quarta-feira, abril 06, 2011

CELSO MING - É o controle de capitais


É o controle de capitais
CELSO MING

O ESTADO DE SÃO PAULO - 06/04/11

O Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou ontem um documento altamente polêmico sobre controle do fluxo de capitais.
É como um gol duvidoso. Quem não gosta de futebol não compreende por que tanta discussão. Mas, para os outros, é um assunto e tanto.
Esse documento leva o título de Controle da Entrada de Capitais: Que Instrumentos Usar? (Managing Capital Inflows: What Tools to Use?) e está disponível no site do FMI (www.imf.org).
A polêmica começa pelo modo como os analistas o receberam. Para uns, é a primeira vez que o FMI, conduzido agora pelo francês Dominique Strauss-Kahn, diretor-gerente, admite o controle de capitais. Para outros, trata-se de uma tentativa de policiar a forma de os emergentes lidarem com o excesso de afluxo de capitais. Já se sabe, por exemplo, que o governo brasileiro atacou fortemente o conteúdo desse documento.
O controle do fluxo dos capitais, tanto na entrada como na saída, é uma interferência que pode mudar subitamente as condições de um jogo e impor enormes prejuízos para administradores de um patrimônio qualquer. E essa é a principal razão pela qual os setores mais conservadores abominam controles dessa natureza.
Mas há uma segunda razão para essas medidas serem atacadas: quase nunca funcionam, pois os capitais são como a água. Em condições de forte liquidez, como agora, podem deixar de entrar pelos canais normais, passando por fendas, frestas e infiltrações, que nenhum sistema econômico consegue eliminar. E, assim, as distorções se multiplicam. O governo, por exemplo, limita há quase três anos a entrada de capitais, primeiro os "voláteis" ou especulativos e, recentemente, os de maior prazo, impondo pedágios (cobrança de taxas) e "medidas macroprudenciais". E, desde 2004, o Banco Central intervém quase todos os dias no mercado de câmbio como comprador de moeda estrangeira, quase nunca como vendedor.
O foco dessas medidas é evitar a excessiva valorização do real (baixa do dólar no câmbio interno) para que o setor produtivo não perca condições de competição comercial diante dos fornecedores do exterior. E, no entanto, os dólares não param de entrar no Brasil. Há fortes razões para acreditar que algumas dessas medidas atraem ainda mais moeda estrangeira.
Em duas críticas o governo do Brasil tem razão quanto ao conteúdo do documento do FMI. A primeira é a de que não vai a uma das maiores causas do problema: a excessiva frouxidão com que os bancos centrais dos países ricos administram sua política monetária (de juros). Os mercados estão encharcados de moeda estrangeira e boa parte dessa hiperliquidez vaza para os mercados dos emergentes.
A outra crítica consequente é a de que os países ricos querem empurrar um pedação do ajuste global aos emergentes, sem fazer tudo o que têm de fazer. Querer, por exemplo, que a China valorize unilateralmente sua moeda é uma dessas exigências descabidas. Outra é a imposição, também unilateral, de regras arbitrárias de conduta na gestão do fluxo de capitais.
Mas, num ponto, o FMI está carregado de razão. O controle de capitais esconde distorções nos países que os admitem. No caso do Brasil, é o elevado custo de produção (impostos altos demais, juros escorchantes, precariedade da infraestrutura, etc.) que tenta ser compensado com controles do câmbio e dos afluxos de capital, sem que as causas reais dessas distorções sejam eficazmente combatidas.

CONFIRA
É preciso mais

Ontem, o diretor financeiro da Petrobrás, Almir Barbassa, avisou que terá de levantar empréstimos externos de US$ 12 bilhões a US$ 18 bilhões por ano. Será necessário saber do que ainda precisarão os fornecedores da cadeia do pré-sal e, pelo menos, as outras cem maiores empresas do Brasil. Por aí se vê que não se pode querer que as empresas brasileiras se conformem com a baixa entrada de capitais.

Papo furado
Há dois anos, Lula se gabava de que, de devedor, o Brasil passou a ser credor do Fundo Monetário Internacional e que, por isso, cresceram as condições de o País influenciar suas decisões. A divulgação do último documento sobre controle de capitais (veja matéria ao lado) mostra quanto disso não passou de papo furado.

Ainda vai demorar
Dentro do Fed, mostrou a ata ontem divulgada, nem todos concordam com a frouxidão da política de juros. Mas não há sinal de que eles subirão ainda em 2012. 

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