de atentados institucionais já superado. Agora haveria apenas um jogo sob regras democráticas: The Only Game in Town , como chama a literatura especializada no assunto.

Aliás, 1992 foi mesmo um divisor de águas. Alguns países como o Brasil pós-impeachment institucionalizaram sua democracia e economia ano a ano. Outros como a Venezuela enveredaram por uma sequência de crises de institucionalidade política e econômica, recuando um passo atrás do outro.

Seria possível assegurar que a região é hoje mais democrática do que há dez anos? Há razões para duvidar.

Neste momento, a Venezuela é a principal marca do retrocesso que aflige a região. O golpe de 10 de janeiro de 2013 ungiu ao poder uma pessoa que simplesmente não recebeu voto algum. Nicolás Maduro se transformou no primeiro presidente biônico de fato do século 21 na América Latina. Chávez voltou para Caracas, mas o problema continua. Nada apaga o golpe. Além disso, Maduro ainda governa por delegação dada por alguém que está em um leito de hospital, sem condições de exercer a Presidência como deveria.

Vale dizer que a virtude da democracia não está em um só homem e seu partido, mas na natureza das instituições do sistema político.

Recentemente, houve também ruptura democrática (também "temporária") em Honduras e no Paraguai, bem como inúmeras tentativas de censurar a imprensa, controlar as pesquisas e o livre pensamento nas universidades, anular os contrapesos institucionais e inibir a oposição em muitos outros países.

Nem mesmo o Brasil escapou dessa onda golpista. O atentado institucional levou aqui o nome de mensalão. O Supremo, no entanto, demonstrou independência e condenou pessoas poderosas. Gerou preocupação o último pronunciamento em rádio e TV da presidente Dilma. Foi mais próximo ao estilo chavista, dividindo a nação entre governistas e opositores.

Segundo a presidente, quem pensa diferentemente dela não tem fé no país, fazendo lembrar o slogan da ditadura "Brasil, ame-o ou deixe-o", mesmo com crescimento econômico agora similar ao da década perdida nos anos 1980.

Pouco a pouco, o pesadelo do autoritarismo volta a assombrar a América Latina. Talvez simbólica seja a ascensão de Cuba à presidência da Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac). Justamente um regime autoritário muito antigo estará à frente da nova organização regional.

Nos últimos tempos, os países mais dinâmicos como Chile, Peru, Colômbia e México fazem uma aposta no aprofundamento das instituições democráticas e de mercado, elaborando inclusive uma área de livre comércio. É difícil classificá-los de neoliberais porque investem progressivamente em políticas sociais em um novo contexto internacional.

Em compensação, os governos do Mercosul não sabem o que fazer para reverter a tendência de desintegração econômica já observada nos indicadores. A importância relativa do bloco decresceu para nós mesmos. As supostas esquerdas e grupos nacionalistas no poder não têm agenda de desenvolvimento e ampliam a dependência em relação à China, que de comunista só restou a ditadura.

Isso não quer dizer que o Mercosul deva ser descartado. Ao contrário, precisa ser reabilitado no seu comércio e espírito democrático. Uma coisa que faria muito bem a todos seria a alternância de poder.

Uma perigosa rota continuísta se estabeleceu. Uma parte considerável de partidos sul-americanos já está há mais de dez anos no poder, e sem qualquer perspectiva de saírem de lá. O voto que define as democracias sofre com sucessivas violações sobre o que o torna livre.

O antídoto que as sociedades têm para preservar suas instituições pluralistas é substituir um partido por outro, elegendo grupos diferentes. Não há outro remédio.


O custo Brasil começa nos atoleiros - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 25/02

Não serão necessárias filas de caminhões nas rodovias próximas aos portos ou congestionamentos de navios à espera de carregamento para que o agronegócio sofra com os gargalos logísticos

As discussões sobre logística, os embates a respeito dos portos e as divergências sobre novas ferrovias mostram que o Brasil está se preocupando mais com os gargalos que elevam os custos do escoamento da produção agrícola. Porém, a colheita da soja e do milho de verão mal entrou em sua fase mais intensa e o país já se depara com problemas primários, como atoleiros em importantes estados produtores: Mato Grosso, Paraná, Goiás e Minas Gerais. O agravamento desse problema nas próximas semanas será um fator de risco para a economia brasileira, que há 12 anos depende das exportações do setor para registrar superávits na balança comercial.

Aparentemente, caminhões atolados dão prejuízo apenas para as empresas transportadoras e para os donos das cargas. E a conservação das estradas rurais, por sua vez, é responsabilidade das prefeituras. Mas a extensão desse drama vai além da esfera local. A ampliação dos custos e a demora no transporte tiram competitividade do Brasil nas exportações. A multa cobrada quando um navio demora para ser carregado acaba sendo repassada a produtores – na redução do preço da soja – e consumidores, quando a logística eleva o custo dos alimentos.

Dessa forma, a gravidade das filas de caminhões que se formam em estradas rurais após dois ou três dias de chuva está na elevação do custo Brasil. E o caso é apenas simbólico. Além dos atoleiros, faltam redes de energia elétrica e comunicação nas regiões de expansão das lavouras, reparos nas rotas de asfalto mais utilizadas, e estrutura para estacionamento de caminhões e descanso de caminhoneiros que percorrem trechos de mais de 2 mil quilômetros. Até chegar aos projetos de ampliação das ferrovias e de reestruturação dos portos, essa lista vai longe.

Não serão necessárias filas de caminhões nas rodovias próximas aos portos ou congestionamentos de navios à espera de carregamento para que o agronegócio sofra com os gargalos logísticos. Eles ocorrem em praticamente todos os elos da cadeia da soja e do milho, atingindo, consequentemente, as indústrias que dependem dessas matérias-primas, como a da carne de frango e a da carne suína. Os atoleiros são apenas a ponta de um iceberg.

As iniciativas que buscam soluções para esses problemas deveriam unir governos locais, estaduais e federais. No entanto, o que predomina é a criação de fundos para aplicação em infraestrutura, mas que frequentemente acabam sendo usados para outros fins. Em Mato Grosso, o agronegócio reclama que R$ 530 milhões recolhidos ao Fethab para abertura e conservação de rodovias foram destinados, nos últimos quatro anos, a ações relacionadas à Copa de 2014. Isso teoricamente. A Secopa, que controla os gastos da Copa, informou que apenas um terço dos R$ 530 milhões foi aplicado.

No Paraná, a conservação das estradas rurais promete entrar em uma nova fase neste ano. O governo estadual passa a oferecer apoio às prefeituras, colocando à disposição de consórcios regionais 30 conjuntos de máquinas com retroescavadeira, trator de esteira, pá-carregadeira, motoniveladoras e rolos compactadores. As obras começam em março, na Região Sudoeste do estado. Se o projeto engrenar, devem ser investidos R$ 110 milhões ao ano na locação das máquinas.

O problema dos atoleiros, mesmo assim, não será resolvido de vez tão cedo. O que há de diferente na iniciativa é a união de esforços para a solução de um problema que praticamente todos os municípios enfrentam. As prefeituras, que sempre reclamam estar assumindo responsabilidade do governo estadual no transporte escolar, têm nesse projeto uma espécie de contrapartida. Terão de se organizar em consórcios, o que não é uma tarefa tão simples. Os esforços farão sentido se, com transporte menos problemático, os produtores conseguirem reduzir custos e melhorar sua renda; se os agricultores familiares conseguirem injetar mais recursos nas economias regionais; e se, por tabela, o acesso das comunidades rurais a escolas também for facilitado.

O emprego do 'ABS' na gestão da economia - MARCO ANTONIO ROCHA

O ESTADÃO - 25/02

A largada oficial e definitiva na campanha de reeleição de Dilma Rousseff foi abrilhantada na semana passada por dois eventos: a comemoração do "fim da miséria no Brasil", por Dilma; e a festa dos 10 anos do PT. Nesta, Lula sacramentou: "Nós vamos dar, como resposta, a reeleição de Dilma" - referindo-se a críticas do PSDB e de Aécio Neves. Então, agora já dá para entender mais ou menos esse stop and go com que o governo petista está conduzindo a gestão da economia.

Aparentemente, até recentemente, a opção preferencial do governo era pelo "desenvolvimento", em detrimento da "estabilidade". Na última semana, declarações do ministro Mantega e do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, deram sinais de uma prudente marcha à ré. O governo teria ficado preocupado com o ímpeto que a inflação vem tomando e estaria inclinado a cuidar com mais rigor da política monetária - das rédeas da carruagem -, juros e crédito.

Mas, no fundo, o que parece mesmo é que a dupla Mantega-Tombini vem empregando a tecnologia ABS para lidar com o binômio estabilidade/crescimento. ABS é o sistema de freios antiblocagem. É a maneira de parar um carro em alta velocidade que antigamente os bons motoristas já usavam: pisavam e soltavam o pedal do freio, em rápida sucessão, diante de um obstáculo inesperado ou em via molhada. Isso evita que o carro derrape ou que as rodas travem e o carro capote. A indústria criou um mecanismo que faz a mesma coisa: o freio é acionado e aliviado automaticamente em frações de segundos. A possibilidade de derrapagem ou capotagem diminui muito.

Supomos que os doutores da administração econômica governamental apostam no ABS como estratégia de controle de risco, soltando o freio quando a ameaça maior é de desaquecimento, freando quando é de inflação. Reconheçamos que, se for isso, não deu muito certo até agora. Ou a pisada e o alívio não foram acionados tempestivamente ou a economia toda não respondeu como deveria, uma vez que o mergulho do PIB foi mais fundo do que se esperava e a decolagem da inflação está sendo mais rápida do que se advertia.

Mas é uma estratégia que, se encontrar um ajuste fino, pode favorecer a reeleição desejada pelas hostes petistas. Se não se encontrar esse ajuste, o projeto de reeleição não se perderá, mas o grande projetão de "todo o poder ao PT" para todo o sempre - pois é disso que se trata, e não é pouco - será minado.

O problema é que, sem o ajuste competente da dinâmica desse processo, alguns vírus podem comprometê-lo. Por exemplo, se "o fim da miséria" é um fato mais real do que os oponentes de Dilma admitem, a demanda a ser atendida passa a ser muito mais difícil do que decretar que a miséria acabou: transferir renda é a parte mais fácil do combate à miséria. Os milhões de brasileiros que subiram na escala estatística, de R$ 70 per capita de renda para R$ 71, ou até R$ 500, que seria a fronteira da classe média, continuam miseráveis, mas seus projetos de vida mudaram. Essas pessoas não querem regredir, querem sair não só da miséria, mas também do Bolsa-Família, pois sabem que essa dependência é arriscada e, principalmente, não oferece horizonte para os filhos. Querem emprego firme com salário estável.

E quantos novos empregos firmes com salários estáveis a economia brasileira está oferecendo por ano aos egressos da faixa da miséria? Segundo o Caged, no ano passado, ela ofereceu 1,3 milhão de empregos com carteira assinada. É pouco? É muito? É suficiente?

De cara podemos dizer que os brasileiros que pegaram esses novos empregos no ano passado não eram miseráveis libertados pela poderosa presidente. Eram trabalhadores que já estavam numa faixa de renda superior ou eram jovens que entravam no seu primeiro emprego, de famílias acima do Bolsa-Família.

É possível dizer, em segundo lugar, que milhões de miseráveis que deixaram a faixa da miséria continuam sem emprego, sem perspectivas e com o risco de regressão. Por outro lado, é possível supor também que muitos dos que conseguiram se afirmar, deixar a miséria e entrar no mercado de trabalho tornaram-se consumidores ascendentes e, portanto, querem bens de cidadania: moradia, móveis, utensílios domésticos, aparelhos diversos, toda a parafernália que traça a fronteira entre o miserável - o candidato a morador de rua em grandes cidades - e o brasileiro formalizado, o cidadão. A estrada entre os dois status pode até não ser longa, mas é complexa e tortuosa. E não há como o governo pegar o ex-miserável pela mão e conduzi-lo pela estrada toda.

O governo, do PT, do PSDB, de qualquer partido, não tem e nunca terá um programa capaz de levar milhões de brasileiros a uma bem-sucedida e definitiva mudança de status social. Isso só pode acontecer com aquilo que Dilma e o PT não estão conseguindo: um "pibão"continuamente acelerado, que o Brasil já teve, desde Getúlio Vargas até o início dos anos 80.

Essa política de prende/solta, solta/prende não garante isso, pois não garante o principal para que os investimentos se multipliquem: segurança e fé na estabilidade da ação governamental de médio e de longo prazos.

O endividamento das Santas Casas - PAULO BROSSARD

ZERO HORA - 25/02

Faz alguns dias, foram divulgados alguns dados envolvendo o Serviço Único de Saúde, SUS, que não são lisonjeiros, antes são preocupantes, na medida em que têm se deteriorado os serviços que dele dependem, como o da saúde, cada vez fica mais difícil e oneroso. Assim, em 2004, os hospitais públicos respondiam por pouco mais de 41% das internações pelo SUS, os hospitais privados sem fins lucrativos, instituições filantrópicas e Santas Casas, por quase 40%, e com 18,7% as entidades privadas com fins lucrativos; em 2011 estas instituições particulares diminuíram sua participação em 10,2% do total das internações: hoje, as Santas Casas e os demais hospitais filantrópicos cobrem 44% das internações, enquanto os hospitais públicos atingem 45%. O mais significativo, porém, é revelado pelo endividamento das Santas Casas: em 2005 o montante da dívida aumentou para R$ 1,8 bilhão, em 2009 ela passou para R$ 5,9 bilhões, e em 2011 atingiu a casa dos R$ 11 bilhões.
Não é preciso dizer que o serviço em tela não poderá manter-se nesse crescente ritmo de endividamento e a causa desse desequilíbrio é sabido e consabido: se em 2011 gastavam R$ 14,7 bilhões com os serviços, enquanto a retribuição do SUS não passa dos 65% do total despendido, o déficit foi de R$ 5,1 bilhões. O que vem de ser exposto não passa do esboço de uma realidade, e de uma realidade que se agrava dia a dia. Ainda uma vez não será temeridade antever que a situação em causa não pode manter-se por muito tempo e em ocorrendo a falência dos serviços de saúde, os efeitos serão catastróficos. Se hoje os números divulgados são constrangedores, amanhã serão desastrosos, até porque o aumento deles é inevitável em razão de vários fatores a partir do crescimento da população.
Outrossim, ocorreu-me lembrar que os progressos de medicina a partir de metade do século passado foram extraordinários, o número de especialidades profissionais se multiplicou, mas o instrumental correspondente aos progressos científicos tem de acompanhá-los, o que envolve constantes investimentos; a cada avanço alcançado surgem duas necessidades. E o fluxo não para.
Segundo os entendidos, o ano de 2013 começou com o endividamento de R$ 12 bilhões e deverá encerrar-se com endividamento de cerca de R$ 17 bilhões, uma vez que, a remuneração não passa de 65% da despesa. Não é preciso grande esforço para concluir que as Santas Casas e os hospitais beneficentes não têm como sobreviver à sangria que vem sofrendo; de outro lado, levando em consideração os hábitos da administração (que só acorda quando o caso se torna insuportável, como no caso da desindustrialização da metalurgia, do prépânico da indústria automobilística e depois dos eletrodomésticos) só quando as Santas Casas forem levadas à paralisação que a administração pública vai agir, enquanto os números não cessaram de crescer. Muitos aspectos do problema poderiam ser anexados a esta apertada síntese, mas deliberadamente fico no mínimo, desejando que a proximidade das eleições e a sedução da reeleição possam tirar da letargia a administração ronceira.

Um almoço para Einstein LUIZ PINGUELLI ROSA

O GLOBO - 25/02

A partir de agora, atividades acadêmicas e científicas nas universidades federais deverão seguir uma cartilha com 122 prescrições burocráticas da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Ministério da Educação (MEC).

"A revolução dos bichos" ("Animal farm", no título original), sátira de George Orwell ao stalinismo por trair a revolução socialista, tinha também uma cartilha, com sete mandamentos: tudo o que ande sobre duas pernas é inimigo; tudo o que ande sobre quatro pernas ou tenha asas é amigo; nenhum animal usará roupas; nenhum animal dormirá em cama; nenhum animal beberá álcool; nenhum animal matará outro animal; todos os animais são iguais.

Há contradição, arbitrariedades, burocracia idiota, moralismo hipócrita e pontos éticos e corretos. Embora ficção, essa cartilha é paradigmática.

Na cartilha da CGU e do MEC, há contradições e interpretações que confrontam a Constituição. Se a cartilha for seguida à risca, nenhum professor em dedicação exclusiva poderá possuir ações de empresas, nem mesmo da Petrobras ou do Banco do Brasil, o que é um absurdo. Também não poderá participar de sociedade privada, logo os pesquisadores terão que abdicar de sociedades científicas, como a SBPC, e de outras, como o Clube de Engenharia. O item 11, por exemplo, limita a autonomia universitária listando leis e decretos e omitindo artigos da Constituição. Outros itens tratam colegiados acadêmicos como corporativos e ameaçam seus membros. O objetivo é incutir o medo que costuma paralisar as pessoas.

Alguns auditores da CGU, articulados com elementos da Procuradoria da República no Rio, promoveram acusações a Aloísio Teixeira e Carlos Levi, ex-reitor e atual reitor da UFRJ, respectivamente, e a outros colegas da reitoria (No fim da década de 1960, existiram, na UFRJ, os atingidos pelo AI-5. Agora, haverá os atingidos pelos órgãos de controle, especialmente o professor Geraldo Nunes, que o relatório da CGU demite, sem existir um processo específico contra ele na UFRJ e sem passar pelos colegiados.) As acusações foram refutadas na sua essência pelo Conselho Universitário. Aloísio faleceu. Teve em vida reconhecimento, além de acadêmico, pela posição democrática coerente desde a oposição de esquerda à ditadura. Levi, um dos criadores do LabOceano, o primeiro do moderno Parque Tecnológico da UFRJ, foi inocentado pelo colegiado da própria CGU de acusações sem pé nem cabeça: comprovou-se que os recursos foram gastos em obras e atividades acadêmicas por meio da Fundação José Bonifácio, da universidade.

Infelizmente, para a mentalidade conservadora e juridicista que entrava o serviço público, tudo o que moderniza a gestão do Estado é inimigo, até mesmo as fundações de apoio, criadas por lei com esse propósito. Por sua vez, tudo o que segue o caminho mais complicado e demorado é amigo: para seguir as regras da cartilha, doentes podem morrer sem remédios e estudantes podem ficar sem laboratórios. Querem até licitar a folha de pagamento da UFRJ, feita há décadas por meio do Banco do Brasil! A quem serve isso? A algum grande banco. Isso combate a corrupção ou a estimula?

São muitas as proibições que estimulam o imobilismo e a indolência, pois qualquer iniciativa acadêmica pode violar algo. O deputado Chico Alencar contou 3,7 milhões de leis "no país da cultura bacharelesca". Uma denúncia anônima mentirosa - disparada como um míssil por um inimigo pessoal - pode levar um colega sério a ser alvo de perseguição kafkiana. Em outro livro de Orwell, "1984", um terrível personagem, o Big Brother, de algum lugar vigia todos e os pune. Seu famoso bordão - "Big Brother está observando você" - chegou a inspirar o programa televisivo. Por razões ideológicas ou midiáticas, problemas administrativos sanáveis viram escândalos. Podem ser refutados na Justiça, mas advogados saem caro.

Dar aulas cumprindo o expediente é uma obrigação que deve ser cobrada de todos os docentes. Aliás, não há nada sobre isso na cartilha. É o mínimo, mas é preciso fazer mais: envolver os estudantes, criar coisas novas, ajudar a mudar o Brasil em benefício do seu povo e a compreender o mundo contemporâneo na cultura, nas artes, na ciência e na tecnologia. A quem interessa acabar isso?

Em 1925, Einstein esteve na UFRJ: na Escola Politécnica e no Museu Nacional, fundados por Dom João VI. Fizeram parte da UFRJ Darcy Ribeiro, José Leite Lopes, Maria Yedda Linhares, Eulália Lobo e Milton Santos (atingidos pelo AI-5), César Lattes, Carlos Chagas e Clementino Fraga. A Coppe, criada por Alberto Luiz Coimbra, que este ano comemora 50 anos de pós-graduação e pesquisa de engenharia, recebeu Noam Chomsky, os ganhadores do Nobel Carlo Rubbia e Joseph Rotblat e brasileiros ilustres como Oscar Niemeyer e os presidentes Dilma e Lula. Projetos com empresas realizados por meio da Fundação Coppetec foram citados como referência pelos ministros Mercadante e Raupp em visitas recentes. Nada disso exime a UFRJ do controle externo, mas é preciso haver respeito à autonomia. Oferecer um almoço na visita de Einstein à universidade hoje poderia ser considerado um ato ilícito, segundo a cartilha.


Cheiro de autoritarismo - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 25/02

Ao eleger a "grande imprensa" como inimigo, a direção do Partido dos Trabalhadores mostra dificuldade em aceitar o pluralismo e a liberdade de expressão como elementos intrínsecos da democracia.


As manifestações agressivas contra a presença da blogueira cubana Yoani Sánchez no país, a intromissão dos embaixadores da Venezuela e de Cuba em assuntos estritamente brasileiros e o virulento ataque de lideranças do PT à imprensa no recente encontro do partido são sinais claros, evidentes e preocupantes da reativação de um radicalismo autoritário que parecia fazer parte do passado no Brasil. Pelo jeito, estava apenas adormecido. Por conta da visão exacerbada desta militância anacrônica e de seus representantes no parlamento, até mesmo uma entrevista da dissidente cubana esteve para ser censurada na TV Senado, só indo ao ar por interferência direta do senador Eduardo Suplicy, que vem dando exemplos de sensatez e moderação em meio ao comportamento extremista de seus correligionários.
Se a iniciativa de impôr ideias e ideologias no grito e no constrangimento partisse apenas de extremistas políticos, poderia ser creditada à normalidade democrática. Num regime de liberdades, todos têm o direito de se manifestar. O preocupante é a constatação de que lideranças políticas do partido que está no poder também comungam deste pensamento único, discricionário e excludente. Foi o que se viu na reunião da cúpula petista na semana passada, em São Paulo, para celebrar o aniversário da sigla e os 10 anos no comando do país. O evento marcou o lançamento da candidatura da presidente Dilma Rousseff à reeleição, mas também foi utilizado pelas principais lideranças da sigla para fustigar a oposição e para ataques à imprensa, especialmente aos veículos de comunicação que atuam com independência e criticam o governo.
Ao eleger a "grande imprensa" como inimigo, a direção do Partido dos Trabalhadores, respaldada pelo ex-presidente Lula, mostra dificuldade em aceitar o pluralismo e a liberdade de expressão como elementos intrínsecos da democracia. No ambiente de corporativismo partidário do encontro da última quarta-feira, que contou inclusive com a presença de petistas condenados no processo do mensalão, até mesmo a presidente Dilma Roussef deixou de lado sua histórica posição de apoio à liberdade de imprensa ("O único controle da mídia que eu proponho é o controle remoto na mão do telespectador") para se alinhar ao coro dos insatisfeitos.
Esse clima de patrulhamento, conjugado ao início antecipado da campanha eleitoral para 2014, gera uma situação preocupante para o país, pois tende a legitimar as ações de grupos radicais que não respeitam quem pensa diferente. No momento em que o Brasil registra significativos avanços sociais e se prepara para encarar os desafios do desenvolvimento, seria de todo indesejável um retrocesso nas liberdades democráticas duramente conquistadas e defendidas pela maioria dos brasileiros.