quarta-feira, agosto 18, 2010

EDITORIAL - O GLOBO

O custo do aparelhamento e da fisiologia

EDITORIAL
O Globo - 18/08/2010
 
 O aparelhamento da máquina público decorrente de interesses político-ideológicos e o loteamento de áreas do Estado por motivação fisiológica são duas pragas da política brasileira que respondem por boa parte da má aplicação do dinheiro do contribuinte, já esmagado sob uma carga tributária de mais de 35% do PIB, recorde no bloco dos emergentes. 
É típica do aparelhamento de origem política a ocupação do Incra e do Ministério do Desenvolvimento Agrário pelos chamados "movimentos sociais" - MST e similares. Nesta privatização daninha da coisa pública, o contribuinte também não está a salvo de desvios criminosos do seu dinheiro. Vide indícios fulgurantes de expropriação de recursos públicos existentes na prestação de contas de entidades criadas neste âmbito "social" apenas para ter acesso ao Tesouro. Isto quando prestam contas. É assim que ações violentas de invasão de propriedades terminam financiadas pelo Erário. 
O empreguismo e o loteamento de cargos por razões fisiológicas também têm símbolos na Era Lula. Justiça se faça, trata-se de mazelas tradicionais no Brasil, infelizmente. Não surgiram de 2003 para cá. Mas o governo, por não ter querido ou sabido fixar limites à voracidade de partidos da base parlamentar, convive com situações como a dos Correios. Na estatal, hoje prestadora de maus serviços, chefias nomeadas por caciques partidários se dedicaram a arrematar propinas para caixa dois de legendas. Não faltou a grotesca cena, gravada, em que Maurício Marinho, autoproclamado representante do petebista Roberto Jefferson na ECT, literalmente embolsa um maço de dinheiro entregue por um fornecedor da estatal. Ali começaria o escândalo do mensalão e acabaria de vez a virgindade do PT. 
Este é o contexto no qual surge a informação, apurada pelo GLOBO, de que 399 relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU), feitos a partir de 2009 sobre a atuação do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), apontam para uma conta de R$1,02 bilhão proveniente de superfaturamento de obras e outros malfeitos. Em linguagem direta: roubo, desfalque. 
O Dnit faz jus ao fato de ser o velho Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) com outro nome. Pois o DNER foi fechado no governo FH devido ao longo histórico de corrupção da autarquia. Reencarnou no Dnit com o mesmo DNA. 
A ação de quadrilhas no departamento, retalhado entre apaniguados políticos, chega a ser rocambolesca. No início do mês, o superintendente do departamento no Ceará, Guedes Ceará, e outras pessoas foram presos pela Polícia Federal sob a acusação de participar do desvio de R$5,5 milhões do orçamento de obras. Guedes havia sido indicado pelo ex-governador Lúcio Alcântara, do PR. 

Se forem consultadas auditorias do TCU na Infraero surgirão casos semelhantes. Enquanto isso, a população se arrisca em estradas federais malconservadas e padece em aeroportos há tempos incapazes de atender ao crescente volume de passageiros. O assunto serve de munição de campanha eleitoral. Mas, haja o que houver nas urnas, o próximo governo bem que poderia atenuar o bombeamento de recursos do Tesouro para grupos que se especializaram em capturar dinheiro público, à esquerda e à direita. Quando mais não seja, por inteligência: vai aparecer mais dinheiro para financiar despesas efetivas.

MÔNICA BERGAMO

EIKE DÁ MILHÕES 
EM LEILÃO DE "MADRINHA" MARISA

MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SÃO PAULO - 18/08/10 

"Eu vim aqui comprar", disse o empresário Eike Batista à coluna, no leilão promovido pelo cabeleireiro Wanderley Nunes em prol de um projeto de alfabetização na favela de Paraisópolis, anteontem, na Daslu. A primeira-dama Marisa Letícia, "madrinha" do projeto, estava lá. "O Wanderley me ligou e disse que o presidente Lula viria. Aí, eu disse que viria se ele viesse. Hoje [anteontem] à tarde, recebi um telefonema da dona Marisa pedindo que eu viesse, e eu vim", disse Eike. Já Lula não apareceu. 

O mestre de cerimônias Chico Pinheiro chamou ao palco "o Barack Obama de Paraisópolis" Gilson Rodrigues, presidente da União dos Moradores da favela. Ele entregou um arranjo de flores para dona Marisa, que usava vestido e casaco Reinaldo Lourenço. Marlene Araújo, nora da primeira-dama, clicava tudo com sua câmera profissional Canon. "É meu hobby", dizia. "Eu que aprendi marketing desde pequeno, que vendi coxinha aos sete anos de idade, sei que é difícil não começar esse leilão. Vamos começar", disse Nunes.

O chapéu e o berrante autografados por Sérgio Reis (R$ 3.000) não recebeu lances. Já o par de abotoaduras de ouro de Agnaldo Rayol foi vendido por R$ 4.000.

Sentado em uma mesa ao lado da primeira-dama e da nora dela, de assessores e dos filhos do cabeleireiro, Eike bebeu água sem gás na garrafa e até tomou champanhe nacional Chandon. Arrematou e colocou de volta no pregão, para serem leiloados outra vez, uma cozinha profissional (R$ 100 mil) e um vestido Colcci usado por Gisele Bündchen (R$ 25 mil). Com ele, vinha uma joia de Antonio Bernardo. O dono da EBX comprou também, e devolveu, um Rolex de ouro doado por Faustão (R$ 80 mil). O capacete de Emerson Fittipaldi (R$ 30 mil ) e um vinho branco (R$ 10 mil), levou consigo. E para fechar a noite, pagou R$ 500 mil pelo terno usado por Lula em sua primeira posse. Doou a peça ao próprio Lula, para o "acervo dele".

O humorista Tom Cavalcante ajudou a leiloar o tênis de Oscar Schmidt. "Boa noite a todos, boa noite à primeira-dama Letícia. Pensem naquelas bolsas Hermès que vocês têm", dizia, incentivando as pessoas a darem lances. Ele próprio não levou nada. 
"Marisa, uma moça tá pedindo pra você tirar uma foto com a Gloria [Coelho, estilista]", disse a nora Marlene à sogra. "Ah, mas agora eu vou comer", respondeu a primeira-dama, enquanto beliscava o filé mignon com risoto de cogumelos. "Sete de abril? Ah, eu sou de sete de julho.
Sete é um número forte", dizia o estilista Pedro Lourenço. Dona Marisa faz aniversário em sete de abril. "A Marisa adora as roupas de toda a família dele", entregava Marlene. "Ela vai usar uma roupa do Pedro na reinauguração do Palácio [do Planalto]". "É um tailleur de lã azul-marinho", disse Pedro

No fim, Eike ofereceu o dobro da arrecadação da noite à entidade -R$ 2 milhões que viraram R$ 4 milhões.
"A gente ainda tem cinco anos de governo", dizia dona Marisa. Pausa. "Quer dizer, cinco meses! Ainda tem muita coisa pra fazer, entregar muitas obras. Depois disso é arrumar as coisas e voltar pra casa, em São Bernardo." A primeira-dama diz que Eike Batista, que se declara publicamente "imparcial" nas eleições, vai colaborar com a campanha de Dilma. "Ah, ele vai me ajudar", diz Marisa.

ARROZ E FEIJÃO 
O Cine Belas Artes arrecadou R$ 31 mil no primeiro mês da campanha, em parceria com restaurantes, na qual clientes acrescentam R$ 5 na conta e ganham um ingresso para um filme e uma sobremesa. O montante cobre só a metade de um mês de aluguel do prédio do cinema (R$ 60 mil). Com IPTU são gastos outros R$ 10 mil. 

SOBREMESA 
O número de contribuintes, no entanto, foi animador: 6.200 pessoas aderiram à campanha para salvar o Cine Belas Artes. 

BARREIRAS DE ACESSO 
Depois de questionar todos os shoppings da capital sobre a aplicação de uma lei que os obriga a ter equipamentos motorizados para idosos com problemas de locomoção, a Defensoria Pública do Estado ameaça processar o shopping Metrô Tatuapé, na zona leste. Ele foi um dos três estabelecimentos que disseram não estar cumprindo a determinação, e o único que não aceitou fazer um acordo de ajustamento.

CAMINHO 
O shopping diz que "já iniciou a compra dos carrinhos motorizados" e que "está em contato com a Defensoria para se adequar" à lei.

MOSSAD 
Os jornalistas tiveram que abrir até os porta-malas dos carros de reportagem na entrada do jantar que Marina Silva (PV) teve com integrantes da comunidade judaica, anteontem, em um condomínio na zona sul de SP. Tudo isso para terem acesso apenas a uma casa anexa à do anfitrião, Roberto Klabin, onde a presidenciável deu uma coletiva e de onde não se podia ver nem o imóvel do empresário nem os convidados que chegavam.

PORTAS ABERTAS 
Marina foi a primeira convidada da série de encontros que a Conib (Confederação Israelita do Brasil) pretende fazer com os presidenciáveis. José Serra (PSDB) confirmou presença, mas não marcou data, e Dilma Rousseff (PT) ainda não respondeu.

NO PALCO E NA TELA 
A banda americana OK Go será a atração internacional do Video Music Brasil, prêmio da MTV, em setembro. Sandy e Mallu Magalhães aparecerão no telão do evento, estrelando uma paródia do humorístico "15 Minutos".

QUADROS E JOIAS 
A curadora Vera Chadad recebeu convidados para a abertura da 17ª edição do Salão de Arte, anteontem, no clube A Hebraica. O evento reúne até o próximo domingo 60 expositores, entre galerias de arte, antiquários, designers de joias e colecionadores.

CURTO-CIRCUITO

O filme "5x Favela, Agora por Nós Mesmos" tem pré-estreia para convidados, hoje, às 21h30, no Kinoplex do shopping Vila Olímpia. Classificação etária: 14 anos. 

A grife Dior inaugura hoje, das 11h às 20h, o novo espaço Sala Privé, no primeiro andar da loja da rua Haddock Lobo, nos Jardins.

O livro "Erre Mais", de Chantal Brissac e Marcelo Mariaca, será lançado hoje, às 19h, na livraria Saraiva do shopping Vila Olímpia.

A estilista Lolitta Zurita Hannud recebe hoje convidados em sua loja da rua Peixoto Gomide, nos Jardins, para o lançamento da coleção de verão de sua grife.

com DIÓGENES CAMPANHA, LEANDRO NOMURA e LÍGIA MESQUITA

GOSTOSA

ROBERTO DaMATTA

Pedradas

ROBERTO Da MATTA
O Globo - 18/08/2010

"A morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; por isso, nunca procure saber por quem os sinos dobram; eles dobram por ti" 
John Donne 

Falávamos em "pedrada" quando alguém dava um "fora" dizendo ou fazendo alguma coisa tão desviante da rotina que o ato soava absurdo ou rude. Nestes tempos de globalização que, para muitos, é uma era de supressão de diferenças, o mundo às vezes fica de ponta-cabeça, produzindo pedradas mortais, reveladoras de nossa ignorância dos outros e, por tabela, de nós mesmos. Pois como é possível condenar alguém a morrer a pedradas como no Irã? 
Mas - vale refletir - fuzilar, guilhotinar, enforcar, decapitar, esquartejar, eletrocutar ou envenenar seria menos cruel do que apedrejar? Deve-se lembrar que se a execução pública tem como alvo inibir ou erradicar, o castigo mais doloroso deve - pela velha lógica patriarcal e radical do exemplo - ser o mais cruel. Isso parece absurdo em tempos em que legislamos proibindo palmadas e tentando separar políticos honestos dos criminosos, mas lamentavelmente ocorre nos países onde há pena de morte e nas ditaduras. 
Afinal as pedradas levam à indignação diante da injustiça e da opressão das mulheres, mas também ao papel simbólico das pedras. Havia uma pedra no caminho do poeta e muitas na nossa jornada. Nos sistemas tradicionais as pedras marcam territórios. Nelas foram inscritas as leis de Deus, e a força criativa do falo, idolatrado na forma de um calhau na Índia e outros locais. De pedras são feitas as montanhas, esse ponto médio entre o céu e a terra, entre deuses e homens. As pedras falavam e viviam em agremiações, como diz mestre Câmara Cascudo, e como coisas de longa duração têm, em muitas culturas, uma relação direta com as origens do mundo. São elas que, como ensinam os geólogos, dão testemunho do planeta antes de ele ter sido pisado por seres vivos. 
Não estou aqui para defender um costume abominável, nem para justificar os estados teocráticos fundados nos ensinamentos de Maomé, mas para lembrar que, se só Deus pode dar e tirar a vida, como bem lembrou o Lula quando, num comício e, como sempre, demagogicamente, pediu clemência pela vida de uma mulher iraniana condenada ao apedrejamento, Ele (Deus) - como todos os radicais - legitima a morte aos seus inimigos com a mesma serenidade paternal com a qual abençoa seus eleitos. 
Lembro também que a velha Nova Inglaterra, dos puritanos que inventaram os Estados Unidos democráticos e igualitários de hoje, fundou uma cidade em cima de um morro, uma Nova Jerusalém, cujo código era tão bíblico e fundamentalista quanto esses vigentes no mundo islâmico. Conclusão fugaz: existem muitas modernidades do mesmo modo que há mais coisas entre o céu e a terra do que imagina a nossa vã filosofia e o nosso trêfego populismo, porque não é fácil conciliar autonomia política, soberania religiosa e nacional com costumes que abominamos como é o caso do apedrejamento e, ao lado dele, do despotismo (diante do qual, aliás, o nosso presidente emudeceu). 
Temos levado muitas pedradas. A da eventual substituição de um apedrejamento por um "humanitário" e condescendente fuzilamento em nome do que é tomado como um crime inafiançável - o adultério - que, em algumas plagas, só é cometido pela mulher, jurídica e religiosamente englobada por seu marido. E, no Brasil, a terrível e brasileiríssima condenação pelo eminente Conselho Nacional de Justiça de dois magistrados que vendiam sentenças a aposentadorias milionárias. 
Qual é o elo entre punir uma mulher com apedrejamento e condenar juízes a aposentadorias de 25 mil reais mensais? Penso que o excesso e o transbordamento são seus denominadores comuns. No mínimo, temos uma ausência chocante de bom senso. Mas, como lembra o presidente Lula, voltando a ser um homem de princípios, cada terra tem seus usos a serem respeitados. No limite dessa ausência de ética, ainda teríamos escravidão como continuamos a ter servidão doméstica. Como temos, no caso dos juízes que vendiam sentenças, condenados a ficarem em casa recebendo de todos nós 25 mil por mês até o fim de suas vidas - com os devidos direitos de transmitirem esses ordenados de condenados às suas famílias. Uma prova cabal de como o Estado brasileiro aristocratiza cargos e pessoas. Mais do que um clássico patrimonialismo, temos um estado republicano de molde imperial e aristocrático, no qual alguns cargos e poderes penetram a carne e o sangue na pessoa que deles tomam posse. Com isso, são muito mais do que sócios ou donos do aparelho estatal, como ocorre no patrimonialismo, pois passam a ser filhos diletos e herdeiros deste Estado que sempre é forte com os fracos e fraco com os fortes. 
ROBERTO DaMATTA é antropólogo.

JOSÉ SIMÃO

UebaVou debater uma
José Simão
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/08/10


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta! Até a Simony é candidata! E quem vai ser o suplente dela? O Ursinho Pimpão?! Rarará! E a Vanusa só devia cantar "Paralelas". Porque elas nunca chegam a se encontrar.
E diz que um cara chegou perto da Dilma com um cigarrinho: "Tem fogo?". "Tenho sim." "Então cospe, dragão." Rarará! E o Serra parece a van da família Adams. Com a nuvem preta em cima! E um amigo me disse que a Marina descende dos Turu Bandeira. Aqueles que vivem em bando e só comem folhas!
E o debate Folha UOL? Primeiro debate on-line! Então devia ficar cada um na sua casa. Tuitando! E só pode falar como no Twitter: em 140 caracteres! O senhor vai falar sobre educação, segurança, saúde e habitação em 140 caracteres! Cada um dá um grunhido e pronto!
E pode fazer perguntas em 140 caracteres. Como diz um amigo: 140 caracteres já dá para mandar tomar na fresa da frisa da beirada do olho do fiofó! Rarará!
O Mercadante devia cantar bolero em churrascaria da marginal. Aliás, sabe como chama aquele bigode do Mercadante? Rodapé de xoxota! E o Celso Russomano com o look de motoboy aposentado! E o Alckmico? A Volta do Picolé de Chuchu! Rarará!
O Alckmin parece um guarda-chuva. Carisma de cabo de guarda-chuva! Aliás, ele parece um contador. Cara, cérebro, nariz e discurso de contador. Parece o Juvenal, o meu contador! Aliás, sabe como na Bahia chamam o Alckmin? GARÇA DE LAGOA! Branco, esquálido, narigudo e estático! Rarará!
E adorei essa chamada: "Maluf é revistado na porta do debate". O Maluf gosta tanto de debate que vai até no debate dos outros! E debate é assim: viu um, viu todos! Prefiro me trancar no banheiro e debater uma. Debater uma bronha. Rarará! Primeiro debate com participação dos pernaltas. Ops, internautas.
Então como disse a Dilma: "Primeiro, vou dar um oi para os internautas: OI, INTERNAUTAS!". Rarará! E eu só voto na Marta se ela vestir aquela camiseta: "Nem relaxo e nem gozo". Rarará!
E agora o Serra mudou de nome no hilário eleitoral. Agora se chama Zé. Pra ficar mais popular.
E o povo tá votando numa candidata chamada Dilma Roussef! Um nome tão fácil e tão popular quanto Zé! Rarará! É mole? É mole, mas sobe! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

GOSTOSA

MERVAL PEREIRA

Novos rumos
Merval Pereira
O GLOBO - 18/08/10



A disputa eleitoral está permitindo, paralelamente à corrida dos candidatos a presidente da República, uma chance a que os partidos que deram os candidatos a vice exercitem seus músculos atrofiados pela falta de poder real nos muitos anos em que foram apenas coadjuvantes da cena política nacional.

PMDB e DEM optaram há muito por não disputar a Presidência da República, indo a reboque de PT e PSDB, os partidos que polarizam a política nacional há 17 anos.

Na recente política brasileira, o PMDB não conseguiu até hoje ter um candidato que unisse as diversas facções do partido para disputar a Presidência da República, colocando para funcionar a gigantesca máquina eleitoral que tem a maior bancada de senadores e deputados federais, o maior número de prefeitos, vereadores e governadores.

Quando lançou candidato próprio, nomes como Ulysses Guimarães ou Orestes Quércia foram engolidos pelo próprio partido.

Em compensação, nenhum presidente da República consegue governar sem o apoio do PMDB, um partido que já foi o principal representante da esquerda brasileira e hoje patina no fisiologismo explícito.

Com a união do PMDB a partir do segundo mandato do presidente Lula, uma nova etapa parece estar se abrindo para o partido, que pretende impor sua força eleitoral para transformarse em partícipe de um eventual governo Dilma Rousseff e não apenas um coadjuvante de luxo que se contenta com as regalias do poder, sem exercê-lo realmente.

No caso atual, o exercício do poder tem uma característica específica, a de o partido se apresentar à sociedade como o garantidor de que a democracia não será ultrapassada por medidas do grupo radical que tentou ainda recentemente emplacar o programa petista como o programa de um futuro governo Dilma.

O DEM, por sua vez, tenta sair de uma posição préfalimentar para transformarse em um representante com credibilidade da direita brasileira.

O papel que o deputado Indio da Costa, candidato a vice na chapa de José Serra, está exercendo na campanha eleitoral é o de vocalizar as críticas ao esquerdismo mais radical do PT, assumindose como porta-voz de um eleitorado que teme a chegada de uma ex-guerrilheira à Presidência da República.

Não é à toa que desde que foi indicado ele questiona a relação do PT com o MST e com a guerrilha colombiana Farc, temas em que insistiu em debate de vices ontem.

O presidente Lula vangloriase pelo fato de que não há nenhum "troglodita da direita" como candidato à Presidência da República, sem atentar que não haver um candidato viável representando a direita é apenas mais uma das muitas distorções da democracia brasileira.

Embora nenhum político brasileiro se declare "de direita", a direita política está sempre presente nos governos formados a partir de 1985, quando Tancredo Neves se elegeu presidente da República numa aliança política impensável com os dissidentes do PDS, partido que dava sustentação à ditadura militar.

Boa parte desses políticos, abrigados no Partido da Frente Liberal (PFL), fez a aliança com o PSDB que levou Fernando Henrique ao poder em 1994, a bordo do Plano Real.

E uma dissidência do PFL, atual DEM, acabou apoiando Lula em 2002, capitaneada pelo senador José Sarney, que se transformou no principal apoio político de Lula no Senado e dentro do PMDB.

O presidente Lula, para eleger-se em 2002, procurou um empresário para compor sua chapa, como maneira de tranquilizar os que ainda o viam como uma ameaça.

Embora o governo Lula seja considerado "de esquerda", a escolha de uma candidata "de esquerda" como Dilma Rousseff não afasta da coalizão os partidos "de direita", como o PP e o PR.

A coalizão do PSDB que apoia a candidatura de José Serra reúne também o PPS, herdeiro do antigo Partido Comunista, e o DEM, atraiu também o PTB e setores do PMDB, e é identificada pelos petistas como "de direita" ou, no máximo, de "centrodireita".

A refundação do PFL, que passou a se chamar Democratas, foi feita com a metodologia do PP da Espanha, parceria firmada durante a reunião da Internacional Democrática de Centro (IDC), realizada há alguns anos no Rio.

A IDC se contrapõe à Internacional Socialista, que reúne os partidos de esquerda e social-democratas no mundo, e essa parceria teria se desdobrado em uma candidatura própria este ano se não fossem o fracasso da tentativa de lançar Cesar Maia como candidato e, mais recentemente, o escândalo do governo de José Roberto Arruda, uma de suas principais lideranças ao lado de Maia e do prefeito paulista, Gilberto Kassab.

O receituário do novo PFL foi dado durante aquele encontro da IDC: políticas liberais no governo, que obtiveram grande sucesso nos oito anos de governo de Aznar na geração de empregos.

Essas mesmas políticas estariam representadas também por Jacques Chirac, na França; Durão Barroso, do PSD em Portugal, hoje presidente da Comissão Europeia, e o Partido Republicano nos Estados Unidos.

O corolário natural desses movimentos é os dois partidos prepararem candidaturas próprias para a sucessão de 2014, tudo subordinado, evidentemente, à situação política da ocasião.

O PFL continua tendo em Cesar Maia seu líder com mais votos, mas é difícil avaliar se sua provável eleição para o Senado pelo Rio o transformará em um líder nacional.

O PMDB tem no candidato a vice-presidente Michel Temer um conciliador que terá papel fundamental de negociação com o Congresso, onde provavelmente o PMDB continuará tendo a maior bancada tanto na Câmara quanto no Senado.

E o governador do Rio, Sérgio Cabral, sendo reeleito no primeiro turno como tudo indica, será um dos potenciais candidatos.

ZUENIR VENTURA

Dilma, olhai por Sakineh 
Zuenir Ventura
O GLOBO - 18/08/10

Depois que a advogada iraniana Shirin Ebadi, Prêmio Nobel da Paz em 2003, disse que só a pressão internacional pode salvar Sakineh Ashtiani do apedrejamento, espera-se que Lula insista com firmeza junto a Ahmadinejad, que rejeitou a oferta de asilo, alegando não haver necessidade de “criar mais confusão para o presidente Lula”, que, por sua vez, já justificara o oferecimento dizendo que queria livrar o colega de um “incômodo”. O que um chama de “confusão” e o outro de “incômodo” é uma mulher de 43 anos que está no corredor da morte aguardando execução. Tanto os dois filhos da condenada quanto os advogados que tentam defendê-la são unânimes em reafirmar a importância do papel do Brasil e de seu presidente, tendo em vista sua declarada amizade com o tiraniano.

Espera-se também que Dilma Rousseff, além de interceder junto a seu padrinho, manifeste publicamente sua própria indignação e engrosse o movimento mundial para salvar Sakineh, quando nada por solidariedade feminina. Procurei no Google e só encontrei essa declaração da candidata do PT: “A condenação fere a nós, que temos sensibilidade, humanidade.” É pouco. A condenação fere mais, é um atentado inominável contra os direitos humanos universais. Em menor escala, a ex-guerrilheira sabe o que é isso, pois foi torturada durante a nossa ditadura.

Espera-se finalmente que a vida de Sakineh seja poupada, ela que, em 2006, já recebera 90 chibatadas por “relação ilícita” com o presumível assassino de seu marido (depois, o juiz reabriu o processo e, mesmo sem testemunhas, concluiu que o relacionamento ocorrera ainda em vida do assassinado, o que constituía adultério, passível de apedrejamento).

Agora, seus algozes podem perdoá-la ou “abrandar” a pena para enforcamento, acreditando dar ao mundo uma prova de que existe compaixão no reino dos aiatolás, onde a corda no pescoço é um prêmio de consolação. De qualquer maneira, como esse episódio não encerra a prática infame, já que ainda há pelo menos mais doze mulheres à espera de serem apedrejadas, resta uma pergunta para Dilma: se eleita, ela continuará apoiando um sistema que mata mulheres por lapidação ou enforcamento? O apelo que a advogada Shirin faz a empresas como a Nokia — que teria fornecido a Teerã equipamento para censurar celulares — pode se estender de alguma maneira ao governo brasileiro: “Parem de ganhar dinheiro fortalecendo o sistema de repressão no Irã”, ela pede.

Será que os interesses comerciais no nosso caso justificam tanta simpatia e complacência com um regime em que a barbárie é lei?

GOSTOSA

PAINEL DA FOLHA

Operação planície
RENATA LO PRETE

FOLHA DE SÃO PAULO  18/08/10 

Ao afirmar que, uma vez fora do Planalto, pretende "continuar a rodar o país" e, "se tiver uma coisa errada, pegar o telefone e ligar para a minha presidenta", Lula manifestou em público uma intenção sobre a qual já vinha falando com auxiliares em privado. 
A declaração, feita no mesmo dia em que Dilma Rousseff (PT) começou a ser "emancipada" na propaganda de televisão, reflete a ideia de Lula de se tornar uma espécie de "articulador político informal" em caso de vitória de sua candidata, um elemento aglutinador de partidos da base aliada em torno de questões espinhosas, como a reforma política. 


Amigo do homem Comentário bem-humorado de um dirigente petista diante da cena do programa eleitoral em que Dilma brinca com o labrador Nego, herdado do antecessor na Casa Civil: "E depois dizem que o Zé Dirceu não está na campanha...". 

A troca A campanha de José Serra planejara exibir o mesmo programa na hora do almoço e à noite. Ontem, depois da estreia, optou por mudar o programa noturno. 

Radar eletrônico O presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), foi dos primeiros tucanos "flagrados" no QG de monitoramento organizado pela campanha nacional: candidato a deputado federal, não citou Serra na estreia da propaganda. 

Migração A UGT, única das centrais sindicais que havia declarado apoio a Serra, participou de evento com Dilma ontem em São Paulo. 

The best of O PSDB de São Paulo produziu DVD com trechos de discursos de Serra e Geraldo Alckmin. O material será distribuído aos 85 diretórios zonais e 572 diretórios municipais da sigla. 

Sem tela Candidata a deputada federal, a procuradora Luiza Eluf acusa o PV-SP de excluí-la da propaganda. "Isso é inaceitável num partido que quer inovar." 

Musical A propaganda eleitoral de Antonio Anastasia (PSDB-MG) trará depoimentos de artistas como Samuel Rosa, do Skank, e Rogério Flausino, do Jota Quest, além de remanescentes do Clube da Esquina. 

Pedra no lago A campanha do tucano se animou com o crescimento de sua intenção de voto espontânea no Datafolha tanto em Belo Horizonte (14% para 22%) quanto na região metropolitana (12% para 18%). A coordenação argumenta que isso prenuncia movimento semelhante no interior do Estado. 

Sai dessa Tão logo ficou claro que a segunda semana de "esforço concentrado" rumava para novo fracasso, um aliado tratou de aconselhar o presidente da Câmara e companheiro de chapa de Dilma, Michel Temer (PMDB-SP), a se manter distante da iniciativa. O peemedebista, que pela manhã participou de debate em São Paulo com outros vices, não tinha aparecido na Casa até o fim da tarde. 

Segunda classe Os deputados que vieram a Brasília aproveitaram para se queixar às direções dos partidos de falta de recursos para suas campanhas. No PT, a choradeira foi particularmente copiosa, dado que Lula tem dito e repetido que a prioridade da sigla, além de eleger Dilma, é investir na formação de uma bancada forte no Senado. 

Visita à Folha Milton Luiz de Melo Santos, diretor-presidente da Agência de Fomento Paulista/Nossa Caixa Desenvolvimento, visitou ontem a Folha. Estava com Sabrina Henrique, coordenadora de comunicação, e Moraes Eggers, jornalista. 
com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELLI 

tiroteio 

Ele só pode estar se referindo àqueles que aprovaram a emenda da reeleição de FHC. 
DO DEPUTADO EDUARDO CUNHA (PMDB-RJ) em resposta a José Serra, que, resgatando antiga frase de Lula, negou ser como aqueles que dizem que o Congresso tem "300 picaretas"; estes estariam "todos com a outra candidata". 

contraponto 

Tudo tem limite 

O deputado Mendes Ribeiro, integrante da ala do PMDB gaúcho alinhada com a candidatura de Dilma Rousseff, deixava o gabinete da liderança do partido na Câmara, ontem à tarde, quando avistou, espalhados sobre a mesa da recepcionista, santinhos de candidatos a deputado distrital pelo PT. 
Ribeiro se foi comentando com um colega: 
-Aí também já é demais... Para presidente, tudo bem votar no PT, mas para deputado não dá, não!

DORA KRAMER

Com vara curta 
Dora Kramer 

O Estado de S.Paulo - 18/08/2010

É cedo e o material muito pouco para avaliações de desempenho. Na estreia do horário eleitoral na televisão ontem todos ainda apresentando credenciais, cada qual preocupado consigo deixando o vizinho quase de lado.

Quase porque, premido pela necessidade, José Serra citou logo a fera pelo nome no sambinha-provocação "sai o Silva e entra o Zé". Cutucou a onça dentro da toca. Pode se dar bem ou muito mal, mas arriscou.

Foi o único diferencial, a indicar que talvez - por ora apenas talvez - pela falta de instrumental da envergadura do presidente Luiz Inácio da Silva o PSDB precise recorrer à criatividade e com isso leve o PT a reeditar seus melhores momentos de propaganda.

O primeiro programa não foi um deles. Obrigado a tratar logo do passado combativo de Dilma Rousseff (em versão mitigada que omitiu a participação na luta armada), a falar para as mulheres, a marcar um linguajar despojado cheio de "pra" "tô" "tá" e "ocê", a dizer-se estudiosa e competente administradora, o programa não teve margem para inovações ou surpresas.

De verdade nem pareceu ser essa a ideia. Ao que se propôs, cumpriu: suavizou a candidata, mostrou família, amigos, profissão, juventude, tarefas no governo Lula e principalmente o carimbo da "continuadora" com participação bem dosada do presidente.

Nem demais que escondesse a candidata nem tão pouco que deixasse de marcar bem a presença de Lula. Dilma esteve o tempo todo na condição de protagonista. Como deve ser se não quiser parecer teleguiada.

O melhor do horário do PSDB foi a trilha sonora, tanto o forró de abertura como o samba de encerramento, duas boas sacadas. Entre uma e outra, o já sabido e nessa agora reafirmado com ênfase: a infância de pobreza e superação pelo esforço, a juventude de política estudantil, a vida adulta de realizações administrativas entre uma e outra eleição a deputado, senador, prefeito e governador.

Sempre o Serra que "cuida", é "próximo" e "vive" o problema das pessoas para servir ao mesmo tempo de contraponto e antídoto à imagem distante e irascível que tem dele o senso comum.

Pelo menos no dia do credenciamento nenhum dos dois marqueteiros fez espetáculo de imagem, atendo-se ao necessário para mostrar as faces dos chefes.

Marina narrou em "off" um videoclipe sobre meio ambiente e apareceu apenas no fim numa representação da quintessência do básico: de pretinho, declarou "eu sou Marina Silva, candidata a presidente do Brasil" e encerrou.

Plínio de Arruda Sampaio simplesmente não apareceu, sendo apresentado por imagens e locução.

Quanto aos demais, os ditos nanicos, francamente, 55 segundos é tempo demais.

Como assim? Políticos e analistas podem ter discutido sobre o sexo dos anjos quando atribuíram às entrevistas do Jornal Nacional importância capital sobre o resultado das pesquisas.

Detalhe da pesquisa Ibope: a grande maioria (62%) não soube dizer se o desempenho de Dilma foi bom ou ruim. No caso de Serra deu-se o mesmo.

Homens cordiais. Lula e Ahmadinejad usaram termos e conceitos semelhantes para tratar em público do caso de Sakineh Ashtiani, condenada à morte por adultério.

O presidente brasileiro ofereceu asilo "à mulher que está causando incômodo por lá (no Irã)" e o iraniano recusou alegando não haver "necessidade de criar mais confusão para Lula".

Nem pressão de um lado nem reação de outro: só amizade e indiferença aos direitos humanos.

A conhecer. A Justiça Eleitoral exige que os candidatos a suplente de senador (dois para cada titular) sejam devidamente registrados.

De onde deveria ser obrigatório que fossem devidamente apresentados ao eleitorado. Durante a campanha, antes do fato consumado da substituição do gato por lebre.