sexta-feira, junho 24, 2016

Custo Brasil, custo PT - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 24/06

Custo Brasil virou assunto de polícia. Graças à bandalheira do PT, o sentido dessa expressão foi enriquecido. Deixou de pertencer apenas ao jargão econômico e passou a integrar também o vocabulário criminal.

Durante muito tempo, custo Brasil foi a denominação de uma porção de entraves enfrentados pelos brasileiros quando competem no mercado internacional. Tributação irracional, ineficiência logística, mau preparo da mão de obra, burocracia excessiva, capital muito caro e insegurança jurídica são alguns desses entraves. Governos incompetentes, aparelhamento e loteamento de cargos e um tsunami de corrupção agravaram esses problemas.

Parte dos estragos foi exposta pela Operação Lava Jato. Cada etapa teve um nome diferente. As ações iniciadas na manhã de quinta-feira pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República foram, enfim, batizadas como Operação Custo Brasil. Essa denominação teria sido perfeita desde o começo das investigações.

Bastariam os estragos causados à Petrobrás para mostrar o forte vínculo entre loteamento, corrupção, ineficiência e custos. As denúncias quase sempre deram destaque à relação entre propinas e contratos. Perdas de bilhões foram reconhecidas em demonstrações financeiras. Mas os danos efetivos foram muito além do dinheiro desviado.

Os aumentos de custos com certeza superaram os desvios comprovados nas investigações policiais. Atrasos em obras, assim como seleção de fornecedores sem critérios econômicos, implicam elevação de custos e redução de produtividade.

O enfraquecimento financeiro resultou em maior dificuldade de financiamento e em diminuição do ritmo de investimentos.

Falta calcular e explicitar boa parte desses prejuízos, assim como falta uma devassa completa, por exemplo, dos atrasos de obras e da elevação de custos da Refinaria Abreu e Lima. Nem sempre é possível separar com clareza os danos causados por decisões meramente erradas e aqueles produzidos pela corrupção, mas o parentesco dos dois problemas é inegável no caso da Petrobrás.

É inegável, também, o parentesco entre loteamento, aparelhamento, corrupção e perda geral da produtividade do País. Para esclarecer esse ponto, vale a pena um pequeno lembrete. O crescimento econômico depende, a longo prazo, da taxa de investimento e da eficiência produtiva de cada real investido. Esses dois fatores, no Brasil, são muito insatisfatórios e com certeza pioraram nos últimos anos.

O mais comentado é a taxa de investimento fixo, indicada pela relação entre os recursos aplicados em capital fixo (máquinas, equipamentos e construções) e o Produto Interno Bruto (PIB). Essa relação tem oscilado há muito tempo entre 17% e 20% do PIB. Em outros emergentes, mesmo na América Latina, frequentemente supera 25%. Em alguns países da Ásia fica acima de 30%.

Muito menos comentada é a questão da produtividade do investimento. Se obras demoram muito além do normal, como é frequente no Brasil, e se a sua qualidade é deficiente, cada real investido se torna muito menos produtivo do que poderia ser. Políticas protecionistas, elevando os preços de máquinas, equipamentos e insumos diversos, produzem dano semelhante.

Em suma, no Brasil investe-se pouco e com muito desperdício de recursos – e parte dessa lambança é explicável pela baixa qualidade da administração, aparelhada, loteada e vulnerável a todo tipo de irregularidade. A Operação Lava Jato, apesar de sua extensão e das muitas condenações, mostra só uma parte da bandalheira instalada no País.

O custo Brasil, velho pesadelo de empresários e assunto há muito debatido por economistas, é muito mais que uma ampla coleção de problemas técnicos.

Mesmo questões técnicas, como a tributação inadequada, podem ser muito desafiadoras, por causa da oposição de interesses, por exemplo, regionais. Mas o caso brasileiro é especial, porque o custo Brasil está associado também à degradação política da gestão pública. Bem poderia, por isso, ser também chamado custo PT.

GOSTOSA


Custo Brasil - ELIANE CANTANHÊDE

O ESTADÃO - 24/06

Ministério Público Federal e Polícia Federal acreditam que o roubo no Ministério do Planejamento na gestão Paulo Bernardo (PT), durante o governo Lula, chegou a R$ 100 milhões, desviados de contratos com a empresa Consist, responsável pelo sistema de crédito consignado dos servidores federais.

Em delação premiada, Sérgio Machado (PMDB) disse que, nos seus cerca de dez anos na presidência da Transpetro, subsidiária da Petrobrás, repassou mais de R$ 100 milhões para integrantes da cúpula do seu partido: José Sarney, Renan Calheiros, Edison Lobão, Romero Jucá...

Um único gerente da Petrobrás, que nem diretor era, se comprometeu na delação premiada a devolver aos cofres públicos a bagatela de US$ 100 milhões: Pedro Barusco, ex-gerente executivo da Diretoria de Serviços da maior, mais simbólica e mais querida companhia brasileira.

Nestor Cerveró, ex-diretor da área Internacional da Petrobrás, disse em depoimento que transferiu uns US$ 100 milhões de propina ao governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) com a venda da empresa petrolífera Pérez Companc.

De grão em grão, a galinha enche o papo. Pois, de 100 milhões em 100 milhões (de reais ou de dólares), o País vai empobrecendo em saúde, educação, habitação, costumes, ética e o que, talvez, seja o mais assustador: em política.

O PT passou 20 anos na oposição, vendendo-se como puro contra todos os demais, os impuros, até assumir o poder e não apenas se embolar e se confundir com os impuros, como chegar a ponto de disputar com eles em diferentes modalidades: “Quem dá mais?”; “É dando que se recebe”; “Toma lá, dá cá”.

Depois de 20 anos de uma disputa sangrenta, PT e PSDB, os dois partidos mais respeitados do País, se veem não diante, mas dentro de um cenário de terra arrasada. Se houvesse eleição antecipada, como alguns insistem em defender, quem seria candidato do PT? Lula, atingido em cheio pelos filhos, pelo partido, por sítios e tríplex? E quem seria o do PSDB? Aécio Neves, arroz de festa em delações sobre Furnas?

Nessa situação um tanto desesperadora, o mundo se divide em dois: a sociedade vibra com gravações, delações e prisões, mas o universo político começa assumir movimentos de autoproteção.

Quando o ex-tucano e ex-petista Delcídio Amaral viveu o ineditismo de um senador preso no exercício do mandato, o plenário do Senado aprovou e votou a favor da sua prisão. Quando o ex-tucano e peemedebista Machado entregou 20 políticos e fez um strike no PMDB de Michel Temer, o PT foi contido e discreto. Agora, quando o MP e a PF fazem busca e apreensão no apartamento funcional da senadora petista Gleisi Hoffmann, enquanto prendiam Paulo Bernardo, seu marido, o PSDB não ficou apenas contido e discreto, mas partiu para vibrante defesa.

Segundo o líder tucano, Cássio Cunha Lima, foi “um absurdo” um juiz de primeira instância mirar no apartamento funcional de uma senadora, pois só o Supremo Tribunal Federal poderia fazê-lo. “Apesar de políticos, somos gente (sic). É preciso ter um mínimo de compreensão com a dor alheia. O silêncio dos senadores é um silêncio respeitoso”, disse ele.

Trata-se do velho espírito de corpo, quando a Lava Jato escancara tudo, expõe todos e cada um. Aparentemente, nenhum partido sobrevive e todos os políticos caem na mesma vala comum, na percepção cruel e destruidora de que “todos são iguais”. O problema é que isso tudo dispara o espírito de corpo dos políticos, mas o brasileiro está cada dia mais espírito de porco – no bom sentido.

Ausência. O líder natural na América do Sul é o Brasil, que tem o maior território, a maior economia, a maior planta industrial, a maior população. Mas, apesar disso, o Brasil ficou totalmente fora do acordo histórico entre Farc e governo na Colômbia. Por quê? Por ideologia. Preferiu se agarrar à Venezuela, que é de “esquerda”.


Vilões, vilezas e vilanias - NELSON MOTTA

O GLOBO - 24/06

De mãos para trás e cabeça baixa, parecem o que sempre foram, trapaceiros de luxo com caras de bandido


Aprendi com meu pai que é covarde e indigno tripudiar sobre perdedores, que se deve ter compaixão pelos caídos, não chutar cachorros mortos. Mas também ser solidário com as vítimas, lutar pela justiça, para que os criminosos paguem pelos seus atos, em nome da democracia e da civilização.

Mas não são só ladrões, achacadores, delatores, traidores e fraudadores que estão caídos como cachorros mortos: o Brasil está no chão, vítima da arrogância, da indecência e da irresponsabilidade dessa gentalha que se crê uma casta privilegiada e se esconde atrás de partidos e da boa-fé popular para fazer o que bem entende na certeza da eterna impunidade.

A face do crime é medonha. Ao trocar as roupas de grife pelo uniforme de presidiário, eles se revelam em toda a sua feiura e vulgaridade. Presos e humilhados, príncipes intocáveis mais parecem marginais de rua, guerreiros do povo são desmascarados em ladrões e fraudadores de eleições, senhores poderosos, de mãos para trás e cabeça baixa, parecem o que sempre foram, trapaceiros de luxo com caras de bandido. 


Quando Rita Lee disse em seu clássico “Ôrra meu” que “roqueiro brasileiro sempre teve cara de bandido”, desconsiderou os políticos. Eles é que têm cara de bandido, embora alguns nem exerçam a atividade, mas a vasta maioria compõe uma galeria apavorante. É quando a ética se expressa na estética. 

E os vilões? Quanto pior, melhor. Todos têm seus vilões favoritos, o Coringa, Darth Vader, Bia Falcão, Carminha, Flora... o meu era o Zé Dirceu, mas já está fora de combate, game over. Agora, olhem bem as caras de Cerveró, Vaccari, André Vargas, Bumlai, Barusco, Renato Duque, Pedro Corrêa, Gim Argello, Fernando Baiano, Léo Pinheiro... que medo, hein? Mas, por enquanto, o mais vil da nova safra parece ser Sérgio Machado, com o physique du rôle e o histórico familiar de um arquétipo da vileza cordial brasileira. Qual o seu?

Renan, Jucá, Sarney e Eduardo Cunha, além do neovilão Lula, são hors-concours, porque ainda estão soltos, e só vale vilão preso. Mas, com sua delação premiada, Marcelo Odebrecht pode se tornar o campeão nacional da vilania.

Corrida de revezamento - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 24/06

A “Operação Custo Brasil” trouxe uma boa notícia para o país e uma péssima informação para os investigados da Lava-Jato: não adiantou fugir do Paraná porque em São Paulo a investigação continuou com tanta competência quanto em Curitiba. Ontem, a Polícia Federal, o Ministério Público e a Receita Federal mostraram um outro braço do mesmo estado combatendo o mesmo crime.

Quando houve o primeiro fatiamento da Operação Lava-Jato, que levou de Curitiba para São Paulo o caso da empresa prestadora de serviços de informática, a Consist, que teria pago propina no Ministério do Planejamento, pareceu ser um problema. Não porque só em Curitiba houvesse competência e empenho na Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal, mas porque o caso se conectava com a investigação, na opinião dos policiais e procuradores, e porque isso poderia favorecer os investigados, na opinião deles próprios e dos seus advogados. Tanto que a notícia foi comemorada. Houve no fim de 2015 outro fatiamento, o que levou o caso Eletronuclear para o Rio de Janeiro.

A preocupação era porque em Curitiba havia uma força-tarefa, tanto no MP, quando na PF, e em outros estados não haveria tanta gente para se dedicar ao assunto e o caso iria parar. Com isso contavam os investigados. O que a massa de informações divulgada ontem pelos representantes da PF, MP e Receita demonstra é que houve, na verdade, uma corrida de revezamento. Em São Paulo os funcionários públicos pegaram o bastão, foram adiante e descobriram os estarrecedores fatos narrados. De 2010 a 2015, nos governos Lula e Dilma, o Ministério do Planejamento contratou uma empresa de informática, a Consist, que nos empréstimos consignados desviou dinheiro dos tomadores de crédito para pagar propina ao PT e a algumas autoridades, entre elas o ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo.

— Infelizmente a corrupção não é ‘privilégio’ da Petrobras, ela está espalhada como um câncer em diversas instituições — disse o procurador Andrey Borges de Mendonça. Até a imagem é a mesma utilizada pela força-tarefa em Curitiba: “um câncer” que se espalha pelo organismo do país.


A corrupção se parece de certa forma. Em geral contratos são superfaturados, para que, através de alguns dos surrados truques de sempre, esse dinheiro vá para os “agentes políticos”. Em cada operação se descobre que em cima dessa fórmula básica os corruptos usam toda a criatividade.

Neste caso, o que houve foi o avanço sobre o consignado. O devedor, sem saber, estava pagando mais para que o esquema fosse alimentado. E foram R$ 100 milhões tirados desta forma. As pessoas deixaram de usar o dinheiro para o seu bem, “para comprar remédio”, exemplificou o procurador.

Esta semana o coordenador da Operação LavaJato, Deltan Dallagnol, falou no Congresso sobre corrupção e também usou exemplos em que fica fácil entender que o dinheiro criminosamente desviado provoca mortes. Ao darem exemplos concretos os procuradores estão ampliando a capacidade de compreensão dos mecanismos sempre obscuros da corrupção.

O procurador Andrey Borges disse que foi “uma ação conjunta, sincronizada, em que um apoiou o outro para conseguir dar o primeiro passo”. Foi fundamental que isso acontecesse exatamente para mostrar, o que o procurador disse, “que não é só Curitiba que faz investigação, e faz muito bem. Isso é uma meta das instituições aqui presentes. As investigações vão continuar onde quer que estejam”.

Os crimes investigados por este desdobramento da Lava-Jato têm um agravante que é o de usar o sistema de crédito consignado que foi montado para reduzir o custo do dinheiro no Brasil. Ele ampliou o mercado de crédito e reduziu seu custo em relação às taxas de outros produtos financeiros. O que foi elogiado como sendo uma boa engenharia financeira acabou usado como mais um duto de se extrair o dinheiro coletivo e levá-lo para os muitos beneficiários que se aboletam no poder. O negócio ficou tão grande, que a empresa prestadora dos serviços ficava com 30%. A maior parte alimentava a corrupção. O passo de ontem foi fundamental para mostrar que estão se fortalecendo os elos entre os que combatem o crime.


Temer surfará queda do juro - FERNANDO DANTAS

O ESTADÃO - 24/06

Sucesso da política fiscal cimentaria o caminho de substancial redução da Selic

Juro alto é um remédio econômico muitas vezes necessário, mas naturalmente antipático. Nada melhor para um governante, portanto, que iniciar seu governo com corte de juros. Michel Temer provavelmente terá essa sorte. Não será necessariamente no primeiro momento, mas tem tudo para acontecer ainda na fase de aquecimento dos motores do novo governo.

A lógica do argumento não é complicada. Os bancos centrais concentram suas atenções em três fatores principais: os desvios da inflação em relação à meta, o desvio da atividade econômica em relação ao “PIB potencial” (que é quanto a economia pode crescer sem provocar desequilíbrios) e a estabilidade do sistema financeiro.

Cuidar da inflação é a principal atribuição do Banco Central, o que faz com que o primeiro fator tenha um lugar especial dentre os objetivos da instituição. Mas os outros dois não podem ser ignorados. O PIB brasileiro caiu 3,8% em 2015 e a expectativa é de que caia por volta de 3,5% este ano. O desemprego atingiu 11,2% no trimestre até abril, ou 11,4 milhões de pessoas, num salto brutal ante os 8,0% registrados no mesmo período de 2015.

A recuperação judicial da Oi, com R$ 65 bilhões em dívidas, é apenas o maior exemplo das grandes dificuldades financeiras das empresas brasileiros. O sistema bancário, que também lida com inadimplência no crédito ao consumo, vem resistindo até agora sem sinais preocupantes de problemas sistêmicos, mas o prolongamento indefinido da queda do PIB poderia trazer riscos para a estabilidade financeira, que o BC deve resguardar.

O BC tem de pesar os prós e os contras de baixar os juros, e, como visto acima, há claramente fatores que apontam nessa direção. No principal objetivo, porém, que é o da inflação, a coisa se complica. O arcabouço formal do sistema de metas brasileiro indica que o BC deve trabalhar para que o IPCA feche 2017 em 4,5%. Porém, olhando de hoje, nenhum analista acha que esse objetivo será atingido a menos que a taxa básica, a Selic, seja mantida por muito mais tempo no atual nível de 14,25% ou até que seja elevada.

Dessa dificuldade emergiu uma discussão entre analistas e participantes do mercado financeiro sobre a possibilidade de o BC adotar uma “meta ajustada” para 2017, algo entre 5,0% e 5,5%, que poderia ser atingida mesmo que fosse iniciado nos próximos meses um ciclo de redução da Selic.

O economista e consultor Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, considera que o debate sobre a meta ajustada é, de certa forma, uma filigrana – ligada à estratégia de comunicação – dentro da questão maior da política monetária nos próximos 18 a 24 meses, durante os quais enxerga um ciclo de queda da taxa de juros.

Ele nota que há vários fatores – parte dos quais nada agradável – que ajudarão o BC no seu objetivo principal de controlar a inflação. “O canal de crédito está obstruído”, diz Pastore, referindo-se às dificuldades das empresas e dos consumidores e à postura defensiva dos bancos. Aliás, nos bancos estatais a ordem também é de pisar no freio. O desemprego ainda cresce e a renda do trabalho cai. Todos esses fatores seguram a demanda, e, portanto, a inflação.

E há, finalmente, a política fiscal, que – se o governo Temer conseguir aprovar medidas como o limite dos gastos públicos – também deverá contribuir para conter a demanda. Um efeito adicional do eventual sucesso da política fiscal, notado por Pastore, é o de reduzir o risco Brasil, o que reforça a valorização do câmbio já em curso, que também ajuda a combater a inflação.

A política fiscal, portanto, é a peça fundamental da estratégia de Temer. Se der certo, acaba de cimentar o caminho de substancial redução da Selic. E, neste caso, poucos se importarão se o IPCA chegar aos 4,5% na metade de 2018 e não no fim de 2017. A bola já estará dentro da rede.

COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV

A prisão que atrapalha Dilma - BERNARDO MELLO FRANCO

Folha de S.Paulo - 24/06

É cada vez mais difícil ver PT e PMDB dizendo a mesma coisa. Os ex-aliados voltaram a concordar nesta quinta (23) ao avaliar os efeitos daprisão do ex-ministro Paulo Bernardo. Nos dois partidos, a ação policial foi vista como um baque na defesa de Dilma Rousseff no Senado.

O ex-ministro é marido da petista Gleisi Hoffmann, uma das vozes mais ativas na comissão do impeachment. Ex-chefe da Casa Civil, a senadora continua a desempenhar o papel de escudeira de Dilma. Ela costuma se sentar na primeira fila e não perde uma chance de discursar a favor da presidente afastada.

Para o governo interino, a prisão de Paulo Bernardo vai abalar o moral da tropa dilmista. A ação ocorre num momento em que o noticiário policial se voltava contra o PMDB de Michel Temer. Por isso, a desgraça do ex-ministro foi motivo de comemoração discreta no Planalto.

No front petista, a reação foi de perplexidade e desânimo. "Isso vai dar um alívio para o Temer e uma desarticulada na gente", comentou um senador, em conversa reservada.

Em público, a ordem foi questionar as razões da prisão temporária. A liderança do PT no Senado classificou a decisão como "abuso de poder". Em nota, o partido sugeriu uma ação coordenada para encobrir "fatos gravíssimos de corrupção que atingem diretamente o governo".

Além de atingir a imagem de Gleisi, a nova operação da Polícia Federal resvala na gestão de Dilma. Os investigadores relataram um esquema que teria desviado verbas federais até o ano passado.

A prisão de Paulo Bernardo produziu outra união entre políticos que estão em lados opostos na batalha do impeachment. Líderes de vários partidos reclamaram da entrada da PF num prédio habitado por senadores. Muitos acordaram assustados com o barulho de um helicóptero nas primeiras horas da manhã. Como as investigações não param, ninguém sabe quem receberá a próxima visita indesejada.


A reforma que nunca é feita - SÉRGIO AMAD COSTA

O ESTADO DE S. PAULO - 24/06

Toda vez que surge um novo governo, escuta-se, não raro, do Poder Executivo a necessidade de fazer uma reforma trabalhista. Mas logo a ideia morre. Ainda não sabemos ao certo o que está por vir ou até mesmo se virá alguma coisa nova, nem quando. Mas há notícias de que o presidente Michel Temer pretende partir para uma flexibilização, dando prevalência nas negociações coletivas para determinadas regras dispostas na legislação, como, entre outras, jornadas de trabalho e salários e manter os direitos assegurados pela Constituição.

Caso isso um dia aconteça, já será um bom começo. Pois, quando se fala em flexibilizar, é justamente dar a possibilidade de ampliar o grau das negociações coletivas. Até mesmo dirigentes do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a mais alta Corte da Justiça do Trabalho, reconhecem a necessidade da flexibilização.

O presidente do TST, ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, em entrevista ao ConJur, no mês passado, sustentou a necessidade de uma reforma legislativa que dê maior flexibilidade protetiva ao trabalhador: "Dizer que em períodos tais, quando os trabalhadores estão fragilizados, não se devem promover reformas, é esquecer que também as empresas estão fragilizadas e quebrando, o que exige rápida intervenção para recuperar uns e outros. E isso só se faz afrouxando um pouco a corda que vai enforcando a todos, encontrando o ponto de equilíbrio de justa retribuição ao trabalhador e ao empresário empreendedor".

No passado recente também o então presidente do TST, ministro João Oreste Dalazen, em entrevista ao ConJur, em julho de 2012, defendeu a necessidade da revisão da CLT: "Primeiro, porque é uma regulação rígida e fundada na lei federal, que praticamente engessa toda relação entre patrão e empregado; segundo, é excessivamente detalhista e confusa, o que gera insegurança jurídica, e, inevitavelmente, descumprimento, favorecendo o aumento de ações na Justiça; e terceiro, está cheia de lacunas. O mundo e a sociedade evoluíram. Tudo mudou, exceto a legislação trabalhista".

Afirmei acima que será apenas um bom começo, essa flexibilização que parece estar sendo estudada pelo novo governo. Apenas um bom começo, pois caso ela, em algum momento, vingue, será para atender às necessidades emergenciais da crise, visando a gerar empregos. Mas, para sair desse modelo atrasado que temos e pensar em um futuro sustentável para o Brasil, é preciso muito mais do que isso. Flexibilizar uma legislação não é tarefa fácil em um país que tem uma CLT com 922 artigos, vários dispositivos de cunho trabalhistas na própria Lei Maior, além de centenas de Súmulas e Orientações.

Uma reforma trabalhista, a meu ver, aqui envolve a revisão de tudo o que está ultrapassado nas relações entre empregados e empregadores. Faz-se também necessário, além do estímulo às negociações, a adoção de um sistema negocial mais flexível, fundado no instrumento do contrato coletivo de trabalho, que funcione de forma diferente dos atuais acordos coletivos de trabalho e convenções coletivas de trabalho. E, finalmente, é preciso democratizar a estrutura sindical.

Tudo leva a crer que as centrais sindicais não aceitarão, caso surja, uma proposta de flexibilização. O presidente da CUT, Wagner Freitas, por exemplo, já se manifestou: "Se passar a pauta conservadora e a reforma da Previdência e trabalhista, vamos organizar a maior greve geral que esse país já viu" ( O Estado de S. Paulo, 10/6). Tal reação é incompatível com a preocupação com o desemprego.

Esse tipo de resistência ao novo, da parte de dirigentes sindicais, somado ao populismo de vários congressistas, faze com que a ideia de reforma trabalhista seja sempre abortada antes mesmo de nascer. Faço votos para que esse governo não desista desse propósito, caso ele realmente o tenha. É uma forma de contribuir para que haja trabalho, pois é a única maneira de dar cabo a exigências legais exageradas, uma das razões que eliminam postos de emprego.

*É PROFESSOR DE RECURSOS HUMANOS E RELAÇÕES TRABALHISTAS DA FGV-SP

Os Moros agem - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 24/06

Quando, em setembro de 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu desmembrar a investigação da Operação Lava-Jato, retirando da jurisdição da 13ª Vara Federal do Paraná, do juiz Sérgio Moro, o processo sobre a corrupção no Ministério do Planejamento, houve comemoração nas hostes petistas. Mas houve também quem previsse que aquela medida criaria “vários Moros” pelo Brasil.

Ontem, com mandados expedidos pelo juiz Paulo Bueno de Azevedo, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, foram feitas várias prisões e executados mandados de busca e apreensão em diversos estados, atingindo, inclusive, dois ex-ministros dos governos petistas, Carlos Gabas, ex-ministro da Previdência tão ligado à presidente afastada, Dilma Rousseff, que a levava a passear por Brasília na garupa de uma de suas possantes motocicletas Harley-Davidson; e Paulo Bernardo, em cujo Ministério do Planejamento que chefiava foi montado grosso esquema de corrupção, segundo as investigações da Polícia Federal.

Com se previa, os juízes que receberam processos derivados da Operação Lava-Jato estão atuando no mesmo diapasão da Justiça de Curitiba, a demonstrar que esse não é um padrão exclusivo de Moro e dos procuradores de Curitiba, mas de uma nova geração de juízes e procuradores do Ministério Público, que se sentem moralmente responsáveis pela continuidade de uma ação do Judiciário que tem amplo apoio da sociedade.

No Rio de Janeiro, por exemplo, o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, conhecido como “o Moro do Rio”, está à frente de casos do eletrolão, que investiga a atuação do ex-presidente da Eletrobras vice-almirante Othon Pinheiro, especialmente na construção da usina Angra-3, e também alguns termos da delação premiada de Nestor Cerveró sobre compras de empresas estrangeiras pela Petrobras, uma de gás no Uruguai e outra na Argentina.

A sentença do caso de Angra-3 sai em julho, pois semana que vem iniciam os prazos para as alegações finais das defesas. Também está sendo investigado no Rio o ex-governador Sérgio Cabral, por suspeita de ter recebido propina de empreiteiras envolvidas nas obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e nas obras de reconstrução do Maracanã para a Copa do Mundo.

O desmembramento de diversos casos só aparentemente fragilizou a tese da Procuradoria-Geral da República de que o que está sendo investigado é organização criminosa que atuou em várias instâncias do governo federal além da Petrobras. A ação do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, dando apoio a investigações pelo país, garantiu que a Lava-Jato e suas ramificações não sofressem descontinuidade.

Está provado que não existe apenas um juiz no país, como ironizou o ministro do STF Dias Toffoli ao apoiar o desmembramento da investigação sobre o esquema dos empréstimos consignados montado no Planejamento pelo ex-ministro Paulo Bernardo. Naquela ocasião, houve críticas à decisão de desmembrar, pois, como alegou o ministro Luís Roberto Barroso, o caso deveria ter sido definido pelo próprio juiz Moro na primeira instância, que decidiria qual tribunal adequado para conduzir as investigações do caso Consist.

Também o ministro Gilmar Mendes se opôs à medida, alegando que, no afã de livrar certos acusados do juiz Moro, estavam sendo puladas etapas importantes nas decisões do Supremo. Se Moro se afirmasse competente, e alguma parte discordasse, poderia interpor a “exceção de incompetência”, a ser julgada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cabendo dessa decisão o recurso especial ao STJ.

Foi o que o plenário do STF decidiu na quarta-feira, enviando ao juiz Moro o desmembramento do caso contra o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha; ele decidirá se tem competência para assumir as investigações sobre a mulher e a filha do deputado, cabendo recurso em caso positivo.

Os desdobramentos das investigações ligadas à Operação Lava-Jato em diversos pontos do país demonstram que há uma tendência nova no Judiciário brasileiro, o que abre caminho para uma superação de antigos vícios e costumes políticos no país.


Combate à corrupção sem prazo de validade - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 24/06

Prisão do ex-ministro Paulo Bernardo ressalta a importância da Lava-Jato e reforça a constatação de que é absurda a ideia de que a investigação precisa ter um limite

A prisão do ex-ministro Paulo Bernardo — do Planejamento, com Lula; das Comunicações, no governo Dilma — faz um sugestivo contraponto à movimentação entre políticos, visível ou subterrânea, para conter a Operação Lava-Jato, já convertida em símbolo do combate à corrupção.

Marido da senadora do PT do Paraná Gleisi Hoffmann, também investigada, Bernardo caiu na malha da Operação Custo Brasil, executada a partir do Ministério Público Federal de São Paulo. Ele é acusado de ter recebido pelo menos R$ 7 milhões de uma empresa contratada de forma fraudulenta pela pasta do Planejamento, quando ele era ministro. Passou para as Comunicações e, segundo o MP, continuou a receber propinas.

A empresa Consist foi contratada para gerenciar empréstimos consignados obtidos por servidores federais, cobrando-lhes um sobrepreço na tarifa de serviço, para financiar o esquema de propinas.

Entre 2010 e 2015, foram R$ 100 milhões — na prática, expropriados de servidores públicos, uma das bases eleitorais do próprio PT. O nome da operação, Custo Brasil, foi inspirado na ideia do peso que a corrupção representa para o país.

Gleisi Hoffmann não compareceu ontem à sessão da comissão do impeachment no Senado, onde é aguerrida defensora da presidente afastada Dilma. Ela tem motivos para se preocupar. Também a Custo Brasil teve aceito pela Justiça o pedido de prisão preventiva de Guilherme Gonçalves, advogado de campanhas eleitorais de Gleisi. A senadora já entrara na mira da Lava-Jato, depois que o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa a delatou como beneficiária do petrolão.

Tudo isso é um alento para quem se preocupa com os riscos de abafamento da Lava-Jato e outras ações anticorrupção. A Custo Brasil é resultado de um fatiamento da Lava-Jato, quando se pensou que retirar processos de Curitiba, da jurisdição do juiz Sérgio Moro e de procuradores que atuam por lá, iria enfraquecer as investigações. Pelo visto, não deu certo neste caso de Paulo Bernardo e que pode chegar a Gleisi. É auspicioso saber que há juízes e promotores fora de Curitiba.

O clima de conspirata contra a Lava-Jato, captado pelo gravador do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em conversas com o alto comando peemedebista — Renan Calheiros, José Sarney, Romero Jucá — poderia existir também no Planalto de Michel Temer.

O presidente repete que apoia a Lava-Jato, o que é sempre positivo. Mas não ecoaram bem os votos do ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, para que a Operação tenha a “sensibilidade” de saber o momento de encaminhar uma “definição final”. Mas como? Cabe a tautologia: deve finalizar quando acabar a investigação, por falta do que investigar. É inadmissível que qualquer operação contra o crime tenha prazo de validade.

O procurador Deltan Dallagnol, da Lava-Jato, esteve quarta-feira na Câmara e lá comparou a corrupção a um “serial killer” que mata disfarçado de “buracos de estrada, de falta de medicamentos, crimes de rua e de pobreza”.

A imagem é adequada. E é porque os bilhões desviados no petrolão, ou qualquer outra tramoia maquinada em Brasília, fazem falta em despesas públicas essenciais para a população que reprimir essa roubalheira não pode estar subordinado a conveniências políticas.

Todo amor desta vida - PAULO DE TARSO LYRA

CORREIO BRAZILIENSE - 24/06

Antes mesmo da prisão do ex-ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, na manhã de ontem, em decorrência da Operação Custo Brasil, o presidente em exercício, Michel Temer, tinha decidido dedicar todo o seu carinho, afeto e atenção ao Senado, Casa que, em breve, julgará definitivamente o afastamento ou não da presidente Dilma Rousseff. Mais do que pedir a ministros e líderes governistas que cabalem votos entre os indecisos, Temer tem dedicado atenção especial aos políticos da Câmara Alta.

Mesmo tendo confidenciado a interlocutores que achou entediante o convescote, Temer fez questão de marcar presença no jantar oferecido pelo senador Zezé Perrela (PDT-MG) na noite de terça-feira. Sentou à mesa com o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), o líder do governo. Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), entre outros.

Riu, ouviu histórias e aproveitou para agradecer a Renan pela aprovação do texto original da lei das estatais, que impõe regras mais rígidas para indicações a cargos públicos. A Câmara desvirtuou a quarentena de três anos para a proibição de dirigentes partidários e sindicais ocuparem as funções públicas. Temer não chiou - não é seu estilo - mas deu um like para os senadores que restituíram a vedação original.

Não é só. O presidente em exercício também avocou, como se sempre tivesse sido sua, a pauta do Senado. Além da lei das estatais, estão no bojo a Lei dos Fundos de Pensão, as novas regras para o pré-sal, que tira da Petrobras a prerrogativa de operadora única. Prometeu também - onde for possível, claro, para não ferir a lei que defende - dar preferência para os afilhados políticos dos senadores.

Até mesmo a renegociação da dívida dos estados tem essa finalidade. Aliviar a vida dos administradores estaduais é bem-visto pela Casa responsável pelo debate federativo, ocupada por ex-governadores , futuros postulantes e presidida pelo pai do governador de Alagoas.

Quer mais amor? O todo poderoso Henrique Meirelles, czar da economia, jantará com a bancada de senadores na próxima terça-feira para explicar o que eles quiserem sobre o futuro do país. Temer faz tudo em busca do remédio que lhe tire da interinidade.

Punição para Bolsonaro! - REINALDO AZEVEDO

FOLHA DE SP - 24/06

Entrei numa porfia com alguns amigos que se querem liberais ou libertários por causa da decisão da Primeira Turma do STF, que, por quatro votos a um, aceitou denúncia contra o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) por incitação ao crime de estupro.

Apoio sem reservas a decisão, sempre lembrando que Bolsonaro não foi ainda condenado. Apenas se aceitou uma denúncia. Existe a chance de defesa, um bem que inexiste na sociedade que ele abriga, em que torturador é herói.

O evento indica que tipo de sociedade queremos e até onde os não esquerdistas, a exemplo de seus antípodas, também se estendem em franjas éticas. As do PT, por exemplo, se tornaram tão longas que, na sua morte, o partido já não sabe definir o próprio caráter.

Fato e circunstância: em 2003, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) interrompeu uma entrevista de Bolsonaro à RedeTV!, em que defendia a maioridade penal aos 16 anos. Ela o chama de "estuprador". Uma injúria. Ele responde: "Eu jamais iria estuprar você porque você não merece". Ameaça de agressão mútua. O vídeo está neste endereço.

Onze anos depois, no dia 9 de dezembro de 2014, num debate parlamentar, Bolsonaro está criticando conclusões da Comissão da Verdade, defendidas havia pouco por Maria do Rosário. Ela se levanta para sair, um direito seu. Ele, então, chama a sua atenção: "Não saia, não, Maria do Rosário, fique aí! Há poucos dias, você me chamou de estuprador no Salão Verde, e eu falei que eu não estuprava você porque você não merece. Fique aqui para ouvir".

O "poucos dias", reitero, fazia 11 anos.

Três amigos liberais contestaram a minha posição argumentando em favor da "liberdade de opinião". Fiquei feliz que não tivessem privatizado o liberalismo –ou eu teria de tentar outra coisa... Eu os desafiei a reescrever com as próprias palavras a opinião de Bolsonaro. Ninguém aceitou porque, de fato, não há opinião ali. Uma coisa é a resposta dada a quente, no calor do embate. Outra é disparar a mesma fala 11 anos depois.

As palavras fazem sentido. Se Bolsonaro diz que Maria do Rosário não "merece" ser estuprada por ele porque a despreza, está dizendo o evidente: há as que merecem. E as mulheres que ele admira correm mais riscos. Exagero na interpretação? Não! Em entrevista ao Jornal "Zero Hora", foi inequívoco: "Ela não merece [ser estuprada] porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia. Não faz meu gênero. Jamais a estupraria". Fosse Rosário, a seu critério, boa e bonita e fizesse seu gênero, então sim.

Se os não esquerdistas não souberem a diferença entre crime e liberdade de expressão –que não é um direito absoluto porque nenhum é–, deixarão para as esquerdas culturais, hegemônicas mundo afora, a tarefa de confundir liberdade de expressão com crime.

O episódio não prova nem a existência da cultura do estupro nem a vertente censória do politicamente correto. É bom que certas conquistas da civilização não sejam tidas como um valor dos nossos inimigos. Aprendi isso com Trótski, que contestava Lênin mentalmente, segundo a biografia de Isaac Deutscher. Vai ver me falta boa literatura política para entender o espírito indômito de Bolsonaro e o valor da imunidade parlamentar.

Que ele se desculpe e admita seu erro ou que seja punido exemplarmente por aquilo que praticou: apologia do estupro –mas não de todas as mulheres, claro! Só das boas, bonitas e que fazem seu gênero.

PS: Antes que sugiram que estou tentando administrar a minha reputação para ganhar a admiração de quem me detesta, leiam o que escrevi neste espaço sobre esse caso no dia 19 de dezembro de 2014.

‘Debate’ como eles gostam - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo 24/06

A audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na terça-feira passada para debater a situação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) mostrou bem o que a companheirada entende por “debate”: um encontro entre amigos com o objetivo único de chancelar a doutrina do partido ao qual pertencem ou com o qual simpatizam. Nada mais apropriado para uma reunião destinada a discutir a “comunicação pública” – expressão que, na boca da companheirada petista, ganha um significado muito peculiar: trata-se da comunicação com o objetivo exclusivo de espalhar o evangelho do PT.

A EBC está na berlinda desde que o presidente em exercício Michel Temer decidiu desmontar o aparelho petista que dominava a empresa. Logo que assumiu, Temer demitiu da direção da EBC o jornalista Ricardo Melo, que Dilma Rousseff nomeara poucos dias antes de ser afastada da Presidência, numa clara manobra da petista para criar um enclave no governo Temer. Assim, a tropa de choque dilmista teria à sua disposição uma plataforma de comunicação para defender a tese do “golpe”. Tanto isso é verdade que Ricardo Melo, assim que voltou à direção da EBC por força de uma liminar da Justiça, mandou a emissora entrevistar Dilma e ordenou que os veículos da empresa voltassem a tratá-la como “presidenta”.

Esse episódio ilustra o caráter privado da EBC, contrariando o que prometiam seus idealizadores nos idos de 2007, quando a empresa foi criada por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A EBC deveria ser uma empresa de comunicação pública, a serviço dos cidadãos e voltada para a produção de programas que estimulassem a cultura e ousassem no formato, sem compromissos comerciais e muito menos políticos. Na prática, tornou-se um cabide de empregos para jornalistas amigos do governo petista, que em troca transformaram a EBC em porta-voz do partido.

Isso ficou claro no “debate” promovido pelos apaniguados do PT na Câmara a título de defender a EBC. No jogral ensaiado pela turma, o alvo foi o já surrado “monopólio da radiodifusão comercial”, ao qual a EBC seria o heroico contraponto. “Quem se opõe à construção de uma comunicação pública forte são aqueles que detêm o monopólio da circulação das notícias e das ideias, do discurso sobre a nossa sociedade”, disse Renata Mielli, coordenadora de um tal Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Como se sabe, “democratização da comunicação” é um eufemismo para o ataque à imprensa livre, que os petistas desde sempre enxergam como instrumentos de poder das “elites”. Nesse caso, o papel da EBC é claríssimo: funcionar como a TV do PT nessa batalha de comunicação, torrando dinheiro público, é claro, pois os petistas não sabem atuar de outra maneira.

Assim, quando a presidente do Conselho Curador da EBC, Rita Freire, disse no “debate” na Câmara que “nós não vamos deixar que toquem na EBC”, ela vocalizou o pensamento dos que se julgam donos da empresa. Em outra ocasião, quando Temer tomou a decisão de mexer na EBC, Rita disse que era preciso “urgentemente” desvincular a empresa da Presidência da República. De fato, essa é uma das patologias congênitas da EBC: ela foi constituída para ser controlada por Lula. O curioso é que somente agora, quando a Presidência não é mais do PT, o Conselho Curador se preocupou com esse problema.

Mas é claro que não se pode cobrar coerência ou racionalidade de quem está defendendo o sequestro do Estado por um partido que se considera o único porta-voz legítimo de todas as minorias e defensor dos direitos do povo. “Onde o índio, o coletivo de mulheres, os LGBTs, o movimento sem-teto e outros tantos teriam espaço?”, perguntou Ricardo Melo, presidente da EBC, que em seguida arrematou: “É isso o que irrita o governo que está aí. O que está acontecendo é, na verdade, não só um desmonte da empresa de comunicação pública, mas um ataque político à democracia”. Exótica essa noção de democracia, segundo a qual é legítimo que o dinheiro público financie a difusão do pensamento único.


Golpe na corrupção - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 24/06

A melhor forma de combater a corrupção é, sem dúvida, evitar que ela ocorra. Fechar todas as portas e janelas que se conhecem como passagem para as espertezas que envergonham e empobrecem o país. Nesse sentido, o Brasil acaba de dar um passo importante no combate a esse mal em um nicho que, nos últimos anos, havia se transformado em valhacouto, verdadeiro festim com o dinheiro público, principalmente no plano federal. O Senado aprovou, esta semana, a Lei de Responsabilidade das Estatais.

Menos expostas à fiscalização da sociedade do que à administração direta, as estatais controladas parcial ou totalmente pela União eram, até agora, presas fáceis de arranjos político-partidários. Passaram, por isso, a ser disputadas por malfeitores interessados em rios de propinas.

Mesmo que nem tudo que foi denunciado seja comprovado, a delação premiada do ex-senador e ex-presidente da Transpetro (subsidiária da Petrobras), Sérgio Machado, que movimentava bilhões de reais, deveria ter bastado para convencer a todos de que é preciso estancar a hemorrágica imoralidade que tomou conta de boa parte dessas empresas.

Deveria, mas não bastou. Pelo menos para a maioria da Câmara dos Deputados, que, na calada da noite de 15 de junho, torpedeou projeto de lei destinado a conter, ainda que só em parte, a influência política e corporativa nas estatais, tornando mais rígidas as exigências para a nomeação de seus dirigentes. O que os deputados votaram é a manutenção da farra, retirando do texto todas as limitações e exigências para poder reivindicar nomeações que obedeceriam a seus interesses nem sempre confessáveis.

O texto original, felizmente resgatado e aprovado pelo Senado, proíbe que parlamentares e dirigentes de partidos políticos sejam membros da diretoria e dos conselhos de administração das empresas estatais. Também não poderão ocupar esses cargos as pessoas que nos últimos três anos participaram de atividades políticas ou partidárias, de campanhas eleitorais e de organização sindical. Os conselhos administrativos terão, pela Lei das Estatais, obrigatoriamente, 25% de seus quadros constituídos de profissionais independentes.

Além disso, exige, para a nomeação, experiência comprovada em cargos de nível superior, seja no setor público, seja ou no privado, inclusive dos profissionais liberais. A lei aprovada determina providências a serem tomadas pelas estatais no sentido da transparência de suas ações, incluindo a divulgação periódica de balanços e de detalhes da remuneração da diretoria e conselhos.

É claro que nem todas as possibilidades de má gestão ou de corrupção estão removidas. Afinal, basta lembrar que boa parte dos envolvidos nos desvios apurados pela Operação Lava-Jato eram funcionários de carreira da Petrobras, embora indicados e mantidos por dirigentes políticos. Mesmo assim, a Lei de Responsabilidade das Estatais pode se tornar um marco e um paradigma na administração do patrimônio público brasileiro. Isso vai depender do acompanhamento permanente das lideranças políticas de boa-fé e, sobretudo, da sociedade.


NO PT SÓ TEM LADRÃO!


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

GRAVAÇÕES TRATAVAM ATÉ SOBRE ‘PULADAS DE CERCA’
As gravações do ex-senador Sérgio Machado, que implicaram próceres do PMDB, inclui confissões sobre questões pessoais e familiares e, até, aventuras extraconjugais, desprezadas na investigação. Para ganhar a confiança dos interlocutores cujas conversas gravaria, o ex-presidente da Transpetro, que fez acordo de delação premiada, mostrou-lhes uma “pasta israelense” que serviria para bloquear telefones celulares.

ALÔ, GRAVANDO
Com seu celular sobre a “pasta israelense”, Sérgio Machado deitou e rolou, gravando conversas para escapar da cadeia.

PARTILHA DO ROUBO
Como os pecados pessoais não interessavam à investigação, priorizou-se a partilha do dinheiro surrupiado por Machado da Transpetro.

OPÇÃO ERRADA
Na tentativa de repetir o caso Delcídio, Sérgio Machado orientou suas conversas gravadas na suposta conspiração para obstruir a Justiça.

PERGUNTA NA LAVA JATO
Se de fato pagou R$ 70 milhões a Renan, Sarney, Jucá e Lobão, por que Machado não provocou esse assunto nas conversas gravadas?

PETISTAS TEMEM QUE PAULO BERNARDO FAÇA DELAÇÃO
A prisão de Paulo Bernardo, que foi ministro dos governos Lula e Dilma, deixou correligionários à beira de ataque de nervos. Eles temem que o investigado não suporte a prisão e logo feche acordo de delação premiada, até porque vinha se queixando de “abandono” de Lula & Cia. Ao contrário da mulher, senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), ele não tem foro privilegiado e pode passar uma longa temporada na cadeia.

CANA LONGA
Ainda que tente fazer delação, Paulo Bernardo ficará longa temporada preso, segundo avaliam experientes investigadores.

VEM MAIS POR AÍ
João Vaccari Neto, que ontem foi alvo de novo mandado de prisão, também se queixa de abandono do PT e negocia sua delação.

CAMARADAGEM
A oposição ao PT foi novamente muito cordial, evitando repercutir a prisão do ex-ministro de Lula e Dilma na comissão do impeachment.

BATEU O DESESPERO
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) ficou abatida após a prisão do marido. Aliados de Dilma avaliam que a Operação Custo Brasil liquidou suas chances, que já não eram muitas, na comissão do impeachment.

BICO FECHADO
Senadores e deputados, do governo e da oposição, se esconderam para evitar falar sobre a prisão de Paulo Bernardo. Aposta-se nos festejos de São João para o episódio perder força na imprensa.

CASSAÇÃO É SOLUÇÃO
Segundo Glauber Braga (PSOL-RJ), a solução para a Câmara se livrar do presidente interino Waldir Maranhão (PP-MA) é cassar Eduardo Cunha para provocar nova eleição para o cargo.

DISTRIBUIÇÃO DE TAREFAS
A senadora Simone Tebet (PMDB-MS) reclamou com aliados do governo. Enquanto os petistas acusam suposto golpe, os defensores do impeachment se calam. “Precisamos de distribuição de tarefas”, diz.

VICE VAI DAR BARULHO
Deve virar alvo o mais provável vice do deputado Cícero Almeida (PMDB-AL) na disputa pela Prefeitura de Maceió. Trata-se de Omar Coelho, que foi acusado de integrar um esquema de compra de votos em eleição para a OAB-AL, entidade que presidiu. Tem até gravação.

MEU PIRÃO PRIMEIRO
Médico e senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) aproveitou a votação do Supersimples e emplacou uma emenda que reduz os impostos para serviços de medicina, enfermagem e exames laboratoriais.

A COISA ESTÁ FEIA MESMO
Renan Calheiros resolveu imitar o falecido senador ACM, que, quando se desesperava diante da falta de respostas às malfeitorias atribuídas a ele, passava a difamar e tentar destruir quem as denunciava. E até quem as divulgava, os jornalistas, na tola tentativa de intimidá-los.

ERA O QUE FALTAVA
Após Lava Jato, Petrolão, obras inacabadas, vírus zika, desistências de atletas e a crise no Rio, internautas do grupo “Nostradamus” alertam para um “perigo iminente” nas Olimpíadas: um improvável tsunami.

PENSANDO BEM…
… até pelos números impressionantes da roubalheira que desbaratou, a Lava Jato deveria mudar de nome para Operação Pega Ladrão.