domingo, novembro 15, 2009

SUELY CALDAS

O muro abaixo do Equador


O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/11/09


Há dias a festa de 20 anos da queda do Muro de Berlim reuniu chefes de Estado dos EUA e países da Europa, ex-comunistas e capitalistas, liberais e autoritários, que protagonizaram a guerra fria pós-anos 1950 e ali estavam para, finalmente irmanados, celebrar o fim de uma barreira que dividiu uma cidade, separou famílias, extinguiu a liberdade. Abaixo da Linha do Equador, a guerra fria também chegou à América Latina, trazida pelos dois fantasmas que dominavam o mundo: o comunismo e o imperialismo norte-americano. Por aqui não havia muro. Mas generais que enxergavam o fantasma comunista em tudo tomaram o poder e impuseram suas ditaduras. Prenderam, torturaram, mataram opositores, exterminaram a liberdade.


Até a queda do Muro de Berlim, em 1989, as ditaduras de esquerda no Leste Europeu e as de direita na América Latina espalharam autoritarismo pela força das armas, suprimiram a liberdade e a democracia. Nos últimos 20 anos elas foram desaparecendo e em nosso continente só restou Cuba. Recuperamos, enfim, a liberdade - o bem mais precioso e impregnado no homem e do qual ele não aceita abrir mão por vontade espontânea, independentemente da classe social.

O Muro de Berlim caiu há 20 anos e o leste da Europa não quer voltar no tempo, mas a ideologia que lhe deu origem ainda sobrevive no imaginário de alguns governantes latino-americanos, que sonham se eternizar no poder (como os ditadores) sem ter de enfrentar oposição nem imprensa livre e impor o seu "socialismo bolivariano" - o populismo ralé do século 21, que distribui dinheiro à população pobre e não desenvolve o país, não gera riqueza, empregos e salários.

Ao longo da História, ditaduras de esquerda e de direita sempre se confundiram, usaram os mesmos métodos. Quando o venezuelano Hugo Chávez, que se diz socialista e de esquerda, convoca "estudantes revolucionários, trabalhadores e mulheres" para uma guerra patética contra a Colômbia, nada mais faz do que repetir o general Roberto Viola - que se dizia de direita - ao conclamar o povo argentino para a aventura da Guerra das Malvinas contra a Inglaterra, em 1982. Em momentos diferentes da História e com ideologias diferentes, ambos usam o mais grosseiro e rude populismo de inventar uma guerra como meio de criar um falso clima patriótico-nacionalista e atrair apoio político da população. Na Argentina, milhares de jovens recrutas morreram no mar gelado das Malvinas sem saberem por quê.

Quando o mesmo Chávez fecha emissoras de rádio e TV, Cristina Kirchner cria uma nova lei da mídia e persegue os jornais El Clarín e La Nación - pelo simples motivo de lhe fazerem oposição - e Lula tenta criar um conselho para controlar a imprensa no Brasil, eles repetem a censura imposta pelas ditaduras militares da América Latina nos anos 70.

É verdade que a onda de terceiro, quarto mandatos para os governantes na Venezuela, Equador, Bolívia, Colômbia e, agora, Honduras não chegou ao Brasil. É também verdade que Lula não usa o caudilhismo autoritário de Chávez, Morales e Correa. Ele até pode baixar o nível e recorrer ao deboche rasteiro ao falar da oposição, mas não tenta calá-la.

O problema de Lula não é se perpetuar no poder - embora o ambicione e tudo fará para voltar em 2014. O retrocesso político que ele impõe ao País decorre de sua visão estreita e limitada de democracia. Oportunista ou verdadeiro, pensado ou irrefletido, o fato é que ele vê a democracia como um sistema político em que os governantes são escolhidos pelo voto. E ponto final. Basta ter eleição para consagrar as liberdades democráticas.

Mas quem passa sete anos no exercício do poder sabe que democracia é um sistema político construído a partir das instituições, que precisam funcionar a favor dos cidadãos, ser suficientemente fortes para barrar a incompetência, a corrupção e proteger a sociedade contra governantes mal-intencionados. Em suas viagens mundo afora Lula viu democracias frágeis, outras maduras, umas em estado embrionário, outras em estado avançado de construção, viu que o Paraguai é diferente da Dinamarca.

O Brasil começava a construir suas instituições quando Lula chegou com seu trator em 2002. Loteou funções de Estado entre partidos políticos, com pessoas incompetentes e despreparadas. E, se o cumprimento da regra de uma instituição lhe desagrada, trata de mudá-la. Como faz agora com o Tribunal de Contas da União, cuja função ele quer substituir por um conselho, por ele controlado, para liberar suas obras suspeitas de corrupção.

GOSTOSA


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ELIANE CANTANHÊDE

Microincidentes

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/11/09


BRASÍLIA - Para o ministro da Justiça, Tarso Genro, o apagão que atingiu 18 Estados, mais de 60 milhões de cidadãos e paralisou o país foi um "microincidente".
Para o de Minas e Energia, Edison Lobão, foi um problema de "tempestade, vento, raios", e não se fala mais nisso.
Para o líder do PT, Aloizio Mercadante, "a oposição está muito nervosa, devia tomar maracujina". E, para Dilma Rousseff, ex-ministra de Minas e Energia e manda-chuva do setor e do sucessor, "racionamento é que é barbeiragem".
Nessa profusão de pérolas, ninguém conseguiu superar o insuperável Lula. Vejamos o que o presidente disse: "Essa questão do clima é delicada por quê? Porque o mundo é redondo. Se o mundo fosse quadrado ou retangular...".
E, assim, o mundo gira, sem que a oposição supere o trauma do próprio apagão e reaja politicamente.
Coube a Lula, não ao DEM (que até tenta) ou ao PSDB (mais perdido do que a gente em apagão), fazer as vezes de oposicionista-mor.
Dilma, com aquele jeitão dela, e Lobão, bem ensaiado, já tinham declarado o assunto do apagão, ops!, do blecaute, como "encerrado". E veio Lula condenar o "achismo" e cobrar uma investigação afinal séria e respostas definitivas. Se elas virão? Bem, aí é outra história.
Para sorte geral de Tarso, Lobão, Mercadante, Dilma e, principalmente, Lula, o mundo não só gira como gira rapidíssimo e pegou de jeito a obra mais vistosa do tucanato paulista. Antes mesmo do fim de semana, "a tempestade, o vento e os raios" que derrotaram o sistema elétrico brasileiro derrubaram três vigas de 40 metros do trecho sul do Rodoanel.
Não foram tempestade, vento e raios? Então que Serra dê um basta no "achismo" e exija investigações sérias e respostas definitivas. É melhor do que agradecer o "milagre" e dizer que foi "um presente de Deus não haver mortes".
PS - O anúncio dos caças é no dia 23.

DANUZA LEÃO

Que semana

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/11/09


Sem TV, sem poder ler jornal, sem ter com quem falar, só tive uma coisa para fazer: pensar. Sabe que é bom?

A SEMANA foi agitada: houve a expulsão de Geisy por usar minissaia -minissaia, aliás, lançada por Mary Quant nos anos 60-, a "desexpulsão", depois o protesto de colegas da UnB que a apoiaram e que, nus, foram entregar uma carta ao reitor da universidade (e eu pagava para ver a cara do reitor).
Além disso, chegou Madonna, o que é sempre um acontecimento, não se sabe bem por que, e que passou duas horas no hotel Fasano com a mãe de Jesus, provavelmente pedindo sua mão em casamento. E para completar, tivemos o apagão. Como não estou em fase política, vou fingir que acreditei em tudo o que disse o grande especialista em energia Edison Lobão, indicado ministro por Sarney para que o PMDB apóie o PT, que assim terá mais tempo no horário político da TV, deu para entender? Na quinta à tarde, o ministro disse, com voz firme, que o assunto está encerrado; que maravilha. É claro que foram a chuva, os ventos e alguns raios os responsáveis pelo apagão, mesmo tendo chovido tão pouco em Itaberá; tão pouco que as luzes da cidade nem se apagaram, segundo o prefeito e os habitantes locais. Quanto a raios, nem unzinho. A culpa então foi de quem? Dos inimigos do PT e da imprensa, naturalmente.
A pergunta que mais se fez foi "onde você estava na hora do apagão?". Eu estava em casa, e como não costumo ter velas na gaveta, fiquei numa escuridão/solidão total, e morta de calor; foi uma das noites mais quentes do ano. Celulares, nada; tentei ligar do fixo, mas não conseguia ver os números, então abri a tampinha do celular e com aquela luzinha fraca digitei o número, mas qual: tudo mudo. E percebi o quanto somos dependentes de toda essa parafernália eletrônica. Da luz, em primeiro lugar, e de todo o resto, em segundo. Quem me salvou dessa noite de trevas foram meus dois gatinhos, que não saíram de perto de mim um só minuto. E sem televisão, sem poder ler um jornal, sem ter com quem falar, só tive uma coisa para fazer: pensar. Sabe que é bom?
Nunca se tem tempo para essa coisa fundamental: pensar. Pensei em tudo o que a gente acaba negligenciando, sobretudo nossos afetos. Mas como os sentimentos não sobrevivem sem uma certa atenção, um dia se começa a achar que o coração não consegue -e nunca mais vai conseguir- gostar ou ao menos sofrer por alguém. Mas o tempo passa, aquele amigo de quem se gostava tanto viaja, e um belo dia você sente saudades dele. Há quanto tempo isso não te acontecia? Ter saudades quer dizer que seu coração está vivo, e esse fato é mais merecedor de uma comemoração do que qualquer data querida.
Um amigo é uma coisa muito boa, e se ele for daqueles que não te patrulham, não te invejam, não te analisam nem discutem a relação, é bom demais. Um amigo que te aceita do jeito que você é, não faz perguntas indiscretas, te entende pelo olhar, e não é, jamais, invasivo. Um amigo que nunca pergunta "em que você está pensando?", que é leve, que tem o hábito saudável de não se aprofundar sobre nenhum assunto -só a pedidos.
Se estiver tomando um banho de mar, ele não vai contar o quanto o mar o influenciou para ser quem é, como são boas as coisas simples da vida: uma rede, um camarãozinho frito e uma cerveja gelada -e daí para o divã é um pulo. Um amigo leve apenas usufrui a vida, e quem tiver a sorte de tê-lo a seu lado vai ter momentos de grande felicidade. E se você se distrair e voltar a falar no apagão, ele te dá a solução: ter sempre, na mesa de cabeceira, uma caixa de remédio para dormir -tarja preta.

GOSTOSAS


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JOSÉ SIMÃO

Ueba! No apagão com Madonna!

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/11/09


E diz que os cariocas só falam isso: "Quando é que a Madonna vai embora, hein?!"

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta! A loira da Uniban vai sair pelada. Na "Playboy". Logo depois da Fernanda Young? O véio dono da "Playboy" vai se atirar da cobertura. De desgosto!
E o Twitter tá proibido na Uniban porque o texto é muito curto!
ITAIFU URGENTE! Duas verdadeiras causas do Apagão! 1) A Madonna deixou o vibrador ligado. E apagou o Brasil. Aliás, a Madonna não sofreu apagão porque ela namora com o Jesus PINTO DA LUZ! Então ela namora com uma lanterna.
Rarará! Perfeito! E diz que os cariocas só falam isso: "Quando é que a Madonna vai embora, hein?!". 2) O Hugo Chávez puxou um gato pra tomar um banho. E apagou o Brasil!
E o ministro Tarso Genro diz que o apagão foi um microacidente. Microacidente? Porque na casa dele só deve ter queimado o micro-ondas. E aquele monte de geladeira sem IPI que todo mundo comprou? Sacanagem: o Brasil inteiro compra geladeira sem IPI. E, aí, dá apagão!
Adorei a charge do Pelicano com o Lula: "Mantega, sabe o que tem que incluir na linha branca? VELA!".
E o melhor movimento a favor da loira da Uniban: Pela Descriminalização das Gostosas! Diria, baranga!
E o que as celebridades falaram durante o apagão? Lula: "Eita cachacinha boa! Deixa a gente ceguinho, ceguinho!". Zé Mayer: "Com a luz apagada é melhor, PRÓXIMA!". Lucianta Gimenez: "Vou ligar a TV pra me informar do apagão". Ligou a TV e viu que tinha apagão. Tá certa. Angélica: "Desculpe, amor, peguei no teu nariz". Serra: "Uhaha, vou sugar o seu sangue". E Dilma: "Não se assustem, sou eu, a mãe do PAC".
E festival de Piadas Prontas! Direto de Três Corações, Minas: "Presos assinam termo em que se comprometem a não fugir". E se o cara que assinou tá preso por falsidade ideológica!? E essa: "Domingo Chiqueria, o Bonde do Tesão com as Panteras do Funk". Onde? Na PRAÇA DA BÍBLIA! Rarará! E essa dos EUA: "Ladrão de carro rouba veículo para não perder o julgamento". Adorei esse americano, bem prático: tava sendo julgado por roubo de carros e, para não chegar atrasado no julgamento, roubou outro. E essa da Espanha: "Curso para ensinar masturbação a jovens causa polêmica". Onde? Em EXTREMADURA! É mole? É mole, mas sobe!
E atenção: Cartilha do Lula. O Orélio do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Guerras Púnicas": guerra entre companheiros pra ver quem solta mais pum.
O lulês é mais fácil que o ingrêis. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno.

CLÓVIS ROSSI

O apagão mental

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/11/09

SÃO PAULO - Pior que o apagão elétrico da terça-feira é o apagão mental que assola boa parte da elite dirigente brasileira. Trata-se de um blecaute permanente, sinal de que o subdesenvolvimento não é apenas econômico e social mas também de cultura política.
Apagão mental, por exemplo, é o do ministro Tarso Genro (Justiça), que classificou o blecaute de "microincidente", incapaz por isso de turvar o "nunca antes" neste país que se tornou a história oficial. Tarso não entende nada do assunto, que não é de sua área de atuação.
Mas precisava mostrar servilismo ao chefe -uma evidência de subdesenvolvimento político.
Que o próprio chefe, depois, tenha chamado o "microincidente" de "desastre" não fez Tarso corar de vergonha. Levar pito do líder é um clássico nos casos de culto à personalidade, que também é sinal de subdesenvolvimento.
Apagão cultural deu-se igualmente com Dilma Rousseff, que decretou "caso encerrado", apenas para ser, ela também, desmentida pelo chefe. De novo, é típico do subdesenvolvimento da cultura política tapuia achar que não é preciso prestar contas ao público por problemas que afetam a vida de uma ou de milhões de pessoas.
Menos mal que, no público, há quem enxergue com clareza as coisas, caso de Cornelio Celso de Brasil Camargo, do Laboratório de Planejamento de Sistemas de Energia Elétrica da UFSC, que escreveu à Folha sobre o que fez o governo norte-americano no apagão de Nova York em 1965: "O governo não buscou evasivas, não fez uso político do evento e palpiteiros de plantão não foram ouvidos. A preocupação foi esclarecer tecnicamente o que aconteceu. Foi montada uma comissão federal de alto nível, com técnicos de empresas elétricas e professores de universidades, para emitir um relatório", lembrou o leitor. Acender as luzes não é tão difícil, não é mesmo?

PARA MINHAS LEITORAS

MERVAL PEREIRA

E a cigana se enganou...

O GLOBO - 15/11/09


A primeira eleição a gente nunca esquece, especialmente a de 1989, que tinha várias particularidades para mim: naquela que era a primeira eleição direta para presidente, seria a primeira vez em que votaria, pois quando fiz 18 anos estávamos em plena ditadura militar; era editor-chefe do GLOBO e, por uma coincidência dessas que não acontecem todos os dias, um dos candidatos a presidente, Fernando Collor, havia sido meu colega de colégio. E ainda havia uma história familiar curiosa. Minha mãe, grávida, passava férias em Caxambu, uma estação de águas em Minas muito em moda naquela época, 1949, quando uma cigana leu sua mão e decretou: seu filho vai ser presidente da República.

A cigana estava certa, só que com o radar um tanto desfocado. Acontece que ao lado de minha mãe estava uma amiga, Leda Collor de Mello, também grávida daquele que seria o trigésimo segundo presidente da República do Brasil.

Depois de cursarmos juntos o ginásio no Colégio São Vicente de Paula, no Rio, aonde chegamos a fazer juntos um jornalzinho, nos separamos, Collor foi para Brasília e eu fiquei no Rio.

Muitos anos depois, voltamos a nos cruzar em Brasília, para onde fui trabalhando no GLOBO como repórter, e ele era deputado federal, mas não tivemos muito contato.

Quando o então governador de Alagoas começou a despontar como o “caçador de marajás”, e depois possível candidato a presidente, comecei a me interessar de longe pela atuação daquele ex-colega.

Com a aproximação da campanha eleitoral, o contato foi restabelecido, e um dia combinamos um almoço no Rio. Me lembro bem, foi no antigo Hotel Méridien, em Copacabana.

Collor acabara de ser muito aplaudido no desfile das escolas de samba, transformandose num fato político relevante.

Eu ainda disse a ele: “Você não vai ser candidato a presidente nada, quer mesmo é ser vice de alguém”.

Ele me pareceu sincero quando respondeu: “Vou ser candidato e vou ganhar a eleição. Em todo lugar que eu vou é a mesma coisa, as pessoas querem que eu seja candidato”.

Como se tivesse combinado, de repente uma senhora abordou-o na mesa para pedir que continuasse daquela maneira, que se tornasse presidente para dar um jeito no país. Era de fato um fenômeno eleitoral.

No decorrer da campanha, porém, fomos nos afastando gradualmente, ele crescendo nas pesquisas até chegar à liderança.

Eu, desconfiado de que aquilo não ia dar certo, o que parecia novo era a velha política oligarca fantasiada de modernidade.

Houve momentos da disputa em que parecia que Afif Domingues, do PL, poderia decolar; o senador Mário Covas, do recém-criado PSDB, fez um discurso defendendo um “choque de capitalismo” e parecia uma alternativa melhor do que o novato Collor, mas não se mostrou viável, não decolou.

Lembro-me de uma conversa com o candidato do PMDB, Ulysses Guimarães, na casa de Renato Archer, levado por meu amigo Jorge Bastos Moreno, seu assessor de imprensa na campanha presidencial, em que o grande político falava na virada que daria quando o PMDB colocasse em campo toda sua máquina partidária, o que nunca aconteceu.

A campanha ia se afunilando com os três candidatos, Lula e Brizola pela esquerda e Collor pela direita, e o clima político foi se radicalizando à medida que se aproximava a definição.

Os programas eleitorais chamavam a atenção tanto pela agressividade, especialmente o de Collor, quanto pelas novidades tecnológicas que introduziram.

O presidente José Sarney foi atacado de todas as maneiras pelos candidatos, especialmente Collor, que o chamou até de “corrupto e safado”.

Lula não ficou atrás, e disse certa vez que Maluf era “um trombadinha” perto do governante da Nova República, José Sarney.

As redações eram majoritariamente petistas, e a do GLOBO não era diferente. Onde Lula aparecia, não era raro que até os repórteres aderissem ao coro de “Lu-la-lá” que arrebatava os militantes.

Eram comuns também os confrontos entre militantes, especialmente os “colloridos” contra os “petistas” — não que os brizolistas fossem menos agressivos.

Na Brizolândia, no centro do Rio, os confrontos eram diários.

Mas faltavam votos a Brizola em estados fundamentais, como Minas e São Paulo.

Na definição de quem iria para o segundo turno contra Collor, Brizola e Lula disputavam palmo a palmo.

Lula venceu por 0,5%, e Brizola morreu convencido de que fora roubado na apuração dos votos, numa conspiração para colocar Lula no segundo turno, um candidato mais fácil de ser derrotado, segundo Brizola.

Lula mostrou-se, porém, um candidato fortíssimo, e o grau de radicalização da campanha ganhou tons dramáticos.

Houve o polêmico episódio da Miriam Cordeiro, que foi levada ao programa de Collor para acusar Lula de tentar fazê-la abortar a filha de ambos, Lurian, poucos dias antes do debate do segundo turno entre Collor e Lula.

O debate foi tenso, com Collor sugerindo que tinha acusações gravíssimas contra Lula em uma pasta que colocou estrategicamente na sua mesa, e Lula nervoso, sem conseguir reagir. Perdeu o debate e a eleição.

Hoje, 20 anos depois, vendo Lula, Sarney e Collor unidos no mesmo projeto político, vejo como eram ingênuos os militantes de ambos os lados, que radicalizaram aquela primeira eleição direta para presidente do Brasil depois da ditadura.

E, com o que aconteceu no governo Collor, e a confissão de Lula, de que não estava preparado para governar se fosse eleito, vê-se que não tínhamos escapatória naquele ano de 1989.

Qualquer que fosse o resultado, teria havido uma crise política.

Pensando bem, aquela cigana de Caxambu não estava com nada.

ELIO GASPARI

A arma cinematográfica de Lula e Dilma

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/11/09

O filme "Lula, o filho do Brasil" conta uma história real que emociona e incomoda

O filme "Lula, o filho do Brasil" estreará em 500 cinemas no dia 1º de janeiro. As platéias chorarão de emoção e a oposição, de raiva. São 128 minutos de viagem pela história de um garoto que sai do sertão pernambucano, come o pão que o Diabo amassou, e chega à presidencia da República. É possível que algumas pessoas comecem a chorar já na fila para a compra de ingressos. Deliberadamente épico, o filme arranca até a última lágrima da platéia. A epopéia foi lustrada pelos roteiristas e pelo diretor Fábio Barreto, mas não foi invenção deles. Ela está na essencia da história do filho de Dona Lindu.
"O Filho do Brasil" baseia-se no livro do mesmo título, de Denise Paraná, lançado em 2002. Ele reúne uma longo depoimento de Lula à autora, mais entrevistas com seus três irmãos, três irmãs e a mulher, Marisa. Quem o leu viu uma parte da alma de Nosso Guia, acompanhou as vicissitudes de sua família e admirou a altivez das irmãs Marinete, Maria e Tiana, duas empregadas domésticas e uma operária.
A crítica a "Lula, Filho, do Brasil" correrá em duas pistas. Uma, estética, discutirá o filme. Outra, política, cuidará da narrativa e seus efeitos num ano de eleição presidencial. Só Deus sabe o tamanho do benefício que o sucesso do filme levará aos companheiros. Olhado sob esse prisma, é um exemplar de realismo petista. Retrata com fidelidade quase todos os fatos que conta, mas constrói um herói implausível, sem defeito nem deslize. Pena, porque aos 29 anos, Lula abandonou uma companheira grávida de seis meses com quem planejava viver. Foi o caso de Miriam Cordeiro, mãe de Lurian. (Essa história está bem contada, por ele, no depoimento que deu ao projeto "ABC de Luta": "Eu até compreendo o ódio que [ela] tem de mim"). Situações desse tipo refletem a complexidade, as tensões e os sofrimentos da vida dos mortais. Tirá-las da narrativa, como fizeram, empobrece o personagem e ilude a platéia.
É comum ver adversários de Lula torcendo o nariz sempre que ele relembra as dificuldades por que sua família passou. As desgraças mostradas no filme são uma pequena e contida amostra do que eles penaram. Fábio Barreto não filmou a cena em que o menino Lula pede um chiclete mastigado a um amigo. Ficou de fora também a morte, sem qualquer assistência médica, de um casal de gemeos de Dona Lindu, recem-nascidos em São Paulo. A doença e morte de Lurdes, primeira mulher de Lula, grávida de oito meses, vai mostrada em cenas breves, quase secas. A tragédia que se vê na tela choca e emociona, mas não exagera. Aquilo foi o que aconteceu no Hospital Modelo em 1971.
Um episódio pouco conhecido da vida de Lula foi sovieticamente alterado pela arquitetura da construção do herói implausível. No filme um operário é assassinado durante uma greve e seus colegas atiram o empresário (ou gerente) do alto de um passadiço da fábrica. Lula assistiu a cena de longe e, indignado, reclamou com seu irmão. Falso. Nosso Guia contou o caso a Denise Paraná e ele está na página 80 de seu livro. (Paraná é co-roteirista do filme.) O episódio ocorreu em 1962, o dono de uma pequena confecção baleou um grevista e seus colegas atiraram-no do alto de um sobrado e lincharam-no. É Lula quem narra: "O pessoal chutou ele" (à) "Acho que ele morreu" (à) "Eu achava que o pessoal estava fazendo justiça".
"Lula, o filho do Brasil" ajudará, e muito, as campanhas de Dilma Rousseff e do PT. Se Luís Inácio da Silva visse esse filme em 1968, quando era um peão que só pensava em futebol, votaria no PT, em Dilma e nos candidatos indicados por aquele filho porreta de Dona Lindu.
Nenhum dos ingredientes que o levariam a tomar essa decisão seria inteiramente falso. Noves fora a trapaça do linchamento e alguns retoques, o que aparece na tela aconteceu na vida real.
Como Tarzan, Rocky Balboa ou até mesmo o esplendido Napoleão de Abel Gance, o herói implausível de "Lula, o filho do Brasil", encanta, comove, e só. Torce-se por ele, mais nada. Saudades de Erin Brokovich (Julia Roberts) e de George Patton (George C. Scott), filmes que enriquecem quem os vê.

PÁREO DURO
Quem sabe ler pesquisa e examinou os números da Vox Populi (36% para Serra e 19% para Dilma) acha que, em condições normais de temperatura e pressão, entre o final de janeiro e o início de março, os dois estarão emparelhados.

SERRA X AÉCIO
Prospera num pedaço do empresariado a ideia de que é melhor perder a sucessão presidencial com Aécio Neves do que ganhá-la com José Serra. A manobra nasceu no poço de rancor que a ekipekonômica de Fernando Henrique Cardoso cultiva em relação a Serra. Desse núcleo propagou-pela pela banca e pela turma do papelório. A conta é simples: "Se ganharmos com Aécio, acertamos na loteria. Admitindo-se que para nós tanto faz Dilma como Serra, trocamos um jogo de perde-perde por outro de perde-ganha."

AGOURO
A ministra Dilma Rousseff deve tomar cuidado com o que diz. No dia 10 de outubro ela informou que tinha uma certeza: "Não vai ter apagão". Um mês depois, 18 Estados ficaram sem luz. Na tarde de quinta, ela avisou: "Ninguém pode prometer que um sistema complexo como o nosso não vai ter blecaute". Poucas horas depois, apagaram-se as luzes no Acre e em Rondônia. Copacabana, Santa Teresa e Laranjeiras ficaram sem luz por cerca de uma hora.

TESTE
A ministra Dilma Rousseff e o ministro Edison Lobão disseram que o caso do blecaute de terça está "encerrado". Tudo bem, mas fica combinado que, se voltarem ao assunto, estarão reconhecendo que mentiram (na pior da hipóteses) ou que disseram besteira (na melhor).

DDT NA JUSTIÇA
A dedetização do Poder Judiciário passou pelo Ceará, esteve na Bahia e chegou ao Rio de Janeiro. A próxima parada dos mata-gatunos será na Bahia.

PRIVATARIA
Quando o tucanato vendeu o patrimônio da Viúva, seus sábios ensinavam que a entrega das distribuidoras de energia elétrica a empresas estrangeiras traria preciosos capitais para Pindorama. Tudo bem. A estatal Cemig vai comprar a Light, que foi vendida aos franceses da EDF em 1996. Como fez o corsário Duguay-Trouin no Rio no século 18, a turma da privataria veio, faturou e voltou. Agora verifica-se que a Eletropaulo, vendida em 1999 para a americana AES, devia R$ 910 milhões à Viúva e acorreu para baixo do guarda-chuva do Refis. Assim, bombará o balanço do quarto trimestre com um lucro líquido de R$ 250 milhões.

CRISE, QUE CRISE?
A crise acabou para o andar de cima. No ano passado o leilão de arte contemporânea da casa Sotheby's de Nova York fechou em clima de liquidação, faturando US$ 22 milhões, 9 milhões abaixo da expectativa mais pessimista. Neste ano deu-se o contrário, um leilão que moveria US$ 69 milhões, rendeu US$ 134 milhões. Na semana passada, um painel de Andy Warhol avaliado em até US$ 12 milhões valeu US$ 43,8 milhões. (Alô PC do B: um Mao Tse-tung de Warhol custa US$ 550 mil.) Entre 1930 e 1931, enquanto os americanos ralavam nas filas dos sopões, o bilionário Andrew Mellon comprou 23 obras-primas do Museu Hermitage, mandados ao mercado por Stálin. No lote estava a Alba Madona, de Rafael. Em dinheiro de hoje, a coleção custou uns US$ 60 milhões.

JAPA GOSTOSA


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LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO

Ideias feitas

O GLOBO - 15/11/09


Pode-se supor que o descobrimento do Brasil estava entre as notícias que inspiraram Thomas More a inventar sua Utopia, a ilha perfeita em algum lugar do Novo Mundo. Jean-Jacques Rousseau também usou os nativos da América, incluindo os do Brasil, nas suas teorizações sobre nobres selvagens e suas sociedades puras. De um jeito ou de outro – e culminando com Claude Lévi-Strauss – todos os que fantasiaram ou especularam na mesma linha sobre os incivilizados deste lado do mundo os estavam desagravando, tentando resgatá-los das ideias feitas das suas respectivas épocas a respeito do selvagem. Até o começo do século vinte ainda se debatia a natureza dos seres primitivos que habitavam a África e as Américas colonizadas, se eram humanos ou não, mas para uma certa tradição intelectual europeia eles não apenas eram humanos, mas humanos superiores. O próprio Lévi-Strauss, que estava longe de ser um romântico atrás da inocência do primitivo, atribuiu a tribos indígenas brasileiras uma sofisticação cultural que afrontou ideias convencionais que ainda persistiam na Europa sobre o selvagem.
Hoje, para o imaginário europeu, o Lula – só para pegar o selvagem mais à mão – é tudo que os românticos e os
pensadores anticonvencionais diziam sobre aqueles estranhos habitantes do Novo Mundo e poucos acreditavam. A ideia feita na Europa agora é que o Lula é o cara e o Brasil, se não é a Utopia sonhada, está mais perto dela do que qualquer outro país comparável.
Enfrentou a crise econômica melhor do que ninguém, tem mais riqueza a ser explorada do que qualquer outro, tem um líder simpático com apoio quase universal – e isso sem falar no Carnaval! Enfim, somos não apenas humanos, mas humanos superiores, certamente superiores aos chochos europeus. E você fica tentado a pedir calma e reflexão: também não é bem assim, gente. Não somos mais antropofágicos, a não ser em casos especialíssimos, mas o que temos ainda não pode ser chamado de civilização. Temos problemas,
temos guerra nas ruas, temos... Mas não adianta. A atual ideia feita sobre a nossa excepcionalidade é tão arraigada quanto era a ideia feita sobre os tupinambás.
PÔ!
Me chamem de megalômano mas tive a nítida certeza de que o apagão era contra mim. Souberam que nós estávamos voltando e apagaram todas as luzes para que o avião não encontrasse o Brasil. Se não queriam que eu voltasse das férias era
só dizer, pô!

JOÃO UBALDO RIBEIRO

Os torpes labéus


O GLOBO - 15/11/09

Agora, com o Google, brincadeiras como esta perderam a graça, mas, sem pesquisar na internet, tente lembrar-se do que as palavras “torpes labéus” têm a ver com o dia de hoje. Não é preciso saber o que significam, até porque acho que isso, depois que o saudoso Antônio Houaiss nos deixou, ninguém mais sabe. Pensem aí, filhos ingratos, que dia é hoje? Pois é, se caísse na segunda-feira, vocês se lembrariam, por causa do feriadão. Hoje é o grande feriado da Proclamação da República, que no momento pode não estar assim em esplendorosas condições de funcionamento, mas é a que temos.

E os torpes labéus? Bem, neste ponto tenho que curvar-me ao fato de que as gerações mais novas, ou até as menos velhas, não encararam todos os hinos que o pessoal dos velhos tempos encarava. Aliás, ao que parece, encararam apenas o Hino Nacional e, assim mesmo, sem muita aplicação, Portanto, não se pode estranhar que bem pouca gente lembre o Hino da República, que é onde estão os torpes labéus - logo no quarto verso. Na verdade, nem é justo evocar o Hino da República através dos torpes labéus. Ao contrário do lábaro que ostentas e da terra mais garrida, que na escola nos ensinavam o que queriam dizer, ninguém dava pelota para os torpes labéus. Na escola de d. Madalena, em Itaparica, meu colega Mundinho Budião inventou que era xingamento dos mais pesados concebíveis e, durante algum tempo, várias brigas se travaram depois de um xingar outro de torpilabéu fidumaégua. E Mundinho, que sempre foi de boa paz, mas não levava desaforo para casa, até hoje deve ser homem de dar uma mãozada em quem o chamar de torpilabéu.

Sim, não é justo que o Hino da República seja lembrado apenas por essa associação negativa. A parte boa ainda está bem viva na memória de muitos. É o estribilho, que diz “Liberdade! Liberdade!/Abre as asas sobre nós!/Das lutas na tempestade/Dá que ouçamos tua voz!” Garanto que mais diversos entre vocês recordaram agora não só a letra como a melodia, alegre e reconfortante, a liberdade, simpaticíssima, abrindo as asas para nos proteger. Bem verdade que, de 1889 para cá, fecharam as asas dela algumas vezes e tem sempre quem queira dar pelo menos uma aparadinha nelas, mas a estrofe continua boa, bem como o desejo nela expresso.

Quanto aos mais torpes labéus do passado, foram todos remidos, diz mais ou menos o hino. Ou seja, antes da República, devemos ter obrado ou causado todo tipo de torpe labéu possível, em tal proporção que somente uma providência radical poderia redimir o horrendo passado. Aí nos livramos do Imperador e de toda a nobreza local (no hino chamados de “púrpuras régias”) e instituímos a República, episódio ainda não perfeitamente entendido pela maior parte de nós – querem ver, saiam perguntando por aí. Mas com ele resolvemos todos os nossos problemas, pelo menos a se julgar pelo hino.

No entanto, como sabemos, há controvérsias. Em Itaparica já são finados os monarquistas e republicanos históricos, mas permanecem rixas ancestrais, bem como um forte núcleo monarquista, sobre o qual razões de segurança me impedem de revelar mais detalhes. Comentam os maledicentes que, desde 1890, um comitê de militantes discute a redação de um convite endereçado ao futuro rei da ilha, mas ninguém concorda quanto aos termos desse documento. E mencionem-se também os anarquistas, como meu finado primo Walter Ubaldo, o filósofo do sorriso de desdém, que dizia que a única consequência da Proclamação da República tinha sido um grande aumento de gente para se xingar, com muito maior variedade.

Também creio que, numa demonstração de como a política nacional está presente na vida da ilha, ainda existem por lá alguns jogadores do chapéu do Marechal, passatempo em que o forasteiro não deve entrar a dinheiro, porque vai sair mais pobre. Baseia-se em que todo mundo já viu pelo menos a reprodução de um quadro do marechal Deodoro proclamando a República montado em seu cavalo, mas ninguém consegue lembrar se a) ele estava com as duas mãos nas rédeas: b) ele estava de chapéu; c) ele estava erguendo o chapéu; d) ele estava erguendo a espada; e) ele etc., etc., conforme os jogadores presentes. O fato é que, por mais certeza que se tenha de como era o tal retrato, vai sempre aparecer, como prova apresentada na hora, um diferente do descrito pelo apostador. Como é que se faz, não sei e nem o próprio Zecamunista, apesar da amizade, quis me contar, disse que era para meu próprio bem, impediria minha perdição irremediável.

– Vá por mim, vai lhe evitar os mais torpes labéus.

– Zeca, você também se lembra disso?

– Claro que me lembro, não sou analfabeto. Mas eu detesto esse hino, só gosto da parte da liberdade.

– Mas o que é tão detestável nele?

– Você não deve estar lembrado. É a parte do ovante.

– A parte do quê?

– Do ovante, já vi que você esqueceu. Ele diz que nosso estandarte é ovante, isso sempre me pareceu uma ofensa.

– Mas que quer dizer “ovante”?

– Não vem ao caso, veja no dicionário. O fato é que, se uma mulher me chamasse de ovante, eu ia ficar grilado, você não ia, não?

– Bem, a palavra realmente não tem um som bonito, mas...

– Não tem “mas”, eu não confio nesse hino. É porque você também esqueceu, mas, na hora em que ele fala em derramar sangue, tira o corpo fora e diz que Tiradentes já cuidou disso. Ovante é a mãe deles, não aceito.

GOSTOSA

VOLTEI

VOLTEI DO HOSPITAL
VOU VER O MEU FLA

DORA KRAMER

O jogo do João bobo

O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/11/09


É intrigante a insistente solicitude com que governistas se dispõem a aconselhar o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, a persistir na luta para obter a legenda do PSDB na disputa pela Presidência da República em 2010.

Tecem loas à capacidade de Aécio para agregar aliados, insinuam que se ele for o candidato da oposição o governo estará em maus lençóis porque a aliança em torno de Dilma Rousseff tenderia a explodir em função do êxodo de governistas em direção à candidatura do mineiro e alimentam abertamente a tese de que "Minas" tende a se insurgir contra uma posição subalterna, pois a sucessão presidencial "passa" necessariamente por lá.

Começando pelo fim: se Minas não aceita uma posição subalterna e tem - como, de fato, tem - a importância estratégica devida ao segundo maior colégio eleitoral do País, por que a direção nacional do PT não começa por organizar sua própria seara, hoje às turras no Estado, ao invés de incentivá-la a se tornar uma sublegenda do PMDB?

É que a preocupação primordial do governo é afastar o máximo de obstáculos possíveis do caminho de Dilma Rousseff, haja vista a determinação do presidente Luiz Inácio da Silva em tirar o deputado Ciro Gomes do páreo e acomodá-lo na disputa pelo governo de São Paulo.

Nessa linha, a paúra maior é com a possibilidade de o PSDB juntar os governadores de São Paulo e Minas Gerais numa mesma chapa. Se a dupla seria imbatível ou não, só o eleitor para confirmar. Mas é fato que nas hostes governistas o temor é grande porque a avaliação em tese é a de que seria praticamente impossível derrotar José Serra e Aécio Neves juntos.

O ideal, qualquer governista confirma, teria sido conseguir que Aécio saísse do PSDB e concorresse por outro partido, de preferência o PMDB, para tirar dos tucanos os votos de Minas.

Essa possibilidade morreu com o fim do prazo para filiação partidária dos candidatos e a permanência de Aécio Neves no PSDB. A meta do adversário passou a ser, então, a tentativa de alimentar a cizânia interna na esperança de que se repita o cenário de 2002, quando boa parte do PSDB fazia cara de paisagem enquanto José Serra disputava a Presidência com Lula.

É do jogo, não fere nenhuma regra, mas o caminho escolhido agride a lógica dos fatos e não faz jus à inteligência dos envolvidos. De ambos os lados.

Os petistas dizem por toda parte que Aécio é o candidato mais difícil de ser derrotado, que eles prefeririam mil vezes concorrer com José Serra e que se o mineiro for escolhido está tudo perdido. Cobrem o governador de Minas de elogios, fazendo dele um juízo que não condiz com quem aprendeu na família que a política é a arte de ser matreiro.

Se Aécio é mesmo, na visão do PT, o adversário mais perigoso, o natural seria combatê-lo, minar suas chances, desqualificá-lo no lugar de elevá-lo à condição de divindade.

Nem Aécio acredita nem o PT se faz verossímil. Inclusive porque já usou o truque em 2006, quando ministros "confidenciavam" a jornalistas que o PSDB faria bom negócio em escolher o então governador de São Paulo, pois Geraldo Alckmin seria um páreo duríssimo para Lula.

Agora a coisa se repete. Dá para entender alguém que elege para si a melhor opção para o adversário? Só sendo mentira. E das bem bobas.

Futucar é preciso

Hoje à noite no programa É notícia (Rede TV!) o presidente Lula aparecerá dizendo em entrevista a Kennedy Alencar que o mensalão foi fruto de armação de seus adversários, uma tentativa de golpe da oposição que ele não denunciou porque não é função do presidente da República ficar "futucando essas coisas".

Quer dizer, então, que há quatro anos o Brasil correu o risco de enfrentar uma ruptura institucional e o chefe da Nação deixou passar em branco, permitindo que os responsáveis pela conspiração ficassem impunes, mais não fosse da condenação moral diante da opinião pública?

Se foi isso mesmo que o presidente Lula quis dizer na gravação feita durante a semana, cabe ao menos uma interpelação judicial para que sua excelência explique as razões pelas quais deliberadamente acobertou uma tentativa de agressão ao Estado de Direito, cláusula pétrea da Constituição.

Se não foi, cumpria reparar. A ausência de cobranças sérias a respeito das declarações do presidente e a aceitação tácita de que sua popularidade o torna inimputável é o que o autoriza a cometer toda sorte de leviandades, a ofender as pessoas, desmoralizar qualquer um que se oponha aos seus propósitos e ainda exigir que seja tratado com obsequiosa reverência.

A penúltima foi comparar a oposição a Hitler dizendo que a organização de militantes para atuar da eleição se assemelhava à cooptação de jovens na Alemanha nazista.

Como Lula fala tolices a mancheias, as pessoas acham graça. Vão rindo até o momento em que encontrarão razões para chorar e já não terão como reclamar.

CLÁUDIO HUMBERTO

“Não há dúvida de que Marina é a melhor para o Brasil”
HELOÍSA HELENA (PSOL-AL), QUE QUER ALIANÇA COM A CANDIDATA DO PV, MARINA SILVA

GOVERNO DESPREZA POSSÍVEL SABOTAGEM DO MST
Apesar das ameaças e até do histórico recente do MST, o “Movimento dos Trabalhadores Sem Terra”, que há dois anos teria dinamitado uma torre de transmissão no Sul, o presidente Lula se recusa a admitir a hipótese de terrorismo ou sabotagem, no apagão desta semana. Como o MST é aliado do governo, seria constrangedor para o presidente descobrir que os porraloucas aloprados do MST provocaram o apagão.
NORTE E SUL
Enquanto partes do Sul, Sudeste e Centro-Oeste e Recife estavam às escuras, a derrubada de uma torre deixou 18 cidades do Pará sem luz.
VALE A VERSÃO
Fonte do Ministério de Minas e Energia afirma que o governo ainda não sabe o motivo do apagão. Mas aprecia a versão improvável de “raio”.
A DEUS PERTENCE
As grandes empresas brasileiras exportadoras de commodities, como minério de ferro e aço, ligaram o desconfiômetro com o apagão.
LUNÁTICOS
A Nasa descobriu água na Lua. O problema são as linhas de transmissão: chegar ao Brasil é longe à beça. Com raio, então...
PARÁ: CASO DA MENINA PRESA NÃO TEM CULPADOS
Há dois anos uma menina de 15 anos foi presa no Pará “por suspeita de roubo” e mantida por 26 dias em uma cela com cerca de 20 homens onde sofreu todos os tipos de abuso. Os envolvidos não sofreram qualquer punição e até o delegado-geral, Raimundo Benassuly, que foi afastado e apontado como responsável à época, foi reconduzido ao cargo pela governadora petista do Pará, Ana Júlia Carepa.
ABSURDO
O delegado Raimundo Benassuly até disse que a menina teve uma “parcela de culpa” no caso e parecia ter “alguma debilidade mental”.
HEDIONDO
Durante 26 dias, a menina sofreu abusos sexuais em troca de comida, foi espancada, queimada e teve os cabelos cortados com navalha.
CONSEQUÊNCIAS
A única ação do governo petista do Pará foi colocar a adolescente em um programa de proteção de testemunhas. Mudou de nome e cidade.
EU VIGIO, TU VIGIAS
Indiciado com o ex-ministro Humberto Costa e outros 40 na “máfia dos vampiros”, de desvios na Saúde, Aloisio Alves de Matos agora é gerente de portos e aeroportos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
ELE TOMA POSSE
A Anvisa não vê “ilegalidade” na nomeação de Matos, funcionário de carreira. Rebate com o velho argumento da “presunção de inocência” e que é “preciso aguardar” o processo judicial. É livre e desimpedido.
ACRE: ABUSO DE PODER
Após o Enade levantar a bola do governo Lula, o Acre cita o ex-governador Jorge Viana no vestibular da Universidade do Acre, federal, com “florestania”, inexistente em Português, mas criado no governo de Viana por um “cumpanhêro”, como junção de “floresta” e “cidadania”.
ESTREIA
A primeira-dama do DF, Flávia Arruda, estreia como apresentadora de tevê neste domingo, às 10h, na Band Brasília. Ela está à frente do programa Nossa Gente, que conta histórias de pessoas que mudaram uma dura realidade através de programas sociais.
IMPASSE FISCAL
Empresários e comerciantes do Rio vão à Justiça contra o prazo inferior a dois meses para entregar o arquivo magnético de cupom fiscal à secretaria de Fazenda. O equipamento exigido custa uma baba.
NOVO TURISMO
O ministro do Turismo israelense, Stas Misezhnikov, assinou um acordo de cooperação em sua área com o governo brasileiro.
A ideia é facilitar o trânsito de brasileiros e israelenses entre os dois países.
PROTESTO
A petroleira Edilene Farias prometeu deitar num caixão na Transpetro, Centro do Rio, após ter sido demitida por justa causa “por denegrir a imagem da empresa e abandono de emprego”. Para a estatal, tem “alergia hereditária” e não foi contaminada por benzeno, como alega.
AVISO DO CÉU
A médium Adelaide Scritori enviou ao Planalto aviso do cacique Cobra Coral, o dos ventos e tempestades: pode haver outro apagão em 43 dias. Mandou um relatório reservado ao Ministério das Minas e Energia.
PENSANDO BEM...
...o último a sair deixe ao menos uma luz acesa.

PODER SEM PUDOR
O OLHO DA PERDIÇÃO
Candidato ao governo de Minas em 1982, Tancredo Neves recebeu dos assessores uma recomendação, em tom de apelo, para fitar a luz vermelha da câmera, nas suas entrevistas à TV. Explicaram-lhe que, assim, ele estava olhando para o telespectador. Tancredo respondeu:
– Olha, eu vi a televisão nascer e, com ela, a vaidade crescer. Conheci muita gente que se perdeu por aí. Então, decidi: nunca olho para aquele olho seco e vermelho. Pode ser a perdição.

O IMBECIL

DOMINGO NOS JORNAIS

- Globo: Dinheiro gasto no D. Marta daria um imóvel por família


- Folha: Número de apagões no país cresce 29%


- Estadão: Uso de transgênico na safra de milho vai de 19% para 53%


- JB: Cabral: sim às drogas, mas só com aval da OMS


- Correio: Fraude dos diplomas atinge universidades