domingo, junho 28, 2009

TOSTÃO

Distorções de fatos e de conceitos


JORNAL DO BRASIL - 28/06/09

Nunca disse que os treinadores não são importantes. Seria burrice. Quem distorce minha opinião faz por má intenção ou porque não leu. Escrevi, um milhão de vezes, que os técnicos são supervalorizados, nas vitórias e nas derrotas. É bem diferente de não ser importantes.

São os técnicos que organizam os esquemas táticos, escalam, substituem, treinam, formam o grupo e muitas outras coisas. Tudo isso é difícil. Muito mais fácil é ser comentarista.

Isso é uma coisa. Outra é achar que os técnicos são mais importantes que os jogadores, que ganham e perdem partidas por causa de uma substituição, de uma mudança de um jogador dois metros para a direita ou dois metros para a esquerda. Já vi técnico ganhar ou perder jogo, mas isso é raro.

Ao constatar que muitos sonhos noturnos eram consequência de desejos conscientes e inconscientes, Freud quis explicar o mecanismo de todos os sonhos. Nem todos são assim. Do mesmo jeito, comentaristas, por várias razões, constroem, depois da partida, com bons e maus argumentos, uma história irreal. É a obsessão pelo reducionismo. Assim como a vida, o futebol é muito mais complexo. Nós é que tentamos simplificá-lo.

Acontecem muitos detalhes táticos em uma partida que independem da vontade do técnico. Existe ainda um grande número de outros fatores envolvidos no resultado de um jogo, na conquista de um título. Por isso, um treinador pior pode ser campeão mais vezes que um melhor. Geninho já foi campeão brasileiro, e Celso Roth nunca foi.

O acaso está também presente em todos os jogos. O acaso não é sorte nem mistério. São fatos corriqueiros, que não sabemos quando e onde irão ocorrer.

Dunga, mesmo sem ter sido treinador, tem mostrado que é capaz de fazer tão bem, ou até melhor, que badalados e experientes técnicos. Isso é mais um evidência de que os treinadores não possuem nenhuma mágica ou segredo. A maior qualidade de Dunga não é ser um motivador, um estrategista nem ter muita sorte; é ter gana, obsessão pela vitória.

Joel, ridicularizado por ser simplório e não falar inglês, criou enormes dificuldades para o Brasil, como escalar um meia de cada lado para impedir os avanços dos laterais. Já o famoso Marcelo Lippi, técnico da Itália, campeão do mundo, deixou todos os espaços para Maicon atacar, mesmo conhecendo bem o lateral.

A Espanha não perdeu para os EUA porque o técnico americano surpreendeu com um novo esquema defensivo. A Espanha, como faz sempre, dominou o jogo e teve todas as chances de ganhar. Foi uma grande zebra, uma sucessão de detalhes surpreendentes que raramente ocorre.

A deficiência da Espanha nesse jogo, que pode se tornar um problema, é não saber fazer gol feio, esquisito, de bola espirrada ou de canela.

Assim como é raríssimo um raio cair duas vezes em um mesmo lugar, o Senado ter dignidade, não haver desperdício de dinheiro público para a realização da Copa de 2014 e alguns dirigentes esportivos deixarem o poder, é muito difícil, quase impossível, os EUA ganharem, em poucos dias, da Espanha e do Brasil.

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