terça-feira, junho 30, 2015

Uma mente confusa - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 30/06

Tentar pôr pecha de traidor em Pessoa piora as coisas para Dilma. A presidente Dilma, infelizmente para nós brasileiros e para o país, não tem o dom de organizar seu pensamento. Se fosse apenas uma dificuldade de se expressar, como quando resolveu louvar a mandioca e chamou-a de "grande conquista brasileira", já seria difícil para uma autoridade que tem obrigação de explicar seus atos a cada instante de seu governo.

Mas, quando o pensamento equivocado é também embaralhado, aí já se torna um problema político-institucional. Se ela diz que não respeita delatores, está partindo do princípio de que o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, e outros executivos que fizeram suas delações premiadas estão revelando fatos verdadeiros que deveriam ser escondidos.

Sim, porque só pessoas que estão por dentro das conspirações ou bandidagens podem delatar companheiros em troca de algum benefício da Justiça. Foi para evitar que revelações sobre crimes fossem desqualificadas pelos interessados que o que chamamos de "delação premiada" tem o nome oficial de "colaboração premiada".

Mas, de qualquer maneira, Dilma jogou sobre Pessoa a pecha de traidor, comparando-o a Joaquim Silvério dos Reis, o que a deixa mal e a todos os denunciados pelo empreiteiro. E ela não percebe essa incongruência, o que faz com que prossiga em linha reta para o abismo sem que ninguém possa ajudá-la, já que, sabe-se, ela não admite contestações.

"Eu não respeito delator, até porque estive presa na ditadura militar e sei o que é. Tentaram me transformar numa delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas presas, e garanto para vocês que resisti bravamente. Até, em alguns momentos, fui mal interpretada quando disse que, em tortura, a gente tem que resistir, porque se não você entrega seus presos."

Nessa frase, temos de tudo: confusão entre seu papel como guerrilheira e o dos petistas no mensalão e no petrolão; ignorância assombrosa da diferença entre democracia e ditadura e, sobretudo, a insensatez de comparar os inconfidentes mineiros com mensaleiros e petroleiros, que podem ser tudo menos patriotas heroicos em luta contra opressão estrangeira.

Não há Tiradentes nessa história que Dilma tenta recontar, e nem ela foi uma lutadora pela democracia, como pretende hoje. A tortura de que ela e muitos outros foram vítimas é uma página terrível de nossa história, mas não pode servir de desculpa para justificar roubos de uma quadrilha que tomou de assalto o país nos últimos 12 anos, nem para isentar os eventuais desvios cometidos pela presidente.

Ao contrário, aliás, muitos fazem hoje a comparação da sanha arrecadatória do governo federal com os "quintos do inferno", que a colônia portuguesa tirava do Brasil. Quanto à insinuação de que os presos pela Lava-Jato sofrem torturas como no tempo da ditadura, só mesmo a politização da roubalheira justifica tamanho despautério.

A propósito, o jurista Fábio Medina Osório, especialista em questões de combate à corrupção e improbidade administrativa, "olhando o direito comparado e o que ocorre hoje no mundo em termos de combate à corrupção", discorda dos que consideram abusivas as prisões decretadas pelo juiz Sérgio Moro.

"Não apenas nos EUA, mas na Europa, prisões cautelares têm sido utilizadas no início de processos ou quando investigações assinalam elementos robustos de provas", diz, lembrando os casos do ex-premier de Portugal José Sócrates e dos dirigentes da FIFA, presos cautelarmente por corrupção - alguns em avançada idade -, que seguem encarcerados. "A ideia não é humilhar, mas, diante do poder econômico ou político das pessoas atingidas, estancar o curso de ações delitivas de alto impacto nos direitos humanos, tal como ocorre no combate à corrupção".

Medina Osório lembra que, "nos termos da Lei Anticorrupção, as empresas deveriam ter aberto robustas investigações para punir culpados e cooperar com autoridades, talvez até mesmo afastando os executivos citados nas operações, se constatadas provas concretas ou indiciárias de suas participações em atos ilícitos".

Ao não cooperar nem apurar os atos ilícitos noticiados, "as empresas sinalizam que estão ainda instrumentalizadas por personagens apontados pela Operação Lava-Jato como os possíveis responsáveis".

Para Medina Osório, vale indagar: o que é realmente novo aqui no Brasil? "Prisões democráticas, onde cabem ricos e pobres, convenhamos".

O PT e suas falácias - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 30/06

Após a homologação pelo STF da delação premiada de Ricardo Pessoa, dono das construtoras UTC e Constran e apontado como articulador do cartel de empreiteiras acusado de atuar no escândalo da Petrobrás, o PT tenta se defender com todos os recursos disponíveis das suspeitas que recaem mais pesadamente do que nunca sobre a rapaziada. Mobiliza uma ampla rede de militantes na internet, desmente tudo com hipócrita indignação e, no último fim de semana, escalou para falar ministros acusados de se beneficiarem da roubalheira. O repertório petista, quase sempre baseado no princípio de que a melhor defesa é o ataque, torna-se mais falacioso à medida que a pressão sobre o partido aumenta.

Um recurso recorrente da contraofensiva petista é a tentativa de desqualificar o instituto da delação premiada, colocando os denunciados na posição de vítimas de malvados fora da lei que pretendem apenas aliviar a própria culpa. Quem concorda em fazer um acordo de delação tem a intenção de, em troca, ver reduzida a pena a que vier a ser condenado. É o caso do próprio Ricardo Pessoa, que já se beneficia da prisão preventiva domiciliar monitorada por tornozeleira eletrônica. O que os petistas não contam é que uma delação premiada só é homologada pela Justiça – como o fez o ministro Teori Zavascki com o depoimento de Pessoa – após a comprovação de uma base factual que dê credibilidade às denúncias. Se o juiz entender que as denúncias são improcedentes, o acordo é anulado. Quer dizer: delator mentiroso não ganha nada com isso.

Outra esperteza petista, incorporada a seu discurso desde que o PT chegou ao poder e passou de estilingue a vidraça, é tentar se eximir de culpas com o argumento descarado de que seus adversários cometem exatamente os mesmos malfeitos que lhe estão sendo atribuídos. É a isonomia às avessas, segundo a qual todos são iguais não perante a lei, mas perante o crime: se meu adversário pode roubar, eu também posso.

Foi partindo exatamente desse raciocínio – de que roubar não faz mal porque todo mundo rouba – que o presidente Lula impôs, em nome da governabilidade, o peculiar “presidencialismo de coalização”, que justificou o PT ter renegado toda sua pregação histórica pela probidade na vida pública para se aliar aos mais notórios corruptos da política brasileira. De outra maneira, argumentam até os petistas bem-intencionados, “é impossível governar”. Deu no que está aí.

Outro truque a que os petistas – como, de resto, os políticos em geral – recorrem na maior caradura é garantir, invariavelmente, que todo o dinheiro recebido de empresas privadas constitui “doação legal” e “devidamente registrada” na Justiça eleitoral. Ora, o fato de uma doação estar registrada na contabilidade oficial do partido nada prova em relação a sua origem. É sabido, por óbvio, que nas relações com o poder público os empresários não fazem doação, mas um investimento que esperam recuperar com boa margem de lucro. E esse investimento pode ser o produto de chantagem ou das “regras do jogo”, como alegam os cínicos. Investigações como as que estão sendo realizadas com rigor e empenho pela Operação Lava Jato estão servindo para esclarecer de onde vieram as “doações legais” que alimentam os cofres partidários.

É óbvio também, quando se trata de receber “doações”, que quem está no governo leva enorme vantagem sobre quem não está e, portanto, pouco ou nada tem a oferecer em troca. Não é por outra razão que, na mamata da Petrobrás, o propinoduto estava montado para jorrar “doações” e “recursos não contabilizados” – para usar a expressão consagrada pelo primeiro tesoureiro petista a ir para a cadeia – nos cofres do PT e de seus dois principais aliados no governo, o PMDB e o PP.

Acusado por Ricardo Pessoa, o ministro Edinho Silva, chefe da Comunicação Social da Presidência, fez um bom resumo de todos os argumentos falaciosos do PT, ao protestar contra as “mentiras divulgadas pela imprensa”: “Causa-me indignação a tese de criminalização seletiva das doações da nossa campanha (de Dilma, em 2014). E acho estranho suspeitas colocadas apenas sobre as doações legais da campanha da presidente Dilma, enquanto outros partidos também receberam”. Se a defesa da elite do PT ficar nisso, as cadeias vão lotar.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Eu não respeito delator” Presidente Dilma tentando desqualificar as revelações do empreiteiro Ricardo Pessoa  
ASSESSORIA ENGANOU DILMA COM FALSOS NÚMEROS

Um bando de medrosos e uma má gestora inventaram a economia de fantasia no Brasil. A área econômica do governo enganou Dilma sobre contas públicas em 2014, segundo fonte graduada do Planalto, criando a ‘magia’ de duplicar números. Usavam a mesma fonte de receita para dois cálculos diferentes e sequenciais, mas, ao ser usada no primeiro, a mesma receita não poderia aparecer no segundo cálculo. Mas apareceu e deu a percepção de mais fontes de receita do que existem.
 
BALÃO MÁGICO

“Eles mentem e ela acredita”, diz o assessor, dando nomes aos bois: Ministério da Fazenda, Secretaria do Tesouro e Banco Central.
 
ME ENGANA QUE EU GOSTO

O relato do assessor graúdo ilustra a péssima capacidade de Dilma de analisar as informações dos ‘mágicos’ da sua equipe econômica.
 
CAROCHINHA

No Ministério do Desenvolvimento, prevalecia o conto da carochinha: Dilma não era informada das angústias do comércio e da indústria.
 
BANDO DE MEDROSOS

Quando se percebia a manobra enganadora da equipe econômica, eles diziam internamente que, se falassem a verdade, Dilma iria ‘explodir’.
 
PESSOA CONFIRMA PAGAMENTOS A FILHO DE CEDRAZ

O ministro Aroldo Cedraz tentará o apoio dos colegas do Tribunal de Contas da União (TCU), nesta terça (30), contra revelações de Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC, de que pagava R$ 50 mil por mês a seu filho, advogado Tiago Cedraz, para obter informações na corte. Além disso, em um caso sobre obras bilionárias na usina nuclear de Angra 3, o escritório de Cedraz teria negociado R$1 milhão com a UTC.
 
UM SANTO

O ministro Aroldo Cedraz processa jornalistas que noticiam denúncias envolvendo a influência do seu filho, Tiago, em seu tribunal.
 
CADÊ A INVESTIGAÇÃO?

Em nota, o TCU tentou desqualificar as revelações do empreiteiro Ricardo Pessoa, e não menciona providências para apurar a denúncia.
 
MINISTRO ACUSADO

Ricardo Pessoa não deixou mal apenas os Cedraz, pai e filho: também apontou sua metralhadora giratória para o ministro Raimundo Carreiro.
 
SÉRIO DEMAIS

A viagem do ministro Joaquim Levy aos Estados Unidos, mesmo contra a vontade dos médicos, decorre do fato de que a parte econômica da visita oficial é importante demais para deixar só na mão de Dilma.
 
O PAÍS NA CABECEIRA

Assim que Joaquim Levy deu entrada no Hospital do Coração, em Brasília, sexta-feira à noite, o País prendeu a respiração. O alívio só apareceu quando ele recebeu alta, horas depois.
 
NO GRITO

A esquerda tentará impedir no grito a votação do projeto que reduz a maioridade penal. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, não parece impressionado: diz que vai votar o projeto hoje (30).
 
ARREGLO

O governo apelou ao presidente do Senado, Renan Calheiros, para segurar a medida provisória do reajuste do salário mínimo. Renan ainda não sinalizou se vai facilitar a vida do Planalto.
 
PREJUÍZO OMITIDO?

Assessoria da Andrade Gutierrez alega que o grupo teve prejuízo de R$ 451 milhões em 2014, mas isso não consta nas demonstrações financeiras padronizadas publicadas no site pela AG Participações S.A.
 
LUCRO MUDOU DE NOME

De acordo com os demonstrativos da holding controladora da Andrade Gutierrez, a empreiteira teve lucro líquido de R$ 1,59 bilhão no primeiro mandato de Dilma. O grupo foi o maior “investidor” na reeleição dela.
 
SOBRANDO DINHEIRO

O Impostômetro registrou ontem a marca de R$ 1 trilhão retirados do bolso dos brasileiros em 2015, mas outras receitas do governo federal são bem mais significativas: já chegaram a R$ 1,4 trilhão.
 
SINAL TROCADO

Velha raposa siberiana em Brasília não deixou de notar: ironicamente, nos duelos de vôlei masculino do fim de semana, a Rússia jogou de azul, os Estados Unidos de vermelho. E os americanos ganharam.
 
PERGUNTA NA LAVA JATO

Dilma respeita delator que, como Ricardo Pessoa, documenta suas delações?
 
PODER SEM PUDOR O GOVERNADOR REPROVADO

Enquanto preparava o livro sobre o avô, a deputada estadual Juliana Brizola (PDT-RS) lembrou da professora aposentada e ex-líder sindical, de 90 anos, que a procurou em seu gabinete para contar que reprovou Leonel Brizola por meio ponto, reencontrando o ex-governador gaúcho décadas depois, numa negociação salarial:

- Guria, como eu podia imaginar que o aluno que reprovei por meio ponto viria a se tornar governador?