segunda-feira, abril 25, 2016

Freud estará morto? - LUIZ FELIPE PONDÉ

Folha de SP - 25/04

No futuro, sexo será coisa de pobre. Diz, de repente, meu amigo esquisito, que anda meio deprimido com o Brasil "inteligente", que insiste em amar o populismo brega do PT. Mas, voltemos à hipótese acima. Por que no futuro sexo será coisa de pobre?

Vamos desenvolver essa intuição desesperadora. Simples: porque os mais ricos e instruídos farão sexo sustentável consigo mesmos. O acúmulo de riqueza está deixando a moçadinha mais instruída brocha. A vida sexual nessa camada social será uma grande punheta. Faça um teste: entre os mais jovens, só os pobres ainda acreditam na "diferença sexual". Dito de forma direta: só os mais pobres acreditam que existam homens e mulheres entre nós.

E qual a razão "filosófica" pra isso? Simples, de novo. A histeria (aquela que deixava as mulheres do tempo de Freud paralisadas diante do gozo) hoje se fez laço político utópico. A utopia política é histérica porque toda utopia é histérica.

Limpinha, perfeita, imaculada, paralisada diante da realidade suja. A histeria teme o gozo porque tem horror ao sexo, sujo em sua natureza íntima. E os inteligentinhos (histéricos de carteirinha) determinaram que o sexo é político.

Para gozar, temos que ser sujos e injustos. Imagine uma histérica de hoje, toda limpinha, fazendo um boquete num cara? A exigência será que o esperma seja orgânico e igual para todos.

Os heterossexuais serão visto andando em bandos na periferia, mergulhados em sua ignorância, acreditando na fábula da "diferença entre os sexos". Os mais ricos terão aderido ao movimento "transnada". Mesmo os gays já serão um fenômeno de classe C. O chique mesmo será visto nas ruas da zona oeste, passeando com seu golden retriever: o "transnada". Figura eclética, criada pela sociologia "progressista".

Nosso "transnada" frequentará consultórios de psicanalistas e se cortará diante de sua analista, procurando sentir alguma coisa, já que a sociologia de gênero terá provado que seu "corpo é uma representação social". Como sentir alguma coisa se seu corpo é uma representação social? Como um fantasma, nosso "transnada" vagará pelo mundo das representações sociais.

Detalhe: a cegueira contemporânea é não perceber que a agressão ao desejo agora não vem do "cristianismo", mas do sexo como representação social. É a utopia do sexo correto que aniquilará o desejo pelo corpo.

Acreditar que o corpo seja uma representação social é como crer em almas penadas: uma vez tendo caído na rede, você fica bobo e o próximo passo será a crença em duendes.

Aprofundemos um pouco mais. Como pensar em sexo sem pensar na pulsão de morte? Conceito problemático para um mundo rico que localizou o mal na opressão social. Só o capital carrega a "letra escarlate" da pulsão de morte. E sem pulsão de morte, o sujeito está morto. Por isso, só os mais pobres farão sexo.

Porque estes ainda gozarão com o "mal" em si mesmos. Sem pulsão de morte não há sexo nem gozo.

Vou contar um fato que presenciei recentemente, que parece não ter nada a ver com isso, mas que tem tudo a ver.

Estava eu observando um grupo de monitores conversando com um grupo de crianças de uns quatro ou cinco anos, num ambiente de classe A em São Paulo. Um dos meninos chuta uma árvore. Parece irritado. O monitor, carregado daquela bondade perigosa e adocicada, diz para ele em forma de repreensão, mas fingindo ser uma forma de amor ao portador:

"Joãozinho!" (vamos chama-lo de Joãozinho para prestar uma homenagem a esse personagem já perdido no tempo, um tempo sem a melação de hoje em dia).

"Você não lembra do desenho que acabamos de ver?". Joãozinho para, assustado. "Você não lembra que o desenho mostra que se maltratarmos a natureza isso fará mal para nós mesmos?" Joãozinho permanecia imóvel diante de "tanto amor à natureza".

Os idiotas do bem esqueceram do ensinamento do grande Nelson Rodrigues, nosso maior especialista em sexo, desejo e pulsão de morte: "Só os neuróticos verão a Deus". No futuro, só os sujos terão corpo. Só os pobres de espírito farão sexo. Só os injustos gozarão. Freud estará de fato morto.

A mentira do golpe - PAULO GUEDES

O GLOBO - 25/04

A falsa narrativa é na verdade o maior de todos os golpes que poderiam ser desferidos contra o regime democrático brasileiro



A presidente Dilma teve o bom senso de não atacar nossas instituições em sua fala na ONU. Pois a falsa narrativa de que estaria sofrendo um golpe pelo processo de impeachment é na verdade o maior de todos os golpes que poderiam ser desferidos contra o regime democrático. A mentira do golpe é pior do que “um gravíssimo equívoco” e “uma ofensa às nossas instituições”, como condenaram os ministros do Supremo Celso de Mello e Dias Toffoli. É uma perversa convocação à militância na tentativa de manter o poder, apesar das evidências de desrespeito à lei orçamentária e de omissão ou cumplicidade com a roubalheira. É também uma desonesta desculpa para o colapso político e econômico de um país exaurido pela incompetência e pela corrupção.

Compromete nosso futuro porque tenta ocultar o aperfeiçoamento institucional que experimentamos. O despertar de instituições republicanas revela disfunções de um capitalismo de quadrilha, em que se associam a falta de transparência e a corrupção no aparelho de Estado à compra de sustentação parlamentar, cimentando degenerada aliança de piratas privados e criaturas do pântano político. O impeachment de Collor foi golpe contra presidente que não era de “esquerda” e não dividiu o butim? Ou foi avanço institucional pela declaração de independência do Legislativo? Poder que exerce agora atribuições constitucionais avaliando a admissibilidade do impeachment de Dilma. Como um Judiciário independente celebrará no futuro as atuações históricas de Joaquim Barbosa e Sergio Moro.

É o fim da administração centralizada gerencialmente caótica (excesso de ministérios) e politicamente desarticulada (sem sintonia com Estados e municípios). Prioridades da democracia emergente (saúde, educação, saneamento) exigem políticas públicas de execução descentralizada. A lipoaspiração do governo federal (reforma administrativa) e a descentralização de recursos para Estados e municípios (reforma fiscal) aumentam a eficiência e melhoram a governabilidade. Impostos disfuncionais (reforma tributária), relações de trabalho obsoletas, encargos sociais proibitivos (reformas trabalhista e previdenciária) e marcos regulatórios deficientes impedem investimentos. As reformas na política e na economia são urgentes e indissociáveis.

Por quem Lula chorou? - VALDO CRUZ

Folha de S.Paulo - 25/04

Lula foi às lágrimas no dia da derrota da batalha do impeachment. Ao lado de Dilma, ele chorou três vezes quando a Câmara aprovou a abertura do processo de impedimento contra sua criatura.
O ato de chorar implica profundo sofrimento e demanda respeito – a não ser quando são vertidas lágrimas de crocodilo, o que não era o caso. Mas por quem Lula chorou?

Por Dilma? Certamente, ao ver a seu lado, no Palácio da Alvorada, alguém que, pela história política, não merecia tal destino. Só que Lula também sabe que ela, durante seu governo, fez por onde ser derrotada.
O ex-presidente deve ter se lembrado dos inúmeros conselhos dados à petista nos últimos anos, mas que não foram acatados. Ali, em seu silêncio e olhando pelas vidraças do Alvorada, deve ter se perguntado: por que ela não me ouviu? E chorou.

Pelo PT? Também, ao notar que naquele momento ficava mais complicada sua tarefa de recuperar o projeto original de seu partido, perdido nas negociatas do petrolão ao virar farinha do mesmo saco e aderir ao velho esquema da propina.

Por ele mesmo? Com certeza, ao sentir que o legado de seu governo corre sério risco de ser aniquilado pelo fracasso da administração de sua sucessora. Naquele instante, Lula deve ter refletido: por que a escolhi candidata? E chorou.

Pelo Brasil? Talvez, mas deveria, porque não tivesse hoje o país mais de 10 milhões de desempregados e mergulhado na pior recessão da história o destino não reservaria tal desfecho para ele e Dilma Rousseff.
Em suas reflexões, o ex-presidente deve estar, principalmente, matutando com os amigos: por que sua criatura nunca fez, de fato, uma autocrítica e assumiu seus erros.

Enfim, interlocutores e amigos de Lula têm a avaliação de que Dilma se aproxima da hora de se afastar do governo numa atitude de autonegação –e quando não se enxerga os próprios erros não se evita os precipícios. Deu no que deu. E em choro.

Vice-presidente escuta diagnósticos pessimistas - EDITORIAL VALOR ECONÔMICO

VALOR ECONÔMICO - 25/04

O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, admitiu, na semana passada, a possibilidade de um novo contingenciamento das dotações orçamentárias, em virtude da queda continuada das receitas da União. Por isso, Barbosa pediu pressa ao Congresso Nacional para que vote a mudança da meta fiscal deste ano, que autoriza o governo a fazer déficit primário neste ano. Só com a alteração da meta o governo não seria obrigado a fazer os novos cortes, que podem paralisar a administração federal. O apelo do ministro da Fazenda dá uma dimensão precisa da situação dramática das contas da União.

Essa é a realidade sobre a qual a equipe do vice-presidente Michel Temer terá que se debruçar, caso o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff seja acolhido pelo Senado. No encontro que manteve com o economista Armínio Fraga, Temer ouviu que a situação é mais dramática do que aparenta, pois estaria camuflada nas últimas semanas pelo impacto da melhora do mercado internacional e pela própria perspectiva do afastamento de Dilma.

Os diagnósticos que os economistas estão fazendo ao vice-presidente mostram que o Tesouro está quebrado, a grande maioria dos Estados está quebrada, a situação da Petrobras e dos bancos estatais é delicadíssima, existindo a possibilidade concreta de que o Tesouro seja obrigado a capitalizá-los.

A conclusão que o vice-presidente estaria tirando das conversas com os economistas, de acordo com relatos da imprensa, é a de que não poderá se comprometer com o reequilíbrio das contas públicas em um prazo curto. O estrago feito pela gestão de Dilma Rousseff foi grande e para atingir o equilíbrio do Orçamento seria necessário fazer um corte monumental nas despesas, algo como R$ 100 bilhões. Essa tarefa não é politicamente viável.

Se Temer vier a assumir a presidência da República, a ideia será, portanto, a de executar um programa de ajuste que resgate a capacidade do setor público gerar superávits, mas de forma gradual. Em vez de prometer equilíbrio das contas já em 2017, o que não seria crível para o mercado, o programa de Temer apontaria superávit primário para 2019 ou 2020.

A execução de um programa de ajuste crível, por uma equipe econômica com credibilidade, promoveria um choque de confiança que ajudaria a retomada do crescimento. O aumento da atividade econômica resultaria em mais receitas tributárias, o que fortaleceria o equilíbrio das contas públicas. Essa é a estratégia que parece estar sendo delineada pelos assessores mais diretos de Temer.

Para demonstrar o espírito de austeridade que pretende imprimir ao seu governo, o vice-presidente estaria disposto a reduzir os atuais 32 ministérios para cerca de 20 e fazer um corte substancial nos cargos comissionados. A economia com essas medidas é pequena, mas os assessores de Temer acham que elas teriam um valor simbólico importante neste momento.

Para dar certo, a estratégia de ajuste gradual das contas públicas precisa, no entanto, ser acompanhada de medidas concretas que fortaleçam as expectativas favoráveis geradas inicialmente. Só terá futuro um plano que diga para a sociedade o que o governo vai fazer para evitar o aumento continuado das despesas obrigatórias, em ritmo maior do que o crescimento da economia.

Entre as medidas que estão sendo discutidas pelos assessores mais próximos do vice-presidente estão, de acordo com os relatos da imprensa, a desvinculação das verbas orçamentárias, desindexação dos gastos sociais da variação do salário mínimo, a reforma tributária, a flexibilização do mercado de trabalho e a reforma da Previdência Social, com o estabelecimento da idade mínima para a aposentadoria.

Todas essas mudanças necessitam de amplo apoio político, que o vice-presidente terá que garantir. Ele não conseguirá fazer isso sozinho. Como ocorreu com o Plano Real, executado no governo de outro vice-presidente que substituiu o titular também por causa de impeachment, somente com apoio das principais lideranças políticas do país será possível executar um programa que reequilibre as contas do setor público brasileiro. Esse é um desafio que terá que contar com a ajuda de todos.

Impeachment não é o epílogo - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 25/04

Nem bem terminou a sessão da Câmara que aprovou o prosseguimento do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o País foi informado de que, na Operação Lava Jato, surgiram mais indícios de crimes que teriam sido cometidos pela própria Dilma e por outras figuras de proa da República. Ao que parece, o impeachment, por mais dramático que seja, será apenas um capítulo, e não o epílogo, da purgação da política nacional.

O nome da presidente foi citado na delação premiada de Diogo Ferreira, ex-chefe de gabinete do senador Delcídio Amaral. Ferreira informou aos investigadores que, segundo o que ouviu de Delcídio, Dilma pretendia interferir no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para “libertar réus importantes da Lava Jato”, citando “expressamente” o nome do empreiteiro Marcelo Odebrecht.

Dilma teria exigido que o desembargador Marcelo Navarro, nomeado por ela para o STJ, assumisse um “compromisso de alinhamento” com o governo. Toda essa negociação foi testemunhada por Delcídio, disse Ferreira, que participou de reuniões e trocou mensagens com personagens da suposta manobra - destinada a livrar igualmente os ex-diretores da Petrobrás Renato Duque e Nestor Cerveró. Para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, houve uma “trama espúria” no Palácio do Planalto.

Na segunda-feira, foi a vez de Cerveró dizer ao juiz Sérgio Moro que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), recebeu propina de US$ 6 milhões de um dos operadores do petrolão. Não foi possível saber mais detalhes porque Moro pediu ao depoente que parasse de falar, já que se tratava de citação de acusado com foro privilegiado.

No entanto, mesmo breve e incompleta, essa menção a Renan, no momento em que ele se prepara para presidir o decisivo trâmite do processo de impeachment no Senado, é suficiente para devolver o nome do parlamentar à berlinda, de onde ele tentava fugir de todas as maneiras. Agora, mais do que nunca, Renan usará o poder que tem sobre o processo contra Dilma para tentar escapulir do cerco judicial.

Outro que usa o cargo para evitar o acerto de contas com a Justiça é o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e sua habilidade permitiu até agora que, mesmo diante de gritantes evidências de crimes financeiros os mais diversos, ele pudesse conduzir a sessão do impeachment de Dilma. Mas, dois dias antes da sessão, o deputado voltou a ficar no centro do noticiário policial, quando se divulgou a delação de Ricardo Pernambuco Júnior, dono da Carioca Engenharia. Segundo o empreiteiro, as empresas envolvidas na construção do Porto Maravilha, programa de revitalização da zona portuária do Rio, deveriam pagar R$ 52 milhões de propina a Cunha.

Perito em manobrar o regimento da Câmara para se livrar da cassação, Cunha até agora foi bem-sucedido - e seus aliados já dizem que o deputado deverá até mesmo completar seu mandato. No entanto, Cunha não tem mais o impeachment como trunfo, e isso deve reduzir drasticamente seu poder de barganha.

Por fim, a semana do impeachment reservou dor de cabeça adicional ao grande chefe petista, Luiz Inácio Lula da Silva. Um laudo da Polícia Federal indicou que o ex-presidente recebeu R$ 3,6 milhões da Andrade Gutierrez, entre 2011 e 2014. Os valores transitaram por uma conta usada pela empreiteira para pagar empresas investigadas por lavagem de dinheiro no âmbito da Lava Jato.

Nesse cenário, a única certeza é que não se sabe o que mais está por vir. O impeachment de Dilma, hoje dado como certo, não encerrará, em nenhuma hipótese, a marcha de acontecimentos que já ninguém controla. Por mais que Dilma apele a seu passado de torturada pela ditadura para se dizer perseguida, por mais que Renan e Cunha se julguem protegidos pelos cargos que ocupam, por mais que Lula pense estar acima da lei por se considerar o salvador dos pobres, todos eles, e também seus inúmeros cúmplices, muitos em posição de destaque na política e na economia, terão de se ver com a Justiça, mais cedo ou mais tarde. Que o País tenha firmeza e serenidade para enfrentar os próximos capítulos desse intenso drama.