domingo, maio 13, 2012

Quanto vale um amor? - DANUZA LEÃO

FOLHA DE SP - 13/05/12


Pedir uma indenização -em dinheiro- porque não foi amada pelo pai, eu acho estranho

Abandono afetivo; e dá para entender que alguém entre na Justiça reivindicando uma quantia porque não recebeu do pai o afeto que gostaria?

O ideal seria que todos os pais cercassem seus filhos de carinho e de amor; mas isso é o ideal, e o ideal, como todo mundo sabe, não existe. Alguns pais não são nem carinhosos nem amorosos, que pena, mas a vida é assim, e uma filha que nunca teve o afeto paterno tem que entender que alguns não têm afeto para dar, ou apenas não conseguem -e tratar de viver a vida como ela lhe foi apresentada, isto é, como ela é.

Pedir uma indenização -em dinheiro- porque não foi amada pelo pai, acho estranho. Quem põe um filho no mundo tem obrigações, mas amor dá quem pode, nem é um problema de querer; e amor não se cobra, nem de pai nem de ninguém.

Fico pensando na quantidade de crianças que moram com pai e mãe e que nem assim recebem o afeto de que necessitam. Pais que não tomam conhecimento de suas existências, não conversam, nem ao menos olham para seus filhos, mesmo vivendo sob o mesmo teto. E aí, eles podem cobrar também? Como? Se cobrarem, e o juiz achar que têm razão, como estipular a quantia que vai compensar a indiferença que sofreram durante anos? Vai depender da conta bancária do pai, imagino, mas não acho que seja por aí. Quem foi abandonada e desamada tem que dar a volta no passado sabendo, inclusive, que isso acontece muito mais do que se imagina.

Abandono afetivo; imagino que sejam raros os que não têm, lá no fundo do coração, a sensação de não terem sido amados suficientemente pelo pai ou pela mãe. Todos precisamos de amor, e quando somos crianças queremos todo o amor do mundo, e de todas as pessoas. Com o tempo, aprendemos que se recebermos algum afeto -de poucas pessoas, e só às vezes-, já está mais do que bom.

Carência afetiva não é fácil; alguns conseguem -ou pelo menos dão a impressão- superar e viver bem a vida; outros vão sofrer até o último suspiro, mas de uma coisa tenho certeza: não se resolve com dinheiro. Se resolvesse, nenhum filho de milionário teria o problema.

O valor da indenização me põe curiosa, tanto quanto qualquer processo que implique "danos morais". Já passou um pouco de moda, mas nos EUA, até anos atrás, uma mulher assediada sexualmente -nada de muito grave, apenas uma boa e competente paquera- processava o paquerador e exigia uma quantia por danos morais; é possível?

É normal que quando alguém sofre algum tipo de constrangimento precise de um desagravo (recompensa) pelo que passou, mas querer em dinheiro é uma maneira muito esperta de dar a volta por cima. Danos morais são vagos e dependem do foro íntimo de cada um.

Quando vou a São Paulo e, no aeroporto, a Polícia Federal me faz tirar os sapatos, o cinto e o relógio, e ainda por cima pega minha tesourinha de unhas e joga no lixo, eu me sinto vítima de grande violência moral, e acho que teria direito a uma indenização em $$ -e ter a minha tesourinha de volta, claro-, mas ainda não fiz isso por achar, entre outras coisas, ridículo; mas que é constrangimento, é.

E os namoros que não deram certo, os casamentos que não vingaram porque o amor acabou, será que isso também pode ser considerado abandono afetivo? Quanto vale o amor que deixaram de nos dar?

O mundo está muito louco.

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