O Estado de S.Paulo - 20/05
Este, que é o grande jornal brasileiro, promoveu uma série de entrevistas com economistas para que encarassem os desafios do próximo governo. Autoridades consagradas e respeitadas ofereceram suas receitas para o generalizado mal-estar que contamina todos os setores da vida nacional. Entre as propostas de imprescindível reforma figuram a tributária, a da Previdência e a trabalhista, além da reforma política, sem a qual as anteriores não prosperarão. Ninguém, todavia, se deteve sobre uma reforma que, em profundidade e consistência, ainda não se fez: a reforma da Justiça brasileira.
Será que não tem impacto econômico o funcionamento de um sistema de Justiça que produziu quase 100 milhões de processos, atravancando todos os juízos e tribunais da República? Será que desapareceu o "custo Brasil" da Justiça a, primeiro, amedrontar e, depois, afugentar o investimento externo?
Ainda estes dias recebi uma comitiva de magistrados da China. Depois de esclarecerem que o Brasil não precisa temer seu país, cuja tradição histórica é pacifista, quiseram saber alguma coisa do funcionamento da máquina judiciária. Disseram que o Brasil convida o empresário chinês a investir no Brasil. Mas, depois que ele chega aqui e se surpreende com a burocracia, fica perplexo com a facilidade com que se discutem no Judiciário questões que já foram acordadas nos contratos. Mas a maior surpresa é a de que um juiz suspende o cumprimento da avença e o outro libera. Na segunda instância, um tribunal mantém a decisão do primeiro juiz, mas outro colegiado a substitui pela decisão do segundo. E assim vão, de um polo a outro, até vencerem as quatro instâncias e as dezenas de possibilidades recursais de reapreciação do mesmo tema. Culminaram por indagar: "Mas a lei não é a mesma?".
Como explicar aos chineses que nossa Constituição é dirigente e principiológica, abriga valores antagônicos, cuja conciliação só é possível se adotarmos estratégias denominadas otimização, ponderação, racionalidade, proporcionalidade e outros instrumentos do neoconstitucionalismo? Eles são sedutores exercícios de sofisticada elaboração doutrinária, a redundar em eloquentes posturas jurisprudenciais. Mas justificam a validade de todo e qualquer ato decisório, desde que bem fundamentado. Será que os chineses conseguem absorver a complexidade de um Brasil que se converteu no território livre da hermenêutica?
Penso haver lugar para refletir sobre a excessiva judicialização, que priva a sociedade de capacidade de dialogar e de ser protagonista de seus próprios interesses, em lugar de se conformar com a posição de objeto da vontade do Estado-juiz. Também seria interessante questionar o sistema normativo, prolífico e complicado, insuscetível de uma consolidação, pois o Brasil não tem condições de definir o que está vigendo ou não. Há pouco tempo deixamos de concluir todo ato normativo em sentido estrito com a expressão "revogam-se as disposições em contrário", sem especificar quais seriam tais dispositivos.
Será que o processo, concebido como instrumento de realização do justo concreto, não se tornou preponderante em nosso sistema? Quem é que poderia calcular a porcentagem de decisões, em todos os níveis e em todos os ramos da Justiça, que terminam apenas processualmente, deixando intacto ou ainda mais agravado o conflito originador da demanda? Os sociólogos e antropólogos poderiam explicar se há razão de ser para que, em Estados-Nação mais adiantados, o ofendido lance um repto ao ofensor dizendo "vou levá-lo à Justiça" ou "vamos nos encontrar no tribunal", enquanto no Brasil é o infrator que diz ao lesado "vá procurar seus direitos!"?.
Como explicar que alternativas tais quais os juizados especiais, cujos parâmetros são a oralidade, a singeleza, a preferência pela conciliação e a rapidez, sejam contaminadas pelo único defeito consensual da Justiça convencional, ou seja, a sua invencível lentidão? Qual seria a razão pela qual se oferece uma resistência clara ou disfarçada a soluções informais, como a conciliação, a mediação, a negociação, a transação e tantas outras, como se a única opção para quem se sente injustiçado fosse o burocratizado, complicado e demorado processo judicial?
É racional que os processos findos devam ser conservados por tempo além do razoável ou por toda a eternidade, com isso onerando um orçamento já sacrificado pela crônica insuficiência de recursos financeiros, desviando verbas preciosas para armazenar papel velho? Qual o argumento que superaria a inafastável constatação de que os seres humanos são destinados a voltarem ao pó e que, sob essa concepção, o papel é mais importante, porque terá duração infinita? Existe explicação convincente para a preservação de modelo judicial que distribui milhares - ou mesmo milhões - de ações praticamente idênticas, entre centenas de julgadores de igual nível hierárquico, e que não haja consenso entre eles, para que o interessado não seja surpreendido por essa álea hoje existente? A depender da distribuição, o resultado será um. Se intervier a sorte, a resposta será outra e em sentido contrário.
Resiste a uma plausibilidade em termos de eficiência admitir longos ou mesmo intermináveis conflitos de competência, ou seja, discussões sobre qual Justiça ou qual julgador de um mesmo tribunal é o "competente" para decidir, se o que interessa à parte é somente uma resposta à sua pretensão? Um observador isento e provido de sensatez encontrará muitas outras questões a serem analisadas no funcionamento da Justiça brasileira. Todas elas talvez suscetíveis de merecerem tratamento mais adequado. Justiça é serviço estatal, sustentado pelo povo, para resolver seus problemas. Não precisa ser mais complicado do que isso.
Seria recomendável que O Estado de S. Paulo, sempre pioneiro no enfrentamento das grandes questões nacionais, também se interessasse pela inadiável profunda reforma estrutural da Justiça brasileira. Dela adviria um salto qualitativo para a própria saúde da República.
terça-feira, maio 20, 2014
Trapalhada do MEC - RONALD GUIMARÃES LEVINSOHN
O GLOBO - 20/05
Ministério causou confusão no setor
Dias antes de o senador Aloizio Mercadante ser promovido para a Casa Civil, professores, funcionários e alunos da Universidade Gama Filho e da UniverCidade, em greve por salários atrasados, invadiram o gabinete do então ministro da Educação. Exigiam que a mantenedora Galileo fosse federalizada através de medida provisória.
A Galileo é uma sociedade de papel, sem qualquer ativo, criada há apenas três anos, pertencente ao bispo Adenor Gonçalves dos Santos, sem experiência no ensino universitário e sem currículo adequado para ser empresário de educação. Entretanto, ele foi aprovado e festejado pelo baixo clero do MEC.
A mídia destacou a balbúrdia durante dias e, à medida que se aproximava a posse de Mercadante no Palácio do Planalto, as exigências dos grevistas aumentavam e a barulheira tomou conta das ruas. Como o pleito dos grevistas é vedado pela Constituição, o ministro e a Nomenklatura do MEC não puderam atender seus correligionários, e preferiram impor punição maior à Galileo: o descredenciamento dos cursos, ou seja, a decretação de uma falência indireta das duas instituições envolvidas. A Galileo, que emitiu debêntures de R$ 100 milhões mediante a garantia das mensalidades do curso de Medicina da Gama Filho, ficou impossibilitada de pagá-los. O MEC, além de causar confusão no setor, impingiu prejuízo aos fundos Postalis e Petros, que haviam adquirido tais debêntures.
Sem o devido processo legal em razão da pressa de blindar a promoção do ministro Mercadante, é bem possível que o ato do MEC, quando submetido aos tribunais, gere indenização e vultoso precatório.
Se o MEC tivesse a Expertise do Banco Central para atuar no mercado, tudo teria sido feito em silêncio, apontando ao bispo Adenor um comprador para as instituições que administrava - inclusive os próprios antecessores, corresponsáveis pelo pagamento dos débitos fiscais e trabalhistas, e que poderiam ter posto os salários imediatamente em dia.
O mais grave é que a Galileo não cumpriu as obrigações previstas nos contratos que celebrara com as sociedades mantenedoras, e a Justiça certamente os anulará, devolvendo a Associação Educacional São Paulo Apóstolo (Assespa), antiga mantenedora da UniverCidade, e a Sociedade Universitária Gama Filho, mantenedora da Gama Filho, aos seus antigos associados.
O volumoso débito das citadas sociedades poderia ser pago através do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior, a longo prazo e mediante concessão de bolsas de estudo e dinheiro. A Assespa possui imóveis em valor superior a seus débitos fiscais e trabalhistas. Igualmente, a família Gama possui, em nome de sociedade constituída em paraíso fiscal, imóveis em valor superior ao débito.
Quem sabe o senador Mercadante, já instalado no Palácio do Planalto, e o atual ministro da Educação, já consolidado no Ministério da Vergonha Nacional, encontrem um caminho para desfazer a atrapalhada decisão. Parece coisa de aloprados.
O estrago que Meirelles faria - ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SP - 20/05
BRASÍLIA - José Serra demorou duas semanas, pelo menos, para dizer que "nunca" pensou em ser vice de Aécio Neves. Donde se conclui que a ideia animou círculos tucanos, mas não colou, provavelmente por não encantar o próprio Aécio.
O novo nome na roda é o de Henrique Meirelles, que vai seguindo assim o exemplo do "dono" do PSD, Gilberto Kassab, disputado a foice por tucanos e petistas.
Como Kassab, Meirelles ganha direito a promessas do poderoso Lula, entra na mira da campanha de Dilma, recebe elogios públicos de Aécio e conquista bom espaço na mídia.
Compare-se a reação do candidato tucano. Quando o nome de Serra vazou para a imprensa como opção, Aécio se fez de desentendido, elogiando Serra, mas escapulindo de admitir a possibilidade. Já quando o nome de Meirelles chega a público, Aécio não só o elogia como admite "conversar" a respeito.
Serra seria forte, pelo "recall", pela densidade. Mas Meireles, ex-BC, tem imensa vantagem: ele atinge o coração da campanha petista.
Maestro da política econômica na época da euforia com Lula, ele é um contraponto desconfortável para a era Dilma, que se debate com crescimento baixo, inflação alta, dúvidas e mau humor.
Aliás, uma sugestão: a leitura do artigo imperdível de Meirelles na Folha de 11/5, "Pecados nada originais". É uma crítica clara, assumida, contra a "nova matriz econômica" inventada no governo Dilma.
Meireles seria, pois, um troféu da dissidência que já ronda a candidatura Dilma. Não só mais um entre os mais de dez ministros lulistas que não votam na reeleição da presidente, mas "o" ministro. E poderia puxar a fila dos partidos que estão com Dilma, mas atentos às pesquisas.
Logo, Meirelles seria um vice fantástico para Aécio e devastador para Dilma. Por isso, Lulinha ex-paz e amor vai com tudo para segurar Meirelles e também Kassab, que nunca se divertiu tanto como em 2014.
BRASÍLIA - José Serra demorou duas semanas, pelo menos, para dizer que "nunca" pensou em ser vice de Aécio Neves. Donde se conclui que a ideia animou círculos tucanos, mas não colou, provavelmente por não encantar o próprio Aécio.
O novo nome na roda é o de Henrique Meirelles, que vai seguindo assim o exemplo do "dono" do PSD, Gilberto Kassab, disputado a foice por tucanos e petistas.
Como Kassab, Meirelles ganha direito a promessas do poderoso Lula, entra na mira da campanha de Dilma, recebe elogios públicos de Aécio e conquista bom espaço na mídia.
Compare-se a reação do candidato tucano. Quando o nome de Serra vazou para a imprensa como opção, Aécio se fez de desentendido, elogiando Serra, mas escapulindo de admitir a possibilidade. Já quando o nome de Meirelles chega a público, Aécio não só o elogia como admite "conversar" a respeito.
Serra seria forte, pelo "recall", pela densidade. Mas Meireles, ex-BC, tem imensa vantagem: ele atinge o coração da campanha petista.
Maestro da política econômica na época da euforia com Lula, ele é um contraponto desconfortável para a era Dilma, que se debate com crescimento baixo, inflação alta, dúvidas e mau humor.
Aliás, uma sugestão: a leitura do artigo imperdível de Meirelles na Folha de 11/5, "Pecados nada originais". É uma crítica clara, assumida, contra a "nova matriz econômica" inventada no governo Dilma.
Meireles seria, pois, um troféu da dissidência que já ronda a candidatura Dilma. Não só mais um entre os mais de dez ministros lulistas que não votam na reeleição da presidente, mas "o" ministro. E poderia puxar a fila dos partidos que estão com Dilma, mas atentos às pesquisas.
Logo, Meirelles seria um vice fantástico para Aécio e devastador para Dilma. Por isso, Lulinha ex-paz e amor vai com tudo para segurar Meirelles e também Kassab, que nunca se divertiu tanto como em 2014.
Razão e emoção - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 20/05
No limiar do que promete ser a disputa mais acirrada para a Presidência da República dos últimos 20 anos, estamos entrando em uma campanha política em que os recursos da moderna propaganda serão usados à exaustão para explorar as descobertas mais recentes da neurociência, que já definiu que o eleitor vota mais com a emoção do que com a razão.
O sociólogo Manuel Castells, baseado também em estudos da neurociência, diz que o medo é a emoção primária fundamental, a mais importante de nossa vida a influenciar as informações que alguém recebe.
O livro de John Mearsheimer sobre o hábito de mentir dos governantes, da Editora Zahar, debruça-se sobre o que ele chama de mentiras estratégicas , e uma das muitas facetas dessas mentiras para o bem da pátria é a difusão do medo.
Está aí a raiz da recente propaganda partidária do PT, apelando para o receio do que classificam de retrocesso caso a sigla seja derrotada nas urnas. Para se contrapor à tendência à mudança que as pesquisas apontam como a principal motivação para o voto nesta eleição.
É interessante observar que, embora esteja na frente nas pesquisas, a presidente Dilma concorre à reeleição com dificuldades que a fazem dizer uma frase como a revelada por Renato Maurício Prado no GLOBO, num encontro da presidente com jornalistas esportivos recentemente no Palácio da Alvorada em Brasília: É a minha hora. E vou até o fim. Perdendo ou ganhando .
As primeiras campanhas propagandísticas com vistas à reeleição foram realizadas com o objetivo de evitar a derrota, o que indica uma fragilidade que não seria de se supor em uma presidente de posse de todas as forças inerentes ao cargo que ocupa. O que revela que ela não tem pleno controle dessas forças.
Não é de estranhar que esse tenha sido o caminho escolhido pelo marqueteiro João Santana, que já admitiu certa vez que, numa campanha, trabalham-se produções simbólicas , tentando captar o imaginário da população , não exatamente a verdade dos fatos.
Nessa guerra que se avizinha, como em todas as guerras, a verdade é a primeira vítima, na frase famosa atribuída geralmente ao senador americano Hiram Johnson. Em sua obra A República , Platão afirma que os governantes têm o direito de não dizer a verdade para os cidadãos, e até mesmo de mentir no interesse da própria cidade .
O governo Dilma leva essa permissão platônica ao pé da letra e cria um mundo de ficção que esbarra na realidade. É o caso dos aeroportos, que Dilma declarou ontem prontos para receber os milhões de turistas esperados para a Copa.
É por isso que estamos vendo um verdadeiro festival de traições nos bastidores da política, à medida que a campanha eleitoral vai se aproximando das datas marcadas pelo calendário oficial para a definição das candidaturas.
Quem mais sofre nessas situações é o governo, que tem mais a perder do que a depauperada oposição. A começar pelos minutos de propaganda oficial, que podem dar a Dilma quase três vezes o tempo do candidato em 2º nas pesquisas, o senador Aécio Neves, do PSDB.
Cada minuto retirado da principal oponente pode valer até o dobro para a oposição, e quem tem tempo de propaganda para negociar, como o PMDB (perto de 5 minutos) ou o PSD (cerca de 2 minutos), ganha dimensões políticas que a atuação parlamentar muitas vezes não justifica.
A vice-presidência da chapa tucana está na mesa de negociações, enquanto Michel Temer, do PMDB, o vice de Dilma Rousseff, precisa ser ratificado na convenção de junho para garantir aos governistas a hegemonia na propaganda partidária.
Correndo por fora, a dupla Eduardo Campos-Marina Silva joga com a rejeição aos políticos tradicionais para superar as barreiras logísticas impostas pela fragilidade de suas bases partidárias formais.
O que já desandou na estratégia política governista foi a realização da Copa do Mundo como instrumento galvanizador dos anseios nacionais. Ao contrário, as necessidades da população nos grandes centros urbanos do país contrastam com a orgia de gastos públicos nos 12 estádios, colocando em xeque, talvez pela 1ª vez na História do país tratando-se de futebol, as prioridades do governo, definidas em detrimento das mais prementes demandas da população.
A seleção não deixará de ser a pátria de chuteiras , na definição perene de Nelson Rodrigues, mas o patriotismo não servirá de refúgio para as deficiências do governo.
O sociólogo Manuel Castells, baseado também em estudos da neurociência, diz que o medo é a emoção primária fundamental, a mais importante de nossa vida a influenciar as informações que alguém recebe.
O livro de John Mearsheimer sobre o hábito de mentir dos governantes, da Editora Zahar, debruça-se sobre o que ele chama de mentiras estratégicas , e uma das muitas facetas dessas mentiras para o bem da pátria é a difusão do medo.
Está aí a raiz da recente propaganda partidária do PT, apelando para o receio do que classificam de retrocesso caso a sigla seja derrotada nas urnas. Para se contrapor à tendência à mudança que as pesquisas apontam como a principal motivação para o voto nesta eleição.
É interessante observar que, embora esteja na frente nas pesquisas, a presidente Dilma concorre à reeleição com dificuldades que a fazem dizer uma frase como a revelada por Renato Maurício Prado no GLOBO, num encontro da presidente com jornalistas esportivos recentemente no Palácio da Alvorada em Brasília: É a minha hora. E vou até o fim. Perdendo ou ganhando .
As primeiras campanhas propagandísticas com vistas à reeleição foram realizadas com o objetivo de evitar a derrota, o que indica uma fragilidade que não seria de se supor em uma presidente de posse de todas as forças inerentes ao cargo que ocupa. O que revela que ela não tem pleno controle dessas forças.
Não é de estranhar que esse tenha sido o caminho escolhido pelo marqueteiro João Santana, que já admitiu certa vez que, numa campanha, trabalham-se produções simbólicas , tentando captar o imaginário da população , não exatamente a verdade dos fatos.
Nessa guerra que se avizinha, como em todas as guerras, a verdade é a primeira vítima, na frase famosa atribuída geralmente ao senador americano Hiram Johnson. Em sua obra A República , Platão afirma que os governantes têm o direito de não dizer a verdade para os cidadãos, e até mesmo de mentir no interesse da própria cidade .
O governo Dilma leva essa permissão platônica ao pé da letra e cria um mundo de ficção que esbarra na realidade. É o caso dos aeroportos, que Dilma declarou ontem prontos para receber os milhões de turistas esperados para a Copa.
É por isso que estamos vendo um verdadeiro festival de traições nos bastidores da política, à medida que a campanha eleitoral vai se aproximando das datas marcadas pelo calendário oficial para a definição das candidaturas.
Quem mais sofre nessas situações é o governo, que tem mais a perder do que a depauperada oposição. A começar pelos minutos de propaganda oficial, que podem dar a Dilma quase três vezes o tempo do candidato em 2º nas pesquisas, o senador Aécio Neves, do PSDB.
Cada minuto retirado da principal oponente pode valer até o dobro para a oposição, e quem tem tempo de propaganda para negociar, como o PMDB (perto de 5 minutos) ou o PSD (cerca de 2 minutos), ganha dimensões políticas que a atuação parlamentar muitas vezes não justifica.
A vice-presidência da chapa tucana está na mesa de negociações, enquanto Michel Temer, do PMDB, o vice de Dilma Rousseff, precisa ser ratificado na convenção de junho para garantir aos governistas a hegemonia na propaganda partidária.
Correndo por fora, a dupla Eduardo Campos-Marina Silva joga com a rejeição aos políticos tradicionais para superar as barreiras logísticas impostas pela fragilidade de suas bases partidárias formais.
O que já desandou na estratégia política governista foi a realização da Copa do Mundo como instrumento galvanizador dos anseios nacionais. Ao contrário, as necessidades da população nos grandes centros urbanos do país contrastam com a orgia de gastos públicos nos 12 estádios, colocando em xeque, talvez pela 1ª vez na História do país tratando-se de futebol, as prioridades do governo, definidas em detrimento das mais prementes demandas da população.
A seleção não deixará de ser a pátria de chuteiras , na definição perene de Nelson Rodrigues, mas o patriotismo não servirá de refúgio para as deficiências do governo.
Ir a pé ou ir de trem - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 20/05
Convenhamos: no que mesmo o ex-presidente Luiz Inácio da Silva ajuda a campanha pela reeleição da presidente Dilma Rousseff quando trata com menosprezo questões que têm o apoio da população?
A capacidade de Lula de dizer coisas desprovidas de sentido é conhecida, faz parte do seu show. A novidade é a tendência de fazê-lo em contradição ao manual do populismo, cuja regra de ouro é dizer coisas que soem agradáveis, sábias e lógicas aos ouvidos da maioria.
Nessa fase em que volta com força à cena política convenientemente protegido por plateias simpáticas ou por entrevista à imprensa estrangeira que nem sempre dispõe de todos os dados da realidade nacional para contestá-lo, o ex-presidente tem fugido à sua prática de não entrar em divididas com o senso comum.
Há três exemplos recentes. Comecemos pelo último por ser, do ponto de vista dessa mudança de comportamento, o mais eloquente.
Se não falasse a blogueiros reverentes, mas a um público eclético que encontrasse na rua (onde, aliás, não tem circulado), Lula teria a ousadia de dizer que considera uma tolice (em expressão mais grosseira) as pessoas quererem estações de metrô nos estádios de futebol? Na melhor das hipóteses seria educadamente contestado. Na pior, estrepitosamente vaiado.
Nem o mais insensível integrante da "zelite" seria capaz de um pouco caso desta ordem: "Nós (os brasileiros) não temos problema em andar a pé". Os torcedores, acrescentou, vão aos estádios de qualquer jeito: "descalço, de bicicleta, de jumento".
Sim, e também vão de ônibus lotados, em seus carros para serem extorquidos pelos guardadores. Mas, por que precisam ter desqualificado o natural anseio por um maior conforto urbano? Ou Lula está dizendo que o brasileiro deve se conformar com pouco? Se não quis, disse. Que transporte público de qualidade é luxo desnecessário, dispensável para quem anda sem sapatos e, se preciso for, se locomove no lombo de jumentos. Certamente não por escolha.
Lula, por boa contingência da vida, conta com transporte terrestre e aéreo à disposição, trata da saúde no Sírio-Libanês e não enfrenta desconfortos do cotidiano. Nada contra, desde que não faça pouco caso de quem se ache no direito de querer algo além de comida (cara) no prato, serviços públicos de péssima qualidade e apelos à gratidão eterna para um governo que se tem na conta de inventor do Brasil.
No terceiro caso o ex-presidente fez uma conta em entrevista a uma jornalista portuguesa: o julgamento do mensalão foi 20% jurídico e 80% político. Pois segundo as pesquisas, é mais ou menos este último o porcentual de brasileiros que consideram o resultado justo.
O apoio quase unânime da população às condenações feitas pelo STF significa reconhecimento de que houve um tratamento equânime no julgamento de crimes cometidos por poderosos, algo que vai ao encontro de uma aspiração civilizatória. As pessoas se sentiram bem.
Repetindo o raciocínio acima: o ex-presidente teria coragem de repetir - e mais, justificar - essa argumentação em discurso para público não selecionado previamente? Dificilmente.
Assim como seria de se ver para crer se Lula defenderia o controle dos meios de comunicação que, segundo ele, tratam com "desrespeito" a presidente Dilma Rousseff, diante das mesmas plateias que a têm recebido com vaias.
Ressurreição. Para o governo não é uma boa notícia a ordem do ministro Teori Zavascki para soltar os presos da Operação Lava Jato, notadamente o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa.
Até agora quem porventura teme o que teriam a dizer estava salvo. Soltos, serão alvo de pressão para falar no Congresso. Seja em alguma das CPIs para investigar a Petrobrás ou nas comissões da Câmara e do Senado. O assunto ganha novo gás.
Convenhamos: no que mesmo o ex-presidente Luiz Inácio da Silva ajuda a campanha pela reeleição da presidente Dilma Rousseff quando trata com menosprezo questões que têm o apoio da população?
A capacidade de Lula de dizer coisas desprovidas de sentido é conhecida, faz parte do seu show. A novidade é a tendência de fazê-lo em contradição ao manual do populismo, cuja regra de ouro é dizer coisas que soem agradáveis, sábias e lógicas aos ouvidos da maioria.
Nessa fase em que volta com força à cena política convenientemente protegido por plateias simpáticas ou por entrevista à imprensa estrangeira que nem sempre dispõe de todos os dados da realidade nacional para contestá-lo, o ex-presidente tem fugido à sua prática de não entrar em divididas com o senso comum.
Há três exemplos recentes. Comecemos pelo último por ser, do ponto de vista dessa mudança de comportamento, o mais eloquente.
Se não falasse a blogueiros reverentes, mas a um público eclético que encontrasse na rua (onde, aliás, não tem circulado), Lula teria a ousadia de dizer que considera uma tolice (em expressão mais grosseira) as pessoas quererem estações de metrô nos estádios de futebol? Na melhor das hipóteses seria educadamente contestado. Na pior, estrepitosamente vaiado.
Nem o mais insensível integrante da "zelite" seria capaz de um pouco caso desta ordem: "Nós (os brasileiros) não temos problema em andar a pé". Os torcedores, acrescentou, vão aos estádios de qualquer jeito: "descalço, de bicicleta, de jumento".
Sim, e também vão de ônibus lotados, em seus carros para serem extorquidos pelos guardadores. Mas, por que precisam ter desqualificado o natural anseio por um maior conforto urbano? Ou Lula está dizendo que o brasileiro deve se conformar com pouco? Se não quis, disse. Que transporte público de qualidade é luxo desnecessário, dispensável para quem anda sem sapatos e, se preciso for, se locomove no lombo de jumentos. Certamente não por escolha.
Lula, por boa contingência da vida, conta com transporte terrestre e aéreo à disposição, trata da saúde no Sírio-Libanês e não enfrenta desconfortos do cotidiano. Nada contra, desde que não faça pouco caso de quem se ache no direito de querer algo além de comida (cara) no prato, serviços públicos de péssima qualidade e apelos à gratidão eterna para um governo que se tem na conta de inventor do Brasil.
No terceiro caso o ex-presidente fez uma conta em entrevista a uma jornalista portuguesa: o julgamento do mensalão foi 20% jurídico e 80% político. Pois segundo as pesquisas, é mais ou menos este último o porcentual de brasileiros que consideram o resultado justo.
O apoio quase unânime da população às condenações feitas pelo STF significa reconhecimento de que houve um tratamento equânime no julgamento de crimes cometidos por poderosos, algo que vai ao encontro de uma aspiração civilizatória. As pessoas se sentiram bem.
Repetindo o raciocínio acima: o ex-presidente teria coragem de repetir - e mais, justificar - essa argumentação em discurso para público não selecionado previamente? Dificilmente.
Assim como seria de se ver para crer se Lula defenderia o controle dos meios de comunicação que, segundo ele, tratam com "desrespeito" a presidente Dilma Rousseff, diante das mesmas plateias que a têm recebido com vaias.
Ressurreição. Para o governo não é uma boa notícia a ordem do ministro Teori Zavascki para soltar os presos da Operação Lava Jato, notadamente o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa.
Até agora quem porventura teme o que teriam a dizer estava salvo. Soltos, serão alvo de pressão para falar no Congresso. Seja em alguma das CPIs para investigar a Petrobrás ou nas comissões da Câmara e do Senado. O assunto ganha novo gás.
Diante do espelho - JOSÉ CASADO
O GLOBO - 20/05
‘O que aconteceu?’ — talvez seja a melhor pergunta que a candidata Dilma possa fazer para a presidente. Resposta sincera seria confissão, sem absolvição
Começa amanhã uma nova rodada de pesquisas de intenção de voto em todo o país. PT, PSDB e PSB informam não apostar em surpresas na tendência do eleitorado quanto à disputa presidencial. Concentram atenção na expectativa de mudanças a partir de 2015.
Por isso, pesquisadores do Ibope, por exemplo, voltam às ruas de mais de 700 cidades com uma pergunta objetiva: “Gostaria que mudasse totalmente o governo do país?”
Mês passado, mais de dois terços (68%) dos entrevistados do Ibope disseram esperar alguma mudança na forma de governar o país. Quando questionados se desejavam mudar “com Dilma no governo ou com outro presidente’’, 64% indicaram “outro presidente’’, 25% citaram “Dilma” e 11% não souberam dizer ou não responderam.
Esse retrato, confirmado em outras pesquisas, mostra um ambiente político diferente — e contrário — ao dos meses anteriores à eleição de Dilma Rousseff, em 2010, quando a simples continuidade de governo era percebida como um valor. Na prática, reafirma-se hoje algo perceptível nas ruas desde o ano passado.
Avançou a percepção de perda de horizonte de progresso pessoal e coletivo. Em campanha, isso dá realce à crítica sobre a gerência rudimentar do governo em serviços básicos como saúde, educação, transporte e segurança, pelos quais se paga 36% do Produto Interno Bruto em tributos — carga equivalente à média da Europa.
As pesquisas, em geral, espelham uma ansiedade por crescimento econômico com serviços públicos de melhor qualidade.
Nos últimos três anos o país cresceu à média de 1,9% (aumento do PIB, descontada a inflação). Esse ritmo de avanço é dos menores da história da República, demonstra Reinaldo Gonçalves no livro “Desenvolvimento às avessas’’.
Ao comparar o desempenho de Dilma com o de outros 29 presidentes, no período entre 1890 e 2014, ele conclui que o atual governo estacionou em 28º lugar, com o terceiro pior desempenho da história republicana: “Só não perde para os de Fernando Collor (queda de 1,3% no PIB) e Floriano Peixoto (declínio de 7,5%).”
Sob Collor, ressalva, o país enfrentou crise institucional (com impeachment), e com Floriano atravessou autêntica guerra civil — “a capital (o Rio) foi bombardeada durante seis meses’’.
O quadro não melhora quando o Brasil de Dilma é observado no mapa-múndi. Entre 2011 e 2013, a economia brasileira cresceu 2,5%; e a mundial, 3,5%.
O país (com 1,9%) ficou abaixo da metade da média de crescimento (4,3%) de 152 países em desenvolvimento — entre os 188 acompanhados pelo Fundo Monetário Internacional, esclarece Gonçalves. A situação permanece ruim quando se compara à vizinhança: os 32 países da América Latina e do Caribe cresceram muito mais (3,2%).
Em 2010, Dilma Rousseff se apresentou, com êxito, como melhor alternativa para “gerenciar” o progresso dos brasileiros. Hoje, informam as pesquisas, apenas um em cada quatro eleitores a reconhecem como opção para realizar as mudanças desejadas. “O que aconteceu?” — talvez seja a melhor pergunta que a candidata Dilma possa fazer para a presidente na intimidade do espelho. Resposta sincera seria confissão, sem absolvição.
‘O que aconteceu?’ — talvez seja a melhor pergunta que a candidata Dilma possa fazer para a presidente. Resposta sincera seria confissão, sem absolvição
Começa amanhã uma nova rodada de pesquisas de intenção de voto em todo o país. PT, PSDB e PSB informam não apostar em surpresas na tendência do eleitorado quanto à disputa presidencial. Concentram atenção na expectativa de mudanças a partir de 2015.
Por isso, pesquisadores do Ibope, por exemplo, voltam às ruas de mais de 700 cidades com uma pergunta objetiva: “Gostaria que mudasse totalmente o governo do país?”
Mês passado, mais de dois terços (68%) dos entrevistados do Ibope disseram esperar alguma mudança na forma de governar o país. Quando questionados se desejavam mudar “com Dilma no governo ou com outro presidente’’, 64% indicaram “outro presidente’’, 25% citaram “Dilma” e 11% não souberam dizer ou não responderam.
Esse retrato, confirmado em outras pesquisas, mostra um ambiente político diferente — e contrário — ao dos meses anteriores à eleição de Dilma Rousseff, em 2010, quando a simples continuidade de governo era percebida como um valor. Na prática, reafirma-se hoje algo perceptível nas ruas desde o ano passado.
Avançou a percepção de perda de horizonte de progresso pessoal e coletivo. Em campanha, isso dá realce à crítica sobre a gerência rudimentar do governo em serviços básicos como saúde, educação, transporte e segurança, pelos quais se paga 36% do Produto Interno Bruto em tributos — carga equivalente à média da Europa.
As pesquisas, em geral, espelham uma ansiedade por crescimento econômico com serviços públicos de melhor qualidade.
Nos últimos três anos o país cresceu à média de 1,9% (aumento do PIB, descontada a inflação). Esse ritmo de avanço é dos menores da história da República, demonstra Reinaldo Gonçalves no livro “Desenvolvimento às avessas’’.
Ao comparar o desempenho de Dilma com o de outros 29 presidentes, no período entre 1890 e 2014, ele conclui que o atual governo estacionou em 28º lugar, com o terceiro pior desempenho da história republicana: “Só não perde para os de Fernando Collor (queda de 1,3% no PIB) e Floriano Peixoto (declínio de 7,5%).”
Sob Collor, ressalva, o país enfrentou crise institucional (com impeachment), e com Floriano atravessou autêntica guerra civil — “a capital (o Rio) foi bombardeada durante seis meses’’.
O quadro não melhora quando o Brasil de Dilma é observado no mapa-múndi. Entre 2011 e 2013, a economia brasileira cresceu 2,5%; e a mundial, 3,5%.
O país (com 1,9%) ficou abaixo da metade da média de crescimento (4,3%) de 152 países em desenvolvimento — entre os 188 acompanhados pelo Fundo Monetário Internacional, esclarece Gonçalves. A situação permanece ruim quando se compara à vizinhança: os 32 países da América Latina e do Caribe cresceram muito mais (3,2%).
Em 2010, Dilma Rousseff se apresentou, com êxito, como melhor alternativa para “gerenciar” o progresso dos brasileiros. Hoje, informam as pesquisas, apenas um em cada quatro eleitores a reconhecem como opção para realizar as mudanças desejadas. “O que aconteceu?” — talvez seja a melhor pergunta que a candidata Dilma possa fazer para a presidente na intimidade do espelho. Resposta sincera seria confissão, sem absolvição.
Comício do plano-safra - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 20/05
Em mais um comício patrocinado pelo governo, a presidente Dilma Rousseff aproveitou o lançamento do Plano Agrícola e Pecuário 2014/2015 para falar da contribuição do PT à criação de uma agricultura eficiente e competitiva, como se nada ou quase nada tivesse ocorrido nos 30 anos anteriores à chegada dos petistas ao poder. A cômica versão dilmista do "nunca antes na história deste país" pode ter enganado algum cidadão patologicamente desinformado. Como outras patranhas petistas, é fácil de desmenti-la com dados oficiais de produção e produtividade. Se a intenção fosse apenas lançar mais um plano de apoio à produção, como se faz todo ano, a comparação com o governo tucano - de resto ingênua e inepta - teria sido dispensável. A referência foi obviamente mais um lance eleitoral, mas a oradora havia sido mal instruída sobre temas como produção e produtividade.
A presidente mencionou "dificuldades" no início da gestão petista para "fazer uma política de crédito adequada". Além disso, comparou a produção de grãos e oleaginosas no ano anterior à posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - 96,8 milhões de toneladas em 40,2 milhões de hectares - com a estimada para este ano, 191,2 milhões em 56,4 milhões de hectares. "Tamanho crescimento da produtividade somente é possível com muita pesquisa e muito trabalho qualificado", pontificou. Trabalho de quem: do governo petista?
Para falar sobre produção e eficiência a presidente deveria ter mobilizado mais informações. Isso teria servido para ilustrá-la um pouco mais e talvez poupá-la de algumas bobagens. Síntese dos fatos: a produção cresceu mais nos anos 90 que na década seguinte e mais neste segundo período que nas três safras de 2010/11 a 2013/14.
A transformação da agropecuária brasileira numa das mais eficientes e competitivas foi trabalho de décadas. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi fundada nos anos 70. Resultados de seu esforço começaram a tornar-se visíveis nos anos 80 e apareceram ainda mais claramente nos 90. Uma das consequências foi a redução do peso dos alimentos no orçamento familiar, fato logo registrado pelos institutos de pesquisa de preços.
Na safra 1990/91, o País colheu 57,9 milhões de toneladas em 37,89 milhões de hectares. Em 2000/01, a produção chegou a 100,27 milhões de toneladas, em 37,85 milhões de hectares. A produção cresceu, portanto, 73,17%, enquanto a terra cultivada diminuiu ligeiramente.
Entre as safras de 2000/01 e a de 2010/11, o total produzido aumentou 62,63%, para 162,8 milhões de toneladas, e a área ocupada cresceu 31,75%, para 49,87 milhões de hectares. A produção cresceu rapidamente, mas os ganhos de produtividade foram obviamente muito mais lentos. A safra 2013/2014 está estimada em 191,2 milhões de toneladas (mais 17,44%). A área usada passou a 56,4 milhões de hectares (aumento de 13,09%). A produção por hectare expandiu-se em média pouco menos que 1,2% ao ano nesse período. No decênio anterior, a taxa média havia sido de 2,1%.
Não cabe discutir agora se a presidente Dilma Rousseff distorceu os fatos intencionalmente ou, como ocorre com frequência, por mera ignorância. De toda forma, se ela de fato estivesse interessada em contar a história tal como se passou, teria de mencionar o esforço do presidente Lula para aparelhar a Embrapa para permitir a reorientação ideológica de seu programa de pesquisas. Teria citado o apoio a invasores de terras e a insegurança criada entre os produtores rurais por erros políticos dos governos petistas.
Teria lembrado também os longos anos sem investimento em logística (o PT está no poder desde 2003) e os enormes problemas dos exportadores, nos últimos anos, para embarcar seus produtos.
Era objetivo da presidente, sabia-se desde antes do discurso, conquistar o apoio eleitoral dos empresários do agronegócio. Por segurança, cuidou também dos interesses da indústria automobilística, anunciando a renovação de crédito especial para equipamentos. Esse tipo de apoio à modernização agrícola está longe de ser uma inovação petista, embora alguns jovens desprevenidos até possam acreditar nisso.
Em mais um comício patrocinado pelo governo, a presidente Dilma Rousseff aproveitou o lançamento do Plano Agrícola e Pecuário 2014/2015 para falar da contribuição do PT à criação de uma agricultura eficiente e competitiva, como se nada ou quase nada tivesse ocorrido nos 30 anos anteriores à chegada dos petistas ao poder. A cômica versão dilmista do "nunca antes na história deste país" pode ter enganado algum cidadão patologicamente desinformado. Como outras patranhas petistas, é fácil de desmenti-la com dados oficiais de produção e produtividade. Se a intenção fosse apenas lançar mais um plano de apoio à produção, como se faz todo ano, a comparação com o governo tucano - de resto ingênua e inepta - teria sido dispensável. A referência foi obviamente mais um lance eleitoral, mas a oradora havia sido mal instruída sobre temas como produção e produtividade.
A presidente mencionou "dificuldades" no início da gestão petista para "fazer uma política de crédito adequada". Além disso, comparou a produção de grãos e oleaginosas no ano anterior à posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - 96,8 milhões de toneladas em 40,2 milhões de hectares - com a estimada para este ano, 191,2 milhões em 56,4 milhões de hectares. "Tamanho crescimento da produtividade somente é possível com muita pesquisa e muito trabalho qualificado", pontificou. Trabalho de quem: do governo petista?
Para falar sobre produção e eficiência a presidente deveria ter mobilizado mais informações. Isso teria servido para ilustrá-la um pouco mais e talvez poupá-la de algumas bobagens. Síntese dos fatos: a produção cresceu mais nos anos 90 que na década seguinte e mais neste segundo período que nas três safras de 2010/11 a 2013/14.
A transformação da agropecuária brasileira numa das mais eficientes e competitivas foi trabalho de décadas. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi fundada nos anos 70. Resultados de seu esforço começaram a tornar-se visíveis nos anos 80 e apareceram ainda mais claramente nos 90. Uma das consequências foi a redução do peso dos alimentos no orçamento familiar, fato logo registrado pelos institutos de pesquisa de preços.
Na safra 1990/91, o País colheu 57,9 milhões de toneladas em 37,89 milhões de hectares. Em 2000/01, a produção chegou a 100,27 milhões de toneladas, em 37,85 milhões de hectares. A produção cresceu, portanto, 73,17%, enquanto a terra cultivada diminuiu ligeiramente.
Entre as safras de 2000/01 e a de 2010/11, o total produzido aumentou 62,63%, para 162,8 milhões de toneladas, e a área ocupada cresceu 31,75%, para 49,87 milhões de hectares. A produção cresceu rapidamente, mas os ganhos de produtividade foram obviamente muito mais lentos. A safra 2013/2014 está estimada em 191,2 milhões de toneladas (mais 17,44%). A área usada passou a 56,4 milhões de hectares (aumento de 13,09%). A produção por hectare expandiu-se em média pouco menos que 1,2% ao ano nesse período. No decênio anterior, a taxa média havia sido de 2,1%.
Não cabe discutir agora se a presidente Dilma Rousseff distorceu os fatos intencionalmente ou, como ocorre com frequência, por mera ignorância. De toda forma, se ela de fato estivesse interessada em contar a história tal como se passou, teria de mencionar o esforço do presidente Lula para aparelhar a Embrapa para permitir a reorientação ideológica de seu programa de pesquisas. Teria citado o apoio a invasores de terras e a insegurança criada entre os produtores rurais por erros políticos dos governos petistas.
Teria lembrado também os longos anos sem investimento em logística (o PT está no poder desde 2003) e os enormes problemas dos exportadores, nos últimos anos, para embarcar seus produtos.
Era objetivo da presidente, sabia-se desde antes do discurso, conquistar o apoio eleitoral dos empresários do agronegócio. Por segurança, cuidou também dos interesses da indústria automobilística, anunciando a renovação de crédito especial para equipamentos. Esse tipo de apoio à modernização agrícola está longe de ser uma inovação petista, embora alguns jovens desprevenidos até possam acreditar nisso.
Burocracia agrava efeitos da seca no Nordeste - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 20/05
Moradores dos locais em que poços foram perfurados continuam a depender de caminhões-pipa, devido à lentidão de diversos órgãos públicos
O gigantismo do Estado brasileiro é tema conhecido. Não apenas pelo fato de a própria formação histórica do país ter reservado um papel extremo ao poder público, uma herança da Coroa portuguesa, como pela sua ingerência na esfera privada de todos, cidadãos e empresas. Nos últimos tempos, dada a prevalência da visão estatista em Brasília, o Estado tem atuado numa infinidade de campos: na formação de preços de bens e serviços, até naquilo que o brasileiro pode ou não comprar nas farmácias, e assim por diante.
Para exercer uma miríade de funções, há uma gigantesca máquina burocrática, a qual, apenas no Executivo, abriga quase um milhão de servidores ativos, dado de 2012. Nos chamados “cargos de confiança” — preenchidos sem a necessidade de concurso, geralmente usados para empregar militantes políticos aliados ou mesmo familiares —, há aproximadamente 22 mil pessoas. No início do primeiro governo Lula, eram 18 mil.
Um argumento a favor desta obesidade estatal é que um país com os desníveis sociais e precariedades do Brasil requer mesmo governos superlotados de servidores para mitigar as carências do povo. Balela. No domingo, O GLOBO trouxe a história emblemática de um programa de perfuração de 21 poços profundos para retirar água no interior do Nordeste. Anunciado em reunião da Sudene pela presidente Dilma, em abril de 2013, em meio a uma das piores secas na região, o mais do que necessário programa é um fracasso. E não porque inexista água no subsolo.
Como é praxe no mundo dos gastos públicos, a óbvia urgência do projeto justificou a perfuração de 17 dos poços sem concorrência — o que sempre dá margem a negócios escusos. Mas pelo menos parte do trabalho foi feita. O problema mais grave viria depois, quando o programa, como tantos outros, atolou na lama espessa da burocracia deste Estado onipresente.
Há 14 poços concluídos mas que não produzem uma gota de água porque faltam bombas ou energia elétrica ou adutoras ou tudo. O excesso de órgãos e a própria arraigada cultura da burocracia pátria conseguiram travar o programa. De “urgente”, a perfuração dos poços parou em gavetas de autarquias e departamentos, nem todas no âmbito do Ministério da Integração Nacional, responsável direto pelo programa. Os obstáculos são inúmeros. Municípios pequenos, por exemplo, como vários da região, têm de buscar dinheiro na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para construir adutoras e instalar redes de abastecimento. E de lá os recursos não são liberados com facilidade.
Dessa forma, os moradores dos locais em que os poços foram abertos continuam a depender da visita de caminhões-pipa para encher vasilhames e estocar água em casa, enquanto esperam a burocracia.
No aspecto político, o lançamento do programa deve ter rendido muito discurso a favor do povo. Mas água que é bom, nada. Apesar de o Estado brasileiro custar 40% do PIB.
Moradores dos locais em que poços foram perfurados continuam a depender de caminhões-pipa, devido à lentidão de diversos órgãos públicos
O gigantismo do Estado brasileiro é tema conhecido. Não apenas pelo fato de a própria formação histórica do país ter reservado um papel extremo ao poder público, uma herança da Coroa portuguesa, como pela sua ingerência na esfera privada de todos, cidadãos e empresas. Nos últimos tempos, dada a prevalência da visão estatista em Brasília, o Estado tem atuado numa infinidade de campos: na formação de preços de bens e serviços, até naquilo que o brasileiro pode ou não comprar nas farmácias, e assim por diante.
Para exercer uma miríade de funções, há uma gigantesca máquina burocrática, a qual, apenas no Executivo, abriga quase um milhão de servidores ativos, dado de 2012. Nos chamados “cargos de confiança” — preenchidos sem a necessidade de concurso, geralmente usados para empregar militantes políticos aliados ou mesmo familiares —, há aproximadamente 22 mil pessoas. No início do primeiro governo Lula, eram 18 mil.
Um argumento a favor desta obesidade estatal é que um país com os desníveis sociais e precariedades do Brasil requer mesmo governos superlotados de servidores para mitigar as carências do povo. Balela. No domingo, O GLOBO trouxe a história emblemática de um programa de perfuração de 21 poços profundos para retirar água no interior do Nordeste. Anunciado em reunião da Sudene pela presidente Dilma, em abril de 2013, em meio a uma das piores secas na região, o mais do que necessário programa é um fracasso. E não porque inexista água no subsolo.
Como é praxe no mundo dos gastos públicos, a óbvia urgência do projeto justificou a perfuração de 17 dos poços sem concorrência — o que sempre dá margem a negócios escusos. Mas pelo menos parte do trabalho foi feita. O problema mais grave viria depois, quando o programa, como tantos outros, atolou na lama espessa da burocracia deste Estado onipresente.
Há 14 poços concluídos mas que não produzem uma gota de água porque faltam bombas ou energia elétrica ou adutoras ou tudo. O excesso de órgãos e a própria arraigada cultura da burocracia pátria conseguiram travar o programa. De “urgente”, a perfuração dos poços parou em gavetas de autarquias e departamentos, nem todas no âmbito do Ministério da Integração Nacional, responsável direto pelo programa. Os obstáculos são inúmeros. Municípios pequenos, por exemplo, como vários da região, têm de buscar dinheiro na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para construir adutoras e instalar redes de abastecimento. E de lá os recursos não são liberados com facilidade.
Dessa forma, os moradores dos locais em que os poços foram abertos continuam a depender da visita de caminhões-pipa para encher vasilhames e estocar água em casa, enquanto esperam a burocracia.
No aspecto político, o lançamento do programa deve ter rendido muito discurso a favor do povo. Mas água que é bom, nada. Apesar de o Estado brasileiro custar 40% do PIB.
Insistir na transparência - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 20/05
Desde maio de 2012, a população brasileira tem a sua disposição a Lei de Acesso à Informação, que obriga o Estado a prestar contas de suas atividades. Em vigor há dois anos, a norma ainda enfrenta alguns obstáculos no poder público.
A ONG Artigo 19, dedicada a promover a liberdade de informação, avaliou 51 órgãos federais do Executivo, Legislativo e Judiciário. Levando em conta tanto a quantidade de pedidos de informação atendidos como a qualidade das respostas oferecidas, a entidade concluiu que há aspectos a serem melhorados nos três Poderes, embora não deixe de reconhecer avanços.
Coube à Justiça o pior desempenho no levantamento. Tradicionalmente o mais fechado dos Poderes, o Judiciário já teve destaque positivo em balanços da Lei de Acesso.
Em 2013, por exemplo, verificou-se que quase todos os Tribunais de Justiça davam publicidade aos vencimentos de seus membros. Decisões judiciais, além disso, têm ajudado a garantir o cumprimento dessa legislação de controle social.
A julgar pelo relatório da Artigo 19, contudo, o Judiciário deixou de progredir. De um total de 106 pedidos que lhe foram enviados, 84 foram respondidos. No Executivo, houve resposta a 346 das 350 demandas; no Legislativo, todas as 18 requisições foram atendidas.
Embora tenham sido consideradas 11 instituições relacionadas à Justiça --incluindo Ministério Público Federal e órgãos de controle--, 21 das 22 recusas vieram dos cinco tribunais regionais federais.
Do ponto de vista quantitativo, os números como um todo são auspiciosos. O quadro piora, porém, quando se analisa a qualidade da informação que o cidadão recebe. Na média dos três Poderes, 66,7% das solicitações foram consideradas satisfatórias; no Judiciário, o percentual é de 54,7%. Ou seja, em boa parte dos casos as respostas são incompletas ou inadequadas.
A transparência da Justiça --nesse caso, ao lado do Legislativo-- também frustra quanto às informações que deveriam estar disponíveis em local de fácil acesso e via internet, como gastos orçamentários.
Sem deixar de reconhecer os progressos de órgãos que até pouco tempo atrás não saíam das sombras, é preciso insistir na plena aplicação dos ditames da Lei de Acesso à Informação. Trata-se de valioso meio para aumentar a eficiência do Estado e tornar mais eficaz o combate à corrupção.
Desde maio de 2012, a população brasileira tem a sua disposição a Lei de Acesso à Informação, que obriga o Estado a prestar contas de suas atividades. Em vigor há dois anos, a norma ainda enfrenta alguns obstáculos no poder público.
A ONG Artigo 19, dedicada a promover a liberdade de informação, avaliou 51 órgãos federais do Executivo, Legislativo e Judiciário. Levando em conta tanto a quantidade de pedidos de informação atendidos como a qualidade das respostas oferecidas, a entidade concluiu que há aspectos a serem melhorados nos três Poderes, embora não deixe de reconhecer avanços.
Coube à Justiça o pior desempenho no levantamento. Tradicionalmente o mais fechado dos Poderes, o Judiciário já teve destaque positivo em balanços da Lei de Acesso.
Em 2013, por exemplo, verificou-se que quase todos os Tribunais de Justiça davam publicidade aos vencimentos de seus membros. Decisões judiciais, além disso, têm ajudado a garantir o cumprimento dessa legislação de controle social.
A julgar pelo relatório da Artigo 19, contudo, o Judiciário deixou de progredir. De um total de 106 pedidos que lhe foram enviados, 84 foram respondidos. No Executivo, houve resposta a 346 das 350 demandas; no Legislativo, todas as 18 requisições foram atendidas.
Embora tenham sido consideradas 11 instituições relacionadas à Justiça --incluindo Ministério Público Federal e órgãos de controle--, 21 das 22 recusas vieram dos cinco tribunais regionais federais.
Do ponto de vista quantitativo, os números como um todo são auspiciosos. O quadro piora, porém, quando se analisa a qualidade da informação que o cidadão recebe. Na média dos três Poderes, 66,7% das solicitações foram consideradas satisfatórias; no Judiciário, o percentual é de 54,7%. Ou seja, em boa parte dos casos as respostas são incompletas ou inadequadas.
A transparência da Justiça --nesse caso, ao lado do Legislativo-- também frustra quanto às informações que deveriam estar disponíveis em local de fácil acesso e via internet, como gastos orçamentários.
Sem deixar de reconhecer os progressos de órgãos que até pouco tempo atrás não saíam das sombras, é preciso insistir na plena aplicação dos ditames da Lei de Acesso à Informação. Trata-se de valioso meio para aumentar a eficiência do Estado e tornar mais eficaz o combate à corrupção.
O céu como limite - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
GAZETA DO POVO - PR - 20/05
O financiamento das campanhas é um dos itens que devem compor um novo arcabouço legislativo que estabeleça regras claras e dê legitimidade inquestionável aos mandatos eletivos
Aquilo que a lei não proibir é permitido. Ao que parece, esse será o princípio que regerá os gastos dos partidos com a campanha deste ano. Como o próprio ministro Dias Toffoli, novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), admitiu, não há teto de gastos a ser obedecidos pelos partidos e candidatos nas eleições a não ser que o Congresso consiga a façanha de votar uma lei que estabeleça o valor máximo de despesas de campanha até o dia 10 junho. A definição sobre a legalidade das doações de empresas – outra medida que poderia ter impacto no custeio das campanhas – ainda está em discussão no o Supremo Tribunal Federal (STF) e, segundo Toffoli, mesmo que o Supremo conclua o julgamento logo, a medida só poderá ser obedecida a partir do ano que vem.
Ou seja, no pleito de 2014, deverá valer ainda o “liberou geral”. Desde que partidos e candidatos prestem contas ao TSE e desde que não se configure o uso do caixa dois – isto é, aquelas receitas por baixo do pano, “não contabilizadas”, como diria Delúbio Soares – não há como punir gastos exagerados nem impedir que empresas continuem irrigando de recursos as campanhas eleitorais deste ano. Mais uma vez, portanto, a disputa eleitoral será marcada pela influência do poder econômico na construção dos resultados que emergirão das urnas de outubro próximo.
O tema é candente e de alto interesse público. As afirmações do ministro Toffoli – a quem caberá presidir os processos eleitorais durante os próximos dois anos – trazem à tona a já tão velha quanto adiada questão da reforma político-eleitoral, uma necessidade que se torna tão mais urgente quanto mais se constatam as graves distorções que contaminam a democracia direta que o país pretende estar praticando. O financiamento das campanhas é um dos muitos itens que devem compor um novo e vasto arcabouço legislativo que estabeleça regras claras, equalize as oportunidades do cidadão de votar e ser votado, valorize o voto popular e dê legitimidade inquestionável aos mandatos eletivos. Sabe-se que o poder econômico pode viciar o processo, facilitando a eleição para os que mais podem financeiramente e dificultando que os cidadãos que não contam com as mesmas facilidades de financiamento.
A reforma política, porém, não sai do papel, a não ser em pedaços. Deputados e senadores, aos quais competiria formular a legislação, preferem salvaguardar seus próprios mandatos a criar regras que os coloquem em perigo. Nas ocasiões em que o tema chega a ser debatido no Congresso, a primeira preocupação que lhes ocorre é justamente a de estabelecer medidas em relação ao financiamento das campanhas. E aparece, então, a proposta de que quem deve arcar com os gastos de cada um é o próprio povo pela via do “financiamento público”. Mas seria esse o remédio ideal para acabar com o abominável caixa dois? Quem garante que, além da abertura dos cofres públicos, não se abram também à sorrelfa os cofres privados interessados em eleger partidos, candidatos ou grupos em troca de contrapartidas futuras? Os fundos partidários e os programas eleitorais “gratuitos” nas redes de rádio e televisão já são mantidos com recursos públicos, mas nem por isso são fatores de inibição da prática deslavada de abusos.
Não há como falar em financiamento público de campanhas, nem da legitimidade ou não das doações de empresas, se esses temas não estiverem conectados com as tantas outras normas que devem ser criadas para reger os processos eleitorais, dando-lhes a legitimidade e a higidez necessárias. Discutir a questão do financiamento sem antes debater e definir outros temas importantes, como, por exemplo, a possibilidade de voto distrital ou formas de evitar a multiplicação de partidos de aluguel, é uma inversão de prioridades. Lamentável que, como diz Toffoli, o poder econômico não possa ser contido já nesta eleição, mas ainda mais lamentável é que os políticos se recusem tão insistentemente (e convenientemente!) a fazer um debate amplo, abrangente e efetivo sobre a reforma política em todos os seus múltiplos aspectos.
O financiamento das campanhas é um dos itens que devem compor um novo arcabouço legislativo que estabeleça regras claras e dê legitimidade inquestionável aos mandatos eletivos
Aquilo que a lei não proibir é permitido. Ao que parece, esse será o princípio que regerá os gastos dos partidos com a campanha deste ano. Como o próprio ministro Dias Toffoli, novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), admitiu, não há teto de gastos a ser obedecidos pelos partidos e candidatos nas eleições a não ser que o Congresso consiga a façanha de votar uma lei que estabeleça o valor máximo de despesas de campanha até o dia 10 junho. A definição sobre a legalidade das doações de empresas – outra medida que poderia ter impacto no custeio das campanhas – ainda está em discussão no o Supremo Tribunal Federal (STF) e, segundo Toffoli, mesmo que o Supremo conclua o julgamento logo, a medida só poderá ser obedecida a partir do ano que vem.
Ou seja, no pleito de 2014, deverá valer ainda o “liberou geral”. Desde que partidos e candidatos prestem contas ao TSE e desde que não se configure o uso do caixa dois – isto é, aquelas receitas por baixo do pano, “não contabilizadas”, como diria Delúbio Soares – não há como punir gastos exagerados nem impedir que empresas continuem irrigando de recursos as campanhas eleitorais deste ano. Mais uma vez, portanto, a disputa eleitoral será marcada pela influência do poder econômico na construção dos resultados que emergirão das urnas de outubro próximo.
O tema é candente e de alto interesse público. As afirmações do ministro Toffoli – a quem caberá presidir os processos eleitorais durante os próximos dois anos – trazem à tona a já tão velha quanto adiada questão da reforma político-eleitoral, uma necessidade que se torna tão mais urgente quanto mais se constatam as graves distorções que contaminam a democracia direta que o país pretende estar praticando. O financiamento das campanhas é um dos muitos itens que devem compor um novo e vasto arcabouço legislativo que estabeleça regras claras, equalize as oportunidades do cidadão de votar e ser votado, valorize o voto popular e dê legitimidade inquestionável aos mandatos eletivos. Sabe-se que o poder econômico pode viciar o processo, facilitando a eleição para os que mais podem financeiramente e dificultando que os cidadãos que não contam com as mesmas facilidades de financiamento.
A reforma política, porém, não sai do papel, a não ser em pedaços. Deputados e senadores, aos quais competiria formular a legislação, preferem salvaguardar seus próprios mandatos a criar regras que os coloquem em perigo. Nas ocasiões em que o tema chega a ser debatido no Congresso, a primeira preocupação que lhes ocorre é justamente a de estabelecer medidas em relação ao financiamento das campanhas. E aparece, então, a proposta de que quem deve arcar com os gastos de cada um é o próprio povo pela via do “financiamento público”. Mas seria esse o remédio ideal para acabar com o abominável caixa dois? Quem garante que, além da abertura dos cofres públicos, não se abram também à sorrelfa os cofres privados interessados em eleger partidos, candidatos ou grupos em troca de contrapartidas futuras? Os fundos partidários e os programas eleitorais “gratuitos” nas redes de rádio e televisão já são mantidos com recursos públicos, mas nem por isso são fatores de inibição da prática deslavada de abusos.
Não há como falar em financiamento público de campanhas, nem da legitimidade ou não das doações de empresas, se esses temas não estiverem conectados com as tantas outras normas que devem ser criadas para reger os processos eleitorais, dando-lhes a legitimidade e a higidez necessárias. Discutir a questão do financiamento sem antes debater e definir outros temas importantes, como, por exemplo, a possibilidade de voto distrital ou formas de evitar a multiplicação de partidos de aluguel, é uma inversão de prioridades. Lamentável que, como diz Toffoli, o poder econômico não possa ser contido já nesta eleição, mas ainda mais lamentável é que os políticos se recusem tão insistentemente (e convenientemente!) a fazer um debate amplo, abrangente e efetivo sobre a reforma política em todos os seus múltiplos aspectos.
Atraso no saneamento - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 20/05
Em mais uma das festas político-eleitorais que sua equipe tem organizado para tentar impulsionar sua cambaleante pré-campanha de reeleição - desta vez para o lançamento da terceira etapa do PAC do Saneamento -, a presidente Dilma Rousseff pelo menos reconheceu que, nessa área, a situação é grave e, por isso, é preciso "avançar mais". Imediatamente, porém, tratou de atribuir a responsabilidade pelo quadro ainda calamitoso do saneamento no País a seus antecessores mais remotos - pois o mais próximo, o ex-presidente Lula, foi quem a lançou na vida política e é hoje seu principal trunfo eleitoral.
Ela teria sido mais precisa se reconhecesse que, nos últimos anos, independentemente da cor partidária dos governantes, houve melhoras nas estatísticas de atendimento da população com água tratada e encanada e com a coleta de esgotos. Esse avanço é reconhecido internacionalmente, e não ocorreu apenas de 2003 (início da gestão do PT) para cá. Vem de governos anteriores.
Segundo estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o número de brasileiros com acesso a serviços de saneamento básico aumentou 15% entre 2000 e 2012. Nesse período, mais 31,7 milhões de pessoas passaram a dispor de melhores instalações sanitárias e mais 29,7 milhões, a dispor de água tratada.
A comparação com outros países, porém, revela que foram avanços modestos, e não por responsabilidade deste ou daquele governo. Num período de 13 anos (de 2000 a 2012), 10 dos quais o País foi governado pelo PT, a expansão dos serviços de saneamento no Brasil, de 15%, foi menor do que a da China (17%), do México (19%), da África do Sul (21%) e da Índia (24%). Mais foi igual à da Argentina, governada desde 2003 pelos Kirchners.
Apesar dos avanços, a situação continua ruim. Apenas 48,1% dos brasileiros dispõem de serviços de coleta de esgotos e somente 37,5% do esgoto coletado é tratado, de acordo com dados do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento citados em recentes trabalhos do Instituto Trata Brasil - uma organização não vinculada ao governo criada para mobilizar a sociedade para assegurar a universalização dos serviços de saneamento básico.
As más condições de higiene em que vive boa parte da população causam doenças que podem provocar morte, sobretudo de crianças - daí a participação da Unicef nos estudos da OMS sobre saneamento básico. A população adulta também está sujeita a moléstias causadas pela falta de saneamento básico, como diarreias, hepatite do tipo A, doenças de pele, verminoses e outras.
Além das graves consequências sociais, a falta de saneamento tem custos financeiros elevados, que incluem os tratamentos hospitalares e as perdas de produção decorrentes de doenças causadas por más condições sanitárias das moradias dos trabalhadores. Uma pesquisa recente patrocinada pelo Instituto Trata Brasil e realizada pela Fundação Getúlio Vargas constatou que, anualmente, 217 mil trabalhadores precisam se afastar de suas atividades por causa de problemas gastrointestinais ligados à falta de saneamento.
O poder público, em seus três níveis, vem tentando minimizar o problema. A terceira etapa do PAC do Saneamento anunciada pela presidente prevê investimentos de R$ 2,8 bilhões em obras de abastecimento de água e coleta de esgotos em 655 municípios com menos de 50 mil habitantes. Mas há muitos outros que necessitam de apoio federal, pois as pequenas cidades são as que enfrentam maiores dificuldades técnicas e financeiras para elaborar planos de saneamento.
O problema atinge também cidades grandes. Das 100 maiores do País, 34 ainda não têm seu plano de saneamento básico. A elaboração desses planos é uma exigência da Lei Geral de Saneamento Básico, de 2007. O prazo para a oficialização desses planos era dezembro do ano passado, mas, por causa do atraso de boa parte das prefeituras, foi prorrogado para o fim de 2015. A partir de então, a liberação de recursos federais para saneamento estará condicionada à existência desses planos.
Em mais uma das festas político-eleitorais que sua equipe tem organizado para tentar impulsionar sua cambaleante pré-campanha de reeleição - desta vez para o lançamento da terceira etapa do PAC do Saneamento -, a presidente Dilma Rousseff pelo menos reconheceu que, nessa área, a situação é grave e, por isso, é preciso "avançar mais". Imediatamente, porém, tratou de atribuir a responsabilidade pelo quadro ainda calamitoso do saneamento no País a seus antecessores mais remotos - pois o mais próximo, o ex-presidente Lula, foi quem a lançou na vida política e é hoje seu principal trunfo eleitoral.
Ela teria sido mais precisa se reconhecesse que, nos últimos anos, independentemente da cor partidária dos governantes, houve melhoras nas estatísticas de atendimento da população com água tratada e encanada e com a coleta de esgotos. Esse avanço é reconhecido internacionalmente, e não ocorreu apenas de 2003 (início da gestão do PT) para cá. Vem de governos anteriores.
Segundo estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o número de brasileiros com acesso a serviços de saneamento básico aumentou 15% entre 2000 e 2012. Nesse período, mais 31,7 milhões de pessoas passaram a dispor de melhores instalações sanitárias e mais 29,7 milhões, a dispor de água tratada.
A comparação com outros países, porém, revela que foram avanços modestos, e não por responsabilidade deste ou daquele governo. Num período de 13 anos (de 2000 a 2012), 10 dos quais o País foi governado pelo PT, a expansão dos serviços de saneamento no Brasil, de 15%, foi menor do que a da China (17%), do México (19%), da África do Sul (21%) e da Índia (24%). Mais foi igual à da Argentina, governada desde 2003 pelos Kirchners.
Apesar dos avanços, a situação continua ruim. Apenas 48,1% dos brasileiros dispõem de serviços de coleta de esgotos e somente 37,5% do esgoto coletado é tratado, de acordo com dados do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento citados em recentes trabalhos do Instituto Trata Brasil - uma organização não vinculada ao governo criada para mobilizar a sociedade para assegurar a universalização dos serviços de saneamento básico.
As más condições de higiene em que vive boa parte da população causam doenças que podem provocar morte, sobretudo de crianças - daí a participação da Unicef nos estudos da OMS sobre saneamento básico. A população adulta também está sujeita a moléstias causadas pela falta de saneamento básico, como diarreias, hepatite do tipo A, doenças de pele, verminoses e outras.
Além das graves consequências sociais, a falta de saneamento tem custos financeiros elevados, que incluem os tratamentos hospitalares e as perdas de produção decorrentes de doenças causadas por más condições sanitárias das moradias dos trabalhadores. Uma pesquisa recente patrocinada pelo Instituto Trata Brasil e realizada pela Fundação Getúlio Vargas constatou que, anualmente, 217 mil trabalhadores precisam se afastar de suas atividades por causa de problemas gastrointestinais ligados à falta de saneamento.
O poder público, em seus três níveis, vem tentando minimizar o problema. A terceira etapa do PAC do Saneamento anunciada pela presidente prevê investimentos de R$ 2,8 bilhões em obras de abastecimento de água e coleta de esgotos em 655 municípios com menos de 50 mil habitantes. Mas há muitos outros que necessitam de apoio federal, pois as pequenas cidades são as que enfrentam maiores dificuldades técnicas e financeiras para elaborar planos de saneamento.
O problema atinge também cidades grandes. Das 100 maiores do País, 34 ainda não têm seu plano de saneamento básico. A elaboração desses planos é uma exigência da Lei Geral de Saneamento Básico, de 2007. O prazo para a oficialização desses planos era dezembro do ano passado, mas, por causa do atraso de boa parte das prefeituras, foi prorrogado para o fim de 2015. A partir de então, a liberação de recursos federais para saneamento estará condicionada à existência desses planos.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
“Vai ter Copa!”
Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, para quem a Copa do Mundo já começou
NOVA JOGADA COM MP FAVORECE AS SEGURADORAS
Está na pauta da Câmara, nesta terça, a medida provisória nº 633, com penduricalhos como o que livra as seguradoras de pagar indenizações milionárias a mutuários do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Os lobistas a chamam de "MP dos R$ 17 bi" ou "MP da Sul América Seguros". As seguradoras têm perdido na Justiça, mas, com a MP 633, a Caixa passa a intervir, deslocando as ações para a Justiça Federal, garantindo novo julgamento para tentar reverter o que hoje é perdido.
ESTÁ NO CONTRATO
Mutuários do SFH ajuízam ações por falhas de construção (rachaduras, infiltrações etc.), gerando indenizações bilionárias das seguradoras.
MP DOS R$ 17 BILHÕES
Somadas, todas as ações indenizatórias podem obrigar as seguradoras a pagar mais de R$ 17 bilhões aos mutuários do SFH.
BAIXO INVESTIMENTO
Somente a Sul América, "mãe" da MP 633, investe na sua aprovação para não ter de pagar indenizações que somam mais de R$ 7 bilhões.
MP INCONSTITUCIONAL
A MP 633 trata de matéria processual civil, vedada pela Constituição. E a maioria dos deputados nem sequer desconfia do que está por trás.
SUBMUNDO DA CORRUPÇÃO FAZ FESTA COM SOLTURA
O submundo da corrupção, ferido de morte com a Operação Lava Jato, da Polícia Federal, está em festas desde a decisão de soltar os 12 presos, e suspender a tramitação de inquéritos e ações penais. Inclusive pelo crime de obstrução da Justiça. Familiares e amigos dos meliantes presos deixaram seus afazeres, incluindo trabalho e escola, para começar a festejar antes mesmo da libertação deles.
INCÔMODO
A prisão de Paulo Roberto Costa era considerada a mais "incômoda". Não por acaso, até como autor do recurso, foi o primeiro a ser solto.
ELE FAZ MÁGICA
Advogado de Paulo Roberto Costa, Fernando Fernandes, jacta-se em seu site, de obter decisões que "inauguram linhas jurisprudenciais".
VELOCIDADE DA LUZ
O ministro Teori Zavascki, do STF, liberou os presos na Operação Lava Jato. Ok. Agora, é esperar que não sumam a jato também.
MINISTRO DA VALE
Apesar de nem sempre constar da agenda oficial, o CEO e presidente da Vale, Murilo Ferreira, é quem mais despacha com Dilma: esteve com ela mais do que qualquer ministro da Esplanada, este ano.
IMPACTO ZERO
Estudo do banco suíço UBS relata que a Copa quase não tem impacto nas economias locais. Em 1998, na França, e 2006, na Alemanha, "nem sequer houve impacto positivo em turismo, emprego ou renda".
BARRIGA CHEIA
Lula e o PT reclamam da imprensa, mas ninguém explorou a imagem de Dilma discursando, no evento do PT, enquanto um petista exibia à frente um cartaz dizendo que meliantes presos estavam "presentes".
SEQUELADOS
A Petrobras divulgou que a refinaria superfaturada em mais de R$ 1,4 bilhão, de Pasadena, ganhou "prêmio" por um ano sem acidentes de trabalho. Mas com sequelas nos contribuintes surrupiados.
CAPACETE
Servidores da Rádio Senado podem ter que usar capacete. Pedaços de reboco caem do teto na entrada de um dos estúdios. Nesta segunda-feira, um deles quase foi atingido por um pedaço de tijolo com cimento.
PREVARICAÇÃO
Deveria existir um Procon para os Procons. No DF, empresas que rotineiramente desrespeitam o consumidor estão livres para atormentá-los ainda mais por três semanas. É o prazo fixado pelo Procon-DF de "suspensão do atendimento ao público" para realizar um "treinamento".
TOP SECRET
Até pintores e pedreiros são assunto de segurança nacional, para os arapongas da Agência Brasileira de Inteligência: atos no Diário Oficial omitem seus nomes; só exibem as matrículas.
PADIM CIÇO
Eduardo Campos quer crescer no Nordeste. Marcou para 31 de maio e 1º de junho visita a Juazeiro do Norte (CE), onde visitará a estátua de Padre Cícero. Dirá que se sente cearense, como o avô Miguel Arraes.
PENSANDO BEM...
...foi uma verdadeira ideia de jerico de Lula mandar os torcedores irem até de jegue aos estádios por falta de metrô.
Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, para quem a Copa do Mundo já começou
NOVA JOGADA COM MP FAVORECE AS SEGURADORAS
Está na pauta da Câmara, nesta terça, a medida provisória nº 633, com penduricalhos como o que livra as seguradoras de pagar indenizações milionárias a mutuários do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Os lobistas a chamam de "MP dos R$ 17 bi" ou "MP da Sul América Seguros". As seguradoras têm perdido na Justiça, mas, com a MP 633, a Caixa passa a intervir, deslocando as ações para a Justiça Federal, garantindo novo julgamento para tentar reverter o que hoje é perdido.
ESTÁ NO CONTRATO
Mutuários do SFH ajuízam ações por falhas de construção (rachaduras, infiltrações etc.), gerando indenizações bilionárias das seguradoras.
MP DOS R$ 17 BILHÕES
Somadas, todas as ações indenizatórias podem obrigar as seguradoras a pagar mais de R$ 17 bilhões aos mutuários do SFH.
BAIXO INVESTIMENTO
Somente a Sul América, "mãe" da MP 633, investe na sua aprovação para não ter de pagar indenizações que somam mais de R$ 7 bilhões.
MP INCONSTITUCIONAL
A MP 633 trata de matéria processual civil, vedada pela Constituição. E a maioria dos deputados nem sequer desconfia do que está por trás.
SUBMUNDO DA CORRUPÇÃO FAZ FESTA COM SOLTURA
O submundo da corrupção, ferido de morte com a Operação Lava Jato, da Polícia Federal, está em festas desde a decisão de soltar os 12 presos, e suspender a tramitação de inquéritos e ações penais. Inclusive pelo crime de obstrução da Justiça. Familiares e amigos dos meliantes presos deixaram seus afazeres, incluindo trabalho e escola, para começar a festejar antes mesmo da libertação deles.
INCÔMODO
A prisão de Paulo Roberto Costa era considerada a mais "incômoda". Não por acaso, até como autor do recurso, foi o primeiro a ser solto.
ELE FAZ MÁGICA
Advogado de Paulo Roberto Costa, Fernando Fernandes, jacta-se em seu site, de obter decisões que "inauguram linhas jurisprudenciais".
VELOCIDADE DA LUZ
O ministro Teori Zavascki, do STF, liberou os presos na Operação Lava Jato. Ok. Agora, é esperar que não sumam a jato também.
MINISTRO DA VALE
Apesar de nem sempre constar da agenda oficial, o CEO e presidente da Vale, Murilo Ferreira, é quem mais despacha com Dilma: esteve com ela mais do que qualquer ministro da Esplanada, este ano.
IMPACTO ZERO
Estudo do banco suíço UBS relata que a Copa quase não tem impacto nas economias locais. Em 1998, na França, e 2006, na Alemanha, "nem sequer houve impacto positivo em turismo, emprego ou renda".
BARRIGA CHEIA
Lula e o PT reclamam da imprensa, mas ninguém explorou a imagem de Dilma discursando, no evento do PT, enquanto um petista exibia à frente um cartaz dizendo que meliantes presos estavam "presentes".
SEQUELADOS
A Petrobras divulgou que a refinaria superfaturada em mais de R$ 1,4 bilhão, de Pasadena, ganhou "prêmio" por um ano sem acidentes de trabalho. Mas com sequelas nos contribuintes surrupiados.
CAPACETE
Servidores da Rádio Senado podem ter que usar capacete. Pedaços de reboco caem do teto na entrada de um dos estúdios. Nesta segunda-feira, um deles quase foi atingido por um pedaço de tijolo com cimento.
PREVARICAÇÃO
Deveria existir um Procon para os Procons. No DF, empresas que rotineiramente desrespeitam o consumidor estão livres para atormentá-los ainda mais por três semanas. É o prazo fixado pelo Procon-DF de "suspensão do atendimento ao público" para realizar um "treinamento".
TOP SECRET
Até pintores e pedreiros são assunto de segurança nacional, para os arapongas da Agência Brasileira de Inteligência: atos no Diário Oficial omitem seus nomes; só exibem as matrículas.
PADIM CIÇO
Eduardo Campos quer crescer no Nordeste. Marcou para 31 de maio e 1º de junho visita a Juazeiro do Norte (CE), onde visitará a estátua de Padre Cícero. Dirá que se sente cearense, como o avô Miguel Arraes.
PENSANDO BEM...
...foi uma verdadeira ideia de jerico de Lula mandar os torcedores irem até de jegue aos estádios por falta de metrô.
segunda-feira, maio 19, 2014
Relatório sobre as abelhas - LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SP - 19/05
O quanto ainda teríamos que avançar para chegar em tal estado de equilíbrio e qualidade de vida?
Há alguns meses, por uma dessas contingências da vida, acordei, no meio de uma tarde de verão quente, com gritos. Desci as escadas em minha frente e vi uma nuvem negra sobre o quintal. Tratava-se de uma invasão de abelhas.
Mais tarde, o especialista me explicou que elas haviam decidido se instalar ali, e logo que começassem a produzir mel se tornariam agressivas. Era urgente que, com todo cuidado que seres em extinção merecem, fossem convencidas a partir. Do contrário, se tornariam senhoras da casa.
Antes de continuar, um reparo: ainda movido pelo espanto, tentamos com as autoridades competentes do local uma solução para a invasão. Soubemos, com novo espanto, que apenas especialistas poderiam dar conta do fenômeno relacionado à decisão das abelhas de ali se instalarem. Sem dúvida que, para elas, detalhes como o fato de aquilo tudo ter sido fruto do trabalho de alguns outros seres que não elas pouco importavam.
Diante da pergunta, "mas se não acharmos um especialista em convencê-las a sair, teremos que aceitá-las em nossa casa?", as autoridades responderam sem pestanejar, "nada se pode fazer contra elas". De novo, com ainda mais espanto, ingenuamente, perguntamos, "mas estamos trancados com todos os cachorros e crianças em casa porque elas tomaram conta do quintal!". De novo, com a tranquilidade de quem enuncia algo decidido numa assembleia soberana: "Nada se pode fazer contra elas". Resumo da ópera: tudo dependia do especialista.
Mas paremos o relatório por enquanto. Voltemos ao momento em que eu despertava do sono. Quando eu contemplava a chegada das abelhas e sua decisão de habitar ali, pensei que maravilha deve ser viver assim, de modo coletivo. A paixão pela vida coletiva deve ser algo inspirado pelos deuses, esse seres que gostam de nos atormentar, às vezes fingindo que não existem, às vezes nos chicoteando para que evoluamos na direção da vida em colmeia.
Já não me lembro se sonhei ou se esse fragmento que narro abaixo de fato aconteceu na minha conversa com o especialista.
Disse-me ele que alguns estudos avançados em ciências cognitivas mostram o nível de prazer (o "gozo da colmeia") que elas, abelhas, esses seres evoluídos, sentem quando colocadas em frente a telas coloridas e cheias de luz. As abelhas, esses seres evoluídos, realizam melhor suas superconsciências coletivas quando colocadas diante de redes compostas por letras, imagens e números.
De volta ao que de fato sabemos que ocorreu naquela tarde quente de verão quando acordei com a chegada das abelhas livres. Para mim foi impossível não pensar no grande Franz Kafka, o profeta da esquizofrenia moderna.
Sabemos que certa feita o sábio de Praga falou que o darwinismo não o assustava pelo que dizia do nosso passado, mas sim o assustava pelo que poderia significar para as próximas gerações. Nutro uma grande simpatia, como o leitor atento bem sabe, pelo darwinismo e sua tragédia cósmica de violência, ordem cega e acaso. Mas não posso deixar de pensar que nosso sábio de Praga tinha alguma razão quanto ao efeito nefasto que uma teoria que nos aproxima tanto dos animais poderia ter sobre as gerações futuras.
A paixão pelo "gozo da colmeia" (fato científico) me faz pensar nessa profecia kafkiana. O modo como as invasoras decidiam, ali mesmo, em meio ao ar, em sua assembleia de consciências coletivas, para aonde iam, quem ia fazer o quê, e quem mandava, me causou espanto. O quanto ainda teríamos que avançar para chegar em tal estado de equilíbrio e qualidade de vida?
Por fim, confesso, reli o fabuloso "Relatório para uma Academia" de Kafka (um conto "evolucionista" no qual ele narra a epopeia de um macaco que "vira" humano, ao longo de uma viagem em que aprende a imitar homens e é levado a academia como grande trunfo da ciência). Abri o texto assim como quem busca um versículo que ilumine a vida e achei a seguinte pérola:
"Durante o dia não quero vê-la; pois ela tem no olhar a loucura do perturbado animal amestrado; isso só eu reconheço e não consigo suportá-lo".
O quanto ainda teríamos que avançar para chegar em tal estado de equilíbrio e qualidade de vida?
Há alguns meses, por uma dessas contingências da vida, acordei, no meio de uma tarde de verão quente, com gritos. Desci as escadas em minha frente e vi uma nuvem negra sobre o quintal. Tratava-se de uma invasão de abelhas.
Mais tarde, o especialista me explicou que elas haviam decidido se instalar ali, e logo que começassem a produzir mel se tornariam agressivas. Era urgente que, com todo cuidado que seres em extinção merecem, fossem convencidas a partir. Do contrário, se tornariam senhoras da casa.
Antes de continuar, um reparo: ainda movido pelo espanto, tentamos com as autoridades competentes do local uma solução para a invasão. Soubemos, com novo espanto, que apenas especialistas poderiam dar conta do fenômeno relacionado à decisão das abelhas de ali se instalarem. Sem dúvida que, para elas, detalhes como o fato de aquilo tudo ter sido fruto do trabalho de alguns outros seres que não elas pouco importavam.
Diante da pergunta, "mas se não acharmos um especialista em convencê-las a sair, teremos que aceitá-las em nossa casa?", as autoridades responderam sem pestanejar, "nada se pode fazer contra elas". De novo, com ainda mais espanto, ingenuamente, perguntamos, "mas estamos trancados com todos os cachorros e crianças em casa porque elas tomaram conta do quintal!". De novo, com a tranquilidade de quem enuncia algo decidido numa assembleia soberana: "Nada se pode fazer contra elas". Resumo da ópera: tudo dependia do especialista.
Mas paremos o relatório por enquanto. Voltemos ao momento em que eu despertava do sono. Quando eu contemplava a chegada das abelhas e sua decisão de habitar ali, pensei que maravilha deve ser viver assim, de modo coletivo. A paixão pela vida coletiva deve ser algo inspirado pelos deuses, esse seres que gostam de nos atormentar, às vezes fingindo que não existem, às vezes nos chicoteando para que evoluamos na direção da vida em colmeia.
Já não me lembro se sonhei ou se esse fragmento que narro abaixo de fato aconteceu na minha conversa com o especialista.
Disse-me ele que alguns estudos avançados em ciências cognitivas mostram o nível de prazer (o "gozo da colmeia") que elas, abelhas, esses seres evoluídos, sentem quando colocadas em frente a telas coloridas e cheias de luz. As abelhas, esses seres evoluídos, realizam melhor suas superconsciências coletivas quando colocadas diante de redes compostas por letras, imagens e números.
De volta ao que de fato sabemos que ocorreu naquela tarde quente de verão quando acordei com a chegada das abelhas livres. Para mim foi impossível não pensar no grande Franz Kafka, o profeta da esquizofrenia moderna.
Sabemos que certa feita o sábio de Praga falou que o darwinismo não o assustava pelo que dizia do nosso passado, mas sim o assustava pelo que poderia significar para as próximas gerações. Nutro uma grande simpatia, como o leitor atento bem sabe, pelo darwinismo e sua tragédia cósmica de violência, ordem cega e acaso. Mas não posso deixar de pensar que nosso sábio de Praga tinha alguma razão quanto ao efeito nefasto que uma teoria que nos aproxima tanto dos animais poderia ter sobre as gerações futuras.
A paixão pelo "gozo da colmeia" (fato científico) me faz pensar nessa profecia kafkiana. O modo como as invasoras decidiam, ali mesmo, em meio ao ar, em sua assembleia de consciências coletivas, para aonde iam, quem ia fazer o quê, e quem mandava, me causou espanto. O quanto ainda teríamos que avançar para chegar em tal estado de equilíbrio e qualidade de vida?
Por fim, confesso, reli o fabuloso "Relatório para uma Academia" de Kafka (um conto "evolucionista" no qual ele narra a epopeia de um macaco que "vira" humano, ao longo de uma viagem em que aprende a imitar homens e é levado a academia como grande trunfo da ciência). Abri o texto assim como quem busca um versículo que ilumine a vida e achei a seguinte pérola:
"Durante o dia não quero vê-la; pois ela tem no olhar a loucura do perturbado animal amestrado; isso só eu reconheço e não consigo suportá-lo".
A culpa é do diabo - PAULO GUEDES
O GLOBO - 19/05
Combate à inflação sem disciplina fiscal faz taxa de acumulação de capital maior que taxa de crescimento e aumenta desigualdade
A Grande Recessão nas economias avançadas explica a celebridade instantânea de O capital no século XXI (2014), de Thomas Piketty. Como a queda do Muro de Berlim e os atentados de 11 de Setembro trouxeram popularidade ao Fim da História (1992), de Francis Fukuyama, e O choque das civilizações (2001), de Samuel Huntington. Cada época tem seu fenômeno político, midiático e editorial, argumenta o escritor venezuelano Moisés Naím, em artigo no jornal O Estado de S. Paulo de ontem.
Atribuir ao capitalismo a desigualdade econômica em toda parte e através dos tempos é tão simplista quanto atribuir ao diabo todos os males do mundo. Sim, a desigualdade cresce quando a taxa de remuneração do capital é maior que a taxa de crescimento econômico. Se a acumulação de riqueza sob forma de patrimônio imobiliário, ativos financeiros como ações e títulos de renda fixa ocorre a ritmo superior ao do crescimento da renda na economia, uma fatia cada vez maior do bolo está sendo apropriada pelos ricos. Os ricos abocanham também parcelas crescentes da renda se o governo estimula artificialmente os ganhos de capital nos mercados imobiliário e de ações e garante a riqueza acumulada em operações de salvamento de instituições financeiras, enquanto cai a fatia da remuneração do trabalho, que segue travada pela competição asiática. Se há períodos de selvagem acumulação capitalista, há também permanente destruição criativa de indústrias inteiras por inovações, bem como destruição financeira por investimentos excessivos ou em setores equivocados.
Os governos podem também criar ou destruir riqueza, concentrar ou desconcentrar renda. Décadas de combate à inflação sem disciplina fiscal aumentam a desigualdade no Brasil, pois os juros altos garantem elevada taxa de acumulação do capital financeiro e derrubam nossa taxa de crescimento. Por outro lado, o marco regulatório (tucano) que estimulou a ampliação da oferta privada de vagas universitárias e os programas (petistas) de democratização do acesso (Prouni, Pronatec, Fies) garantem a acumulação de capital humano em ritmo muito acima ao do crescimento econômico. Essa redistribuição da riqueza em uma sociedade do conhecimento é uma promessa de erradicação da pobreza, maior produtividade e desconcentração de renda no futuro.
Atribuir ao capitalismo a desigualdade econômica em toda parte e através dos tempos é tão simplista quanto atribuir ao diabo todos os males do mundo. Sim, a desigualdade cresce quando a taxa de remuneração do capital é maior que a taxa de crescimento econômico. Se a acumulação de riqueza sob forma de patrimônio imobiliário, ativos financeiros como ações e títulos de renda fixa ocorre a ritmo superior ao do crescimento da renda na economia, uma fatia cada vez maior do bolo está sendo apropriada pelos ricos. Os ricos abocanham também parcelas crescentes da renda se o governo estimula artificialmente os ganhos de capital nos mercados imobiliário e de ações e garante a riqueza acumulada em operações de salvamento de instituições financeiras, enquanto cai a fatia da remuneração do trabalho, que segue travada pela competição asiática. Se há períodos de selvagem acumulação capitalista, há também permanente destruição criativa de indústrias inteiras por inovações, bem como destruição financeira por investimentos excessivos ou em setores equivocados.
Os governos podem também criar ou destruir riqueza, concentrar ou desconcentrar renda. Décadas de combate à inflação sem disciplina fiscal aumentam a desigualdade no Brasil, pois os juros altos garantem elevada taxa de acumulação do capital financeiro e derrubam nossa taxa de crescimento. Por outro lado, o marco regulatório (tucano) que estimulou a ampliação da oferta privada de vagas universitárias e os programas (petistas) de democratização do acesso (Prouni, Pronatec, Fies) garantem a acumulação de capital humano em ritmo muito acima ao do crescimento econômico. Essa redistribuição da riqueza em uma sociedade do conhecimento é uma promessa de erradicação da pobreza, maior produtividade e desconcentração de renda no futuro.
Mudança e medo - RICARDO NOBLAT
O GLOBO - 19/05
"Determinados setores parecem desejar o fracasso da Copa, como se disso dependessem as suas chances eleitorais".
Lula, no jornal "El País"
Na última quinta-feira, ao receber para jantar no Palácio da Alvorada dez jornalistas esportivos, Dilma pôs um ponto final na discussão sobre se será ela ou Lula o candidato a presidente na eleição de outubro próximo. Disse em resposta a uma pergunta: "É a minha hora. E vou até o fim. Perdendo ou ganhando". Lembrou que, em 2006, por essa mesma época, Lula tinha índices piores do que ela nas pesquisas.
MENOS, DILMA, MENOS. Em maio de 2006, Lula tinha 45% das intenções de voto, segundo o instituto Datafolha.
Sua tendência era de alta. Pesquisa aplicada este mês conferiu a Dilma 37% com tendência de queda. Os mesmos 37% que ela alcançou em maio de 2010, ano em que se elegeu. Naquela ocasião estava crescendo.
O DESEJO DE MUDANÇA em 2006 e 2010 não foi medido por pesquisas tornadas públicas. Deveria ser baixo, do contrário Lula não se reelegeria com tanta folga nem elegeria Dilma. Este mês, o desejo de mudança atingiu 72% no Datafolha. Noutras palavras: pouco mais de sete em cada dez eleitores querem que o futuro presidente governe em parte ou de forma totalmente diferente de Dilma.
A DE OUTUBRO será a sétima eleição presidencial pelo voto popular desde o fim da ditadura militar de 1964, que durou 21 anos. A primeira eleição foi em dezembro de 1989. Apresentaram-se 22 candidatos.
O brasileiro votou apenas para presidente.
Fernando Collor e Lula, que encarnaram a mudança em relação "a tudo", disputaram o segundo turno.
Collor ganhou apertado.
FERNANDO HENRIQUE se elegeu em 1994 como o candidato da continuidade. Havia sido ministro da Fazenda de Itamar Franco, o vice que substituíra Collor, cassado pelo Congresso sob a suspeita de ser corrupto. Deveu a eleição ao Plano Real, que levou sua assinatura. O plano introduziu uma nova moeda, reduziu ao mínimo a inflação que chegara a mais de 80% ao mês e estabilizou a economia.
A CONTINUIDADE VOLTOU a triunfar em 1998, quando o Real ainda teve fôlego para reeleger Fernando Henrique. Em 2002, com o desemprego subindo, venceu a mudança: elegeu-se Lula. Nas eleições seguintes de 2006 e 2010, sustentada pelos resultados dos programas sociais e de uma melhor distribuição de renda, a continuidade venceu com Lula e Dilma. "A mulher de Lula", como Dilma se tornou conhecida, jamais disputara uma eleição.
EMPENHADO, AGORA, em interromper a queda de Dilma nas pesquisas, o PT sacou de uma velha arma comum às campanhas de todos os partidos e candidatos que se veem em clara desvantagem: o medo. A arma foi usada em um comercial do PT na televisão. Atores representaram pessoas bem de vida confrontadas com o risco de se tornarem miseráveis.
Dará certo? Deu para Collor em 1989, que assustou eleitores dizendo que Lula ameaçava a democracia e a economia de mercado.
O MEDO FICOU de fora da eleição de 1994, mas ajudou Fernando Henrique a bater Lula quatro anos mais tarde. Foi dito que o Plano Real naufragaria se Lula vencesse. A "esperança venceu o medo" em 2002 e elegeu Lula. Que se valeu do medo para derrotar Geraldo Alckmin na eleição de 2006. Foi dito que as empresas estatais seriam privatizadas se Alckmin vencesse.
O medo perdeu o gás na eleição de 2010.
DÁ-SE COMO VERDADE que o distinto público detesta pancadaria em campanha. Prefere a exposição elegante de boas ideias de governo. Não é assim. A pancadaria costuma funcionar. A arte está em saber calibrar o medo com promessas de felicidade.
MENOS, DILMA, MENOS. Em maio de 2006, Lula tinha 45% das intenções de voto, segundo o instituto Datafolha.
Sua tendência era de alta. Pesquisa aplicada este mês conferiu a Dilma 37% com tendência de queda. Os mesmos 37% que ela alcançou em maio de 2010, ano em que se elegeu. Naquela ocasião estava crescendo.
O DESEJO DE MUDANÇA em 2006 e 2010 não foi medido por pesquisas tornadas públicas. Deveria ser baixo, do contrário Lula não se reelegeria com tanta folga nem elegeria Dilma. Este mês, o desejo de mudança atingiu 72% no Datafolha. Noutras palavras: pouco mais de sete em cada dez eleitores querem que o futuro presidente governe em parte ou de forma totalmente diferente de Dilma.
A DE OUTUBRO será a sétima eleição presidencial pelo voto popular desde o fim da ditadura militar de 1964, que durou 21 anos. A primeira eleição foi em dezembro de 1989. Apresentaram-se 22 candidatos.
O brasileiro votou apenas para presidente.
Fernando Collor e Lula, que encarnaram a mudança em relação "a tudo", disputaram o segundo turno.
Collor ganhou apertado.
FERNANDO HENRIQUE se elegeu em 1994 como o candidato da continuidade. Havia sido ministro da Fazenda de Itamar Franco, o vice que substituíra Collor, cassado pelo Congresso sob a suspeita de ser corrupto. Deveu a eleição ao Plano Real, que levou sua assinatura. O plano introduziu uma nova moeda, reduziu ao mínimo a inflação que chegara a mais de 80% ao mês e estabilizou a economia.
A CONTINUIDADE VOLTOU a triunfar em 1998, quando o Real ainda teve fôlego para reeleger Fernando Henrique. Em 2002, com o desemprego subindo, venceu a mudança: elegeu-se Lula. Nas eleições seguintes de 2006 e 2010, sustentada pelos resultados dos programas sociais e de uma melhor distribuição de renda, a continuidade venceu com Lula e Dilma. "A mulher de Lula", como Dilma se tornou conhecida, jamais disputara uma eleição.
EMPENHADO, AGORA, em interromper a queda de Dilma nas pesquisas, o PT sacou de uma velha arma comum às campanhas de todos os partidos e candidatos que se veem em clara desvantagem: o medo. A arma foi usada em um comercial do PT na televisão. Atores representaram pessoas bem de vida confrontadas com o risco de se tornarem miseráveis.
Dará certo? Deu para Collor em 1989, que assustou eleitores dizendo que Lula ameaçava a democracia e a economia de mercado.
O MEDO FICOU de fora da eleição de 1994, mas ajudou Fernando Henrique a bater Lula quatro anos mais tarde. Foi dito que o Plano Real naufragaria se Lula vencesse. A "esperança venceu o medo" em 2002 e elegeu Lula. Que se valeu do medo para derrotar Geraldo Alckmin na eleição de 2006. Foi dito que as empresas estatais seriam privatizadas se Alckmin vencesse.
O medo perdeu o gás na eleição de 2010.
DÁ-SE COMO VERDADE que o distinto público detesta pancadaria em campanha. Prefere a exposição elegante de boas ideias de governo. Não é assim. A pancadaria costuma funcionar. A arte está em saber calibrar o medo com promessas de felicidade.
O medo do PT - AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP - 19/05
Enquanto o PT faz terrorismo na TV, com o intuito de amedrontar os brasileiros e levá-los a votar pela reeleição da candidata Dilma Rousseff, é importante colocar o debate político nos trilhos da sensatez.
O que terá acontecido para que o partido se lançasse no desespero, no tudo ou nada, antes mesmo da campanha eleitoral começar oficialmente? Resposta: há uma vigorosa exigência de mudança pulsando no coração e na mente dos brasileiros. Para se ter a dimensão daquilo que realmente assusta o PT, vale a pena conferir alguns números pouco conhecidos do último Datafolha.
O desejo de que as ações do próximo presidente sejam diferentes das ações da presidente Dilma já é compartilhado em todas as camadas sociais, incluindo-se os mais pobres e a classe média: 69% entre os que ganham até dois salários mínimos, 76% entre dois e cinco salários mínimos, e 81% entre cinco e dez salários mínimos. Nas regiões Norte e Nordeste, já são 67% favoráveis à mudança. Nas faixas etárias de 16 a 34 anos, pode-se chegar a 80%.
O PT, que sempre se julgou dono de parcelas importantes da população, surpreendeu-se com a grande virada país afora. Não percebeu o esgotamento do falso modelo maniqueísta, dos bons vs. os maus, do nós vs. eles, que permanentemente tentam nos impor.
Com uma trajetória marcada pela arrogância, de dono da verdade, detentor de todas as virtudes, o partido abandonou os ideais sob os quais foi fundado. Da defesa intransigente da ética, acabou sócio da corrupção. Nasceu se apresentando como partido dos trabalhadores; virou um partido financiado pela elite econômica do país. Propunha um novo modo de governar e vem destruindo o patrimônio público dos brasileiros, cujo mais eloquente exemplo é o que ocorre na Petrobras. Pregava o respeito à democracia e vem assumindo, sem constrangimento, a defesa da censura aos meios de comunicação.
Essas e outras contradições estão na base da rejeição enfrentada hoje pelo PT.
Com a nova propaganda, o partido passa a si mesmo um atestado de fracasso. Depois de quase 12 anos no poder, não festeja o que deveria ser o seu legado. Não tendo mais esperança ou confiança, oferece aos brasileiros o medo e a ameaça.
Os fantasmas que estão assustando o país não são os do passado. São os fantasmas do presente. O fantasma da inflação, que voltou a assombrar as famílias, do crescimento medíocre da economia, da corrupção desenfreada, das promessas não cumpridas e da falta de rumo do país.
E, ao final, ainda subestimam a inteligência dos brasileiros ao tentar nos convencer de que, para mudar, é preciso deixar tudo como está.
O novo talvez ainda não tenha nome. Mas o velho tem: chama-se arrogância e manipulação. Chama-se PT.
Enquanto o PT faz terrorismo na TV, com o intuito de amedrontar os brasileiros e levá-los a votar pela reeleição da candidata Dilma Rousseff, é importante colocar o debate político nos trilhos da sensatez.
O que terá acontecido para que o partido se lançasse no desespero, no tudo ou nada, antes mesmo da campanha eleitoral começar oficialmente? Resposta: há uma vigorosa exigência de mudança pulsando no coração e na mente dos brasileiros. Para se ter a dimensão daquilo que realmente assusta o PT, vale a pena conferir alguns números pouco conhecidos do último Datafolha.
O desejo de que as ações do próximo presidente sejam diferentes das ações da presidente Dilma já é compartilhado em todas as camadas sociais, incluindo-se os mais pobres e a classe média: 69% entre os que ganham até dois salários mínimos, 76% entre dois e cinco salários mínimos, e 81% entre cinco e dez salários mínimos. Nas regiões Norte e Nordeste, já são 67% favoráveis à mudança. Nas faixas etárias de 16 a 34 anos, pode-se chegar a 80%.
O PT, que sempre se julgou dono de parcelas importantes da população, surpreendeu-se com a grande virada país afora. Não percebeu o esgotamento do falso modelo maniqueísta, dos bons vs. os maus, do nós vs. eles, que permanentemente tentam nos impor.
Com uma trajetória marcada pela arrogância, de dono da verdade, detentor de todas as virtudes, o partido abandonou os ideais sob os quais foi fundado. Da defesa intransigente da ética, acabou sócio da corrupção. Nasceu se apresentando como partido dos trabalhadores; virou um partido financiado pela elite econômica do país. Propunha um novo modo de governar e vem destruindo o patrimônio público dos brasileiros, cujo mais eloquente exemplo é o que ocorre na Petrobras. Pregava o respeito à democracia e vem assumindo, sem constrangimento, a defesa da censura aos meios de comunicação.
Essas e outras contradições estão na base da rejeição enfrentada hoje pelo PT.
Com a nova propaganda, o partido passa a si mesmo um atestado de fracasso. Depois de quase 12 anos no poder, não festeja o que deveria ser o seu legado. Não tendo mais esperança ou confiança, oferece aos brasileiros o medo e a ameaça.
Os fantasmas que estão assustando o país não são os do passado. São os fantasmas do presente. O fantasma da inflação, que voltou a assombrar as famílias, do crescimento medíocre da economia, da corrupção desenfreada, das promessas não cumpridas e da falta de rumo do país.
E, ao final, ainda subestimam a inteligência dos brasileiros ao tentar nos convencer de que, para mudar, é preciso deixar tudo como está.
O novo talvez ainda não tenha nome. Mas o velho tem: chama-se arrogância e manipulação. Chama-se PT.
A rua petista - DENIS LERRER ROSENFIELD
O GLOBO - 19/05
O País está vivendo uma explosão de manifestações de rua, que contrastam fortemente com as que caracterizaram as Jornadas de Junho. As atuais nada têm de autônomas, independentes, voltadas para uma noção do bem comum, embora esta fosse tomada de forma vaga. Ao contrário, elas se caracterizam pelo controle, são todas oriundas daquilo que se pode considerar como movimentos sociais organizados. O brilho da autonomia está sendo suplantado pela heteronomia.
Logo, qualquer termo de comparação tende a ofuscar o que está realmente em causa. Em comum, têm só a bandeira contra a Copa, pela simples razão de ser uma bandeira que havia sido encampada pelas ruas brasileiras. Cessa aí o que têm em comum.
Note-se que as manifestações de São Paulo foram conduzidas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), que nada mais é do que um braço do MST. Historicamente, esse dito movimento social está umbilicalmente ligado ao PT. Foi, inclusive, acolhido pela presidente da República quando da invasão de uma área urbana próxima ao Itaquerão, um dos palcos da Copa do Mundo. Não faltaram, certamente, intermediários.
A invasão, ao contrário do que vinha sendo a regra do atual governo, deu lugar a um encontro com a presidente, que acabou por adotar um comportamento propriamente lulista. O jogo é perigoso, pois o acolhimento pode dar lugar ao transbordamento.
Ainda em São Paulo, há os protestos de professores municipais, tradicionalmente ligados ao PT, apesar de seu movimento estar dirigido contra uma administração municipal petista. Processo análogo ocorre com os rodoviários do Rio de Janeiro, infernizando a vida dos cariocas, que têm o seu direito de ir e vir simplesmente negado. Em Pernambuco, são policiais militares que entram em greve, desobedecendo flagrante e acintosamente a uma decisão da Justiça do Trabalho que considerou a greve ilegal.
Observe-se, nesses casos, que são ações corporativas, fortemente organizadas, oriundas de demandas sindicais, que foram tradicionalmente veiculadas pelo PT e, atualmente, por grupos mais à esquerda que não mais se reconhecem no atual governo. Estão fazendo um jogo de cena, aproveitando-se da oportunidade da Copa para terem as suas reivindicações atendidas. Ocorre que esta rua não é mais a mesma do ano passado!
Consequentemente, devemos fazer a distinção entre esses diferentes tipos de manifestações e as Jornadas de Junho, na medida em que as atuais são o resultado de ações de grupos organizados, os ditos movimentos sociais, em boa parte controlados pelo PT e, também, por grupos mais à esquerda do espectro político. São manifestações instrumentalizadas, inserindo-se num contexto propriamente eleitoral.
Mais especificamente, algumas correspondem a conflitos internos ao próprio PT ou a pressões de grupos esquerdistas de conquistarem mais espaço por meio de lutas setoriais. Em todo caso, há todo um clima de radicalização que começa a se esboçar. Poder-se-ia mesmo aventar a hipótese de que essa radicalização é fruto da tendência eleitoral de queda da presidente Dilma, abrindo espaço para que conflitos intestinos se potencializem.
Neste contexto, não deixa de ser curiosa a reação dos grupos mais afinados com a ideologia tradicional petista, de corte socialista e anticapitalista. Para eles, a mudança significaria voltar a essa mesma doutrina tradicional do partido, abandonando as acomodações "capitalistas" dos governos Lula e Dilma. Pressionando deste lado, eles procuram ao menos conquistar uma maior fatia do aparelho do Estado, notoriamente menor no governo atual do que no anterior. Pretendem ser mais ouvidos e consultados. Vendem mesmo a ideia - duvidosa - de que eventual empenho eleitoral seu poderia se traduzir pela vitória da candidata petista.
Peguemos o exemplo do MTST. Trata-se, como assinalado, de um braço do MST, que está procurando exercer um papel de protagonismo político nas cidades. Ou seja, estamos diante de uma única organização que comporta vários braços, como o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), a Via Campesina, Movimentos dos Pequenos Agricultores, Movimento das Mulheres Campesinas e assim por diante. A tática consiste em mostrar várias cabeças, como se não fizessem parte do mesmo corpo. Essa tática de luta procura expor amplas ramificações como se fossem independentes, com o intuito de capturar a atenção da mídia e, dessa maneira, favorecer a formação da opinião pública.
Ora, o MST e suas ramificações constituem uma única organização de tipo leninista, fortemente centralizada, organizada em departamentos que seguem hierarquicamente um único comando. Não têm nada de espontâneo. Os seus participantes são militantes que se dedicam totalmente à causa revolucionária. A sua ideologia é nitidamente anticapitalista, advogando por uma sociedade socialista. São, no contexto atual, fervorosos defensores da ditadura cubana e do socialismo bolivariano do "século 21". Em seus discursos, usam para o setor urbano as mesmas bandeiras do rural, como a "reforma agrária", a desapropriação das grandes propriedades, o desrespeito à propriedade privada, a luta contra o lucro e assim por diante. Ocorre que, durante o governo Dilma, eles foram marginalizados, relegados a uma posição de segundo plano.
Note-se, em particular, que, no campo, a política da atual presidente foi a de qualificar os assentamentos e apoiar a agricultura familiar, em vez de privilegiar as desapropriações, que seriam formas de criação de mais favelas rurais. Há, pois, uma inflexão em curso. Ela obedece certamente a razões de ordem eleitoral. Fica, porém, a questão de qual tipo de estratégia política se trata. Não estará a presidente vestindo um figurino de Lula que foi, para ele, eleitoralmente válido quando da primeira eleição e mesmo para a segunda? Será que essa roupa serve para os dois da mesma maneira? Não estará o número errado?
O País está vivendo uma explosão de manifestações de rua, que contrastam fortemente com as que caracterizaram as Jornadas de Junho. As atuais nada têm de autônomas, independentes, voltadas para uma noção do bem comum, embora esta fosse tomada de forma vaga. Ao contrário, elas se caracterizam pelo controle, são todas oriundas daquilo que se pode considerar como movimentos sociais organizados. O brilho da autonomia está sendo suplantado pela heteronomia.
Logo, qualquer termo de comparação tende a ofuscar o que está realmente em causa. Em comum, têm só a bandeira contra a Copa, pela simples razão de ser uma bandeira que havia sido encampada pelas ruas brasileiras. Cessa aí o que têm em comum.
Note-se que as manifestações de São Paulo foram conduzidas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), que nada mais é do que um braço do MST. Historicamente, esse dito movimento social está umbilicalmente ligado ao PT. Foi, inclusive, acolhido pela presidente da República quando da invasão de uma área urbana próxima ao Itaquerão, um dos palcos da Copa do Mundo. Não faltaram, certamente, intermediários.
A invasão, ao contrário do que vinha sendo a regra do atual governo, deu lugar a um encontro com a presidente, que acabou por adotar um comportamento propriamente lulista. O jogo é perigoso, pois o acolhimento pode dar lugar ao transbordamento.
Ainda em São Paulo, há os protestos de professores municipais, tradicionalmente ligados ao PT, apesar de seu movimento estar dirigido contra uma administração municipal petista. Processo análogo ocorre com os rodoviários do Rio de Janeiro, infernizando a vida dos cariocas, que têm o seu direito de ir e vir simplesmente negado. Em Pernambuco, são policiais militares que entram em greve, desobedecendo flagrante e acintosamente a uma decisão da Justiça do Trabalho que considerou a greve ilegal.
Observe-se, nesses casos, que são ações corporativas, fortemente organizadas, oriundas de demandas sindicais, que foram tradicionalmente veiculadas pelo PT e, atualmente, por grupos mais à esquerda que não mais se reconhecem no atual governo. Estão fazendo um jogo de cena, aproveitando-se da oportunidade da Copa para terem as suas reivindicações atendidas. Ocorre que esta rua não é mais a mesma do ano passado!
Consequentemente, devemos fazer a distinção entre esses diferentes tipos de manifestações e as Jornadas de Junho, na medida em que as atuais são o resultado de ações de grupos organizados, os ditos movimentos sociais, em boa parte controlados pelo PT e, também, por grupos mais à esquerda do espectro político. São manifestações instrumentalizadas, inserindo-se num contexto propriamente eleitoral.
Mais especificamente, algumas correspondem a conflitos internos ao próprio PT ou a pressões de grupos esquerdistas de conquistarem mais espaço por meio de lutas setoriais. Em todo caso, há todo um clima de radicalização que começa a se esboçar. Poder-se-ia mesmo aventar a hipótese de que essa radicalização é fruto da tendência eleitoral de queda da presidente Dilma, abrindo espaço para que conflitos intestinos se potencializem.
Neste contexto, não deixa de ser curiosa a reação dos grupos mais afinados com a ideologia tradicional petista, de corte socialista e anticapitalista. Para eles, a mudança significaria voltar a essa mesma doutrina tradicional do partido, abandonando as acomodações "capitalistas" dos governos Lula e Dilma. Pressionando deste lado, eles procuram ao menos conquistar uma maior fatia do aparelho do Estado, notoriamente menor no governo atual do que no anterior. Pretendem ser mais ouvidos e consultados. Vendem mesmo a ideia - duvidosa - de que eventual empenho eleitoral seu poderia se traduzir pela vitória da candidata petista.
Peguemos o exemplo do MTST. Trata-se, como assinalado, de um braço do MST, que está procurando exercer um papel de protagonismo político nas cidades. Ou seja, estamos diante de uma única organização que comporta vários braços, como o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), a Via Campesina, Movimentos dos Pequenos Agricultores, Movimento das Mulheres Campesinas e assim por diante. A tática consiste em mostrar várias cabeças, como se não fizessem parte do mesmo corpo. Essa tática de luta procura expor amplas ramificações como se fossem independentes, com o intuito de capturar a atenção da mídia e, dessa maneira, favorecer a formação da opinião pública.
Ora, o MST e suas ramificações constituem uma única organização de tipo leninista, fortemente centralizada, organizada em departamentos que seguem hierarquicamente um único comando. Não têm nada de espontâneo. Os seus participantes são militantes que se dedicam totalmente à causa revolucionária. A sua ideologia é nitidamente anticapitalista, advogando por uma sociedade socialista. São, no contexto atual, fervorosos defensores da ditadura cubana e do socialismo bolivariano do "século 21". Em seus discursos, usam para o setor urbano as mesmas bandeiras do rural, como a "reforma agrária", a desapropriação das grandes propriedades, o desrespeito à propriedade privada, a luta contra o lucro e assim por diante. Ocorre que, durante o governo Dilma, eles foram marginalizados, relegados a uma posição de segundo plano.
Note-se, em particular, que, no campo, a política da atual presidente foi a de qualificar os assentamentos e apoiar a agricultura familiar, em vez de privilegiar as desapropriações, que seriam formas de criação de mais favelas rurais. Há, pois, uma inflexão em curso. Ela obedece certamente a razões de ordem eleitoral. Fica, porém, a questão de qual tipo de estratégia política se trata. Não estará a presidente vestindo um figurino de Lula que foi, para ele, eleitoralmente válido quando da primeira eleição e mesmo para a segunda? Será que essa roupa serve para os dois da mesma maneira? Não estará o número errado?
À mesa com Dilma - RICARDO BALTHAZAR
FOLHA DE SP - 19/05
SÃO PAULO - Dilma Rousseff decidiu falar com jornalistas com maior frequência. Nas últimas semanas, chamou três grupos para jantar no Palácio da Alvorada e passou a noite respondendo a perguntas. É uma boa notícia, mas o formato desses encontros é uma deturpação do espírito que deveria presidir o contato entre os poderosos e a imprensa.
Os jornalistas que participam dos jantares são escolhidos pela assessoria da presidente. Todos podem reproduzir o que ouvirem como acharem melhor, mas câmeras e gravadores são vetados. Dizem que Dilma fica desconfortável com os aparelhos.
A ideia é criar um clima descontraído, para baixar a guarda dos jornalistas e evitar embaraços para a presidente. Dilma abre uma fresta em sua intimidade e diverte com histórias do neto. O fotógrafo oficial registra tudo e faz retratos individuais dos convidados com a presidente.
Dilma não gosta do contato com a imprensa. Como muita gente no PT, ela vê os jornalistas como adversários que só apontam defeitos em seu governo e ignoram acertos. Suas entrevistas são raras e, em geral, são improvisadas entre uma cerimônia e outra, quando repórteres gritam perguntas e ela responde qualquer coisa antes de bater em retirada.
Numa democracia, os políticos se submetem ao questionamento dos jornalistas porque reconhecem que devem prestar contas à sociedade e entendem que a imprensa existe para fiscalizar os governos, não para elogiá-los. Dilma parece pensar diferente, e só decidiu falar aos jornalistas agora porque está em campanha para se reeleger e acha que precisa assumir a defesa de seu governo.
Há um jeito de resolver a questão. No próximo jantar, a presidente libera câmeras e gravadores e deixa à vontade quem quiser transmitir a conversa ao vivo. O público ganharia assim uma chance de avaliar melhor a consistência das suas respostas. E quem desconfia dos jornalistas teria uma oportunidade para julgar quem faz o seu trabalho direito.
SÃO PAULO - Dilma Rousseff decidiu falar com jornalistas com maior frequência. Nas últimas semanas, chamou três grupos para jantar no Palácio da Alvorada e passou a noite respondendo a perguntas. É uma boa notícia, mas o formato desses encontros é uma deturpação do espírito que deveria presidir o contato entre os poderosos e a imprensa.
Os jornalistas que participam dos jantares são escolhidos pela assessoria da presidente. Todos podem reproduzir o que ouvirem como acharem melhor, mas câmeras e gravadores são vetados. Dizem que Dilma fica desconfortável com os aparelhos.
A ideia é criar um clima descontraído, para baixar a guarda dos jornalistas e evitar embaraços para a presidente. Dilma abre uma fresta em sua intimidade e diverte com histórias do neto. O fotógrafo oficial registra tudo e faz retratos individuais dos convidados com a presidente.
Dilma não gosta do contato com a imprensa. Como muita gente no PT, ela vê os jornalistas como adversários que só apontam defeitos em seu governo e ignoram acertos. Suas entrevistas são raras e, em geral, são improvisadas entre uma cerimônia e outra, quando repórteres gritam perguntas e ela responde qualquer coisa antes de bater em retirada.
Numa democracia, os políticos se submetem ao questionamento dos jornalistas porque reconhecem que devem prestar contas à sociedade e entendem que a imprensa existe para fiscalizar os governos, não para elogiá-los. Dilma parece pensar diferente, e só decidiu falar aos jornalistas agora porque está em campanha para se reeleger e acha que precisa assumir a defesa de seu governo.
Há um jeito de resolver a questão. No próximo jantar, a presidente libera câmeras e gravadores e deixa à vontade quem quiser transmitir a conversa ao vivo. O público ganharia assim uma chance de avaliar melhor a consistência das suas respostas. E quem desconfia dos jornalistas teria uma oportunidade para julgar quem faz o seu trabalho direito.
Partidos demais - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S.Paulo - 19/05
A preferência partidária declarada pelos eleitores a Ibope e Datafolha ao longo dos últimos 25 anos compõe um filme dos altos e baixos da política brasileira após a redemocratização. E a história contada pelos números aponta um final nada feliz. Quanto mais partidos há, menos gente se diz simpática a eles.
Se há uma tendência nessa narrativa é a desilusão da maioria dos brasileiros com os partidos. Ambos os institutos convergem para uma taxa próxima a 60% de eleitores sem preferência por nenhuma sigla. Já houve surtos de despartidarização - na investigação do mensalão em 2005/2006 -, mas os últimos anos constituem o mais longo período em que os sem-partido formam a maioria absoluta.
Ao mesmo tempo, nunca houve tantas agremiações políticas. São 32 partidos registrados junto à Justiça eleitoral, dos quais 22 têm representação no Congresso Nacional. Juntos, eles recebem mais de R$ 300 milhões por ano de recursos públicos. Sem contar os benefícios extras e nada desprezíveis, como horas de propaganda no rádio e na TV a cada semestre, que também custam ao Tesouro.
Além de não ser gratuita, a propaganda partidária tem efeito oposto ao esperado. Em vez de envolver mais pessoas no debate político, as afasta. São tantas siglas vazias, numa combinação aleatória de chavões e palavras de ordem, que é impossível a sopa de letrinhas formar poema concreto na cabeça do eleitor. Ao contrário. É como se o público, ao fim do palavrório, intuísse que o que é bom para os caciques não é bom para a tribo.
Por certo não foi apenas a abundância de siglas caça-níquel que contribuiu para a despartidarização do eleitorado. A novela sem fim da corrupção sobrepõe camadas de desilusão a fatias de descrédito. No fim, forma um bolo só, recheado de partidos e coberto de ceticismo, opinionismo oportunista e despolitização.
Os 25 anos ininterruptos de eleições livres para todos os cargos no Brasil são também a história da ascensão e queda dos partidos que simbolizaram a seu tempo a mudança e os avanços sociais. Primeiro foi o PMDB. De resistência à ditadura, virou uma nova confederação dos tamoios, tomado por caciques que, cada vez com menos índios, gerenciam suas lucrativas franquias estaduais.
No começo dessa história, o PMDB chegou a ter a simpatia de mais de 20% do eleitorado. Hoje, está resumido a 5% e caindo. Na sua decadência prosperaram PSDB e PT. Os tucanos, porém, nunca decolaram de fato. Nem mesmo os impulsos do Plano Real e, depois, da investigação do mensalão, foram suficientes para transformar o PSDB em um partido de massa. Mal chegou a 10% das preferências. Hoje, atrai tanta simpatia quanto o PMDB.
O PT foi a agremiação que mais corações e mentes conquistou enquanto PMDB e PSDB perdiam simpatizantes. No auge, beirou os 30% de preferência do eleitorado. Mas o histórico dos últimos anos mostra uma curva descendente. No melhor cenário, os petistas estabilizaram em pouco mais de 20% dos eleitores - e acumularam uma antipatia equivalente de outros tantos.
Entre a sua ascensão, apogeu e queda o PT mudou de cara e de público. Os simpatizantes petistas envelheceram e migraram do Sudeste para o Nordeste. Ao mesmo tempo, o partido perdeu quase metade da penetração que tinha no eleitorado com nível superior.
É uma incógnita que tipo de mudança o PT estará apto a propor e implementar com essa nova base social de apoiadores.
Caso o partido perca o poder, quem ocupará seu vácuo? Por enquanto, nenhum partido dá sinais de estar preparado. Nenhuma sigla desponta nas preferências do eleitor. O PSB, que há poucos anos começou a ser citado nas pesquisas, ainda tem só 1%. O PV chegou ao auge em 2010. Hoje, quando é lembrado, não passa de 2%. A novidade nas ruas é o discurso antipartidário.
Mesmo essa novidade tem sido, até agora, incapaz de aglutinar interesses comuns e propor um modelo com chance de se contrapor ao cada vez mais antipático sistema partidário brasileiro.
A preferência partidária declarada pelos eleitores a Ibope e Datafolha ao longo dos últimos 25 anos compõe um filme dos altos e baixos da política brasileira após a redemocratização. E a história contada pelos números aponta um final nada feliz. Quanto mais partidos há, menos gente se diz simpática a eles.
Se há uma tendência nessa narrativa é a desilusão da maioria dos brasileiros com os partidos. Ambos os institutos convergem para uma taxa próxima a 60% de eleitores sem preferência por nenhuma sigla. Já houve surtos de despartidarização - na investigação do mensalão em 2005/2006 -, mas os últimos anos constituem o mais longo período em que os sem-partido formam a maioria absoluta.
Ao mesmo tempo, nunca houve tantas agremiações políticas. São 32 partidos registrados junto à Justiça eleitoral, dos quais 22 têm representação no Congresso Nacional. Juntos, eles recebem mais de R$ 300 milhões por ano de recursos públicos. Sem contar os benefícios extras e nada desprezíveis, como horas de propaganda no rádio e na TV a cada semestre, que também custam ao Tesouro.
Além de não ser gratuita, a propaganda partidária tem efeito oposto ao esperado. Em vez de envolver mais pessoas no debate político, as afasta. São tantas siglas vazias, numa combinação aleatória de chavões e palavras de ordem, que é impossível a sopa de letrinhas formar poema concreto na cabeça do eleitor. Ao contrário. É como se o público, ao fim do palavrório, intuísse que o que é bom para os caciques não é bom para a tribo.
Por certo não foi apenas a abundância de siglas caça-níquel que contribuiu para a despartidarização do eleitorado. A novela sem fim da corrupção sobrepõe camadas de desilusão a fatias de descrédito. No fim, forma um bolo só, recheado de partidos e coberto de ceticismo, opinionismo oportunista e despolitização.
Os 25 anos ininterruptos de eleições livres para todos os cargos no Brasil são também a história da ascensão e queda dos partidos que simbolizaram a seu tempo a mudança e os avanços sociais. Primeiro foi o PMDB. De resistência à ditadura, virou uma nova confederação dos tamoios, tomado por caciques que, cada vez com menos índios, gerenciam suas lucrativas franquias estaduais.
No começo dessa história, o PMDB chegou a ter a simpatia de mais de 20% do eleitorado. Hoje, está resumido a 5% e caindo. Na sua decadência prosperaram PSDB e PT. Os tucanos, porém, nunca decolaram de fato. Nem mesmo os impulsos do Plano Real e, depois, da investigação do mensalão, foram suficientes para transformar o PSDB em um partido de massa. Mal chegou a 10% das preferências. Hoje, atrai tanta simpatia quanto o PMDB.
O PT foi a agremiação que mais corações e mentes conquistou enquanto PMDB e PSDB perdiam simpatizantes. No auge, beirou os 30% de preferência do eleitorado. Mas o histórico dos últimos anos mostra uma curva descendente. No melhor cenário, os petistas estabilizaram em pouco mais de 20% dos eleitores - e acumularam uma antipatia equivalente de outros tantos.
Entre a sua ascensão, apogeu e queda o PT mudou de cara e de público. Os simpatizantes petistas envelheceram e migraram do Sudeste para o Nordeste. Ao mesmo tempo, o partido perdeu quase metade da penetração que tinha no eleitorado com nível superior.
É uma incógnita que tipo de mudança o PT estará apto a propor e implementar com essa nova base social de apoiadores.
Caso o partido perca o poder, quem ocupará seu vácuo? Por enquanto, nenhum partido dá sinais de estar preparado. Nenhuma sigla desponta nas preferências do eleitor. O PSB, que há poucos anos começou a ser citado nas pesquisas, ainda tem só 1%. O PV chegou ao auge em 2010. Hoje, quando é lembrado, não passa de 2%. A novidade nas ruas é o discurso antipartidário.
Mesmo essa novidade tem sido, até agora, incapaz de aglutinar interesses comuns e propor um modelo com chance de se contrapor ao cada vez mais antipático sistema partidário brasileiro.
Onze anos em sete meses? - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 19/05
Mais de 11 anos depois de ter chegado ao poder, e só às vésperas do início oficial da campanha eleitoral - que já colocou nas ruas - para tentar obter mais quatro anos a partir de janeiro de 2015, o governo do PT anuncia ter pronto um grande plano de obras rodoviárias para todo o País. Decerto o País carece, e não é de hoje, de uma malha rodoviária extensa e, sobretudo, em boas condições de operação para facilitar a circulação de bens e pessoas, reduzir os riscos de acidentes e evitar custos adicionais a seus usuários, razão pela qual seria muito bem-vinda uma ação eficaz do poder público nesse sentido.
No entanto, não é crível que o governo tenha êxito com seu novo e mirabolante plano rodoviário - "mais de uma licitação por dia até o fim do ano", anuncia o diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), general Jorge Fraxe. Faltando pouco mais de sete meses para o encerramento do terceiro período presidencial do PT, a elite desse partido fez muito pouco na área de infraestrutura.
O Dnit e os planos rodoviários sintetizam os graves problemas que marcaram os 11 anos e meio da gestão do PT, retardaram os investimentos, implicaram perdas para os contribuintes e deixaram rastros de irregularidades, como favorecimentos para empresas privadas e ganhos ilícitos para ocupantes de cargos públicos.
O atual diretor-geral do Dnit foi colocado no posto para, em primeiro lugar, fazer uma limpeza no órgão que, há três anos, foi apontado como centro de um esquema de propinas e superfaturamento de obras. O Dnit foi controlado até meados de 2011 por pessoas indicadas pelo PR, partido da base governista no Congresso e que havia indicado também o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. Afastado durante as investigações das denúncias de que representantes do partido teriam montado no Dnit um esquema de recebimento de propinas de empreiteiras, o diretor-geral na época, Luiz Antônio Pagot, foi depois demitido e substituído pelo atual.
No início de sua gestão, o general Fraxe reviu contratos para afastar do Dnit as suspeitas que ainda restassem de atos irregulares e procurou dar ao órgão a competência técnica que dele se espera, dadas suas responsabilidades na ampliação e manutenção da extensa malha rodoviária federal. O Dnit não conseguiu, porém, desfazer sua imagem de lentidão.
Mesmo que o Dnit passasse a agir com a presteza exigida pela carência de infraestrutura no País, qualquer programa rodoviário federal seria tolhido, como tem sido, pela formação ideológica dos governantes petistas, contrária à participação do capital privado na prestação de serviços públicos.
Apesar da notória escassez de recursos públicos para a execução de obras, o governo do PT resistiu durante anos à participação do capital privado no setor rodoviário. O governo Dilma, quando finalmente aceitou a realidade, o fez de maneira equivocada, impondo aos investidores condições insustentáveis do ponto de vista econômico e financeiro. Interessante para o usuário, a chamada modicidade tarifária veio, porém, acompanhada da imposição de limites muito baixos para o cálculo da rentabilidade da operação ao longo do período de concessão, o que limitou o interesse dos investidores.
O fracasso, em setembro do ano passado, do leilão de concessão da Rodovia BR-262, entre Espírito Santo e Minas Gerais (não houve ofertas, dadas as condições impostas), obrigou o governo a rever as regras para os leilões seguintes.
O programa rodoviário, enfim, chegou com muito atraso, e os obstáculos criados pelo governo, além de sua limitada competência gerencial - notória também nos planos de concessão de ferrovias e de terminais portuários, que ainda não saíram do papel -, devem reduzir o ritmo de seu avanço.
O governo Dilma promete fazer, em sete meses, 400 licitações, investir R$ 8 bilhões em estradas, contornos, anéis rodoviários, pontes, viadutos e travessias de cidades, num total de 6,4 mil quilômetros de obras. Conhecendo seu histórico, dá para acreditar?
Mais de 11 anos depois de ter chegado ao poder, e só às vésperas do início oficial da campanha eleitoral - que já colocou nas ruas - para tentar obter mais quatro anos a partir de janeiro de 2015, o governo do PT anuncia ter pronto um grande plano de obras rodoviárias para todo o País. Decerto o País carece, e não é de hoje, de uma malha rodoviária extensa e, sobretudo, em boas condições de operação para facilitar a circulação de bens e pessoas, reduzir os riscos de acidentes e evitar custos adicionais a seus usuários, razão pela qual seria muito bem-vinda uma ação eficaz do poder público nesse sentido.
No entanto, não é crível que o governo tenha êxito com seu novo e mirabolante plano rodoviário - "mais de uma licitação por dia até o fim do ano", anuncia o diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), general Jorge Fraxe. Faltando pouco mais de sete meses para o encerramento do terceiro período presidencial do PT, a elite desse partido fez muito pouco na área de infraestrutura.
O Dnit e os planos rodoviários sintetizam os graves problemas que marcaram os 11 anos e meio da gestão do PT, retardaram os investimentos, implicaram perdas para os contribuintes e deixaram rastros de irregularidades, como favorecimentos para empresas privadas e ganhos ilícitos para ocupantes de cargos públicos.
O atual diretor-geral do Dnit foi colocado no posto para, em primeiro lugar, fazer uma limpeza no órgão que, há três anos, foi apontado como centro de um esquema de propinas e superfaturamento de obras. O Dnit foi controlado até meados de 2011 por pessoas indicadas pelo PR, partido da base governista no Congresso e que havia indicado também o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. Afastado durante as investigações das denúncias de que representantes do partido teriam montado no Dnit um esquema de recebimento de propinas de empreiteiras, o diretor-geral na época, Luiz Antônio Pagot, foi depois demitido e substituído pelo atual.
No início de sua gestão, o general Fraxe reviu contratos para afastar do Dnit as suspeitas que ainda restassem de atos irregulares e procurou dar ao órgão a competência técnica que dele se espera, dadas suas responsabilidades na ampliação e manutenção da extensa malha rodoviária federal. O Dnit não conseguiu, porém, desfazer sua imagem de lentidão.
Mesmo que o Dnit passasse a agir com a presteza exigida pela carência de infraestrutura no País, qualquer programa rodoviário federal seria tolhido, como tem sido, pela formação ideológica dos governantes petistas, contrária à participação do capital privado na prestação de serviços públicos.
Apesar da notória escassez de recursos públicos para a execução de obras, o governo do PT resistiu durante anos à participação do capital privado no setor rodoviário. O governo Dilma, quando finalmente aceitou a realidade, o fez de maneira equivocada, impondo aos investidores condições insustentáveis do ponto de vista econômico e financeiro. Interessante para o usuário, a chamada modicidade tarifária veio, porém, acompanhada da imposição de limites muito baixos para o cálculo da rentabilidade da operação ao longo do período de concessão, o que limitou o interesse dos investidores.
O fracasso, em setembro do ano passado, do leilão de concessão da Rodovia BR-262, entre Espírito Santo e Minas Gerais (não houve ofertas, dadas as condições impostas), obrigou o governo a rever as regras para os leilões seguintes.
O programa rodoviário, enfim, chegou com muito atraso, e os obstáculos criados pelo governo, além de sua limitada competência gerencial - notória também nos planos de concessão de ferrovias e de terminais portuários, que ainda não saíram do papel -, devem reduzir o ritmo de seu avanço.
O governo Dilma promete fazer, em sete meses, 400 licitações, investir R$ 8 bilhões em estradas, contornos, anéis rodoviários, pontes, viadutos e travessias de cidades, num total de 6,4 mil quilômetros de obras. Conhecendo seu histórico, dá para acreditar?
Efeitos contrários - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 19/05
Há várias decisões espinhosas a serem tomadas pelo próximo governo. Entre elas, sobre a política de indexação do salário mínimo. Mas, caso a presidente Dilma venha a ser reeleita, esta é uma questão decidida: no comício eletrônico que fez em rede nacional, na condição de presidente da República, no pronunciamento que seria institucional, na véspera do Dia do Trabalho, Dilma se comprometeu a prorrogar a lei da indexação do SM, que vence ano que vem.
No entanto, isso não a livrará de dissabores. Poderá se esquivar de pressões de sindicalistas, acenar a bandeira de que “cumpre o que promete” e viver um fugaz momento de recompensa, desses com que o populismo recompensa a curto prazo os governantes que o seguem.
A conta, como sempre, virá depois. Na verdade, ela já está sendo colocada à frente do Planalto, devido à formula que reajusta o SM segundo a variação do PIB de há dois anos somada à inflação do ano anterior.
A correta intenção de aumentar o poder aquisitivo do salário mínimo é política de governo desde a gestão FH. Foi mantida e acelerada com Lula, até receber o lastro desta lei, negociada em 2006, com prazo de validade até 2015.
O objetivo tem relevância. Resta saber da sua viabilidade sem que ameace a estabilidade econômica. Ora, como o salário mínimo é indexador direto dos benefícios previdenciários e de vários outros gastos de assistência social, os aumentos reais dos salários, acima da inflação, fazem os gastos em custeio continuarem a crescer à frente da arrecadação e da própria evolução do PIB. É uma corrida insana rumo ao abismo. O déficit da Previdência (INSS) este ano beirará os R$ 50 bilhões (está subestimado no Orçamento em R$ 42 bilhões). Por isso, o Brasil tem gasto em benefícios previdenciários um percentual do PIB só verificado em economias desenvolvidas de países com população de idade média mais elevada. Esta conta não fechará.
Em artigo recente no jornal “Valor”, o ex-ministro Delfim Netto, conselheiro do governo, alertou que os efeitos desta política do SM, que concede reajustes acima dos ganhos (pequenos) de produtividade da economia, “são visíveis hoje no Brasil”— ou seja, “pressão inflacionária e déficit em conta corrente” (pois a demanda vaza para o exterior e ajuda a acumular déficits comerciais). A política pode servir para ganhar votos, mas nenhum governo irá longe com ela.
Infelizmente, sequer desconcentra-se tanto a renda com aumentos desmedidos do SM. O economista Fabio Giambiagi já alertou para o efeito contrário: entre os que recebem benefícios previdenciários, apenas 1,1% faz parte dos 10% mais pobres.
Seria demais chamá-los de privilegiados. Mas a pobreza absoluta continua onde está quando se concedem reajustes generosos ao salário mínimo.
Há várias decisões espinhosas a serem tomadas pelo próximo governo. Entre elas, sobre a política de indexação do salário mínimo. Mas, caso a presidente Dilma venha a ser reeleita, esta é uma questão decidida: no comício eletrônico que fez em rede nacional, na condição de presidente da República, no pronunciamento que seria institucional, na véspera do Dia do Trabalho, Dilma se comprometeu a prorrogar a lei da indexação do SM, que vence ano que vem.
No entanto, isso não a livrará de dissabores. Poderá se esquivar de pressões de sindicalistas, acenar a bandeira de que “cumpre o que promete” e viver um fugaz momento de recompensa, desses com que o populismo recompensa a curto prazo os governantes que o seguem.
A conta, como sempre, virá depois. Na verdade, ela já está sendo colocada à frente do Planalto, devido à formula que reajusta o SM segundo a variação do PIB de há dois anos somada à inflação do ano anterior.
A correta intenção de aumentar o poder aquisitivo do salário mínimo é política de governo desde a gestão FH. Foi mantida e acelerada com Lula, até receber o lastro desta lei, negociada em 2006, com prazo de validade até 2015.
O objetivo tem relevância. Resta saber da sua viabilidade sem que ameace a estabilidade econômica. Ora, como o salário mínimo é indexador direto dos benefícios previdenciários e de vários outros gastos de assistência social, os aumentos reais dos salários, acima da inflação, fazem os gastos em custeio continuarem a crescer à frente da arrecadação e da própria evolução do PIB. É uma corrida insana rumo ao abismo. O déficit da Previdência (INSS) este ano beirará os R$ 50 bilhões (está subestimado no Orçamento em R$ 42 bilhões). Por isso, o Brasil tem gasto em benefícios previdenciários um percentual do PIB só verificado em economias desenvolvidas de países com população de idade média mais elevada. Esta conta não fechará.
Em artigo recente no jornal “Valor”, o ex-ministro Delfim Netto, conselheiro do governo, alertou que os efeitos desta política do SM, que concede reajustes acima dos ganhos (pequenos) de produtividade da economia, “são visíveis hoje no Brasil”— ou seja, “pressão inflacionária e déficit em conta corrente” (pois a demanda vaza para o exterior e ajuda a acumular déficits comerciais). A política pode servir para ganhar votos, mas nenhum governo irá longe com ela.
Infelizmente, sequer desconcentra-se tanto a renda com aumentos desmedidos do SM. O economista Fabio Giambiagi já alertou para o efeito contrário: entre os que recebem benefícios previdenciários, apenas 1,1% faz parte dos 10% mais pobres.
Seria demais chamá-los de privilegiados. Mas a pobreza absoluta continua onde está quando se concedem reajustes generosos ao salário mínimo.
Mais sinais da fragilidade da economia - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 19/05
Depois do pior dos últimos 10 anos para o comércio, com alta de apenas 4,3% em 2013, quando as vendas chegaram a crescer 10,9% em 2010, o varejo continua a apresentar sinais de fragilidade. Em março, o setor registrou seu mais fraco desempenho para o mês desde 2003: uma retração de 1,1% em relação ao mesmo mês do ano passado e de 0,5% comparando com fevereiro último. O resultado certamente pode ser posto na conta do esgotamento do modelo de crescimento baseado no estímulo ao consumo.
Se o governo conseguia impulsionar o comércio com isenção fiscal e crédito farto agora, a retomada da inflação e a subida dos juros - prescrita como remédio amargo para conter a carestia - engolem os incentivos. E ainda tem o complicador do alto nível de endividamento das famílias. Passada a fase da bonança, com todos indo às compras para trocar a geladeira, o fogão e até o carro, ficaram as dívidas, com o orçamento comprometido pelas prestações a pagar e a resistente escalada dos preços.
Março, aliás, foi um mês ruim para a atividade econômica como um todo, com retração de 0,11% em relação a fevereiro. Já na comparação com março de 2013, também houve queda, embora menor: de 0,09%. Seria demasiado otimismo considerar positiva a expansão de 0,29% no primeiro trimestre de 2014. Tampouco dá para festejar os 2,46% de crescimento dos 12 meses anteriores. Não por acaso, a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) prevê que, pelo quarto ano consecutivo, o Brasil crescerá menos do que a média dos países da região, que já são um parâmetro débil.
Como a política econômica não sinaliza mudança - muito pelo contrário, o discurso é o da continuidade - e milagres somente são operados com perversa manipulação de indicadores, resta esperar que tenhamos chegado ao fundo do poço, com o início de ciclo de expansão na sequência. Mas o mercado internacional tampouco dá prenúncios nesse sentido. Mais uma vez, pelo contrário: a crise persiste e mesmo o robusto dragão chinês, um dos principais mercados de commodities do subcontinente, desacelera.
Ou seja, é inexorável: ou o Brasil reage já, ou está destinado à rabeira das economias frágeis. E reagir é fazer o básico, o dever de casa sempre postergado, a começar pelo enxugamento dos gastos públicos. Deixar o combate à inflação por conta exclusiva do Banco Central, com o garrote dos juros, é estrangular o setor produtivo. O país precisa livrar-se, ao mesmo tempo, da carestia e do dinheiro caro.
Para tanto, urge igualmente rever a carga tributária, desburocratizar o mundo dos negócios, tornar plausíveis as regras de concessão de infraestrutura, garantir a sustentabilidade da Previdência, incentivar o investimento produtivo e por aí afora, cumprindo a receita clássica das economias em ascensão. Andar na contramão delas é, por óbvio, escolher o caminho oposto: o da recessão e do atraso.
Se o governo conseguia impulsionar o comércio com isenção fiscal e crédito farto agora, a retomada da inflação e a subida dos juros - prescrita como remédio amargo para conter a carestia - engolem os incentivos. E ainda tem o complicador do alto nível de endividamento das famílias. Passada a fase da bonança, com todos indo às compras para trocar a geladeira, o fogão e até o carro, ficaram as dívidas, com o orçamento comprometido pelas prestações a pagar e a resistente escalada dos preços.
Março, aliás, foi um mês ruim para a atividade econômica como um todo, com retração de 0,11% em relação a fevereiro. Já na comparação com março de 2013, também houve queda, embora menor: de 0,09%. Seria demasiado otimismo considerar positiva a expansão de 0,29% no primeiro trimestre de 2014. Tampouco dá para festejar os 2,46% de crescimento dos 12 meses anteriores. Não por acaso, a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) prevê que, pelo quarto ano consecutivo, o Brasil crescerá menos do que a média dos países da região, que já são um parâmetro débil.
Como a política econômica não sinaliza mudança - muito pelo contrário, o discurso é o da continuidade - e milagres somente são operados com perversa manipulação de indicadores, resta esperar que tenhamos chegado ao fundo do poço, com o início de ciclo de expansão na sequência. Mas o mercado internacional tampouco dá prenúncios nesse sentido. Mais uma vez, pelo contrário: a crise persiste e mesmo o robusto dragão chinês, um dos principais mercados de commodities do subcontinente, desacelera.
Ou seja, é inexorável: ou o Brasil reage já, ou está destinado à rabeira das economias frágeis. E reagir é fazer o básico, o dever de casa sempre postergado, a começar pelo enxugamento dos gastos públicos. Deixar o combate à inflação por conta exclusiva do Banco Central, com o garrote dos juros, é estrangular o setor produtivo. O país precisa livrar-se, ao mesmo tempo, da carestia e do dinheiro caro.
Para tanto, urge igualmente rever a carga tributária, desburocratizar o mundo dos negócios, tornar plausíveis as regras de concessão de infraestrutura, garantir a sustentabilidade da Previdência, incentivar o investimento produtivo e por aí afora, cumprindo a receita clássica das economias em ascensão. Andar na contramão delas é, por óbvio, escolher o caminho oposto: o da recessão e do atraso.
Modernidade eleitoral - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 19/05
A poucos meses das eleições, permanecem incertas algumas das normas que deverão orientar os partidos e candidatos na disputa.
Se há uma regra invariável no sistema eleitoral do Brasil, talvez seja esta: sucedem-se tentativas de aprimorar a lei, sempre interrompidas ou desfiguradas no Congresso, e depois submetidas a variáveis interpretações no Judiciário.
Tomando posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro José Antonio Dias Toffoli mostrou inquietação com esse estado de coisas. Ainda há tempo, disse, para que se estabeleça, por lei, um limite máximo aos gastos de campanha, a valer neste ano.
Dificilmente o apelo de Toffoli será recebido pelo Legislativo. Embora exista preocupação generalizada quanto às crescentes despesas eleitorais, líderes das mais diversas siglas não mostram empenho prático para frear a gastança.
Perpetua-se, enquanto isso, um modelo que exige das agremiações a busca de financiamentos cada vez mais altos --com a sistemática contrapartida que mais tarde será cobrada do candidato vencedor.
Em recente julgamento no STF, Toffoli revelou-se defensor da tese, majoritária na corte, segundo a qual a Constituição não admite a doação de empresas a campanhas --o entendimento dificilmente se aplicará no pleito de 2014.
O próprio ministro reconhece, todavia, que a vedação não daria cabo do caixa dois. É provável, aliás, que ele volte a crescer. Para esta Folha, a restrição não faz sentido; empresas, assim como indivíduos, devem ser livres para participar do processo democrático.
Melhor seria haver um limite nominal às doações de pessoas físicas e jurídicas. Cumpriria, ademais, facilitar o acompanhamento, em tempo real pela internet, do fluxo de recursos --a fiscalização é o mais importante a ser melhorado.
De nada ajuda, nesse sentido, que o ministro apoie o sigilo em ações de cassação de mandatos na Justiça Eleitoral, ou que vote por restringir investigações do Ministério Público nesse campo.
Seja como for, é positivo que Toffoli se incline por atitude liberal em outros aspectos da campanha. Entende que não cabem interpretações restritivas no que tange às manifestações de candidatos.
Punições a "propagandas antecipadas" pecam por excesso de zelo, limitando o debate e a própria liberdade de expressão.
A modernidade eleitoral ainda tem um longo caminho até ser implantada no Brasil; a improvisação e a ambiguidade prevalecem. Expondo seus pontos de vista, Dias Toffoli parece ao menos disposto a diminuir parte desses problemas no próximo pleito.
A poucos meses das eleições, permanecem incertas algumas das normas que deverão orientar os partidos e candidatos na disputa.
Se há uma regra invariável no sistema eleitoral do Brasil, talvez seja esta: sucedem-se tentativas de aprimorar a lei, sempre interrompidas ou desfiguradas no Congresso, e depois submetidas a variáveis interpretações no Judiciário.
Tomando posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro José Antonio Dias Toffoli mostrou inquietação com esse estado de coisas. Ainda há tempo, disse, para que se estabeleça, por lei, um limite máximo aos gastos de campanha, a valer neste ano.
Dificilmente o apelo de Toffoli será recebido pelo Legislativo. Embora exista preocupação generalizada quanto às crescentes despesas eleitorais, líderes das mais diversas siglas não mostram empenho prático para frear a gastança.
Perpetua-se, enquanto isso, um modelo que exige das agremiações a busca de financiamentos cada vez mais altos --com a sistemática contrapartida que mais tarde será cobrada do candidato vencedor.
Em recente julgamento no STF, Toffoli revelou-se defensor da tese, majoritária na corte, segundo a qual a Constituição não admite a doação de empresas a campanhas --o entendimento dificilmente se aplicará no pleito de 2014.
O próprio ministro reconhece, todavia, que a vedação não daria cabo do caixa dois. É provável, aliás, que ele volte a crescer. Para esta Folha, a restrição não faz sentido; empresas, assim como indivíduos, devem ser livres para participar do processo democrático.
Melhor seria haver um limite nominal às doações de pessoas físicas e jurídicas. Cumpriria, ademais, facilitar o acompanhamento, em tempo real pela internet, do fluxo de recursos --a fiscalização é o mais importante a ser melhorado.
De nada ajuda, nesse sentido, que o ministro apoie o sigilo em ações de cassação de mandatos na Justiça Eleitoral, ou que vote por restringir investigações do Ministério Público nesse campo.
Seja como for, é positivo que Toffoli se incline por atitude liberal em outros aspectos da campanha. Entende que não cabem interpretações restritivas no que tange às manifestações de candidatos.
Punições a "propagandas antecipadas" pecam por excesso de zelo, limitando o debate e a própria liberdade de expressão.
A modernidade eleitoral ainda tem um longo caminho até ser implantada no Brasil; a improvisação e a ambiguidade prevalecem. Expondo seus pontos de vista, Dias Toffoli parece ao menos disposto a diminuir parte desses problemas no próximo pleito.
Inimigo a vencer - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
GAZETA DO POVO - PR - 19/05
A redução da pobreza e a diminuição da desigualdade de renda não são do interesse somente dos pobres, mas de toda a sociedade
Implantar políticas públicas para reduzir a pobreza é um objetivo que deve estar acima dos partidos políticos e deve unir governo e sociedade. A redução da pobreza não é objetivo passível de ser alcançado em curto prazo e tem como principal condicionante que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça mais do que a taxa de aumento da população ao longo de algumas décadas.
Em 1970, o Brasil tinha de 90 milhões habitantes, 46% deles viviam na zona rural e a pobreza atingia 68% do total da população. Em 29 de agosto do ano passado, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou, no Diário Oficial da União, que a população em junho de 2013 era estimada em 201.032.714 habitantes. Em 2010, segundo as estatísticas, a população de pobres era de 20% e os extremamente pobres somavam 7% dos habitantes, porcentuais esses que, aplicados à população do ano passado, equivalem a 40,2 milhões de pobres e 14,1 milhões de extremamente pobres.
Embora esses números possam assustar por sua magnitude, o país conseguiu reduzir a pobreza relativa nas últimas cinco décadas, embora ainda seja muito grande a desigualdade de renda entre as diversas camadas da população. Isso põe o Brasil diante de dois focos principais: de um lado é preciso aumentar a renda por habitante (como meio de reduzir a pobreza no sentido geral) e, de outro, é necessário diminuir a desigualdade de renda (como meio de elevar mais rapidamente a renda dos pobres e dos extremamente pobres). Trata-se de um desafio nacional, que deve transcender as disputas políticas, os embates eleitorais e, sobretudo, deve unir os brasileiros em torno do bem maior. A redução da pobreza e a diminuição da desigualdade de renda não são do interesse somente dos pobres; é do interesse de toda a sociedade nacional, pois os benefícios não se restringem à questão econômica, mas atingem a segurança pública, a educação, a saúde, a melhoria das cidades e aumentam as oportunidades de negócios e empreendedorismo de todos, inclusive dos mais ricos.
É nessa linha que os programas de transferência de renda – entre eles o Bolsa Família e o financiamento educacional subsidiado – tornam-se políticas de Estado e não programas de um só governo. O Brasil sempre teve alguma política de subsídio social e programas de atendimento aos mais pobres, mas foi nos últimos 30 anos que os programas ganharam melhores contornos e foram aperfeiçoados. O Bolsa Família teve o mérito de unificar vários programas, melhorar seu formato e poder ser executado com custo burocrático relativamente baixo. A maior qualidade do Bolsa Família está em sua simplicidade conceitual e facilidade operacional.
Outro programa que deu certo é o Programa Universidade para Todos (Prouni). Criticado no início (foi criado em 2004), o Prouni foi a saída encontrada pelo governo para colocar rapidamente mais estudantes na educação superior, ao conceder bolsas de 50% e 100% na rede privada, sem que o Tesouro Nacional tivesse que fazer um cheque sequer. A lógica do programa foi trocar impostos por educação. As instituições que aderiram ao programa ficaram isentas dos tributos federais. Como muitas não pagavam os tributos devidos, a renúncia fiscal efetiva do governo federal foi menor do que os valores inicialmente estimados. Setores do próprio PT foram contra esse programa, mas ele partiu de uma lógica simples: o governo não tinha condições de abrir vagas rapidamente nas universidades federais – isso implicaria fazer construções, equipar laboratórios e contratar professores – e não tinha meios para abrir vagas em todas as cidades servidas por instituições privadas. Discussões à parte, o fato concreto é que o Prouni já atendeu 1,2 milhão de estudantes na educação superior e dificilmente algum governante terá condições de extingui-lo.
Nenhum programa de transferência de renda ou de combate à pobreza é perfeito e mesmo os programas de alta eficiência se prestam a embates ideológicos. Mas, acima dessas questões, está a necessidade de o Brasil apressar a diminuição da pobreza e a redução das desigualdades, pois o número de pobres ainda é muito grande. Para tanto, é imprescindível que o PIB cresça mais do que o aumento da população, especialmente porque, segundo estudos feitos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – um órgão do próprio governo –, o setor público se tornou muito caro e não é eficiente na distribuição da renda.
A redução da pobreza e a diminuição da desigualdade de renda não são do interesse somente dos pobres, mas de toda a sociedade
Implantar políticas públicas para reduzir a pobreza é um objetivo que deve estar acima dos partidos políticos e deve unir governo e sociedade. A redução da pobreza não é objetivo passível de ser alcançado em curto prazo e tem como principal condicionante que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça mais do que a taxa de aumento da população ao longo de algumas décadas.
Em 1970, o Brasil tinha de 90 milhões habitantes, 46% deles viviam na zona rural e a pobreza atingia 68% do total da população. Em 29 de agosto do ano passado, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou, no Diário Oficial da União, que a população em junho de 2013 era estimada em 201.032.714 habitantes. Em 2010, segundo as estatísticas, a população de pobres era de 20% e os extremamente pobres somavam 7% dos habitantes, porcentuais esses que, aplicados à população do ano passado, equivalem a 40,2 milhões de pobres e 14,1 milhões de extremamente pobres.
Embora esses números possam assustar por sua magnitude, o país conseguiu reduzir a pobreza relativa nas últimas cinco décadas, embora ainda seja muito grande a desigualdade de renda entre as diversas camadas da população. Isso põe o Brasil diante de dois focos principais: de um lado é preciso aumentar a renda por habitante (como meio de reduzir a pobreza no sentido geral) e, de outro, é necessário diminuir a desigualdade de renda (como meio de elevar mais rapidamente a renda dos pobres e dos extremamente pobres). Trata-se de um desafio nacional, que deve transcender as disputas políticas, os embates eleitorais e, sobretudo, deve unir os brasileiros em torno do bem maior. A redução da pobreza e a diminuição da desigualdade de renda não são do interesse somente dos pobres; é do interesse de toda a sociedade nacional, pois os benefícios não se restringem à questão econômica, mas atingem a segurança pública, a educação, a saúde, a melhoria das cidades e aumentam as oportunidades de negócios e empreendedorismo de todos, inclusive dos mais ricos.
É nessa linha que os programas de transferência de renda – entre eles o Bolsa Família e o financiamento educacional subsidiado – tornam-se políticas de Estado e não programas de um só governo. O Brasil sempre teve alguma política de subsídio social e programas de atendimento aos mais pobres, mas foi nos últimos 30 anos que os programas ganharam melhores contornos e foram aperfeiçoados. O Bolsa Família teve o mérito de unificar vários programas, melhorar seu formato e poder ser executado com custo burocrático relativamente baixo. A maior qualidade do Bolsa Família está em sua simplicidade conceitual e facilidade operacional.
Outro programa que deu certo é o Programa Universidade para Todos (Prouni). Criticado no início (foi criado em 2004), o Prouni foi a saída encontrada pelo governo para colocar rapidamente mais estudantes na educação superior, ao conceder bolsas de 50% e 100% na rede privada, sem que o Tesouro Nacional tivesse que fazer um cheque sequer. A lógica do programa foi trocar impostos por educação. As instituições que aderiram ao programa ficaram isentas dos tributos federais. Como muitas não pagavam os tributos devidos, a renúncia fiscal efetiva do governo federal foi menor do que os valores inicialmente estimados. Setores do próprio PT foram contra esse programa, mas ele partiu de uma lógica simples: o governo não tinha condições de abrir vagas rapidamente nas universidades federais – isso implicaria fazer construções, equipar laboratórios e contratar professores – e não tinha meios para abrir vagas em todas as cidades servidas por instituições privadas. Discussões à parte, o fato concreto é que o Prouni já atendeu 1,2 milhão de estudantes na educação superior e dificilmente algum governante terá condições de extingui-lo.
Nenhum programa de transferência de renda ou de combate à pobreza é perfeito e mesmo os programas de alta eficiência se prestam a embates ideológicos. Mas, acima dessas questões, está a necessidade de o Brasil apressar a diminuição da pobreza e a redução das desigualdades, pois o número de pobres ainda é muito grande. Para tanto, é imprescindível que o PIB cresça mais do que o aumento da população, especialmente porque, segundo estudos feitos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – um órgão do próprio governo –, o setor público se tornou muito caro e não é eficiente na distribuição da renda.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
ESTUDO SUÍÇO NEGA INFLUÊNCIA DA COPA EM ELEIÇÃO
Pesquisa realizada pelo banco suíço UBS para avaliar macroeconomia e estratégia de investimento, mostra que não há relação direta entre o resultado em campo na Copa do Mundo e a avaliação de governantes no Brasil. Em 1994, quando o Brasil conquistou o tetra, a avaliação do governo era positiva, com o sucesso do Plano Real. Oito anos depois, em 2002, na conquista do penta, a avaliação do governo caiu 2 pontos.
DATA DE VALIDADE
O estudo conclui que a Copa poderia influir se ocorresse até duas semanas antes das eleições. A Copa deste ano acaba 79 dias antes.
PERDE E CRESCE
Quando o Brasil foi derrotado pela França, na final da Copa do Mundo de 1998, a avaliação do governo brasileiro cresceu 7%.
SEM CERTEZA
A avaliação do governo cresceu 1% após a eliminação nas quartas de final, em 2006. Em 2010: derrota nas quartas e a avaliação caiu 1%.
FONTES MÚLTIPLAS
Estudo do UBS analisou pesquisas próprias e de diversos institutos de pesquisa como Datafolha, Ipea, Fifa, Bloomberg e Data.
EMPREITEIRAS SE IRRITAM, MAS TÊM DESCONTO EM MP
Apesar de ter vetado o artigo da Medida Provisória 627, relatada pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que excluía empreiteiras de nova tributação em lucros gerados no exterior, a presidenta Dilma aprovou ampliar o desconto no PIS e Cofins por mais quatro anos. Uma lei de 2003 permitia que as empreiteiras fossem beneficiadas pelo sistema tributário até 2015, mas a MP 627 estendeu o prazo para 2020.
NA NOSSA CONTA
Além das empreiteiras – maiores doadoras de campanhas no Brasil – concessionárias também ganham extensão no desconto do Pis/Cofins.
OLHA O LOBBY
Mesmo com a extensão no desconto do Pis/Cofins, as empreiteiras não estão satisfeitas: querem isenção para obras realizadas no exterior.
MARCA REGISTRADA
Para a oposição, a MP 627 merecia veto integral só porque o esperto deputado Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB, foi o relator.
PALAVRA PROIBIDA
O governador paulista Geraldo Alckmin proíbe os auxiliares de usar a palavra que mais teme. É mais fácil ele ressuscitar o tal “volume morto” do que citar a palavra “racionamento” em ano eleitoral.
FALA O QUE EU DIGO…
Levantamento da ONG Artigo 19 aponta que o Judiciário é o poder que menos responde aos pedidos de acesso à informação. O Executivo vai bem: respondeu a todos os pedidos.
PERNAMBUCANOS
Lula quer uma frente com o PTB, PDT, PT e PP para apoiar o senador Armando Monteiro ao governo de Pernambuco. Mas o deputado Eduardo da Fonte (PP) prefere se aliar ao PSB, de Eduardo Campos.
OLHA QUEM FOI
Lula mantém obsequioso silêncio sobre as consequências de cada “ok” que autorizou na longa lista de exigências da Fifa, algumas absurdas, para que o Brasil ganhasse o direito de sediar a Copa de 2014.
RACHA INTERNO
Coitada da Venezuela: María Gabriela, filha do finado semiditador Hugo Chávez, está sendo cevada para disputar a presidência da república. Até já cumpriu o script de visitar Fidel Castro, em Cuba.
REJEIÇÃO NO DF
Pesquisa do Instituto Dados (TSE nº 93/2014) mostra que, entre os candidatos ao Senado, no DF, Alberto Fraga (DEM) é o mais rejeitado (10,9%) e o atual senador Gim Argello (PTB), está em 4º (7,5%). O favorito, Antonio Reguffe (PDT), é também o menos rejeitado (1,5%).
SEPARAÇÃO LITIGIOSA
A ex-prefeita de Fortaleza Luizianne Lins atacou sexta-feira, na TV, os irmãos Cid e Ciro Gomes. E declarou que se o PT apoiar o candidato da dupla ao Governo do Ceará, ela votará em Eunício Oliveira (PMDB).
EMBROMATION
O ex-presidente Sérgio Gabrielli está convocado para depor na CPI chapa branca da Petrobras, nesta terça (20), no Senado. Graça Foster ficou para o dia 27 e o ex-diretor Nestor Cerveró para quinta (22).
PENSANDO BEM…
…pelo nível de baixa profundidade, a CPI da Petrobras entrará para a história como a CPI do Volume Morto.
Pesquisa realizada pelo banco suíço UBS para avaliar macroeconomia e estratégia de investimento, mostra que não há relação direta entre o resultado em campo na Copa do Mundo e a avaliação de governantes no Brasil. Em 1994, quando o Brasil conquistou o tetra, a avaliação do governo era positiva, com o sucesso do Plano Real. Oito anos depois, em 2002, na conquista do penta, a avaliação do governo caiu 2 pontos.
DATA DE VALIDADE
O estudo conclui que a Copa poderia influir se ocorresse até duas semanas antes das eleições. A Copa deste ano acaba 79 dias antes.
PERDE E CRESCE
Quando o Brasil foi derrotado pela França, na final da Copa do Mundo de 1998, a avaliação do governo brasileiro cresceu 7%.
SEM CERTEZA
A avaliação do governo cresceu 1% após a eliminação nas quartas de final, em 2006. Em 2010: derrota nas quartas e a avaliação caiu 1%.
FONTES MÚLTIPLAS
Estudo do UBS analisou pesquisas próprias e de diversos institutos de pesquisa como Datafolha, Ipea, Fifa, Bloomberg e Data.
EMPREITEIRAS SE IRRITAM, MAS TÊM DESCONTO EM MP
Apesar de ter vetado o artigo da Medida Provisória 627, relatada pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que excluía empreiteiras de nova tributação em lucros gerados no exterior, a presidenta Dilma aprovou ampliar o desconto no PIS e Cofins por mais quatro anos. Uma lei de 2003 permitia que as empreiteiras fossem beneficiadas pelo sistema tributário até 2015, mas a MP 627 estendeu o prazo para 2020.
NA NOSSA CONTA
Além das empreiteiras – maiores doadoras de campanhas no Brasil – concessionárias também ganham extensão no desconto do Pis/Cofins.
OLHA O LOBBY
Mesmo com a extensão no desconto do Pis/Cofins, as empreiteiras não estão satisfeitas: querem isenção para obras realizadas no exterior.
MARCA REGISTRADA
Para a oposição, a MP 627 merecia veto integral só porque o esperto deputado Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB, foi o relator.
PALAVRA PROIBIDA
O governador paulista Geraldo Alckmin proíbe os auxiliares de usar a palavra que mais teme. É mais fácil ele ressuscitar o tal “volume morto” do que citar a palavra “racionamento” em ano eleitoral.
FALA O QUE EU DIGO…
Levantamento da ONG Artigo 19 aponta que o Judiciário é o poder que menos responde aos pedidos de acesso à informação. O Executivo vai bem: respondeu a todos os pedidos.
PERNAMBUCANOS
Lula quer uma frente com o PTB, PDT, PT e PP para apoiar o senador Armando Monteiro ao governo de Pernambuco. Mas o deputado Eduardo da Fonte (PP) prefere se aliar ao PSB, de Eduardo Campos.
OLHA QUEM FOI
Lula mantém obsequioso silêncio sobre as consequências de cada “ok” que autorizou na longa lista de exigências da Fifa, algumas absurdas, para que o Brasil ganhasse o direito de sediar a Copa de 2014.
RACHA INTERNO
Coitada da Venezuela: María Gabriela, filha do finado semiditador Hugo Chávez, está sendo cevada para disputar a presidência da república. Até já cumpriu o script de visitar Fidel Castro, em Cuba.
REJEIÇÃO NO DF
Pesquisa do Instituto Dados (TSE nº 93/2014) mostra que, entre os candidatos ao Senado, no DF, Alberto Fraga (DEM) é o mais rejeitado (10,9%) e o atual senador Gim Argello (PTB), está em 4º (7,5%). O favorito, Antonio Reguffe (PDT), é também o menos rejeitado (1,5%).
SEPARAÇÃO LITIGIOSA
A ex-prefeita de Fortaleza Luizianne Lins atacou sexta-feira, na TV, os irmãos Cid e Ciro Gomes. E declarou que se o PT apoiar o candidato da dupla ao Governo do Ceará, ela votará em Eunício Oliveira (PMDB).
EMBROMATION
O ex-presidente Sérgio Gabrielli está convocado para depor na CPI chapa branca da Petrobras, nesta terça (20), no Senado. Graça Foster ficou para o dia 27 e o ex-diretor Nestor Cerveró para quinta (22).
PENSANDO BEM…
…pelo nível de baixa profundidade, a CPI da Petrobras entrará para a história como a CPI do Volume Morto.
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