sábado, agosto 20, 2016

Criminosos em campanha contra Sergio Moro - CLÁUDIO SLAVIERO

GAZETA DO POVO - PR - 20/08

O juiz federal é um símbolo do que a maioria dos brasileiros espera da Justiça, e, ao mesmo tempo, inimigo principal dos incriminados


Os petistas e agregados, apavorados com o fim de seu reinado no Palácio do Planalto, bem como na máquina pública, agridem a Moro nas manifestações pró-Dilma e pró-Lula, em curiosa troca de raciocínio


Um juiz de Maringá virou, por seu trabalho e seriedade, uma figura emblemática da potencialidade e da necessidade de Justiça neste país. Por ter colocado empresários, criminosos de “colarinho branco”, e políticos, independentemente de seu escalão – inclusive ex-ministros – na prisão, elencando dúzias em crimes de corrupção, formação de quadrilhas etc., Sergio Moro é um símbolo do que a maioria dos brasileiros espera da Justiça, e, ao mesmo tempo, inimigo principal dos incriminados.

Enquanto o presidente do Senado, Renan Calheiros, além de políticos parceiros, e o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandovski, como alguns membros desta Corte, tentam desmerecer as ações de Moro e a própria Justiça, também petistas e assemelhados esperneiam dentro e fora do Congresso Nacional com as atitudes saneadoras contra a corrupção.

Foi patético, no último dia 4, em sessão da Câmara Federal, com a presença de Sergio Moro, os petistas atacarem o juiz paranaense, como se ele, com a Operação Lava Jato, fosse a causa da derrocada do corrompido e corroído partido.

Entre outros, o deputado Wadih Damous (PT-RJ), um dos principais defensores de Dilma, criticou sugestões enviadas pelo Ministério Público à Câmara, que, segundo ele, “partem de um princípio de que o Brasil não tem ordenamento jurídico capaz de enfrentar a corrupção”, emendando: “Sou do tempo em que juiz só falava nos autos do processo, não se pronunciava sobre os casos. Sou de um tempo antigo, de respeito estrito à Constituição”. Seria de provocar risos, se não provocasse náusea.

Por sua vez, o presidente do STF manteve-se em absoluto silêncio quando Lula e seus advogados foram à Organização das Nações Unidas para tentar desmoralizar o Judiciário brasileiro, pedindo intervenção do Conselho de Direitos Humanos da ONU por “perseguições de órgãos da Justiça e Ministério Público do Brasil, e por imparcialidade...”. A ação é um soco na cara da Justiça brasileira e deveria indignar a todos que prezam o Poder Judiciário e as instituições.

Lewandovski, além de se manifestar sobre esta atitude desrespeitosa, deveria se preocupar com a morosidade do STF, que, segundo o jornal Valor, leva, em média, 945 dias para julgar uma ação contra parlamentares e ministros. Já a operação Lava Jato comandada pelo juiz Sergio Moro e pelo procurador Deltan Dallagnol obteve 989 mandatos executados, 1.291 procedimentos instaurados e 106 condenações criminais.

Ao mesmo tempo, Calheiros, que já teve seu nome citado inúmeras vezes nas investigações da Lava Jato e com mais de uma dezena de processos no STF, tenta impor uma lei para desacreditar e tirar o poder da Polícia Federal e do Ministério Público, em intenção no mínimo condenável.

O projeto prevê punição a servidores públicos e membros do Judiciário e MP, caso sejam feitas prisões fora das hipóteses legais, e escutas que atinjam pessoas investigadas. Moro, em recente entrevista, mais uma vez foi claro, ao comentar que “vê, no projeto, risco de punir juiz por interpretar a lei”!

Os petistas e agregados, apavorados com o fim de seu reinado no Palácio do Planalto, bem como na máquina pública, agridem a Moro nas manifestações pró-Dilma e pró-Lula, em curiosa troca de raciocínio, como se os bandidos fossem heróis e o herói devesse ser condenado por praticar justiça.

Enfim, enquanto um grupo de políticos, parlamentares e inclusive juízes, além de meliantes de alto quilate, tentam desmoralizar e desautorizar as atitudes do juiz Sérgio Moro, cabe aos brasileiros e, especialmente a nós, paranaenses, defendê-las quando, interpretando as leis, colaboram concretamente para promover a Justiça e limpar o país de corruptos e ladrões que emporcalham a nação brasileira. Desses, estamos cheios.


Cláudio Slaviero é empresário, ex-presidente da Associação Comercial do Paraná e autor do livro “A vergonha nossa de cada dia”

O desafio do câmbio - EDITORIAL GAZETA DO POVO

Gazeta do Povo - PR - 20/08

Poucos empresários no mundo lidam com tantas variações cambiais em tão pouco tempo como no Brasil



O desarranjo na economia brasileira fez com que o país novamente caísse na armadilha das grandes oscilações cambiais. Após a desvalorização do real ocorrida entre o fim de 2014 e o início deste ano, o país se tornou a economia cuja moeda mais se valorizou no mundo neste ano, segundo dados do Banco de Compensações Internacionais (BIS). O movimento mostra as dificuldades de se conviver com o câmbio flutuante quando outros fundamentos econômicos são voláteis.

O câmbio flutuante foi adotado pelo Brasil somente em 1999. Ele era uma das pernas do tripé macroeconômico, completado pela meta de inflação e pelo controle das contas públicas. Nesse modelo, a taxa de juros é determinada em função da meta de inflação, que é perseguida com apoio da política fiscal e influenciada por uma variável não controlada, que é o câmbio.

O problema central do modelo é que, em um país instável na manutenção das variáveis que ele controla, o câmbio oscila de maneira violenta – isso mesmo com o Banco Central tendo adotado a postura de intervir no mercado com instrumentos derivativos e a compra e venda de moeda estrangeira. Os efeitos dessas variações reverberam durante meses e dificultam a construção de um cenário de longo prazo para quem está na economia real.

A desvalorização do real ocorrida entre julho de 2014 e setembro de 2015 foi de 31%, segundo dados do BIS que corrigem os índices pela inflação. Em seguida, houve uma valorização de 30% até julho deste ano. O primeiro movimento pressionou a inflação, influenciada pelos preços de produtos importados, mas abriu ao mesmo tempo a perspectiva de elevação das exportações. Em poucos meses, o cenário mudou e já começa a incomodar a indústria, que contava com o câmbio para elevar suas vendas ao exterior.

De fato, o movimento de desvalorização do real não foi suficiente para que as exportações compensassem a perda de atividade econômica interna. Neste ano, os embarques de produtos manufaturados apresentaram um recuo de 2,32%. A perda de competitividade da indústria nos anos de real forte foi tamanha que a melhora da cotação do dólar verificada até o início deste ano não foi suficiente para a conquista de novos mercados.

Não é de estranhar que comecem a aparecer vozes pedindo intervenções mais pesadas no câmbio, como fez o empresário Abílio Diniz – sua sugestão é que se aumente o imposto sobre a entrada de dólares trazidos por investidores. As reclamações são legítimas. Poucos empresários no mundo lidam com tantas variações cambiais em tão pouco tempo.

Ao mesmo tempo, intervenções muito pesadas no câmbio mascaram outros desequilíbrios macroeconômicos. Foi assim que a intervenção maciça feita pelo BC entre 2013 e 2014 para segurar a alta do dólar serviu para conter artificialmente a inflação que o governo Dilma Rousseff teimava em dizer que não existia. O saldo foi a criação de US$ 100 bilhões em derivativos cambiais que custaram bilhões em juros à autoridade monetária.

O primeiro passo para se amenizar o problema é a sustentação do tripé macroeconômico. O governo tem de apoiar sem ressalvas a manutenção da meta de inflação, com um ajuste fiscal duradouro. Isso reduzirá a especulação no mercado de juros, com o efeito benéfico sobre o grau de oscilação cambial.

A melhora macro pode ser acompanhada pela criação de um Comitê de Política Cambial, instrumento sugerido pelo atual presidente do BC, Ilan Goldfajn, em um trabalho feito antes de assumir o posto. Nos moldes da reunião que hoje decide a taxa de juros, o comitê avaliaria os movimentos cambiais para estabelecer políticas de gestão de reservas, taxação de entrada de recursos, entre outras variáveis. Isso melhoraria a comunicação com o mercado e produziria um modelo para reduzir a volatilidade .

Legisladores bêbados? - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 20/08

Nunca fui muito simpático à Lei da Ficha Limpa. Até acho que dá para defendê-la por razões táticas, mas, conceitualmente, eu a vejo como uma limitação do poder do voto do cidadão. Em princípio, eleitores deveriam ter a possibilidade de escolher alguém com problemas com a Justiça. Pense num Robin Hood, ou, num exemplo menos mitológico, num Lula em 2018. Não recomendaria reconduzir tão cedo o PT ao comando do governo federal, mas impedir o principal líder do partido de concorrer não soa lá muito democrático.

Seja como for, a Ficha Limpa veio para ficar. Isso dito, não gostei da decisão que o STF tomou nesta semana de determinar que apenas as Casas Legislativas têm poder para tornar inelegíveis políticos que tiveram suas contas reprovadas pelos tribunais de contas estaduais e municipais. O juízo parece contrariar a própria lógica da Ficha Limpa, que é a de submeter a filtros técnico-jurídicos os nomes que serão apresentados ao crivo do eleitor. Não há dúvida de que os tribunais de contas são órgãos mais técnicos do que câmaras e assembleias, que são instituições eminentemente políticas. E, se é para decidir politicamente e não tecnicamente, então faria mais sentido dar esse poder diretamente ao eleitor, revogando a Ficha Limpa.

Não sei se as pessoas que escreveram essa lei estavam bêbadas, como sustentou o ministro Gilmar Mendes, mas cometeram erros. Parece-me escandaloso que tenham equiparado a exclusão por órgão profissional a uma condenação judicial em segunda instância. Consigo imaginar algumas razões virtuosas que poderiam levar um advogado a ser expulso da OAB, por exemplo. Denunciar o corporativismo da Ordem é a mais óbvia.

O ponto central, me parece, é que a Ficha Limpa tem como pressuposto uma concepção equivocada, que é a de que é possível "corrigir" o eleitor fabricando leis e decretos que o impeçam de escolher "errado".

Ofensiva Meirelles - ADRIANA FERNANDES

ESTADÃO - 20/08

Fazenda vai passar a medir o pulso da confiança do mercado no plano de ajuste



A política fiscal não tem ainda um comitê decisório como o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, colegiado que define os rumos da taxa de juros do País, a Selic, com base na evolução de preços na economia.

Mas o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deu sinal verde para a sua equipe fazer um boletim nos mesmos moldes do relatório de inflação, documento que o BC divulga a cada três meses e serve para o Copom traçar o balanço de riscos para o cumprimento da meta de inflação. O relatório da Fazenda terá como foco a meta fiscal.

Depois do estrago provocado na imagem do ajuste das contas públicas com as negociações do projeto de reestruturação da dívida dos Estados, a equipe econômica desenhou uma ofensiva para melhorar a transparência da sua comunicação e evitar mais danos nesse período de transição entre a fase pós-impeachment e as eleições municipais de outubro, quando o Palácio do Planalto já espera uma negociação mais lenta das medidas fiscais no Congresso.

Meirelles segue o caminho de Ilan Goldfjan, que logo que assumiu o comando do Banco Central promoveu uma mudança radical na comunicação da política monetária, trazendo, inclusive, uma linguagem mais simples para a ata do Copom. Documento que sempre foi muito criticado por ser escrito em “coponês”, uma língua muito particular e de difícil entendimento para a maioria dos brasileiros.

O primeiro passo da estratégia de retomada das rédeas da confiança no ajuste começou esta semana, com a coordenação das expectativas em torno da previsão de crescimento do PIB do Brasil que servirá de base para a elaboração do Orçamento de 2017. Antes mesmo que começassem a crescer os rumores que circulavam com grande velocidade no mercado de que o governo iria “inflar” artificialmente o PIB para fechar o projeto de orçamento sem anúncio de medidas de aumento de imposto, a Fazenda surpreendeu e divulgou sua previsão: alta de 1,6%.

O governo também intensificou a articulação política com os aliados. O presidente em exercício Michel Temer chamou os tucanos, que lançaram nas últimas semanas artilharia pesada na direção do ajuste de Meirelles, e prometeu mais influência no núcleo decisório da economia. Temer tratou ainda de reunir as lideranças políticas nesta última sexta-feira para tratar da agenda econômica.

No campo da coordenação de expectativas e para evitar mais perda da confiança conquistada nos primeiros meses no cargo, Meirelles e sua equipe intensificaram as conversas com empresários e analistas. A Fazenda passará a ter reuniões permanentes com o mercado para medir o pulso da confiança no ajuste, como já faz há anos o BC com a inflação. A divulgação de relatórios fiscais trimestrais poderá ter, no entanto, um papel ainda mais importante ao fazer um mapa de todos os riscos para a estratégia de controle das contas públicas. E mais do que isso: expô-los com clareza.

Hoje, os relatórios fiscais que estão à disposição são muito pouco analíticos. O documento mensal do Tesouro, que traz o resultado das contas do governo, apenas descreve dados. E os relatórios bimestrais enviados ao Congresso, por exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), somente indicam se houve frustração de receita ou aumento de despesa e, em caso afirmativo, a necessidade de contingenciamento.

É por falta de transparência nos dados que os analistas demoraram muito para perceber desde 2012 a forte e rápida piora nas contas públicas. Assim, um relatório mais analítico poderá ser muito positivo. Qualquer informação adicional de qualidade da questão fiscal ajudará no debate e no enfrentamento de medidas. As pessoas no Brasil não conhecem o Orçamento e nem mesmo o que é ou não passível de corte no curto prazo.

É claro que um relatório desse tipo só terá sucesso ser for claro na análise. E que deixe à mostra para a sociedade os riscos fiscais que podem atrapalhar o cumprimento da meta fiscal. O documento só valerá a pena se o governo tiver coragem de mostrar todos os problemas.


Brasil precisa de uma parceria estratégica de longo prazo com a China - MARCOS JANK

FOLHA DE SP - 20/08

Nos primeiros dias de setembro, o presidente Temer vai participar da cúpula do G20, na China.

Trata-se de uma viagem de imensa relevância, durante a qual o novo governo irá interagir com os líderes das principais economias do mundo. No encontro bilateral com Xi Jinping, Temer terá a oportunidade de inaugurar uma nova fase no relacionamento com a China, país com quem já interagiu diversas vezes e conhece em profundidade.

Creio que chegou a hora de apresentar as bases para construir uma verdadeira parceria estratégica de longo prazo com a China, que é, sem dúvida, o país com maior interesse pelo Brasil e dependência dele.

A China tornou-se o maior importador mundial de commodities e vai precisar do Brasil para atender a sua enorme demanda potencial. Apenas dois produtos —soja em grãos e minério de ferro— já fizeram da China nosso maior parceiro comercial, gerando uma revolução econômica em regiões importantes do Brasil. Ainda que de forma gradual e seletiva, a China começa a se abrir para outras commodities, como algodão, milho, trigo, açúcar e proteínas animais.

A experiência milenar de liderança fez da China um país que sabe estudar e planejar o seu futuro muitas décadas à frente. No Brasil, o planejamento é precário e imediatista, cobrindo meses ou, no máximo, uns poucos anos.

Nas commodities, somos basicamente "comprados" e não sabemos aonde queremos chegar. Nas nossas exportações, quem determina a pauta e a velocidade dos fluxos é a China, e nós temos aceitado o que ela quer sem muita discussão ou planejamento.

Nos investimentos, a China começou a internacionalizar suas empresas estatais, adquirindo terras e empresas originadoras de commodities pelo mundo afora, além de investir pesadamente em infraestrutura. Obviamente o objetivo de longo prazo da China é o controle estratégico das suas cadeias de suprimento.

Uma parceria estratégica de ganha-ganha no longo prazo certamente produziria fluxos de comércio com maior racionalidade e sentido econômico, além de uma pegada de água e energia mais sustentável. Poderíamos organizar adequadamente as cadeias de valor, garantindo a implementação dos investimentos chineses no Brasil e a entrada de produtos com valor adicionado e marca no mercado chinês. O Brasil atrairia os investimentos de que precisa, e a China reduziria os seus riscos geopolíticos e sanitários de suprimento.

Um ótimo exemplo é a questão dos volumes explosivos de exportação de soja e milho para alimentar aves e suínos na China. Se aceitarmos essa lógica passivamente, em breve teremos dificuldades para exportar carnes, pois o papel que a China nos reserva neste momento está no fornecimento de dois componentes da ração animal, e não no valor adicionado dos óleos vegetais e das carnes, em que poderíamos diferenciar produtos e consolidar marcas.

A relação Brasil-China tem sido dominada pelo "pequeno varejo" dos problemas regulatórios diários que impedem o comércio bilateral e a atração de investimentos. Nesse campo, a China sabe posicionar os seus interesses críticos em diferentes momentos e mesas de negociação, navegando com pragmatismo na desorganização estratégica brasileira.

Entendo que a construção de uma parceria estratégica deveria começar com bons cenários prospectivos de oferta e demanda no longo prazo e o entendimento franco dos interesses e restrições de cada parte. Disso nasceria uma agenda bilateral consistente nas áreas de comércio, investimentos, agronegócio, tecnologia, infraestrutura, integração de cadeias produtivas e sustentabilidade, no seu sentido amplo.

Tenho notado que o governo Temer está ciente e engajado nessa direção. É hora de lançar as bases dessa parceria estratégica e jogar com time, coordenação e habilidade.

Coluna do Moreno - JORGE BASTOS MORENO

O Globo - 20/08

ASSESSOR TIRA CERVO DO ARMÁRIO


Ao tentar desmentir relatórios oficiais sobre desaparecimento de objetos da Presidência da República, publicados aqui, um assessor da presidente afastada, Dilma Rousseff, sem querer, acabou desvendando um dos maiores mistérios da República: o desaparecimento do cervo búlgaro, presente pessoal do governo daquele país à presidente filha de pai búlgaro.

O veadinho da Dilma estava dentro de um armário no Alvorada, entre tantos outros objetos pessoais da presidente.

O presente chegou a ficar por uns dias no gabinete da presidente. Só que o assessor não sabe é que o sumiço do veadinho foi denunciado, na época, por seus próprios antecessores no cargo.

Somente agora é que o assessor tirou o veadinho do armário para fotografá-lo e enviar uma cópia para a coluna, provando que ele nunca esteve sumido. E que, ao contrário do que foi publicado, o cervo não é de porcelana, mas de ferro fundido, banhado a ouro. Chiquérrimo!

Em suspense
Michel Temer pediu aos líderes da base no Senado que deixem para aprovar o aumento salarial dos ministros do Supremo, do procurador-geral da República e dos defensores públicos somente após o julgamento final do impeachment.

Depois das críticas de que havia concedido aumentos a diversas categorias devido à sua situação de fragilidade como interino, Temer decidiu que o melhor é que o novo pacote de bondades saia com ele já como presidente efetivo.

Dádiva
Do deputado Heráclito Fortes, que virou ouvidor-geral da Câmara esta semana:

— Eu queria mesmo era ser falador-geral!! Tem razão o deputado. Não foi por acaso que Deus o presenteou com aquela boca enorme e com a língua ferina.

Pegadinha
Informado pelo chefe do cerimonial do Itamaraty de que teria que receber os chefes de Estado antes do encerramento da Olimpíada, no Rio, ao lado de Serra, Rodrigo Maia, chamado pejorativamente de “alevino” pelo ministro, perguntou ao diplomata se poderia fazer a recepção sem ter o chanceler ao seu lado.

Vendo a cara assustada do interlocutor, o presidente da Câmara logo alegou que estava brincando.

Tchau, querida!
Nenhum petista dirá isso em público, mas predomina no partido o desejo de que Dilma Rousseff não demore a executar o projeto de passar uma temporada no exterior uma vez encerrado o julgamento do impeachment.

A distância facilitaria um pouco a vida dos candidatos da sigla nas eleições de outubro. Avaliam que seria bom para as duas partes.

Quanta inocência!
E a presidente afastada ainda alimenta a doce ilusão de que conseguirá, durante seu depoimento no Senado, constranger seus (suas) ex-ministros (as) senadores (as) que estão hoje do outro lado, invocando seus testemunhos sobre a lisura do governo a que serviram.

Como se essas pessoas, que já serviram e desserviram a tantos governos, tivessem algum tipo de constrangimento na vida.

Pró-Moro
Não são apenas os candidatos que estão com dificuldade de se adaptar à combinação de crise econômica, Lava-Jato e proibição de doações por empresas.

Mais de um marqueteiro conhecido já teve recusado o seu orçamento de campanha.

Os números foram considerados totalmente fora da realidade.

Bico grande
Marcus Pestana, da cúpula tucana, resume o mal-estar do partido com o governo:

“O PSDB quer ser parceiro e protagonista na reconstrução do país e não apenas caudatário, quer participar da formulação das estratégias do governo. O sucesso ou o fracasso será compartilhado. Se der errado, vamos juntos pelo ralo. Por isso a necessidade de sermos incorporados ao núcleo duro de Michel. Temos três presidenciáveis, sete senadores e grandes bancadas. Não somos um aliado qualquer. Nosso futuro está em jogo. Queremos estar no centro do poder”.

Lava-Jato
O que mais tem em Brasília é morto traçando o futuro, como se este lhe fosse alvissareiro.


O Rio está vencendo - MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 20/08

A Olimpíada surpreendeu. Estrangeiros temiam a violência, a desorganização, a zika. Os brasileiros tinham medo de passar vergonha diante de um grande fiasco. O que apareceu foi a inegável beleza do Rio, o Centro remodelado, a qualidade das arenas para todos os tipos de esportes, o tom elegante e sofisticado da abertura. Os problemas foram superados pelo lado positivo dos Jogos.

Oprefeito Eduardo Paes diz que vai relaxar só quando acabar, mas afirma que está tudo indo muito bem: — Quero confessar que sempre acreditei nisso tudo. Sabia que estávamos trabalhando para dar tudo certo, acreditava na capacidade de celebrar do brasileiro, sabia que havíamos investido para que o Parque Olímpico, a Orla Conde, o Boulevard, o BRT atendessem às expectativas.

O incidente Ryan Lochte produziu forte reação, mas na categoria nadador americano o que ficará mais forte na lembrança foi termos visto um gigante como Michael Phelps nadar entre nós e aqui se despedir das Olimpíadas. Ontem, pela rede social, ele mandou recado carinhoso aos milhões de brasileiros que vibraram com ele, dizendo que está com saudades. E já estamos com saudades também.

O problema que houve com a delegação da Austrália, que encontrou as instalações sem condições de serem ocupadas, causou constrangimento, mas o prefeito acha que acabou sendo um daqueles males que vêm para o bem:

— Foi um problemão, mas foi um sinal de alerta para que pudéssemos rechecar todos os procedimentos.

O país ainda faz uma contagem regressiva para ter certeza de que tudo dará certo até o final e poder escrever, como Phelps, #amazingolympics, Olimpíadas fantásticas. Por enquanto, é evidente que a piscina verde, as filas para comida e para a entrada nas arenas e a falsa comunicação de um crime de assalto a mão armada são eventos menores diante do que deu certo. Trágico mesmo foi a morte de um policial da Força Nacional, que nos lembra o velho drama no Rio na área de segurança.

Sobre as cidades olímpicas, pairam sempre alguns fantasmas e um grande sonho. O desejo é de repetir Barcelona, os temores são repetir Atenas e Montreal. O que houve no Centro do Rio lembra o que aconteceu em Barcelona, que aproveitou os Jogos para remodelar a cidade. Mas e os outros dois exemplos ruins? Vamos repeti-los? O prefeito garante que não.

Para evitar o que houve na Grécia, que fez instalações esportivas sofisticadas que não tiveram serventia depois, o prefeito garante que tudo foi pensado antes para saber o que fazer depois:

— O parque aquático vai virar dois ginásios com piscinas; o handebol será quatro escolas; a Arena 3 será uma escola municipal no local, em tempo integral e preparada para a prática de esportes; a Arena 2 será um centro de treinamento para atletas de alto rendimento; a Arena 1 será concedida ao setor privado. Em Deodoro, o parque aquático será usado pela comunidade e o posto médico montado no local vai virar uma clínica.

O fantasma Montreal é o de ficar com uma dívida que se arrasta no tempo, fruto dos investimentos feitos na preparação para os Jogos.

— Não há dívida de estádio e eles ficaram mais baratos em R$ 11 milhões do que o preço inicialmente orçado. A dívida da prefeitura, que em 2009 era de R$ 13 bilhões e 90% da Receita Corrente Líquida, é hoje de R$ 10 bilhões e 30% da Receita — diz o prefeito.

Essa queda se deve em parte a uma operação de swap feita com o Banco Mundial e a renegociação da dívida dos estados e municípios feita pelo governo Dilma, que aceitou trocar o indexador e reduzir os juros.

O que Paes quer deixar claro é que houve muito trabalho para que os Jogos dessem certo como empreendimento:

— Não é fruto do jeitinho brasileiro, é resultado do trabalho, planejamento do setor público, do esforço do setor privado. O plano de mobilidade foi estudado durante dois anos. A operação dos Jogos foi elaborada com antecedência. Claro que na hora da contingência entra a capacidade de improviso do povo brasileiro, mas a Olimpíada do Rio não foi feita com jeitinho.

Vivemos dias frenéticos, oscilando num turbilhão de emoções, mas o que foi ficando claro a cada disputa é que o Rio estava vencendo a Olimpíada de 2016.


Suplicy comete fraude ao comparar Brasil e Venezuela - DEMÉTRIO MAGNOLI

FOLHA DE SP - 20/08

Eduardo Suplicy, um leitor comum, utiliza-se do Painel do Leitor para cobrar coerência de José Serra (Folha, 19/8). O ministro do Exterior pede que todos os países democráticos pressionem pela realização do referendo revogatório na Venezuela. Daí, conclui o ex-senador, Serra deveria apoiar a reivindicação de Dilma de uma consulta popular sobre a antecipação de eleições no Brasil. Na missiva, encontra-se um paralelo explícito, que é uma fraude lógica, e um implícito, que é uma fraude política. Na base dos dois, oculta-se uma omissão moral que, se não faz justiça à trajetória de Suplicy, ilumina a falência da esquerda latino-americana.

A fraude lógica: na Constituição brasileira, o instrumento de revogação de mandatos é o impeachment, não um plebiscito. Dilma clama por uma consulta inconstitucional; a oposição venezuelana, pelo cumprimento de uma norma inscrita na Constituição de 1999, marco inaugural da "revolução bolivariana". Suplicy sabe disso: em 2005, patrocinou uma emenda constitucional destinada a introduzir o recall de mandatos, mas não obteve apoio nem mesmo para levá-la a plenário.

A fraude política: a Venezuela do anoitecer do chavismo transforma-se em ditadura; o Brasil do ocaso do ciclo de poder lulopetista conserva a democracia. No Brasil, um STF independente supervisiona o processo de impeachment. Na Venezuela, um tribunal superior submetido ao Executivo suprime ilegalmente as prerrogativas da Assembleia Nacional eleita, de maioria oposicionista, e um conselho eleitoral controlado pelo chavismo viola as regras que possibilitam o referendo revogatório.

Anote, Suplicy. No Brasil, a presidente afastada usa o Palácio para acusar o Congresso, o Judiciário e a imprensa de promoverem um "golpe de Estado". Na Venezuela, líderes oposicionistas apodrecem na prisão sob sentenças farsescas denunciadas pela ONU, pela OEA e por organismos internacionais de direitos humanos. Aqui, a militância petista protesta nas ruas contra o impeachment; lá, milícias chavistas atemorizam os cidadãos e agridem manifestantes pacíficos. Aqui, os homens em armas protegem as fronteiras e garantem a segurança pública; lá, as forças armadas juram compulsoriamente lealdade ao chavismo. Suplicy quer mesmo comparar um país que tem políticos presos com um que mantém presos políticos?

Uma ditadura de esquerda não é melhor que uma ditadura de direita. Na sua longa trajetória pública, em nome dessa régua moral, Suplicy desafiou várias vezes seu partido. Poucos anos atrás, o ainda senador confrontou um tabu petista para defender o direito de viagem da blogueira cubana Yoani Sánchez. Sob esse pano de fundo, há algo de muito perturbador no persistente silêncio que conserva sobre a escalada autoritária do regime chavista. Engajado na difusão da lenda do golpe no Brasil, o Suplicy do passado apaga-se voluntariamente, dando lugar a um personagem diferente, disposto a submeter os princípios às conveniências.

A Venezuela não é o objeto mas apenas o pretexto da missiva de Suplicy publicada na Folha. Presos políticos? Soberania popular? Liberdades públicas? Garantias democráticas? Não, nada disso: o tema verdadeiro da cartinha é a manobra desesperada de Dilma na hora do ato conclusivo do processo de impeachment. O Suplicy do passado esclareceria sua opinião sobre a posição diplomática do Brasil diante do colapso da ordem democrática na Venezuela. O Suplicy do presente afasta, com um gesto enfastiado, os dilemas de princípio para cumprir uma missão partidária.

Serra declarou que "um país que mantém presos políticos não é uma democracia". Suplicy perde a oportunidade de cobrar-lhe coerência. A pergunta certa ao ministro é: por que, então, o Brasil não invoca a cláusula democrática contra o regime chavista? Mas essa é, precisamente, a pergunta que Suplicy nunca formulará.

Ré e vítima - JOÃO DOMINGOS

ESTADÃO - 20/08

Há um certo entusiasmo entre os mais afoitos defensores de Dilma Rousseff com a promessa de que ela irá à sessão do impeachment para fazer a própria defesa. Dizem até que a presidente afastada conseguirá reverter votos a seu favor caso, no teatro da política, consiga apresentar-se a todos os que acompanharão o julgamento pela TV não como ré do processo de impeachment, mas vítima de uma trama macabra.

O alvoroço é ilusório.

Presente ou não ao julgamento, faça feio ou bonito, a possibilidade de Dilma alcançar os 28 votos favoráveis à sua absolvição continua remota. Os petistas e a própria presidente afastada sabem disso.

A presença dela na sessão do julgamento tem outra motivação. Há tempos Dilma desistiu de lutar para preservar o mandato. Ela luta é para limpar a biografia. Por isso diz que não cometeu nenhum tipo de crime, nem de responsabilidade nem comum. Por isso diz não ter contas bancárias no exterior. Por isso insiste na tese de um golpe urdido pelo vice e pelo deputado afastado Eduardo Cunha, que Dilma tenta vender para as gerações futuras como o mais sinistro personagem surgido na política brasileira nos últimos tempos, esse sim, dono de contas no estrangeiro.

Dilma não se importa nem mesmo com a possibilidade de perder os direitos políticos até 2026, caso sofra o impeachment. A política não faz parte da vida dela. Dilma caiu na política por um acaso, por um capricho do ex-presidente Lula. Poderia ter passado para a História como uma moça idealista que, como tantos outros brasileiros, pegou em armas para combater a ditadura, foi presa e torturada, sobreviveu e hoje é uma das heroínas da conquista da democracia. Mas caiu na lábia de Lula, aceitou ser candidata a presidente e agora está aí, expiando pecados que, acha ela, nem eram seus, mas do PT.

Essa é a motivação de Dilma. Por isso mesmo ela decidiu ir ao Senado para ver de perto a sessão que vai julgá-la. Dilma encontrou uma maneira de deixar um marco para o futuro. Assim como um dia enfrentou a ditadura militar, o tribunal de exceção que a julgou e condenou, ela vai ao Senado fazer o registro final de sua passagem pela vida pública. Como vítima. De novo.

Assim como a política é feita de artimanhas quando nos bastidores, quando em público é feita de gestos, é alimentada por símbolos.

Se quisesse lutar pelo mandato, Dilma não teria se recolhido ao Palácio da Alvorada, fazendo-se prisioneira de si mesma. Se quisesse lutar pelo mandato, Dilma poderia ter ido todos os dias ao Senado, sozinha ou acompanhada pela pequena multidão com a qual deixou o Palácio do Planalto no dia do afastamento. Dilma acreditou que era vítima e que não precisaria lutar. Acreditou ter o apoio da população, mesmo com popularidade lá embaixo.

Perguntei ao senador Lindbergh Farias (PT-RJ) pelas massas que ocupariam as ruas para defender Dilma. Ele respondeu: “Não estamos mais conseguindo mobilizar ninguém”. Perguntei ao ex-ministro Miguel Rossetto, o mais próximo conselheiro de Dilma, por que o poder tinha sido tirado tão facilmente das mãos do PT, sem nenhuma resistência, sem nada. Ele disse: “Porque não temos 10% de apoio. Não temos as ruas. Porque os golpistas têm mais força do que nós”.

Dilma vai gerar fatos e imagens para os que forem estudar História do Brasil no futuro com a decisão de ir ao Senado fazer pessoalmente sua defesa.

Mas a decisão dela terá consequências para si mesma. A presença de Dilma diante de uma corte formada por 81 jurados (os senadores), presidida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, diante da qual ela poderá se defender do jeito que quiser, vai enfraquecer a tese do golpe. Ao se fazer presente à sessão, Dilma dirá que legitima seu julgamento.

Na defesa do dinheiro público - MERVAL PEREIRA

O Globo - 20/08

Entre as várias associações e entidades que questionam a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que são as Câmaras Municipais, e não os Tribunais de Contas, as instâncias legais para coibir a malversação do dinheiro público, está a Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC), que entrou no Supremo com um “memorial complementar para esclarecer divergência” com o qual pretende que seja revista a interpretação dada à decisão.

Caso prevaleça a tese de que prefeitos — e por extensão governadores — só se tornarão inelegíveis se as Câmaras Municipais (ou as Assembleias Legislativas) rejeitarem suas contas, milhares de prefeitos estarão livres da Lei da Ficha Limpa, que considera que prefeitos (e governadores) perdem o direito a concorrer a cargos públicos se os Tribunais de Contas rejeitarem suas contas, independentemente da decisão dos vereadores ou deputados estaduais.

A decisão foi apertada —6 a 5 — e está causando muita controvérsia, especialmente porque praticamente anula um dos principais pontos da Lei da Ficha Limpa, criticada na sua forma pelo ministro Gilmar Mendes. A presidente da ANTC, Lucieni Pereira da Silva, ressalta, em especial, um ponto: “Mais grave do que o prefeito ficar sob um julgamento meramente político dos vereadores, outro problema gravíssimo é que a Constituição não confere à Câmara Municipal os instrumentos necessários para assegurar o ressarcimento do valor desviado dos cofres públicos”.

Ela se refere a um efeito imediato da decisão: os prefeitos e governadores que tiverem o controle político de suas respectivas Casas Legislativas jamais serão punidos por eventuais falcatruas, além do que terão em mãos um poderoso instrumento contra seus adversários locais, podendo rejeitar as contas dos antecessores mesmo que o Tribunal de Contas as tenha aprovado. Além disso, na mesma sessão, o STF tomou outra decisão: em caso de omissão da análise das contas por parte do Legislativo, os prefeitos não podem ser punidos. Bastará, portanto, que as contas não sejam analisadas para que o prefeito fique livre de punição.

Lucieni Pereira destaca que “As Casas Legislativas não têm competência para julgar contas de ordenador de despesa, fixar o valor do dano, determinar o ressarcimento aos cofres públicos e aplicar multa proporcional ao dano”. Ela explica que ao repartir as competências do controle externo, a Constituição as inclui no artigo 71 (incisos II e VIII), e não na competência do Legislativo (artigos 31 e 49).

Para assegurar o ressarcimento do dano rapidamente, o artigo 71, § 3º da Constituição, estabelece que as decisões do TCU e demais Tribunais de Contas têm eficácia de título executivo, o que significa que as decisões dos tribunais, em caso de desvio de dinheiro público, podem ser executadas imediatamente pela Advocacia-Geral da União (AGU) no Judiciário se for dinheiro federal.

Não é necessário discutir a matéria numa vara civil para só depois executar. O ministro Teori Zavascki destacou esse ponto no seu voto vencido, mas Lucieni Pereira acha que os demais ministros não atentaram para esse dado. “Do jeito que está a decisão, se o prefeito desviar dinheiro em janeiro de 2016, ele só prestará contas anuais de 2016 em abril de 2017, em até 60 dias após a abertura da sessão legislativa. O Tribunal de Contas tem o prazo de 180 dias (6 meses) para emitir o parecer prévio das contas anuais do prefeito, ou seja, tem até outubro de 2017, quando enviará o parecer prévio para Câmara Municipal. E nisso, o dinheiro desviado não voltou aos cofres públicos. Se o prefeito tiver o controle da Câmara Municipal, esse dinheiro não voltará, ressalta a presidente da ANTC.

E, quando a Câmara Municipal julgar esse parecer prévio, só poderá aprovar, aprovar com ressalvas ou rejeitar; não poderá fazer mais nada. Se as contas forem rejeitadas, o prefeito ficará inelegível por 8 anos, mas estará rico. “Assim, o desvio de dinheiro público pode compensar”, lamenta. Oito anos depois, esse ex-prefeito volta a se eleger e desvia novamente, e no máximo ficará inelegível.

A ANTC considera que essa decisão induzirá a dois comportamentos: 1) Prefeitos quererão ser ordenadores de despesa, pois não serão tecnicamente julgados; 2) valerá a pena prefeito roubar, já que o Tribunal de Contas não poderá determinar que ele devolva o valor desviado.

Escada e alavanca - CRISTOVAM BUARQUE

O Globo - 20/08

Critério para gratuidade ou pagamento do ensino deve ser o interesse nacional


O atleta olímpico recebe a medalha para si, mas leva a bandeira do seu país. O reconhecimento ao seu esforço e talento permite-lhe futuros benefícios pessoais, mas na vitória é também uma reverência a todos os seus compatriotas. O pódio é uma escada ao sucesso pessoal do medalhista e também uma alavanca ao prestígio de seu país.

O ensino superior deveria seguir regras parecidas: ser escada social para os jovens e alavanca para o progresso. Graças ao curso, o aluno formado receberá prestígio e remuneração por toda a vida e, com seu conhecimento, ajudará a formar uma sociedade desenvolvida e justa. A universidade deve ser gratuita para aqueles que tiverem talento para a profissão e escolherem um curso que sirva ao progresso econômico e social.

O aspirante na academia militar estuda gratuitamente porque aprende a defender a nação; o aluno da carreira diplomática estuda para estreitar nossas relações internacionais; da mesma forma, o jovem que deseja ser professor do ensino médio estuda para formar cidadãos e construir o Brasil. São cursos e carreiras de interesse nacional e, por isso, devem ser financiados pelos governos.

O critério para a gratuidade ou o pagamento deve ser o interesse nacional, não a renda pessoal ou familiar do estudante. Não há razão para uma família rica ter de pagar os estudos de um filho se ele quer ser cientista, para ajudar a conhecer o mundo e até encontrar o mistério da cura para doenças; ou se quer ser médico para atender à saúde pública; ser filósofo, historiador, matemático ou artista, para enriquecer o mundo culturalmente.

Da mesma forma, quando há limites de recursos públicos, a sociedade não precisa pagar cursos que servem apenas como escada social, sem a característica de ser alavanca do progresso. Mesmo que a carreira seja apenas do interesse privado, o Estado não tem o direito de impedir uma pessoa de seguir o curso para o qual tem vocação, mas não deve ter obrigação de financiar este curso com recursos públicos que devem atender a outras prioridades, como a educação de base.

O atleta que não carrega a bandeira do seu país deve ter direito de se preparar, mas não há razão para exigir investimento público no seu treinamento. Para atender o gosto apenas do atleta que não carrega a bandeira ou do aluno que não tem compromisso com o desenvolvimento e bem-estar da nação, o país e seu povo não precisam pagar. Para ser gratuito, o curso universitário deve ser ao mesmo tempo escada pessoal e alavanca social ao progresso socioeconômico.

O governo deve bancar o estudo de todas as crianças, porque cada uma delas representa em si um potencial, também deve dar-lhe, na escola, a chance de ser um atleta. A partir de um certo momento, deve concentrar os recursos nos mais talentosos e nos cursos que levem o país e seu povo a um futuro eficiente e justo e carregue nossa bandeira.


Aliança entre tucanos e PMDB é só jogo de cena - LEANDRO COLON

FOLHA DE SP - 20/08

A aliança do PSDB com o governo de Michel Temer é um tanto esquisita. O partido pretende ter candidato à Presidência da República nas eleições de 2018 e sabe que, provavelmente, estará daqui a dois anos em lado oposto do grupo político do presidente interino.

Michel Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, são hoje a aposta eleitoral do núcleo palaciano, sobretudo se forem bem sucedidos na missão de resgatar do buraco a economia do país.

O PSDB ficou de "mimimi" nas duas últimas semanas. Cobrou maior participação no governo, mais empenho do Planalto na aprovação de medidas econômicas e criticou os recuos (o governo jura que não são recuos) em discussões no Congresso, entre elas a que trata da renegociação da dívida dos Estados.

E Temer, o que fez? Limitou-se a oferecer um jantar no Jaburu à cúpula tucana e prometer uma tal agenda "ousada e corajosa", segundo palavras de Aécio Neves (PSDB-MG).

A principal novidade foi o gesto simbólico de incluir o líder do governo no Senado, o tucano Aloysio Nunes Ferreira (SP), em reuniões sobre temas econômicos.

"O presidente não tem a possibilidade de errar de agora em diante", declarou Aécio, com ar de quem quer mostrar firmeza, mas ciente de que não está dizendo nada relevante.

Seria bem mais honesto se os dois lados abandonassem o jogo de cena. Temer quer o PSDB na base governista porque precisa dos seus votos no Congresso. O PMDB não conta, ao menos por ora, com os tucanos numa chapa presidencial em 2018.

Os tucanos, por sua vez, preenchem o cardápio da política em Brasília com cobranças ao Planalto, mas no fundo só pensam em mirar o apetite eleitoral de Temer e Meirelles.

Se até o instável presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), emite sinais de paz e amor ao governo de Michel Temer, certamente não será o PSDB o protagonista de um rompimento.

A farra da isonomia - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 20/08

A partir de um projeto de lei apresentado pelo Poder Executivo durante o primeiro ano de mandato do presidente Lula, o Congresso aprovou a Lei 10.698/2003 que concedeu aumento de R$ 59,87 a todos “servidores públicos federais dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, das autarquias e fundações públicas federais, ocupantes de cargos efetivos ou empregos públicos”.

Na exposição de motivos do projeto de lei, o governo federal explicou a finalidade do aumento: “A presente proposta visa a reduzir a distância entre os valores da menor e da maior remuneração, por intermédio da instituição de vantagem pecuniária individual, no valor fixo de R$ 59,87, que, por ser o mesmo para todos os níveis, classes, padrões e categorias existentes, representará uma primeira aproximação entre esses valores”.

Pois bem, o Executivo propôs e o Legislativo aprovou o aumento de R$ 59,87 para os funcionários públicos da União. No entanto, o Poder Judiciário não se conformou com a literalidade do texto e fez uma generosa interpretação da lei, com desastrosas consequências para as contas públicas.

Vários órgãos do Poder Judiciário e do Ministério Público ajuizaram ações nas quais se pedia um aumento além dos R$ 59,87. Segundo a esperta argumentação apresentada, a concessão de um aumento de valor único para todas as categorias de funcionários públicos feria o princípio da isonomia salarial. Obviamente, os processos não pleiteavam o reconhecimento da alegada inconstitucionalidade da lei para pedir a anulação do aumento. Eles queriam outra coisa, bem mais interessante a seus bolsos. Em respeito ao princípio da isonomia, pediam que o valor de R$ 59,87 fosse aplicado apenas à categoria de menor remuneração do serviço público e que às outras castas – pois é essa a mentalidade que transparece nesse tipo de raciocínio – deveria ser dado um aumento proporcional, e não apenas os míseros R$ 59,87.

A engenhosa interpretação do princípio da isonomia gerava logicamente uma multiplicação de valores. Nas petições, aquilo que era por lei um aumento de R$ 59,87 passava a ser, em alguns casos, um reajuste de 13,23% do salário.

O mais grave é que a criativa visão do princípio da isonomia teve calorosa acolhida por vários juízes e tribunais, que concederam os aumentos pleiteados. A boquinha – que a essa altura já não era apenas uma boquinha, mas um presentão – foi concedida a servidores de vários órgãos do Judiciário, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), Superior Tribunal Militar (STM) e Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Num primeiro momento, o Poder Executivo não tomou conhecimento dessa multiplicação dos aumentos promovida pelo Judiciário. Soube do desastre apenas quando o dinheiro começou a faltar e os órgãos começaram a pedir crédito suplementar. Logicamente, a farra da isonomia tinha um alto preço que não cabia no orçamento original.

As estimativas do impacto desses aumentos estão em torno de R$ 2 bilhões, informa o jornal Valor. O cálculo foi feito tendo por base as ações da Advocacia-Geral da União (AGU) protocoladas no Supremo Tribunal Federal (STF) para barrar os reajustes concedidos aos servidores dos tribunais, do Conselho Nacional do Ministério Público, do Conselho da Justiça Federal e da Justiça Federal de 1.ª e 2.ª instâncias. Se todos os servidores reivindicassem o mesmo benefício, o impacto anual seria superior a R$ 25 bilhões.

Felizmente, o STF vem rejeitando unanimemente a criativa interpretação da isonomia e tem declarado inconstitucionais os reajustes concedidos por órgãos do Poder Judiciário. Em alguns casos, como, por exemplo, o dos servidores do TST, a Suprema Corte já concedeu medida liminar para interromper o pagamento dos aumentos.

Num Estado Democrático de Direito não cabe transformar isonomia em privilégio. Além de irresponsável com o dinheiro público, tal alquimia é de uma despudorada perversidade.

É preciso salvar a Ficha Limpa - EDITORIAL O GLOBO

O Globo - 20/08

Uma decisão do Supremo, por maioria de votos, que, na prática, torna inócua a Lei da Ficha Limpa para barrar prefeitos e governadores que desrespeitam normas orçamentárias, criou sérios obstáculos ao combate à corrupção, às portas de um pleito municipal.

O ministro Gilmar Mendes, um dos que constituíram a maioria neste julgamento do STF, atribuiu o veredicto a erros na redação da lei, cometidos por “bêbados”. A estocada foi devolvida por outro ministro, Luís Roberto Barroso, vencido no julgamento, para quem a Ficha Limpa é uma lei importante e “sóbria”.

A esgrima de nada serve; o que importa é resolver a questão de forma a que não seja derrubada a barreira que a Ficha Limpa havia erguido com a finalidade de evitar que prefeitos e governadores responsáveis pela dilapidação do Erário se reelegessem.

Com razão, movimentos de combate à corrupção e associações de magistrados se insurgem contra a decisão do Supremo de que não basta a condenação do prefeito e o governador pelo respectivo tribunal de contas para efeito de enquadramento na Lei da Ficha Limpa. Passa a ser necessária a confirmação do veredicto por câmara e assembleia locais. Ora, ora.

Sabe-se bem como governadores e prefeitos conseguem manter maiorias nas Casas Legislativas. Vale dizer: se o Supremo mantiver com o Legislativo a palavra final contra o chefe do Executivo, em relação à Ficha Limpa, a Corte estará tornando inimputáveis governadores e prefeitos maus gestores dos impostos pagos pela população.

O caso é sério, porque, segundo o presidente da associação dos membros dos tribunais de contas, Valdecir Pascoal, 84% dos gestores públicos impugnados o foram devido a esses tribunais. Confirma-se, então, que é como se a Ficha Limpa fosse revogada. Também de acordo com a associação, seis mil prefeitos já foram apanhados pela Ficha Limpa. Agora, podem pedir anistia.

A esperança está nos embargos que deverão ser impetrados no STF, com pedidos de esclarecimentos sobre essa decisão.

Escapismo parlamentar - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 20/08

Prenuncia-se no Congresso uma tramitação tormentosa para o projeto que estabelece limites anuais para os gastos públicos. Uma amostra pequena, mas esclarecedora, dos percalços pela frente se viu na semana que passou, em sessão da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.

Durante audiência convocada para debate da proposta, os partidos aliados à presidente afastada, Dilma Rousseff (PT), manifestaram, como se previa, sua posição contrária. Causaram espécie, entretanto, as resistências explicitadas por senadores hoje alinhados ao Palácio do Planalto.

O médico ruralista Ronaldo Caiado (DEM-GO) preocupou-se com os reajustes dos valores pagos por procedimentos do SUS. Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), ex-ministro da Integração Nacional, defendeu a preservação das obras de infraestrutura. O paraense Flexa Ribeiro (PSDB) disse que seu Estado precisa de mais leitos hospitalares.

Exemplifica-se, à perfeição, o fenômeno descrito pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn: mesmo os que são favoráveis, em princípio, ao ajuste orçamentário tratam primeiro de seus interesses particulares ou setoriais.

Precedentes perigosos, diga-se, foram abertos pelo governo do ainda interino Michel Temer (PMDB), que cedeu sem maior regateio a pleitos das associações do funcionalismo público. Primeiro, ao patrocinar reajustes salariais para os servidores da União; depois, ao desistir de restrições ao gasto com pessoal nos Estados.

A abertura da temporada de concessões despertou lobbies tão diversos quanto o dos militares, que se empenham em escapar da reforma da Previdência, e o dos governadores das regiões Norte e Nordeste, em busca de mais repasses do Tesouro Nacional.

Iniciativas para a contenção de despesas, claro, são controversas por natureza. A proposta do teto —que proíbe alta do gasto total acima da inflação— colide, ademais, com péssimos costumes do Legislativo brasileiro. De imediato, deixariam de vigorar as regras que vinculam parcelas da receita a áreas como saúde e educação.

Com o novo mecanismo, transfere-se aos parlamentares a tarefa de arbitrar a cada ano a alocação de recursos limitados, o que implica definir prioridades e descontentar grupos influentes. Acabam subterfúgios como estimativas fantasiosas da arrecadação, que o Executivo corrige a toda hora.

O Congresso não aceitará facilmente tal responsabilidade, ainda que seja uma de suas funções essenciais. Bem mais cômodo é o escapismo orçamentário, em que a militância pelo particular acarreta o malefício de todos.

sexta-feira, agosto 19, 2016

Tiro, porrada e bomba - REINALDO AZEVEDO

FOLHA DE SP - 19/08

Cartilha do PT anuncia rompimento com a democracia e tem de levar à luta armada


O PT tem de ter a coragem de romper com o simulacro de democracia que se vive no Brasil e optar pela luta armada. É o que evidencia uma cartilha que escreveu. A conspiração golpista tomou tal proporção e contaminou de tal sorte a sociedade que os puros, os justos e os éticos nada mais têm a perder senão os grilhões. Onde será o novo Araguaia do futuro Éden?

Há palavras que não se dizem. Há cartas que não se escrevem (imaginem se Getúlio Vargas tivesse sido malsucedido naquele tiro...). Há cartilhas que não se publicam. Feitas determinadas escolhas, por dever de coerência, ou se adere ao ato extremo ou se cai, vencido, de joelhos, aceitando o peso da espada do vencedor.

Ainda que o PT tivesse planejado meticulosamente a sua própria destruição, o ato final não poderia ser mais coerente. Depois de a defesa de Lula ter recorrido à ONU (!) contra a suposta perseguição a seu cliente, o partido elaborou uma cartilha em que falsifica a história em quatro idiomas. Ali se denuncia ao mundo, como vai no título, uma caçada judicial ao ex-presidente, com destaque para cinco verdugos: Sérgio Moro, Rodrigo Janot, Gilmar Mendes, o Congresso e a imprensa.

Notaram? O partido acusa uma conspiração a unir, na prática, os Três Poderes da República – aproximo, no caso, o Ministério Público Federal do Executivo, que seria ocupado por um usurpador – e aquele que se costumava chamar, nas democracias, o "Quarto Poder".

Para que o projeto do partido se realizasse na sua plenitude; para que suas utopias ganhassem consequência; para que as mudanças necessárias se operassem, forçoso seria quebrar as pernas do Congresso, que, afinal, dá um golpe parlamentar; fazer uma limpeza no Judiciário, que aplica a lei de maneira seletiva; pôr, como defendeu Lula, o Ministério Público "no seu devido lugar", cassando-lhe prerrogativas, e censurar a imprensa, que conspira contra o poder popular.

Hão de me permitir folhear a própria obra. Em centenas de textos de "O Pais dos Petralhas I e II" e de "Objeções de um Rottweiler Amoroso", denunciam-se as sistemáticas tentativas do partido de encabrestar a democracia; de recorrer às prerrogativas do próprio regime para solapá-lo; de cercear o debate nem que seja pela força da patrulha – e nisso eles são ainda bem-sucedidos.

Tive se enfrentar, por óbvio, a estridência dos apologistas do regime e a desconfiança dos frouxos. Afinal, diziam estes, eu exagerava na caracterização do autoritarismo petista e via tentações hegemônicas no que seria nada mais do que o exercício natural da política.

Que bom que a ópera petista chega ao último ato, com o próprio partido chamando os inimigos por seus respectivos nomes. É o PT quem me dá razão, não os que concordavam comigo. A sigla evidencia, assim, a sua congênita incompatibilidade com a democracia e tira as vestes do farsante.

Tão logo a Afastada nos brinde, numa versão desta vez realmente ridícula dos versos da poeta Cecília Meireles, com o seu "patético momento", é chegada a hora de o PT se apresentar às armas.

E só vê na palavra "patético" uma ofensa, em vez de um lamento piedoso, quem ignora o sentido mesmo da palavra, que foi parar na Sinfonia nº 6 de Tchaikovsky, tão sofrida e tão sem saída. Dilma vai falar no Senado. Ela busca a "sombra de som curtindo o seu próprio lamento".

Depois, é tiro, porrada e bomba.


Hoje, muito menos - RUY CASTRO

FOLHA DE SP -19/08

Alguns jornalistas americanos na Rio-2016 ficaram chocados com os biquínis e sungas dos brasileiros nas praias e piscinas — para eles, reduzidos demais. É mesmo? Bem, este é um assunto sobre o qual os EUA não podem legislar fora do seu feudo. Enquanto o Brasil mantiver a soberania sobre as virilhas nacionais, nossos rapazes e moças continuarão a se exibir como quiserem.

Os EUA parecem ter um problema com o corpo humano. No filme "Aconteceu Naquela Noite" (1934), de Frank Capra, Clark Gable ia passar uma noite (perfeitamente inofensiva) com Claudette Colbert. Quando se despiu para se deitar e surgiu na tela de peito nu, milhões de pascácios americanos descobriram estarrecidos que Clark Gable não usava camiseta sob a camisa social. E só então aderiram à prática, com o que a indústria de camisetas como roupa de baixo quase faliu.

Em "O Rei dos Reis" (1961), de Nicholas Ray, Jeffrey Hunter como Jesus Cristo passa boa parte do filme pregado na cruz, em andrajos, de braços abertos e com as axilas à mostra. A abundância de pelos no peito e debaixo dos braços era inadmissível para as famílias americanas. Daí Jeffrey Hunter sofreu uma depilação em regra e fez o Cristo mais glabro da história do Novo Testamento.

Sem falar em "O Círculo do Medo" (1962), de J. Lee Thompson, em que Robert Mitchum vive um vilão tão cruel quanto assustador. Mas, em certo momento, ele é levado a uma delegacia, ordenado a tirar a roupa, e o que se vê? Um homem sem calças e sem camisa, fortíssimo, mas com uma cueca gigante que lhe sai quase dos sovacos e vai até os joelhos. E, pior, de sapato e meias pretas. A plateia brasileira tinha uma explosão de riso e lá se ia o pavor que Mitchum despertava — porque, em 1962, já ninguém por aqui usaria tal cueca.

Hoje, muito menos. Exceto, talvez, alguns jornalistas americanos.

Dinheirama disponível - CELSO MING

ESTADÃO - 19/08

A enorme abundância de dólares deveria ser encarada como janela de oportunidades, mas ela está sendo desperdiçada


Há pouco mais de dois anos, certo número de analistas da economia brasileira previa a iminência de uma tempestade perfeita.

Entre os estragos que se diziam inevitáveis não estavam apenas o tamanho do rombo das contas públicas e a depressão que se viram depois, mas, também, a forte valorização do dólar nos mercados que se seguiria ao aumento dos juros em preparação pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos).

De lá para cá, o sistema produtivo brasileiro entrou em parafuso, como todos sabemos, o desemprego alcança hoje 11,3% da força de trabalho, a renda do brasileiro está sendo dilapidada e as desgraças vão se sucedendo por opções equivocadas. No entanto, não aconteceu a tão temida operação de enxugamento de liquidez a ser colocada em prática pelo Fed. Se tivesse acontecido, produziria certo sumiço de dólares no mercado de câmbio do Brasil e a alta das cotações da moeda estrangeira.



Essa operação vem sendo sucessivamente adiada, à espera de melhores condições para isso. Quarta-feira, a ata da última reunião do Fed mostrou forte divergência entre seus membros. Há os que argumentam que o nível de desemprego está perto de cair e que essa seria a senha para iniciar o processo de alta de juros. E há os que advertem não só que uma alta dos juros derrubaria ainda mais a inflação que hoje vai girando abaixo da meta de 2,0% ao ano mas, também, que a retomada da atividade econômica dos Estados Unidos continua frágil e não deveria ser restringida por um aperto monetário.

O adiamento do processo de alta dos juros nos Estados Unidos deixa enormes disponibilidades de recursos nos mercados internacionais de câmbio, agora ainda mais incrementadas pela atuação de outros bancos centrais. O Banco Central Europeu, por exemplo, continua injetando recursos não só para enfrentar a recessão, mas, também, os problemas novos produzidos pelo Brexit, a decisão dos ingleses de abandonar a União Europeia. Pelo mesmo motivo, o Banco da Inglaterra (banco central) também afrouxou sua política monetária. Mas há mais bancos centrais poderosos no mesmo caminho, como o Banco do Japão e o Banco Nacional da Suíça.

Muitos por aqui encaram essa impressionante liquidez global como problema, na medida em que injeta mais moeda estrangeira no câmbio interno e concorre para valorização do real (baixa do dólar), situação que derruba a competitividade do produto brasileiro e, assim, prejudica a indústria.

No entanto, essa enorme abundância de dólares deveria ser encarada como janela de oportunidades a ser aproveitada pelo Brasil. E, todavia, ela está sendo desperdiçada.

Poderia servir para atrair capitais de investimento, especialmente para projetos de infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e saneamento), mas os leilões de concessão estão emperrados, pela falta de regras confiáveis de jogo e pela falta de projetos claros. Quando os bancos centrais afinal voltarem a enxugar essa dinheirama, ficará bem mais difícil encontrar financiamento para os investimentos de que o Brasil tanto precisa.

CONFIRA:




Aí está a evolução da produção agrícola pelos números do IBGE.

Recuperação

Na semana passada, Conab e IBGE apontaram queda de 9,8% na atual safra de grãos em consequência da estiagem no Centro-Oeste. Mas nesta quinta-feira, 18, o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Néri Geller, declarou que o governo espera ampla recuperação. Para ele, a próxima safra atingirá 210 milhões de toneladas de grãos, cerca de 12% acima da anterior. A próxima safra começará a ser semeada em setembro e outubro, quando começar a estação das chuvas.

Dólar, conversas paralelas - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 19/08

Enquanto seu lobo não vem, na falta de conversas decisivas, a gente voltou a discutir o que o Banco Central vai fazer da taxa de câmbio, do "preço do dólar". Mas o BC não vai nem tem como fazer nada de muito relevante, a não ser que cometa maluquices estrambóticas.

Claro que a taxa de câmbio é um preço central. Que o "dólar" muito volátil ou barato, em especial nos anos Dilma 1 (R$ 1,60!) ajudou a quebrar as pernas ou uma canela da indústria, um motivo desta economia trôpega.

Para começar, o dólar está barato porque há oceanos de dinheiro barato sobrando no mundo rico, de taxas de juros zero ou menos que isso.

É dinheiro vadio à procura da vida fácil, como a dos juros a 14,25% ao ano do Brasil. Dada a calmaria relativa na praça mundial e até no Brasil (menor "aversão a risco"), os donos do dinheiro grosso vêm tomar caipirinhas no nosso sol de quase setembro.

Mais da metade da variação do preço da moeda brasileira tem dependido de fatores externos, de como o dinheiro reage às idas e vindas das economias centrais, EUA, Europa, China, e ao preço de commodities. Por vezes, o real varia no mesmo passo da taxa dos títulos do governo americano, como em 2013, quando o BC dos Estados Unidos ameaçou pela primeira vez elevar a taxa de juros em sete anos.

O que o BC poderia fazer, em breve? Ficar comprador de dólar (com derivativos ou comprando mais reservas)? Trocando em miúdos: aumentar ainda mais a dívida pública para investir em títulos americanos, juro real zero, pagando juro brasileiro, mais de 14%? Não parece razoável, para dizê-lo de modo ameno.

Fechar as fronteiras do dinheiro, mais ou menos, ou intervenções assemelhadas? Entre outros muitos problemas básicos, não parece uma boa ideia para um país que deseja atrair investimentos e, ainda pior, que mal se recupera da má fama e da ruína deixadas por políticas econômicas malucas.

A não ser para economistas ditos heterodoxos, resta a fazer apenas o básico. Baixar o quanto antes e muito a taxa de juros, o que depende hoje, crucialmente (mas não apenas), de evitar que a dívida pública cresça sem limite, como agora. No mais, o que resta, parece, é aparar arestas, evitar flutuações demasiadas da moeda e efeitos secundários dos corcoveios no câmbio.

Alguns dos economistas apelidados de heterodoxos acreditam que é possível manter a taxa de câmbio em uma determinada banda, por meio de intervenções variadas. Baixar a taxa básica de juros na marra e controlar o fluxo de capitais é em geral o núcleo dessas propostas, trocando a coisa em miúdos grossos.

"Tudo mais constante", diga-se ironicamente, juros menores e porteiras fechadas poderiam permitir um controle do "preço do dólar". Porém, nada mais ficaria constante. Resta explicar ao público interessado os efeitos colaterais (o que seria da inflação? O que seria dos juros de longo prazo, que afetam decisões de investimento? Como ficaria a rolagem da dívida pública? Etc.).

Quem sabe existam meios de lidar com esses problemas destrutivos (sem criar outros, como tabelar preços, fazer "política de rendas", fechar o país, quiçá centralizar o câmbio). A gente espera uma explicação sobre os desdobramentos desses planos de colocar cabresto no câmbio.

Embate ideológico das reformas - FERNANDO DANTAS

ESTADÃO  - 19/08

Reformas são retomadas em ambiente em que esquerda populista perdeu prestígio



À época em que o governo Fernando Henrique fez importantes mudanças na Constituição, o PT, que comandava a oposição, adotou a postura de “fechar questão” contra todas as principais propostas legislativas do Executivo. Isso significava obrigar todos os parlamentares petistas a votar de acordo com a decisão do partido, sob pena de exclusão.

Ainda assim, é muito comum a interpretação de que as dificuldades de FHC em passar suas reformas constitucionais deveram-se quase que inteiramente à resistência corporativista dos grupos de interesse afetados, e muito pouco à oposição ideológica às propostas. Afinal, a bancada do PT e de outros partidos de esquerda, que se opunham ferrenhamente ao programa tucano, tinha dimensão insuficiente para barrar as emendas constitucionais.

Um fator pouco considerado, porém, é que o Congresso Nacional à época de FHC – e ainda hoje – tinha uma grande massa amorfa de parlamentares sem posição ideológica clara, que votavam contra ou a favor de determinada reforma ao sabor de seus cálculos e interesses do momento.

Sempre se enfatiza muito que esse tipo de político se deixa levar pelos interesses “fisiológicos”, isto é, vota a favor de quem tenha atendido seus interesses particulares ou de sua paroquial base de eleitores. Presta-se menos atenção ao fato de que os fisiológicos também são os que mais se deixam levar pelos ventos políticos em constante mutação, já que não se sentem vinculados à nenhuma ideologia específica.

Assim, à época das reformas de FHC, o PT e a esquerda no Congresso eram de fato uma minoria sem votos para brecar reformas, mas que formavam um grupo muito barulhento e com forte credibilidade política, fruto da percepção pós-ditadura de que a esquerda era impoluta e representava os interesses dos oprimidos contra os dos opressores. Era um grupo com o poder de glorificar os votos antirreforma como a “coisa certa” em defesa dos interesses populares contra o governo “neoliberal”.

Esse glamour a mais podia ser muitas vezes o que faltava para que a balança de interesses de um parlamentar fisiológico pendesse para a defesa dos interesses corporativos, e não para o voto pró-reforma acompanhado de alguns “presentinhos” do governo. Em outros casos, podia ser o contrário. Mas o fato é que, em muitas reformas de FHC, cerca de metade dos parlamentares do aliado PMDB, o partido fisiológico por excelência, votou contra o governo.

No campo reformista, por outro lado, naquela época e ainda hoje, a única arma é o surrado discurso tecnocrático que explica que os números não fecham e que, sem mudanças, o País não tem como melhorar no médio e longo prazos. É um trabalho de água mole em pedra dura, mas que muito aos pouquinhos funciona, tanto que reformas foram realizadas até o início do governo Lula.

Em 2006, porém, Guido Mantega assumiu o Ministério da Fazenda dizendo que a reforma da Previdência não era necessária. Até 2014, no impulso do boom de commodities que produziu a economia mágica de 2004 a 2010, o distinto público ouviu do seu governo que reformas fiscais eram desnecessárias e que, para crescer, bastava vontade e ousadia.

Agora, em meio a uma catastrófica ressaca do experimento voluntarista, um governo ainda provisório retoma o caminho das reformas, num ambiente em que a esquerda populista já não tem o prestígio político e moral de outrora, para dizer o mínimo.

É certo que os interesses corporativos e mesmo de grandes grupos, como os aposentados, vão resistir e que tudo será difícil. Mas hoje talvez seja mais fácil caracterizá-los pelo que são: interesses de grupos, e não o interesse coletivo da sociedade no médio e longo prazos. Assim, é possível que o governo Temer, apesar do desafio de se legitimar, tenha sido brindado com condições políticas particularmente favoráveis para travar esse embate ideológico – e não deve desperdiçá-las.

O começo do fim - MIRIAM LEITÃO

O Globo 19/08

O fundo do poço da economia foi em abril, diz o empresário Flávio Rocha, presidente das Lojas Riachuelo. A longa temporada de números negativos nas vendas de varejo começou no fim de 2014 e será deixada para trás depois de setembro. “O Natal já vai ser melhor”, aposta ele. O setor perdeu 500 mil vagas na crise e, segundo o empresário, poderia estar gerando muito mais empregos.

OIndicador Antecedente de Vendas (IAV) mostra exatamente essa trajetória, como se pode conferir no gráfico abaixo. O índice é resultado de consulta a 600 gerentes de compras das grandes empresas de varejo e antecipa tendências. Pelo gráfico, se vê que o que foi previsto pelo índice acompanha bastante o que realmente aconteceu nas verificações do IBGE, na Pesquisa Mensal do Comércio (PMC). As piores expectativas foram em abril, quando os executivos consultados esperavam uma queda de 10,9% nas vendas. A PMC mostrou que a redução acabou sendo de 9%. Para os meses cujos dados não saíram, a previsão é de quedas menores. Em setembro, a expectativa é de quase estabilidade (-0,6%).

O varejo teve altas muito fortes durante o governo do PT. De 2003 a 2013, as vendas cresceram 120%, mas as empresas que fazem parte do Instituto para o Desenvolvimento de Varejo (IDV) aumentaram as vendas em 700%. Mesmo com esse desempenho, Flávio Rocha sempre foi crítico do governo Dilma, defendeu o impeachment, e acha que as perspectivas para o governo Temer são boas. Acredita que o presidente interino, se for efetivado, tentará fazer reformas necessárias, como a trabalhista. Faz uma comparação impressionante.

— O varejo americano emprega 42 milhões de trabalhadores e o do Brasil empregava 7 milhões e agora caiu para 6,5 milhões. Como os EUA têm 50% mais população, o Brasil poderia contratar muito mais. O problema é que a legislação trabalhista no Brasil foi feita para a indústria que trabalha de segunda a sexta e acumula estoques. O varejo não é assim e deveria ter liberdade de contratar para as suas necessidades — disse ele, numa entrevista que me concedeu na Globonews. Segundo Rocha, a reforma trabalhista tem que ter apenas um princípio: o de que o negociado entre trabalhador e empresa se sobrepõe ao legislado.

O Brasil vive um longo vale em todas as áreas, mas nada é pior do que o que está acontecendo no mercado de trabalho. Havia 6,4 milhões de desempregados em dezembro de 2014 e pelos dados do segundo trimestre de 2016, divulgados pelo IBGE, há 11,6 milhões. É urgente a criação de mais empregos, mas o que os economistas estão prevendo é que a taxa continuará subindo nos próximos meses porque a recuperação será muito lenta. Flávio Rocha acha que a situação da economia vai melhorar e rapidamente.

— Não está havendo uma troca de governo apenas, mas o fim de um ciclo que apostou no aumento do tamanho do Estado e elevou impostos. A recuperação será rápida, será em “V”— disse.

Há dúvidas sobre se a retomada será assim tão rápida. As famílias estão endividadas, o desemprego é um freio ao consumo, até de pessoas que não foram diretamente atingidas, e as próprias empresas estão endividadas. O governo não poderá ampliar investimentos por estar em um enorme déficit fiscal. Mesmo assim, a expectativa dos empresários de varejo é que nos setores de bens de menor valor, como vestuário, calçados, livrarias e artigos esportivos, haja em agosto um resultado positivo de 1,8% e em setembro de 2,8%. Mais rápido ou mais devagar, o importante é que o país está começando a sair da longa recessão.

Novo nome na praça - ELIANE CANTANHÊDE

ESTADÃO - 19/08

A dias do impeachment definitivo de Dilma Rousseff e a dois anos da eleição de 2018, num cenário de enorme confusão partidária e muitas interrogações envolvendo políticos, o PMDB de Michel Temer joga ao vento um nome novinho em folha e fora do circuito político para a sucessão presidencial: o do empresário Josué Gomes da Silva.

O objetivo imediato é dissipar as nuvens cinzentas que pairam sobre o Planalto desde que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu a candidatura de Temer em 2018. A turma do presidente fez fila para desmentir, mas aliados passaram a falar no ministro Henrique Meirelles como alternativa.

Diante desse “Temer ou Meirelles”, o PSDB, principal partido da base do governo, deu um pulo e engrossou a voz, pois o acerto com Temer foi feito em cima do compromisso de que ele não disputaria em 2018 e abriria espaço para um nome tucano. Daí por que o senador José Aníbal (PSDB-SP) desandou a criticar o Planalto e a área econômica (leia-se Temer e Meirelles) por afrouxarem as rédeas fiscais para favorecer uma categoria profissional daqui, governos estaduais dali. Aníbal não falava sozinho.

Como tudo neste governo, o imbróglio foi parar na mesa do Palácio do Jaburu. Na quarta-feira, Temer jantou com os senadores tucanos e levou Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima e Moreira Franco. Atenção, o jantar foi para “senadores tucanos”. Significa que foi para Aécio Neves, o mais reticente do trio-mor do PSDB a aderir à transição com Temer. José Serra e Geraldo Alckmin não foram convidados, “senão, seria preciso convidar outros ministros e governadores”. E os deputados tiveram de se contentar com uma única presença, e de última hora.

Entre uma garfada e outra, os tucanos repetiram que o ajuste fiscal é ponto zero da recuperação econômica, mas o governo vem cedendo muito, privilegiando seus interesses políticos em detrimento das urgências econômicas. Paciente, Temer discorreu sobre pressões, ônus e bônus e equilíbrio entre política e economia. Sem força política e base sólida, alegou, terá dificuldades para aprovar alguma coisa no Congresso. E, batendo de frente com o Judiciário, com o funcionalismo e com os estados, aí é que não aprova nada mesmo.

O presidente interino reforçou seu compromisso com o equilíbrio das contas públicas e anunciou que fará um pronunciamento à Nação no dia 7 de Setembro sobre o que encontrou ao assumir e o que pretende fazer já efetivado no governo. No fim do jantar, estava selado o armistício com o PSDB do Senado. Sabe-se lá até quando.

Mas voltemos a Josué Gomes da Silva, da poderosa Coteminas, filho do mítico José Alencar, vice de Lula, filiado ao PMDB desde 2013 e com uma particularidade: nasceu justamente num 25 de dezembro, em 1963, e sua mãe, dona Mariza, muito católica, teve certeza de que isso era um sinal. A família nunca a contrariou.

Além de ser útil agora, para acalmar os tucanos e tirar da cabeça de demais aliados que Temer será candidato ou apoiará Meirelles, Josué fica na prateleira. Com o desgaste dos políticos e a falta de alternativas óbvias no próprio PMDB, vai que cola... Tudo, claro, depende do principal: o governo dar certo, a economia reagir, Temer efetivamente descartar a candidatura e ter força suficiente para patrocinar um nome viável para a sucessão. Resumo da ópera: jogar o nome de Josué ao ar é para tirar o foco de Temer e Meirelles, mas sempre pode ventar.

Histórias. Reação de Tancredo Neves quando o Triângulo Mineiro tentou se separar de Minas: “Ok, me digam se a capital será em Uberaba ou Uberlândia e eu toco em frente”. Nunca voltaram. A lembrança é do Planalto, quando o PSDB exige apoio antecipado ao seu candidato em 2018 e Temer pensa: “Ok, me digam se será Aécio, Serra ou Alckmin e eu apoio”. Não voltarão tão cedo.

Medalha, medalha, medalha... - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 19/08

SÃO PAULO - Nas Olimpíadas incentivamos os atletas a buscarem a excelência máxima, que é recompensada com a medalha de ouro. Até ensaiamos um discurso mais politicamente correto, que assevera que o importante é competir. O ar de decepção daqueles que não conseguem subir no pódio, porém, sugere que ganhar é mesmo bem melhor do que perder.

Não poderia haver contraste maior entre o que ocorre nas Olimpíadas e a tendência, cada vez mais presente nas escolas de educação infantil, de fazer com que os pequenos não experimentem nenhum tipo de sensação de derrota ou de exclusão. Nas competições esportivas escolares, todas as crianças recebem medalhas, pouco importando se chegaram em primeiro ou último lugar na corrida.

Nos EUA, onde essa moda chegou ao paroxismo, surgem situações ainda mais estranhas. O velho sistema pelo qual os times eram montados por escolhas alternadas entre os dois capitães de equipe foi aposentado, para que os últimos alunos a ser chamados não sofressem. Professores de arte já se queixam da dificuldade que é encontrar uma peça para encenar no final do ano, já que os novos tempos exigem que todas as crianças participem e tenham o mesmo número de linhas de diálogo.

A ideia por trás dessas esquisitices é que não devemos golpear a autoestima dos pequenos. Mas será que não devemos mesmo? Ser o último a ser escolhido para o time pode ser doloroso, mas revela uma informação útil: você não é um bom atleta; procure dedicar-se a atividades para as quais está mais talhado.

A própria autoestima precisa ser relativizada. Psicólogos que estudam a violência apontam o excesso de autoestima como a mais prevalente causa de conflitos interpessoais.

Precisamos encontrar um meio-termo entre o espírito ultracompetitivo que reina nas vilas olímpicas e a atonia um pouco ingênua que parece pautar a nova puericultura.

A agonia do Brasil - FERNÃO LARA MESQUITA

ESTADÃO - 19/08

O Brasil que produz e cria empregos está sendo morto a chutes. Como isso foi possível?



Sim, a festa está linda, mas não é do Brasil, é só noBrasil. Quando acabar estaremos de volta àquele Rio de Janeiro de sempre, com R$ 3 bilhões a menos de segurança pública por quinzena, onde errar o caminho é morte certa.

Aquela abertura foi, sim, uma síntese, mas do nosso velho drama roteirizado. A mais moderna tecnologia emprestando cintilância à mais retrógrada e opaca das mensagens assinada, proverbialmente, pelos noveleiros da Globo ultraespecializados nesse tipo de embalagem. Um gostinho para o mundo da antiutopia que, desde os idos de 1936, é entoada diariamente como um mantra sagrado em todas as escolas e “meios de difusão de cultura da burguesia”: a quase centenária “recriação”stalinista das supostas “raízes” de um Brasil sem empreendedores, só com usurpadores de um lado e escravos do outro, que repudia a superação, sonha apenas com a “hegemonia” da favela.

Esse “Brasil” dos “intérpretes”, complacente com a derrota – como provou que não o é cada um dos atletas verde-amarelos na Olimpíada disputada na Vila construída pelos empreendedores “que não há” –, é o único representado em Brasília. O que suava nas quadras e pistas em busca de glória e remissão pelo esforço individual não tem quem fale por ele na capital mundial do horror ao mérito, que a Olimpíada honra, porque meritocracia pressupõe a morte do “Sistema”que vive da distribuição e venda de privilégios.

No Brasil Real, onde a casta dos funcionários públicos vence sempre e é contra a lei evitar o suicídio orçamentário, haja o que houver, há sangue na água e os predadores se assanham. Com a inflação comendo por baixo 9% do valor do trabalho ao fim de oito trimestres consecutivos de queda da produção e mais de 100 mil brasileiros da 2.ª Classe se juntando à legião dos desempregados a cada 30 dias, os bancos comem soltos. O volume de crédito concedido caiu 4,4%, mas a“receita com clientes” subiu 4,2%. A cada“renegociação” das dívidas de empreendedores a quem a única garantia dada pelo “governo de salvação nacional” é a de que nada na equação entre contribuintes e “contribuídos” vai mudar senão para pior, aumenta forte o “spread” entre juros pagos e juros cobrados. Os quatro maiores bancos “lucraram” R$ 31,7 bilhões no segundo trimestre, volume de drenagem que se vem somar aos R$ 60 bilhões recém- chupados pela União para garantir que os seus funcionários permaneçam fora da crise que criaram e aos outros R$ 50 bilhões que vão custar a renegociação sem contrapartidas das dívidas dos Estados. Na fila os governos municipais, só 42 dos quais, em quase 6 mil, têm folhas de pagamento menores que a própria arrecadação, apesar do frenesi de multas com que caçam o povo pelas ruas e estradas de todo o País. Jogue-se por cima disso a tempestade de “ações trabalhistas” que o desemprego em massa precipita, montando, este ano, a algo em torno de R$ 70-80 bilhões, e tem-se um retrato parcial do estupro coletivo que o País que trabalha vem sofrendo.

Bolsa subindo, dólar caindo? No mundo da“arbitragem de instituições” é assim: “Tá caro produzir aqui? A lei não garante? Empregar é expor-se à chantagem? Bora produzir em outro lugar”! E na contramão: “Tá fácil ganhar dinheiro no mole? É o juro mais alto do mundo? Vamos lá, enquanto durar!”. Não tem nada que ver com a economia real. O Brasil que produz e cria empregos está sendo morto a chutes.

Nunca tantos foram tão estraçalhados por tão poucos. Como foi que isso se tornou possível?

O “Sistema” produz exatamente o resultado para o qual foi desenhado. Partindo da falsificação constitucionalmente imposta da base de toda a estrutura de representação da sociedade civil a partir dos sindicatos que dispensam simpatizantes porque são sustentados por impostos, o esquema criado por Getúlio Vargas foi clonado, a partir de 1988, pelos partidos políticos. E isso fez da nossa tão propalada“democracia” uma farsa em que os “representantes” se podem dar impunemente o luxo de dispensar o endosso dos “representados” aos seus atos. Fechado em si mesmo, “O Sistema” tem lá os seus mecanismos de processamento de lutas intestinas, mas o respeito à hierarquia interna, uma vez estabelecida, é sagrado sob pena de “morte”, por condenação aberta quando possível, por chantagem e assassinato de personagem quando necessário. Desse momento em diante garantir“o seu” e o “dos seus” à custa dos “de fora”, tão certo quanto que o sol nascerá amanhã, é o que os unirá a todos, para além do falatório, nos momentos de decisão. O conjunto é absolutamente blindado contra qualquer interferência externa, sobretudo dos eleitores, tanto antes, no processo de seleção dos candidatos a cargos eletivos, futuros “hubs” de distribuição de acesso a privilégios, prerrogativa exclusiva dos grandes caciques segundo critérios inconfessáveis, porém explícitos, quanto depois do momento fugaz da eleição.

Esperar que o próprio “Sistema” atue contra si mesmo é, portanto, uma ilusão de noiva. Enquanto a imprensa ou pelo menos uma parte dela resistiu denunciando os avanços da casta que parasita a Nação e amplificando a voz dos que pagam a conta, sobreviveram, aos trancos e barrancos, elementos de democracia nas instituições brasileiras. Depois que a ética corporativa substituiu a ética jornalística e a função institucional da imprensa, último bastião dos desvalidos, cedeu lugar a uma conta de chegar na ordem das prioridades das empresas de comunicação, o caminho ficou livre.

Enquanto a imprensa, a reboque da guerra de “acessos”aos dossiês com que as partes em disputa pelo controle do “Sistema” se alvejam umas às outras, seguir tratando a corrupção como causa, e não como efeito, da sujeição do País à ditadura de uma casta com direitos e deveres totalmente diferenciados dos do resto do povo que ela está dispensada de expor como o que de fato é, as atenções e as energias da Nação abusada seguirão dispersas e erráticas como estão hoje e não haverá meio de pôr um fim à opressão.

As nuvens políticas - MERVAL PEREIRA

O Globo - 19/08

Uma das frases mais conhecidas sobre política é a do ex-senador e ex-governador mineiro Magalhães Pinto, que comparava sua volatilidade à das nuvens, que mudam de configuração a cada momento. Nada melhor para definir as posições mutantes do presidente interino, Michel Temer, e da presidente afastada, Dilma Rousseff, neste momento.

Temer, que se dizia preparado para as vaias que de fato recebeu na abertura dos Jogos Olímpicos no Rio, desistiu de ir ao encerramento, já prevendo que será vaiado novamente. Dilma, que já anunciara que não compareceria à sessão no Senado de seu julgamento, temendo enfrentar as perguntas da situação, decidiu que irá.

Michel Temer comete um gafe diplomática, pois é tradição que o presidente do país que realiza a Olimpíada transmita simbolicamente a missão ao dirigente do país que sediará a próxima edição, desta vez o Japão, em 2020. Para tanto, o primeiro-ministro Shinzo Abe estará no Rio no domingo, e receberá no Maracanã do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, o bastão simbólico da Olimpíada.

A vaia que certamente seria direcionada a Temer, o será a Maia, que pagará assim o mico presidencial neste momento conturbado da vida política nacional, uma espécie de taxa de insalubridade que lhe permitirá assumir o cargo de presidente interino quando Temer viajar ao exterior.

A decisão de Temer de não comparecer ao estádio — como dizia Nelson Rodrigues, no Maracanã se vaia até minuto de silêncio — é um erro político inexplicável. Ele abre mão das obrigações do cargo que ocupa para se preservar, criando uma imagem de fragilidade que não ajuda na tarefa árdua que terá quando assumir definitivamente a Presidência da República.

Não há uma explicação razoável para a sua falta, ainda mais quando ela cria até mesmo embaraços diplomáticos. Os cerimoniais das duas chancelarias estão tentando montar um encontro entre Temer e Abe fora das vistas do público, para minimizar a consequência da decisão do presidente brasileiro, que mais parece um adolescente malcriado do que um experiente político que tem noção das suas responsabilidades.

Já a presidente afastada fez muito bem, de seu ponto de vista, em mudar de ideia. Sua ausência na sessão do Senado corroboraria a imagem de fraqueza pessoal, justamente o que ficará colado à imagem do presidente interino.

Dilma está tentando reescrever sua história, montando uma narrativa heroica para o que não passa de uma situação normal em democracias maduras. Seu impedimento é resultado de burlas específicas à legislação brasileira, e mostra que nenhum político, por mais popular que seja — não é seu caso — ou por mais votos que tenha tido, não tem o direito de presidir o país sem obedecer às leis.

Mas ela insiste na tese do golpe parlamentar, e é essa visão que estará registrada no livro que pretende escrever, no documentário que está sendo feito por seguidores seus e que está na carta que divulgou recentemente. Não importa se ninguém, além dos militantes da esquerda no Brasil e no exterior, acredita nisso, para ela o importante é seguir nessa toada até o final, quando, perdidos os direitos políticos por oito anos, estará relegada a um rodapé da História brasileira.

Só será protagonista quando se contar o descalabro ocasionado por seus anos de governo, que colocaram o país na pior recessão econômica já registrada em toda nossa História, e no caos político em que vivemos. Dilma terá na sessão do Senado oportunidade de exercitar mais uma vez o papel de perseguida política, de uma mulher honesta que está sendo condenado por um bando de corruptos que, aliás, fizeram parte de seu governo até outro dia.

Se der sorte, e os governistas não forem cuidadosos em seus questionamentos, poderá repetir a cena de quando, acusada pelo líder do DEM, Agripino Maia, de ser mentirosa com base em declarações em que admitia ter mentido muito a seus interrogadores quando esteve presa, teve um momento de brilho político ao transformar em um bumerangue a acusação.

É improvável que um imprevisto mude o resultado do julgamento, mas, para Dilma, ir até o fim na defesa de seus pontos de vista é uma saída melhor do que se esconder. Mesmo que sua versão da História não resista às delações premiadas do marqueteiro João Santana e do empreiteiro Marcelo Odebrecht, entre outros, que a estão culpando de diversos atos de corrupção, que ainda serão cobrados pela Justiça.

Estatais criadas desde Lula sobrecarregam Tesouro - EDITORIAL O GLOBO

O Globo - 19/08


Marca da ideologia dirigista, as 41 empresas criadas de 2003 até o ano passado gastaram muito com salários e geraram um majestoso prejuízo. Era esperado


Nos 13 anos de lulopetismo no poder, o Tesouro (leia-se, o contribuinte, a sociedade) recebeu pesada conta: os prejuízos bilionários causados por esquemas de corrupção que dilapidaram estatais e o resultado da execução de políticas equivocadas como a da criação subsidiada de “campeões nacionais” via BNDES, além de outras aventuras estatistas.

Por exemplo, a construção da “supertele” a partir da Telemar, o provável embrião do retorno da Telebras como empresa de economia mista, mas que resultou na Oi, uma das maiores falências do mercado. Como entre os caloteados estão os de sempre — bancos estatais e fundos de pensão de empresas públicas, área cativa de influência do braço sindical petista, a CUT —, cedo ou tarde este e outros rombos deixados de herança pelo lulopetismo baterão às portas do Tesouro.

Mas há também outra despesa enorme contratada em nome do Tesouro: a criação desbragada de estatais, muitas dependentes do sobrecarregado Tesouro Nacional, para sobreviver e continuar a empregar companheiros e apaniguados em geral.

Pesquisa feita pelo Instituto Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, contabilizou, entre 2003, primeiro ano do governo Lula, e 2015, antes do afastamento de Dilma do Planalto, a criação de 41 estatais, segundo o jornal “Valor”.

No período, excluindo empresas do ramo financeiro, este conjunto de companhias gerou um prejuízo acumulado de R$ 8 bilhões. Para se comparar, são dois bilhões a mais que a primeira baixa feita pela Petrobras, em balanço, devido aos desfalques que sofreu do esquema lulopetista que assaltou a companhia. Também no período, elas pagaram, ao todo, R$ 5,5 bilhões em salários, quase tanto quanto o prejuízo.

A composição desse conjunto de empresas é variada. Há uma fábrica de semicondutores instalada no Rio Grande do Sul, e uma subsidiária da Petrobras, criada para produzir álcool e biodiesel, mas que produz mesmo é prejuízo. O mesmo ocorre com a Cietec, de Porto Alegre, destinada a produzir chips para o rastreamento bovino e identificação de veículos.

Uma das joias dessa coroa de estatais é a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), destinada a absorver tecnologia de trem-bala e executar o projeto da ligação de alta velocidade de Rio a São Paulo. Delirante desde o início, a ideia, como muitas outras, gerou apenas prejuízos e não projetou sequer um dormente. A EPL foi congelada, mas o governo Temer pensa em ativá-la para atuar no programa de parcerias público-privadas em projetos de infraestrutura. Isso teria de ser debatido.

A debacle do projeto do PT está exposta na crise econômica, no impeachment, mas também na criação desvairada de estatais, onde se vê a marca da ideologia dirigista do lulopetismo. E também no seu resultado: empreguismo e prejuízos pesados para o contribuinte.

O parto da montanha - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 19/08

Na fábula de Esopo, depois de muito estrondo a montanha pariu um rato. Dilma Rousseff repetiu a proeza com a divulgação da “mensagem” com a qual pretende convencer de sua inocência o mundo


Na fábula de Esopo, depois de muito estrondo a montanha pariu um rato. Dilma Rousseff repetiu a proeza com a divulgação da “mensagem” com a qual pretende convencer de sua inocência o mundo e especialmente os senadores que vão decidir sobre o impeachment no fim do mês. Mas, depois de tanta hesitação, Dilma acabou escolhendo um mau momento para falar de inocência e se apresentar, mais uma vez, como uma mulher honesta, pois, simultaneamente, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o Ministério Público a abrir inquérito contra ela, o ex-presidente Lula, os ex-ministros Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo e dois ministros do STJ, destinado a investigar a tentativa de obstrução da Justiça no âmbito da Operação Lava Jato.

Na mensagem lida no Palácio da Alvorada, a presidente afastada reitera, candidamente, seu “compromisso com a democracia e com a necessidade da “superação do impasse político que tantos prejuízos já causou ao País”. Parecia estar falando de um outro país e de outra pessoa que não ela, cuja biografia revela total falta de compromisso com a democracia e a proeza de ter arruinado o Brasil. Finalmente, fez um apelo patético a seus julgadores: “Não se faça a injustiça de me condenar por um crime que não cometi”. A uma plateia de jornalistas a quem proibiu de fazer perguntas, Dilma repetiu a necessidade de “diálogo”, defendeu um plebiscito e a delirante ideia da antecipação das eleições presidenciais. Distanciou-se assim, ainda mais, da Nação e até da posição oficial do PT. Promete, agora, comparecer ao Senado para defender-se pessoalmente.

O melancólico evento mostrou ao País exatamente a mesma Dilma cujos defeitos seis anos na Presidência da República só fizeram acentuar: a arrogância, a teimosia, a hipocrisia mal disfarçada na tentativa de parecer humilde, a falta de senso crítico que a impede de se ver como responsável por erros e omissões graves cometidos no catastrófico exercício da Presidência da República. Quando, logo nas primeiras linhas, menciona o “impasse político que tantos prejuízos causou ao País”, fala sobre sujeito indeterminado para não ter que admitir o seu autoritarismo empedernido que envenenou as relações do Executivo com o Legislativo e, depois, com toda a Nação.

O argumento central da defesa de Dilma no processo de impeachment, por ela insistentemente repetido na tal carta, é o de que, como presidente da República, não cometeu nenhum crime de responsabilidade e não pode ser julgada pelo “conjunto da obra”. O julgamento do impeachment pelo Parlamento, no entanto, é essencialmente político, sustentado pela comprovação jurídica do crime de responsabilidade. No caso de Dilma o crime de responsabilidade foi reconhecido, por ampla maioria de deputados e senadores, nas votações de admissibilidade do processo.

A defesa tem, é claro, o direito de alegar que não houve crime e tentar provar isso. Cabe aos jurados, no caso os senadores, em sessão presidida pelo chefe do Poder Judiciário, decidir pela culpa ou pela absolvição. Trata-se, portanto, não de um golpe, mas de um procedimento público – na verdade, escancarado – regido pela Constituição e pelas leis e que segue rito determinado pelo Poder Judiciário.

Mas esse está sendo um julgamento essencialmente político, alega Dilma. É claro que é, pois se refere a um crime de responsabilidade. Os crimes de responsabilidades imputados à presidente são inexpressivos, protestam os dilmistas. As pedaladas fiscais e a liberação de recursos sem autorização prévia do Congresso objetos do processo não são fatos isolados nem corriqueiros. Foram violações flagrantes da lei que constituem, na verdade, o modus operandide um governo autoritário que desprezava o papel constitucional e as finalidades precípuas do Parlamento como órgão da soberania nacional e de representação do povo.

A patética manifestação epistolar de Dilma Rousseff é um conjunto de frases feitas, tiradas retóricas, expressões piegas. De platitudes e obviedades que inevitavelmente assomam em discursos políticos que, por falta de conteúdo fático e genuinamente programático, abusam de falsidades demagógicas na tentativa de conquistar o ouvinte pela emoção. Mas a paciência do povo brasileiro com o ilusionismo lulopetista está esgotada.