segunda-feira, junho 09, 2014

Hobbes de bike - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP -09/06


Outro dia, em visita profissional a uma das principais capitais do país (aliás, uma das minhas preferidas), vi uma cena muito significativa do Brasil atual. De primeira não acreditei, levando em conta o tipo de pessoa envolvida, mas, depois, fui obrigado a aceitar a realidade dos fatos. O que eu vi? Já conto. Antes alguns reparos.

Já disse nesta coluna que estou mais pra Hobbes do que Rousseau em termos de rompimento do contrato social e da ordem pública, porque inclusive muito dos movimentos ditos sociais superestimam sua representatividade. Quando multidões se formam, em poucos minutos podem virar um grande instrumento de violência de massa. Ninguém é "bonzinho" quando se sente parte de uma massa de "iguais".

Hobbes é o cara que viveu uma vida honesta e responsável e dizia que sem ordem degeneramos em violência porque a vida é precária, perigosa, breve e dolorosa. Rousseau é o carinha que mandou os filhos pro asilo, enlouqueceu sua mulher, mas dizia que somos anjinhos e que a propriedade privada e a ganância é que fazem sermos maus e que em multidões revolucionárias "curamos" o mundo.

Voltemos ao Brasil. Por exemplo, com relação à Copa, essa coisa de "não vai ter Copa" é uma tentativa de estragar a alegria da maioria que nunca mais terá a chance de ver uma Copa no país. Isso não significa que não tenha havido abusos e absurdos na condução da logística e infraestrutura, mas nada disso justifica querer tornar a vida das pessoas um inferno com manifestações um tanto totalitárias. Os demais movimentos são naturalmente oportunistas no sentido que a medicina dá a certos processos infecciosos.

E mais: duvido fortemente da suposta evidência de que sem movimentos de rua a sociedade deixe de se modernizar. A Revolução Francesa é um fetiche de professores que erotizam a política da violência "criadora". A França, como a Inglaterra, teria se modernizado sem a maldita revolução. A maioria dos movimentos políticos marcados por uma metafísica revolucionária (jacobinos, Rússia, Cuba, China, Vietnã, Leste Europeu até a queda do muro de Berlim e outros) não serviu para nada a não ser para matar seus inimigos com desculpas metafísicas ou enriquecer seus líderes corruptos com o passar do tempo.

É fato surpreendente que o mesmo tipo de gente que se diz contra guerras goza com a ideia de revoluções. Acho que muita dessa gente goza mais gritando frases de efeito na rua do que transando. Mas muito psicanalista (e similares) por aí acha mesmo que a "verdadeira" clínica é a política. Toda teoria política com metafísica é totalitária em algum momento.

Mas e a cena que eu vi? Conto pra você agora. Estávamos nós saindo de um restaurante à noite quando o farol em nossa frente fechou. Um grupo grande de ciclistas passou. Mas, quando o farol fechou pra eles, em vez de pararem de passar, como seria o correto, três deles barraram a passagem dos carros que tinham o direito legal de passar, como fazem os policiais militares em situações excepcionais. Ou seja, foram autoritários.

Até aí, apenas mais um exemplo de que mesmo grupos que se julgam "do bem" (salvam o planeta pedalando, socializam durante as noites passeando, têm grana porque pobre anda de bicicleta durante o dia e rico anda de bike durante a noite) degeneram em violência quando em bando.

Aí um quarto ciclista se aproximou das filas de carro barradas por eles, desceu da bike, levantou a "magrela" no ar com as duas mãos, como se fosse uma Uzi ou alguma metralhadora similar, e a sacudiu gritando algo incompreensível.

Já vi aqui em São Paulo ciclistas fecharem carros, furarem o farol xingando o motorista (que também nem sempre é educado, diga-se de passagem), correndo riscos de vida. Na Dinamarca, capital das bikes chiques, vi comportamentos agressivos semelhantes.

Fosse eu uma dessas pessoas que "postam fotos", o ciclista estaria famoso a esta altura. A pergunta é: com quem estaria ele se identificando? Eu tenho algumas hipóteses. Entre elas, o líder do Boko Haram da Nigéria e suas meninas raptadas.

A herança maldita na infraestrutura - RAUL VELLOSO

O GLOBO - 09/06

Dificilmente escaparemos de comentários depreciativos dos turistas estrangeiros que, em breve, encherão nossas cidades



O noticiário sobre as obras de mobilidade urbana e dos estádios das cidades-sede da Copa do Mundo é uma eloquente vitrine dos velhos problemas da nossa combalida rede de infraestrutura. Apesar dos planos de expansão anunciados para todos os modais de transporte, na área de ferrovias e portos, por exemplo, especialmente nas primeiras, o calendário de investimentos está totalmente travado. O plano de rodovias avançou um pouco, mas muitos problemas permanecem sem solução. Na área de aeroportos, boas novidades em matéria de realização começam a aparecer em um ou outro, com muito ainda que fazer. Dificilmente escaparemos de comentários depreciativos dos turistas estrangeiros que, em breve, encherão nossas cidades para as partidas de futebol de suas seleções. Que a oportunidade nos estimule a pressionar os governantes por soluções efetivas, e a discutir o tema em profundidade nos vários fóruns e meios de comunicação que existem no país.

Infraestrutura inclui também eletricidade, saneamento e telecomunicações. Desses itens, só o último tem estado sob menor tiroteio, embora ainda haja dúvidas, quando se consideram quesitos como o bom funcionamento da internet na área dos novos estádios. Saneamento é fonte antiga de dificuldades. Quanto à energia elétrica, parece que não aprendemos muito com a recente experiência de racionamento (2001). Conforme livro escrito com colegas, que acabo de lançar, analisando a difícil situação atual e cujo conteúdo pode ser baixado gratuitamente na minha página eletrônica (raulvelloso.com.br), o subtítulo resume o drama: “Tarifas de energia artificialmente baixas e excesso de intervenção estatal provocam ineficiência econômica e expansão inadequada do setor.”

Nesse segmento, as políticas erradas são abundantes. E, como os governantes resistem a enfrentar o desgaste político de ajustar preços para equacionar o descompasso entre demanda e oferta decorrente dos erros, a escassez segue se agravando, as reservas vão se esgotando e a conta a pagar mais adiante aumenta a cada dia. A dramaticidade do quadro, não reconhecida pelo governo, é tal que a probabilidade de um novo racionamento — e tudo de complicado que isso implica — é cada dia mais elevada.

Conforme discutido em outro livro, este sobre transportes e também disponível no mesmo endereço juntamente com outros textos sobre o tema, há, em primeiro lugar, um sério problema de gestão pública. Além disso, existe enorme escassez de recursos públicos para investimentos nessa área e, paradoxalmente, uma postura governamental antissetor privado na gestão das concessões de infraestrutura.

Começando pelos dados de investimento da União, se compararmos o orçamento do Ministério dos Transportes de 2003 com os da década de 70, a queda é brutal. Mesmo medido em porcentagem do PIB, o gasto de 2003 foi 30 vezes menor que o daquela época. De lá para cá tem havido recuperação, mas, no ano passado, representaram apenas 1% do total gasto pela União, sem incluir o serviço da dívida.

A escassez de recursos para transportes se deve à opção, sacramentada na Constituição de 1988, de destinar a maior parte dos recursos federais a pagamentos a pessoas, ou seja, a Previdência, assistência social e pessoal. Assim, mesmo tendo a carga tributária se elevado de forma acachapante nos últimos anos, os recursos destinados a esses três segmentos representam hoje nada menos que 75% do total. Adicionando os 8% da saúde, sobram 17% para o orçamento residual, onde os investimentos em transportes se referem a apenas 1% do gasto total.

Diante dessa opção raramente discutida por parte da sociedade brasileira nos vários canais existentes, inclusive para saber se seus efeitos estão efetivamente alcançando as camadas mais pobres da população, o governo deveria construir — e manter vivo — um adequado marco regulatório para atrair investimentos privados e suprir as lacunas que se criaram, sem falar no fim das violações de contratos. Infelizmente, não é bem o que tem ocorrido na prática.

Depois de um período inicial de esforços bem-sucedidos, é possível afirmar que, desde 2003, vive-se uma incompreensível reversão no processo de concessão à iniciativa privada do direito de atuar em várias etapas da infraestrutura. Isso choca quem analisa o assunto, pois, num quadro de escassez aguda de recursos públicos, seria melhor dar exatamente o contrário. Sem falar que, sob o modelo de bem-estar social seguido no Brasil, os gastos com essa área tendem a explodir nos próximos anos. Ou seja, a escassez de hoje se multiplicará em breve, se não forem postas em prática reformas que reduzam o crescimento do gasto público. Nesse contexto, é preciso enfrentar questões complexas como a introdução da idade mínima de aposentadoria pelo INSS, a extinção do abono salarial e a atenuação da absurda regra de ajuste do salário-mínimo, que é piso dos benefícios sociais, pela variação do PIB de dois anos atrás. O obstáculo é que, em ano de eleição, os políticos querem tudo, menos esse tipo de discussão.

Inovação, competitividade, sobrevivência - JORGE J. OKUBARO

O ESTADO DE S.PAULO - 09/06

Os graves problemas enfrentados pela indústria de transformação nacional - que, além de perder fatias crescentes no mercado mundial, vê até mesmo seu espaço no mercado doméstico ser tomado por produtos importados - dão a dimensão da importância e da urgência de ações que lhe assegurem maior competitividade. Entre elas, inovação é a que mais tem sido mencionada no meio empresarial e nos gabinetes oficiais que tratam desse tema como prioridade. Daí a relevância do Fórum Estadão - Inovação, Infraestrutura e Produtividade, promovido na semana passada pelo Estado em parceria com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

As exposições feitas por representantes do governo, como o presidente da Finep, Glauco Arbix, e o secretário de Inovação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Nelson Akio Fujimoto, deixaram claro que tem crescido o volume de recursos oficiais para projetos privados de pesquisa e desenvolvimento, e que há procura por eles. É sinal de que as autoridades e pelo menos parte do empresariado estão preocupadas com a questão e interessadas em promover avanços nesse campo, essencial para dotar o setor produtivo de condições para competir com produtores estrangeiros, tanto no mercado interno como no externo.

A despeito dessa preocupação e desse interesse, os avanços têm sido pouco tangíveis, como demonstra a persistência da crise da indústria de transformação, cujo desempenho é mais sensível à competitividade do que o de outros setores. É claro que projetos inovadores - que resultem em transformações nos métodos de produção, nos produtos e nos sistemas de comercialização que criem ou expandam mercados - demandam tempo para produzir resultados. Mas o que o Fórum Estadão mostrou é que ganhos sensíveis de produtividade dependem de fatores que vão além de inovação e de dinheiro.

Os programas oficiais de apoio à pesquisa e desenvolvimento, por exemplo, precisam basear-se na definição clara dos setores que - por suas carências notórias, por sua capacidade de produzir respostas mais rápidas em termos de competitividade e crescimento ou por outros fatores - são prioritários, para neles concentrar o foco.

É preciso que haja profissionais qualificados para fazer avançar os projetos privados de pesquisa e desenvolvimento e torná-los eficazes para assegurar às empresas ganhos de produtividade e de competitividade. Há profissionais com esse perfil em alguns setores, mas outros carecem de pessoal adequadamente preparado. Em qualquer dos casos, o número deles é insuficiente. Trata-se de um problema que se estende a quase todo o setor produtivo, numa demonstração das deficiências e carências do sistema de ensino e da urgência de sua reformulação para atender às novas exigências do País.

Como o próprio título do Fórum Estadão sugere, há um vínculo entre inovação, produtividade e infraestrutura. Da inovação decorre, em geral, maior produtividade. Mas, para que os ganhos não sejam corroídos por outros fatores, como insuficiência ou alto custos de insumos e de meios para fazer os produtos alcançarem o mercado, é preciso que o País disponha de infraestrutura conveniente.

É preciso haver oferta confiável, e a preço competitivo, de energia, por exemplo. É preciso que o sistema de transporte seja eficiente. Problemas e custos inesperados do programa de energia do governo, o mau estado da malha rodoviária, a insuficiência de ferrovias e o atraso no programa de modernização dos portos mostram quanto ainda precisa ser feito nesse campo.

A comparação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento nos países industrializados e no Brasil mostram quanto ainda precisamos investir para alcançá-los. A tarefa é basicamente da iniciativa privada - decerto com o apoio do governo -, mas qual será sua disposição de cumpri-la?

Investimentos em novos produtos ou processos nem sempre resultam em ganhos, mesmo que de médio ou de longo prazos. O risco de perda, não desprezível, reduz o interesse do investidor por esse tipo de aplicação. No Brasil, além disso, o empresariado industrial, em boa parte, acostumou-se a viver sob a proteção do Estado, que durante muito tempo lhe assegurou exclusividade no mercado doméstico. Sem necessidade de competir com produtores em geral mais eficientes, essa parcela do empresariado raramente se preocupou com questões como eficiência, produtividade, competitividade. A gravidade da crise da indústria tende a trazê-la à realidade.

Lamentavelmente, porém, o momento parece impróprio. O baixo crescimento econômico dos últimos anos e as previsões de que o ritmo de atividade se manterá baixo no futuro próximo desestimulam investimentos. Da mesma forma, a persistência da inflação em nível muito alto, nas proximidades do limite de tolerância da política de metas do Banco Central e às vezes o rompendo, alimenta o desânimo do empresariado constatado em diversas pesquisas das entidades representativas da indústria.

A proximidade das eleições, de sua parte, faz crescer as dúvidas sobre como será a condução da economia a partir de 1.º de janeiro de 2015, o que igualmente retarda a disposição de investir, sobretudo em projetos de risco como são os de inovação, pesquisa e desenvolvimento.

Se persistir a letargia do meio empresarial, no entanto, os problemas da indústria de transformação poderão se agravar, tornando-se ainda mais difíceis de solucionar. Nesse quadro, quem demonstrar mais disposição para melhorar desde já seu parque e seu sistema produtivo, ainda que a custo de algum risco, poderá obter resultados mais palpáveis que os demais quando, enfim, o quadro se tornar mais claro.

Ganhar eficiência tornou-se, para muitas empresas, questão de sobrevivência.


Rainha de Copas - VALDO CRUZ

FOLHA DE SP - 09/06

BRASÍLIA - Seremos palco, neste ano, de dois megatorneios. A Copa começa nesta semana --em jogo, nossa grande paixão, o futebol. A eleição presidencial tem início oficial em julho --definirá o destino do país nos próximos quatro anos.

Técnico da seleção, Felipão tem um craque espetacular em seu time. Inspirado, Neymar pode nos levar ao hexacampeonato. Já Dilma Rousseff tem uma equipe que não empolga nem um pouquinho e joga um feijão com arroz básico.

Seu principal jogador é bastante questionado pela torcida. Titular da Fazenda, Guido Mantega é alvo de campanha para ser colocado na reserva. Foi destaque na equipe de Lula, mas perdeu rendimento.

Seu beque Alexandre Tombini, contam as más línguas, jogou a toalha e arma seu esquema apenas para evitar que a inflação estoure as redes da meta, de 6,5% ao ano.

Resultado, o placar da economia vai mal. Crescimento fraco, com risco até de recessão. E inflação pressionada, minando o poder de compra dos eleitores, que já ameaçam abandonar a torcida da petista.

Nos vestiários do poder, a culpa pelo jogo feio é colocada nas costas de Dilma. Centralizadora e adepta da terapia da bronca, ela não deixa sua equipe dar um drible a mais, armar jogadas novas. Seus jogadores acabam na retranca, com medo de perder a cabeça, ops, o cargo.

Sem falar que o esquema tático não é de Mantega nem de Tombini, mas dela, a dona da bola. Daí o desejo do empresariado e de petistas de substituí-la pelo reserva de luxo Luiz Inácio Lula da Silva.

Só que, ao melhor estilo Zagallo, Dilma parece dizer a seus companheiros: "Vocês vão ter de me engolir". Só que, se seu time continuar a decepcionar, o coro do "volta, Lula" pode ficar ensurdecedor.

Bem, a bola vai rolar. Vamos torcer pelo Brasil. Principalmente os petistas. A Copa --dentro e fora dos gramados-- pode ser mais decisiva do que se imaginava para a eleição.

Ainda falta muito - PAULO GUEDES

O GLOBO - 09/06
Corrupção a céu aberto na política e estagflação na economia são claros sintomas de uma travessia inacabada rumo à Grande Sociedade Aberta

A transição do antigo regime militar para a Grande Sociedade Aberta segue incompleta. A corrupção a céu aberto na política e a estagflação na economia são claros sintomas de uma travessia inacabada. Mas não há razão para desespero. Afinal, esta viagem histórica de aprofundamento nas práticas de democracia e mercado é a própria síntese de nossa marcha civilizatória. "A civilização ocidental começa com os gregos, os primeiros a iniciarem a transição de uma sociedade tribal submetida a poderes mágicos para a sociedade baseada na liberdade e na racionalidade humana. Começou na Grécia antiga esta grande revolução, que mesmo após milênios parece estar ainda em seu início: a transição para a Grande Sociedade Aberta" registra o formidável filósofo da ciência Karl Popper, em seu clássico "A sociedade aberta e seus inimigos" (1945). Globalização, telecomunicações e internet? "A causa mais poderosa da ruptura das sociedades fechadas foi sempre o desenvolvimento do comércio e das comunicações. Muita evidência disso pode ser encontrada na história da Guerra do Peloponeso de Tucídides, o choque entre a democracia de mercado ateniense e o tribalismo oligárquico de Esparta" observa Popper.

Outro episódio de proporções épicas nesta marcha evolucionária por aperfeiçoamento é descrito por Joseph Ellis, em "Verão revolucionário: o nascimento da independência americana" (2014): "As colônias acreditavam no princípio de que nenhum cidadão britânico teria de pagar tributos legislados sem seu consentimento. Como os americanos não tinham representação no Parlamento, revoltaram-se contra os impostos. Em 1774, em resposta ao quebra-quebra no porto de Boston, os britânicos impuseram lei marcial, transformando uma disputa constitucional em um conflito militar. Em 1775, o rei George III bloqueou ativos americanos, fechou portos e convocou extraordinária força militar para esmagar a incipiente rebelião. A incompetência dos britânicos e de seu rei foi uma providencial oportunidade para um script que seria intitulado a Grande Revolução Americana" Os desafios da globalização, das comunicações e do excesso de impostos são, como se vê, históricos. O importante é transformar tais desafios em oportunidades de aperfeiçoamento nessa longa travessia.


Nós quem? - LÚCIA GUIMARÃES

O ESTADÃO - 09/06

NOVA YORK - O cenário era belíssimo, uma casa de fim de semana em Long Island. Caí de paraquedas numa festa, levada por uma convidada da anfitriã, matriarca de uma família abastada de Nova York. Sem saber - e pouco se importando - em descobrir quem eu era, ela desabafou em voz alta: "Ainda bem que não vieram jornalistas. Eles são tão sujos". Não contive uma gargalhada discreta, um privilégio que ela parecia não ter mais, com seu rosto imobilizado por cirurgiões plásticos.

A pessoa que me levou ficou mortificada e se preocupou, sinceramente, com o meu desconforto. Que era nenhum. Minha reação, uma vez que a opinião da socialite não respingou na minha pessoa asseada, foi evitar seu constrangimento e pedir que não lhe revelassem o meu ganha-pão.

Não arrasto comigo uma categoria profissional, uma identidade corporativa, como uma longa cauda de vestido de noiva. Porcaria e maravilha não fazem discriminação na medicina, na engenharia ou no jornalismo.

Defendo minha atividade como necessária à democracia, denuncio quando jornalistas são censurados, presos, mortos, mas não ponho a mão no fogo por nenhum estranho só porque ele se diz membro de uma profissão. E costumava encolher, defensiva, quando era chamada de "coleguinha" em reuniões de sindicato.

O incidente na festa aconteceu há uns 15 anos, mas a cena me voltou à memória na semana passada. Leitoras que se declararam representantes de uma categoria - a de organizadores profissionais - se sentiram insultadas porque descrevi a atividade, tal como a testemunhei em Manhattan, como "uma pérola de charlatanismo". Eu me referia a pessoas que cobram US$ 125 por hora para arrumar o closet, gavetas e estantes de gente como um conhecido meu, que mora num conjugado. Reconheço que ele fica pior na foto por ter desperdiçado dinheiro terceirizando sua vida pessoal. Minha insensibilidade foi recebida com longas explicações, entre elas o fato de que 300 organizadores profissionais se encontraram em São Paulo para debater a defesa de sua categoria. Tentei explicar que não estava insultando as leitoras mesmo por que desconhecia a existência de tal agrupamento corporativo no Brasil, agrupamento que há de ser composto por pessoas idôneas e nem tanto, como a sociedade em geral.

Se tivesse usado "frivolidade" e não "charlatanismo" a indignação teria sido menor? Não sei. Como expliquei a uma leitora gentil: Um cirurgião plástico que continua a operar uma cliente insegura e progressivamente deformada pode não estar violando nenhum código de seu Conselho Regional de Medicina. Mas, aqui neste canto opinativo, ele é um vocês sabem o quê. Lembrei da cena na festa quando me pediram para "me retratar" pela opinião que expressei. Não só lamento como não questiono a sinceridade da mágoa de quem fez a sugestão. E não duvidem da minha surpresa.

O Brasil que eu deixei era um país autoritário, em transição para um governo civil. O Brasil que reencontro hoje é uma democracia constitucional, mas, além de importar a categoria de organizadores profissionais dos Estados Unidos, importou também uma forma peculiar de autoritarismo cultural marcado pela vitimização e extrema litigiosidade. Vivemos uma espécie de embotamento cívico sob o qual somos tão vulneráveis que uma opinião sobre ter seu armário arrumado por estranhos requer retratação. É um mal-estar só aplacado por corporativismo e unguentos governamentais.

Reconheço este Brasil no país que produziu o Decreto 8243. A presidente Dilma Rousseff viu por bem criar uma nova casta na sociedade brasileira. Não contente com a Constituição, os três poderes e o exercício do voto, a presidente, de uma só canetada, nos separou. Agora há a turma da arquibancada e uma tal sociedade civil que vai ganhar camarotes no Executivo. Numa linguagem que é um modelo de contorção semântica, o decreto define grupelhos para dialogar com o governo. Gente não eleita que não me representa.

Como bem explicou o acadêmico Oliveiros Ferreira num excelente artigo neste jornal, o decreto invade também o território da Justiça, atribuindo a "mesas de diálogo" a função de prevenir, mediar e solucionar conflitos sociais. O governo vai escolher os frequentadores dos camarotes para avançar o espetáculo de "políticas públicas". Quem achava que seu título de eleitor bastava para a participação democrática acordou no dia 24 de maio como membro de uma casta inferior, os que não entraram para o clube da "sociedade civil".

Nem vou entrar aqui na questão de se tratar de uma iniciativa que propicia a perpetuação de apparatchniks na máquina governamental. Mas a falta de indignação inicial com o decreto me pareceu afinada com o embotamento cívico em que enfraquecemos nosso poder individual. Delegar a arrumação do closet a terceiros pode ser uma frivolidade. Mas terceirizar o exercício da democracia constitucional é uma temeridade.


Os milagres de todos os dias - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 09/06

Na noite de sábado, fomos surpreendidos, Letícia e eu, com a chegada antecipada de Julia e Bernardo, meus filhos caçulas. Apreensões à parte, sempre irremediáveis no coração dos pais e das mães, é como se o tempo tivesse parado de repente à nossa volta, como que reverenciando aquele que é o mais importante milagre humano --a vida que floresce e se renova todos os dias.

Tomado pela emoção de ser pai novamente, faço uma pausa nos temas, preocupações e reflexões que venho tratando nesse espaço, para dividir com cada um de vocês um sentimento muito especial. Dizem que quanto mais íntima a alegria ou a dor, mais universal ela é. É o nosso sentimento mais pessoal que nos conecta com toda a humanidade.

Como já havia acontecido comigo antes, com a minha filha Gabriela, os gêmeos trouxeram consigo o poder mágico e indescritível de fazer emergir o que há de mais essencial em cada um de nós, lembrando-nos de quem somos, de onde viemos e o significado maior de nossa jornada aqui.

Mesmo sem saber, Julia e Bernardo tocam, de uma forma extraordinária, o coração de um pai mergulhado em diferentes universos e grandes desafios coletivos, que neste momento, se misturam à pessoal e intensa felicidade da suas chegadas.

Observando os nossos dois bebês, impossível não me emocionar com o precioso sentido do valor da família, resumido na imagem de minha mãe pedindo à Nossa Senhora --como um dia pediu pelos seus filhos-- que receba e envolva os netos em seu manto protetor. Ou lembrar, com saudade, da voz do meu pai, contando casos e histórias, que pretendo um dia contar a eles ao redor da nossa mesa. Porque família é quem veio antes, quem está conosco e quem vem depois. Me tornei o homem que sou pelo exemplo que tive dos meus avós e de meus pais. Deles recebi valores que me esforcei para passar à Gabriela e que pretendo transmitir ao Bernardo e à Julia.

A presença dos meus filhos me rejuvenesce em esperança ao mesmo tempo em que fortalece o meu sentido de responsabilidade com o mundo em que vivemos. E com o legado que cada um de nós está deixando para as novas gerações. Aumenta minha responsabilidade com a luta para que eles possam crescer em um Brasil melhor, mais honesto e que encha a todos nós de orgulho e de esperança. Quem vê o mundo com olhos de pai, o vê com mais cuidado. Mas também com mais vontade de lutar.

Em meio a tantos desafios e preocupações, o relógio da minha vida parou por alguns instantes. São esses pequenos milagres do cotidiano que nos revelam o que é essencial, verdadeiro e transformador. Tempo é dádiva. Vida é dádiva. É preciso fazer a nossa parte para merecê-los.

Gasto público errado - FABIO GIAMBIAGI

O GLOBO - 09/06

O Brasil é um país onde, historicamente, nos três níveis de governo, houve irregularidades aos borbotões



No delicioso documentário sobre Vinicius de Moraes, que passou no cinema há uns 3 anos, há uma anedota contada por Chico Buarque, referente à época em que o poetinha ganhava a vida fazendo shows, muitos deles no exterior, quando Chico estava no exílio. Ele foi ver o show do amigo, que, com sua graça particular, começou a contar uma história que fazia a plateia gargalhar sem parar. No meio desse processo, lacrimejando de tanto rir, mas sem captar uma palavra do que o Vinícius dizia numa mistura ininteligível de italiano, português e inglês, um italiano se vira para o Chico e pergunta: “Bravissimo, ma scusi, che língua parla?” (“Espetacular, mas, me desculpe: que língua é essa?”).

Sempre me lembro da frase quando acompanho o debate sobre a “gastança”. Em relação a isto, a crítica de certa forma une tanto a chamada “direita” como a “esquerda”. A primeira tende a considerar que há um processo populista em curso e que um governo mais comprometido com a austeridade poderia rapidamente reduzir a relação entre o gasto público e o PIB. A segunda, por sua vez, tende a considerar que o gasto vai para os “os ricos”, “a elite” ou “os privilegiados”, em vez de ser direcionada para “nós, o povo”.

Somando-se a crítica à “gastança”, quem se deixa levar por esses argumentos toscos se assemelha ao italiano da anedota diante do show do Vinicius: aplaude o argumento, mas não consegue entender o que se passa.

O drama do gasto público é que o pressuposto da crítica — de que o dinheiro está sendo desviado para fins escusos — está equivocado. O Brasil é um país onde, historicamente, nos três níveis de governo, houve irregularidades aos borbotões. Basta ler qualquer jornal. Na época do Getúlio, nos anos JK, com os militares ou nos governos civis que se seguiram, na União, no estado A ou no município B, em qualquer ano ou instância de governo, com o partido X ou Y, qualquer historiador terá material para encher páginas e páginas com os escândalos de cada época. Entretanto, quando se tenta entender por que o gasto primário federal passou de 13,7% do PIB em 1991 para 22,8% do PIB em 2013, não são os escândalos que explicam isso. São todas coisas que estão diante de nosso nariz — e o país teima em não enxergar. A “gastança” é fruto de decisões tomadas com o beneplácito da grande maioria dos parlamentares — quando não da própria população — que, tempos depois, revela o seu impacto financeiro em toda a sua plenitude, com escasso efeito sobre a melhoria de bem-estar do país. É por esse tipo de coisas que, no fim da vida, exasperado pelos absurdos recorrentes década após década em matéria econômica, Roberto Campos concluía que “a burrice nacional não associa o efeito com as causas”.

Um esclarecimento: a despesa federal com pessoal ativo era de 2,7 % do PIB em 1991 — e caiu para 2,3 % do PIB em 2013. O cidadão tem todo o direito de achar que há muitas repartições onde sobra gente, mas, se pagamos mais impostos hoje do que há 20 anos, não é porque há mais gente trabalhando nos ministérios: o peso relativo dessa conta caiu.

O que foi que aumentou? Três coisas. A primeira, as despesas com benefícios do INSS, de 3,4% do PIB em 1991 e de 7,4% do PIB em 2013 — e os aposentados se queixam de abandono. A segunda, as transferências a estados e municípios, que passaram de 2,7% para 3,9% do PIB nesse período — e governadores e prefeitos vivem de pires na mão. E a terceira, o gasto com o “OCC”, as “outras despesas de custeio e capital”, que pularam de 3,9% para 7,3% do PIB nesses 22 anos. Nessa rubrica, há desde o justificado Bolsa Família, inexistente no passado e que hoje consome em torno de 0,6% do PIB, até o inacreditável gasto com seguro-desemprego de 0,5% do PIB em 2003 quando o desemprego do país era de 12% e de 0,9% hoje, quando o desemprego é da ordem de 5%, no que talvez seja um dos melhores exemplos da incúria nacional, passando pelo aumento das despesas da Lei Orgânica da Assistência Social. No dia em que “gestão” deixar de ser bordão de marqueteiro, será preciso fazer um raio X das contas públicas para verificar a quantidade de recursos que estão sendo gastos de forma torpe, na frente de nosso nariz, como se fosse a coisa mais natural do mundo. É tarefa para estadista.

Política e crime organizado - CARLOS ALBERTO DI FRANCO

O GLOBO - 09/06

Deputado deve explicações à sociedade


Depois de o secretário municipal de Transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, acusar a Polícia Militar de falta de empenho para conter a baderna dos grevistas das empresas de ônibus, o governo do estado revelou o conteúdo de um inquérito policial que apurava uma série de incêndios de ônibus na capital paulista desde o início do ano. Segundo matéria da revista “Veja”, a polícia descobriu que um aliado de Tatto, o deputado estadual Luiz Moura (PT), havia participado de uma reunião, no dia 17 de março, na cooperativa Transcooper com 13 integrantes da facção criminosa PCC.

Nos anos 90, Moura foi condenado a cumprir 12 anos de prisão por assalto à mão armada. O deputado foi preso e, após um ano e meio de pena, fugiu da cadeia. Passou um longo período foragido e só se reapresentou à Justiça quando seus crimes prescreveram. Entrou, então, para o PT.

O deputado deve algumas explicações à sociedade. E a primeira delas está relacionada com seu aumento patrimonial. Luiz Moura, em cinco anos, saiu de um situação de pobreza para ser dono de um patrimônio de R$ 5,1 milhões. Em janeiro de 2005, para solicitar sua reabilitação criminal à Justiça catarinense — que o condenara por roubo —, além de afirmar que praticara os crimes porque usava drogas, mas se regenerara, Moura assinou um atestado de pobreza no qual sustentava não ter “condições financeiras de ressarcir a vítima”, no caso, um supermercado. Além disso, apresentou uma declaração de Imposto de Renda de 2004 (referente ao ano de 2003) na qual afirmava que, em todo o ano anterior, tivera rendimentos que somaram R$ 15.800.

Em 2010, contudo, quando se apresentou pela primeira vez como candidato, Luiz Moura, em sua declaração de bens, apresentou um patrimônio de R$ 5,1 milhões, dos quais R$ 4 milhões em cotas de uma empresa de ônibus — a Happy Play Tour —, cinco postos de gasolina, quatro casas e um ônibus. A sociedade e o próprio PT têm o direito de conhecer as justificativas para tão brilhante crescimento patrimonial.

Além disso, cabe ao deputado dar explicações concretas a respeito de sua participação na reunião que foi interrompida pela ação policial. Na tribuna da Assembleia Legislativa, Moura disse que participou do encontro por causa de sua militância na área de transportes e que tentava evitar uma greve na Zona Leste de São Paulo. Não resolve a questão. A explicação que continua devendo é bem concreta. Como explicar que um homem público, “militante da área de transportes”, certamente conhecedor do setor e dos seus pares, tenha participado de uma reunião que contou com a presença de 13 integrantes do PCC? Estamos falando de mais de 30% dos participantes.

Não é de hoje que pairam suspeitas sobre eventuais incursões do crime organizado na área de transportes na capital paulista. Incêndios de ônibus não podem ser encarados como algo normal. É preciso investigar quem são os mandantes e tomar as oportunas providências de combate ao crime. Trata-se de assunto de interesse público relevante. É preciso apurar, empunhar o bisturi e ir fundo.

A verdadeira reforma política - TONICO RAMOS

 ESTADO DE S.PAULO - 09/06

Durante os governos do presidente Castelo Branco ao de João Figueiredo, os líderes e militantes políticos foram estimulados a sobreviver em razão das dificuldades a eles impostas. As Câmaras Municipais eram atuantes e com frequência recebiam líderes políticos que, sabiamente, repassavam seus conhecimentos aos membros dessas respeitadas Casas legislativas. Os vereadores vocacionados sonhavam com o poder e lutavam para conquistar novos mandatos nos Legislativos e Executivos, orgulhando, assim, suas cidades, seus Estados e a Nação.

Em 1982, com a eleição de governadores, reconquistamos a liberdade e a democracia. Infelizmente, com o passar do tempo inibiu-se a formação de novas lideranças políticas partidárias. Em 1988 e 1989 o processo de elaboração das Cartas Constitucionais federal e dos Estados foi um divisor de águas na História do Brasil, momento em que a sociedade depositou suas esperanças no Poder Legislativo. Buscava-se uma reordenação institucional que enterrasse de vez o chamado "entulho autoritário" produzido por 21 anos de leis arbitrárias, ditatoriais. Foi esse o motivo que levou Ulysses Guimarães, na promulgação da Carta federal de 1988, a identificá-la como a "Constituição cidadã", pois devolvia e ampliava as prerrogativas essenciais ao pleno exercício da cidadania.

Podemos afirmar que a desmoralização da classe política foi a causa principal da não formação de novos líderes e, como consequência, os vereadores foram atingidos diretamente, por conviverem diariamente com os eleitores. A Câmara Municipal é a base da instituição legislativa no Brasil e, sem dúvida, a principal escola política do País. Ali a democracia é praticada pelos legítimos representantes escolhidos pelo povo.

Com a frequência de escândalos no mundo político, os eleitores, revoltados, pararam de ofertar novos nomes para concorrer às eleições. Ficou difícil para eles escolherem com seu voto e arregimentar novos eleitores para elegerem os verdadeiros dirigentes dos destinos da sua cidade. Essa posição adotada teve como causa a pior das corrupções, a ausência de idealismo.

Entendo que os maiores responsáveis por esse desastre institucional foram os prefeitos. Com a surrada desculpa da governabilidade, conquistam os votos dos vereadores usando expedientes não convencionais. Entristecido, registro que os governos dos Estados e a Presidência da Republica também fazem composições com os legisladores de forma condenável, não republicana.

Ao generalizar essas informações posso ser tachado de leviano. Logo, faço a ressalva de que há prefeitos, governadores e presidentes que pensam e agem com seriedade, respeitam o Legislativo e merecem a nossa admiração.

A partir dessa ação impatriótica de prefeitos, sentimos que as Câmaras Municipais estão transformando seus legisladores em líderes envergonhados e preocupados somente com a reeleição. A postulação de mandato nas esferas superiores foi abandonada pelos vereadores.

Os vereadores são obrigados a respeitar a Constituição brasileira, a Constituição estadual e a Lei Orgânica do Município. O principal trabalho dos senadores, deputados federais, estaduais e vereadores é aprovar o orçamento, "dinheiro que entra no cofre", e fiscalizá-lo. Outra atribuição é convocar membros do Executivo para esclarecer dúvidas, encaminhar denúncias com fundamento aos Tribunais de Contas para averiguação, legislar, atender seus eleitores, estar presente em reuniões representando com dignidade o Poder Legislativo.

A Câmara Municipal, a base da instituição legislativa no Brasil, mais antiga que o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas, é o principal viveiro nacional de formadores de líderes políticos, mas parece que passou a nos fornecer frutos com desvio de formação.

É importante ressaltar que o Legislativo praticou atos que nos orgulham. O Congresso cumpriu a Constituição ao cassar o mandato do presidente Fernando Collor e dar posse a Itamar Franco, fazendo saber que no nosso país a democracia era verdadeira e as instituições estavam consolidadas. Governadores, prefeitos, senadores, deputados federais e estaduais, vereadores foram cassados, presos e tiveram seus direitos políticos suspensos.

A Constituição brasileira expressa que o salário mínimo deve ser aprovado anualmente por lei. Medidas provisórias e decretos têm retirado dos legisladores o seu direito de legislar. O Supremo Tribunal Federal tem legislado por causa da omissão do Legislativo. O esteio da democracia está nos três Poderes - Legislativo, Executivo e Judiciário - independentes e harmônicos entre si. Essa usurpação de função é perigosa e parece-nos ser o princípio do "entulho autoritário" ou a busca de governos autoritários. Conspirar é nossa vontade e você pode ser o ator desta revolução participando com seu voto e ousando nestas mudanças históricas.

Em 2012 você elegeu o prefeito e os vereadores de sua cidade. Agora em outubro teremos eleições para presidente, governador, senador e deputados. Agrupe-se ideologicamente. Faça reuniões para discutir política. Fale com entusiasmo de uma boa política partidária por onde passar. Procure um bom candidato para apoiar ou apoie um líder competente para representá-lo. Ele deve assumir o compromisso de defender o interesse municipal, estadual e nacional, independentemente de partido político.

Podemos fazer uma verdadeira reforma política e de líderes, mesmo sabendo que levará décadas para alcançá-la. Os 20 centavos foram apenas o estopim de um movimento que tomou conta do País em junho de 2013, de forma surpreendente! Ele mostrou que a sociedade deve e pode mudar o destino do País. Ele é a base dos movimentos atuais, mas que devem ser feitos de forma ordeira e sem vandalismos.

"Nunca é cedo para começar" e, caso você entenda que deve iniciar essa reforma hoje, agora, saiba que certamente ela será mais rápida.

Encalhado - PAULO BROSSARD

ZERO HORA - 09/06

O Brasil atravessa momento impreciso, praticamente estacionado, tão mofino tem sido seu crescimento, coisa de 2% ao ano, dá a ideia de um navio encalhado. A perspectiva de melhoria significativa parece remota, enquanto a menos boa, lastimavelmente, é mais plausível, considerando a queda no crescimento do PIB e os dados internos e externos. Em ano anterior, o resultado não fora bom e o governo se limitou a projetar aumento espetacular, de um “pibinho” prometia um “pibão”. O resultado, mais que pífio, foi deplorável. Nesse quadro nenhum sinal promissor aparece, nem mesmo na linha do horizonte. Mas a senhora presidente é candidata à sua reeleição. Alvíssaras!
Quem pretende a reeleição sem nada dizer a respeito leva a supor que continuará as linhas da sua atual gestão. Afinal de contas, quem diz reeleição sem nada esclarecer faz crer a continuidade do que fez e do que deixou de fazer em quatro anos de governo.
Compreende-se que um grande governo possa motivar a reeleição do governante, mas ainda não se vira que chegue ao cabo o quadriênio menos feliz da gestão e alguém possa pensar em continuidade. Seria o paradoxo dos paradoxos.
Agora, por exemplo, a senhora presidente sem lei, por arbítrio seu, surpreendeu o seu mutismo com um decreto que literalmente desmancha a administração pública; esta é regida por lei e a senhora presidente, revogando a Constituição, abre as portas da administração a quem nela queira entrar e mexer como lhe aprouver. Seria o conúbio da legalidade administrativa com a licenciosidade do anonimato. Trata-se de uma fuga à realidade nunca vista, expediente com que a senhora presidente pretenderia superar a atrofia politica e administrativa chegada ao descalabro do encalhe. Daí porque, não seria surpresa se o resultado viesse a ser a retração do país, e esta tem sido a opinião de doutos.
Nenhum alvitre, ainda que mediocremente razoável. A reeleição seria o segredo do milagre, mas este é por demais escarninho. Com devaneios não se desencalha uma jangada, muito menos uma nação.

O legado de Dilma - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 09/06

A modéstia, convenhamos, nunca foi o ponto forte de Lula. Mas em relação a Dilma, sua invenção para presidir o país, ele guardava um certo recato. De público, cuidava para não reforçar a impressão de que a tutelava. Na semana passada, em Porto Alegre, Lula mandou às favas todos os escrúpulos e fez o impensável - criticou a política econômica do governo. E na frente de um dos seus responsáveis.

POBRE ARNO AUGUSTIN, Secretário do Tesouro. Ouviu poucas e boas diante de um auditório inclinado a concordar com tudo o que Lula dissesse. Por uma questão de estilo e temperamento, Lula e Dilma são famosos por tratarem com grosseria seus subordinados. Mas isso sempre ocorre em particular. E, no caso de Lula, quando ele reconhece que foi cruel, costuma pedir desculpas sem pedi-las diretamente.

POIS FOI CONSTRANGEDOR. Depois de, na véspera, reunido com empresários, ter chamado a atenção do governo para o risco de perder o controle da inflação, Lula valeu-se do seu próprio exemplo para ensinar a Arno - e, por tabela, a Dilma - como esquentar a economia. Defendeu a expansão do crédito, um meio de aumentar o consumo. E lamentou: "Se depender do pensamento de Arno, você não faz nada".

VOLTOU À CARGA: "Uma medida que tomamos foi aumentar a oferta de crédito. O Arno nem sempre gosta disso" alfinetou. Arno sorriu meio sem graça. "Eu acho, Arno, que um dia você vai ter que me explicar, por que, se a gente não tem inflação de demanda, por que a gente está barrando o crédito? O crédito precisa chegar" cobrou Lula. "Com crédito todo mundo vai à luta." Depende.

NO MEIO DO segundo mandato de Lula, a receita soprada por Delfim Neto, ex-ministro da Fazenda da ditadura de 64, funcionou de fato. O governo tinha dinheiro para ampliar o crédito via bancos oficiais. A taxa de juros havia baixado, tornando os empréstimos mais atraentes. Disparava a boa avaliação do governo. E a indústria tinha capacidade ociosa e podia aumentar a produção para atender ao consumo.

HOJE É TUDO o contrário. Agravado pelo fato de que o pessimismo do brasileiro está em alta - e a culpa não é da oposição, como sugere Dilma. A culpa é de um governo medíocre, centralizado em excesso na figura da presidente, e que realizou pouco. A herança maldita que deixará é a frustração dos que acreditaram na palavra de Lula de que Dilma como gestora era superior a ele. Isso se chama estelionato eleitoral.

O TROCO ESTÁ vindo a galope. Desmancha-se a confiança no governo e nas suas políticas. Pela primeira vez desde 2007, a maior parte dos eleitores (36%) acha que a situação econômica só tende a piorar, segundo a mais recente pesquisa de opinião do instituto Datafolha. Para 64%, a inflação vai crescer - eram 58% há um mês. O desemprego, também, acreditam 48% - eram 42% há um mês.

JOÃO SANTANA, marqueteiro das campanhas de Lula e de Dilma em 2006 e 2010, terá pela frente três tarefas de grande porte: reverter a expectativa negativa dos brasileiros quanto à economia; tornar positiva a avaliação do governo, e convencer a maioria dos que pedem um presidente diferente do atual que a continuidade com Dilma é melhor. Ou de que a mudança pode ser feita com ela.

O ANO COMEÇOU com Dilma como favorita para se reeleger no primeiro turno. Depois, as pesquisas indicaram que ela disputaria o segundo turno ainda na condição de favorita. Agora, o favoritismo de Dilma está ameaçado. Chamem Lula... Para tentar salvá-la - e ao PT.

Uma contradição - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 09/06

Sem reservas expressivas de carvão mineral ou de petróleo (essas últimas somente descobertas a partir da década de 1970), o Brasil calcou no século XX sua matriz de energia elétrica no aproveitamento de recursos hídricos. Junto a quedas naturais, e preferencialmente próximas aos centros de consumo, foram construídas várias hidrelétricas. Mas uma matriz com essas características precisa armazenar água para os anos seguintes, pois o regime de chuvas que alimentam os mananciais não é totalmente previsível. Assim, nos anos de chuvas mais abundantes, armazena-se água para utilização no chamado período seco, quando a vazão dos rios diminui.

Os aproveitamentos hídricos próximos aos centros de consumo foram se esgotando e, além disso, por restrições ambientais, as novas hidrelétricas passaram a ser construídas sem reservatórios de acumulação de água. Ou seja, as novas usinas são a “fio d’água”, e dependem da vazão natural dos rios. O desenvolvimento tecnológico permitiu incorporar à matriz os aproveitamentos hídricos na Amazônia, embora lá as restrições para a construção de reservatórios que acumulem água sejam ainda maiores, pelo fato de a topografia da região não contar com vales relativamente estreitos, o que aumentaria a necessidade de se ampliar as áreas inundáveis. Há, sem dúvida, um exagero nessas restrições, pois nos períodos de cheias as margens de muitos rios são ocupadas pelas águas, impedindo a utilização dessas áreas para outros fins.

O fato é que as distâncias entre as regiões brasileiras e os diferentes regimes de chuvas ao longo do ano exigiram a formação de um complexo sistema interligado, com milhares de quilômetros de linhas para transmissão da energia. Pela ausência de reservatórios de acumulação de água, esse sistema é mais dependente do humor de São Pedro. A forma de torná-lo menos vulnerável é incorporar a essa matriz usinas termelétricas, que complementam as hidrelétricas (no caso das nucleares ou que utilizam biomassa) ou constituem uma reserva para momentos críticos (usinas que queimam óleo, gás natural, carvão).

As peculiaridades da matriz brasileira vêm exigindo uma participação crescente das termelétricas. E nisso há uma contradição na política energética, pois a matriz está ficando mais “suja” devido às restrições ambientais que impedem a construção de hidrelétricas com reservatórios de acumulação de água.

Investimentos expressivos têm sido feitos nas chamadas fontes alternativas, haja vista o grande número projetos de usinas eólicas que se candidatam aos leilões de fornecimento de energia. No entanto, mesmo com todo esse esforço, as usinas eólicas ainda não atingiram 2% de toda a capacidade de geração de eletricidade do país, e respondem por menos de 1% da carga consumida. As usinas eólicas não acumulam energia e dependem inteiramente da continuidade dos ventos. Uma matriz baseada nessas fontes alternativas precisa de uma enorme reserva de usinas termelétricas, encarecendo brutalmente todo o sistema.

Nova ameaça à democracia - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 09/06
A jovem democracia brasileira não para de correr risco. Não se trata mais dos antiquados e grosseiros golpes armados para derrubar presidentes. Os perigos atuais são mais sofisticados, mais bem urdidos e, não raro, evocam a defesa e a ampliação da democracia com o oculto propósito de golpeá-la. Por exemplo: propor e defender a criação de canais que facilitem a manifestação da vontade popular.
Mas a cidadania deve verificar com cuidado se essa proposta não é apenas uma embalagem falsa, um cavalo de Troia. Ao trocar o totalitarismo dos regimes centralizadores pelo poder emanado do povo e exercido por representantes eleitos por ele, a democracia acabou criando caminhos de dominação. São o resultado da manipulação mal-intencionada dos mecanismos que deveriam ser acionados apenas para fazer valer a legítima vontade da maioria.

É com essa preocupação que deve ser encarada a mais nova manobra engendrada pelo grupo político que hoje governa o país. A presidente Dilma Rousseff baixou decreto criando o que parece ser um inocente mecanismo de auscultação popular, ao instituir uma Política Nacional de Participação Social. Essa política, conforme o Decreto nº 8.243, consiste na criação de conselhos temáticos de participação popular, os quais os órgãos da administração direta e indireta terão de levar em conta ao formular, executar e monitorar seus programas e políticas públicas.

Alega o governo que a existência de conselhos na administração pública é antiga e que o que fez foi regulamentar seu funcionamento. Não é bem assim. A estrutura prevista no decreto presidencial, por sua amplitude e força de intervenção na condução do país, abre o caminho para a formação de blocos de poder a serem dominados por movimentos e corporações politicamente atrelados ao governo e a ele submissos.

A ideia é passar por eles a velha aspiração de políticos brasileiros que sonham com a perpetuação de seu grupo no poder, livre dos riscos de uma eventual derrota em pleitos verdadeiramente democráticos. Por essa via, que seria tida como legítima representante da vontade popular, poderão transitar mudanças perigosas para o regime democrático, que pressupõe a alternância no poder e a submissão incondicional às leis aprovadas pelos representantes eleitos pela maioria da população (deputados e senadores).

É uma clara sobreposição ao Congresso Nacional por mecanismo típico da democracia direta, que torna o regime refém de grupos organizados da sociedade, porém submetidos à vontade oficial. Confrontado, o governo argumenta que o decreto foi elaborado com a participação de movimentos sociais e representantes da sociedade civil. Mas a surpresa que sua publicação provocou na maioria da base aliada no parlamento desmente que tenha havido debate amplo e que não se pretendeu atropelar o Legislativo.

Assim como na fracassada tentativa do governo de aprovar a convocação de um plebiscito para votar uma assembleia constituinte exclusiva para modificar o marco político em junho de 2013, o que pode salvar o país de mais essa armação é, além da permanente vigilância da cidadania, mais uma vez a experiência e o bom senso do vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP). "Os conselhos são sempre úteis, mas vale um Projeto de Lei para integrar o Congresso Nacional nessa discussão", ponderou.

Dando bom-dia a cavalo - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 09/06


A crônica política brasileira é pródiga em episódios com os quais Luiz Inácio Lula da Silva ilustra o aforismo segundo o qual quem fala muito acaba dando bom-dia a cavalo. Em longa entrevista concedida a uma revista semanal, o ex-presidente exercita sua megalomania, insiste em conhecidas mistificações sobre os governos petistas e o papel de seu partido na vida política brasileira, repete ataques à imprensa e sofismas sobre o "controle social da mídia", não se constrange em praticar o jogo do "faça o que eu digo, não o que eu faço".

Aflora em toda a extensão da entrevista a obsessão pelo confronto maniqueísta com uma "elite" retrógrada, inominada, a qual acusa de conspirar contra todas as fabulosas conquistas dos governos petistas. É o velho "nós" contra "eles".

É interessante a visão de Lula dos problemas de comunicação de que, entende, padece o governo Dilma. Problemas esses veladamente atribuídos em parte à incompetência do próprio governo, mas agravados pelo comportamento de uma mídia que tem mal-intencionada "predisposição ao negativismo".

Lula cultiva, como se sabe, uma espetacular imagem de si próprio e do modo petista de governar. Mas não se conforma com o fato de essa visão não ser compartilhada pela mídia. Mas tem remédio para isso. Não adianta reclamar que "(...) 'a Globo não me dá espaço'. A gente tem outros instrumentos para dizer o que quer". Como assim? "Tenho dito com a Dilma que não tem de dar ouvidos a quem fala que gastamos muito com publicidade. Eu acho que, se foi anunciado um programa hoje e no segundo dia não houve repercussão, vai em rede nacional. O governo tem de dizer que a mídia não divulgou, porque se não disser, o silêncio se fecha sobre o fato. Dois dias de tolerância e coloca um ministro em rede nacional, não precisa ir a presidenta todo dia".

Se dependesse de Lula, portanto, entre outras providências "democratizantes", dia sim e outro também as redes de televisão, que são o que interessa, abririam espaço para autoridades do governo revelarem todas aquelas realizações importantíssimas para as quais os jornalistas não dão a menor bola. O que significa que, pelo menos enquanto o lulopetismo não conseguir impor seu ambicionado "controle social da mídia", haja verba para publicidade oficial.

São inegáveis, principalmente no campo social, importantes conquistas de 2003 para cá. Mas Lula não deixa por menos do que o delírio absoluto: "Tudo que você imaginar, o Brasil está entre os cinco (melhores/maiores, supõe-se) do mundo". Isso apesar de que "lá fora já não se fala bem da gente". Na vida real, nosso Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), segundo a ONU, é o 84.º no ranking mundial. Em educação, ficamos também no fim da fila.

No capítulo de sua inestimável contribuição para melhorar o mundo, Lula recorreu a um péssimo exemplo: "O Mercosul, quando cheguei à Presidência, não valia nada". Hoje, dominado pelos bolivarianos, vale menos ainda, enquanto a Aliança do Pacífico caminha a passos largos para se tornar o maior polo de atração de investimentos da América Latina.

Lula tem uma receita de "faça o que eu digo..." para avançar no desenvolvimento econômico: "O que o governo tem de garantir é o aumento da poupança interna (não explicou como conciliar isso com o forte estímulo ao consumo), mais investimento do Estado (preferiu ignorar a clamorosa ineficácia na execução dos PACs), mais junção entre empresa privada e pública (desconsiderou o arraigado preconceito petista contra a iniciativa particular), mais capital externo para investir no setor produtivo" (omitiu as dificuldades criadas pelo Mercosul a acordos comerciais bilaterais, sem falar na crescente desconfiança dos investidores internacionais sobre as regras do jogo por aqui).

Lula fala ainda, como não poderia deixar de ser, sobre política. Garante que o PT "é um partido que o próprio povo dirige". Apesar disso, "a gente não pode permitir que meia dúzia de pessoas deformem esse partido". E "o povo"?

Agora, admite Lula, o negócio é campanha eleitoral. Mas confessa: "No primeiro turno todo mundo fala a mesma coisa, promete tudo para o povo".


Copa e eleições aumentam a improdutividade do Congresso - EDITORIAL VALOR ECONÔMICO

VALOR ECONÔMICO - 09/06
Antes mesmo do início da Copa do Mundo, previsto para a próxima quinta-feira, o Congresso já entrou em ritmo de "recesso branco" no qual poucos projetos serão votados. Na última quinta-feira, a Câmara dos Deputados conseguiu votar apenas 12 dos 37 projetos em pauta. No Senado, somente oito das 17 questões foram apreciadas.
Os protestos de junho de 2013, durante a Copa das Confederações, levaram parlamentares e representantes do governo federal a debater 25 projetos de lei como resposta para atender aos anseios da população. Levantamento feito pelo Valor, na segunda-feira, mostrou que apenas sete foram aprovados. Há, portanto, muito trabalho à espera do Parlamento, que, com a Copa e as eleições, deve reduzir as suas atividades.

Eleita pela presidente Dilma Rousseff como principal resposta às manifestações de junho, a realização de um plebiscito para a reforma do sistema político-eleitoral sequer tramitou no Congresso. A definição de regras de proteção a usuários de serviços públicos também não andou, assim como os debates sobre a vinculação de receitas da União para segurança pública e a criação de passe livre para estudantes em todo o país.

Na lista dos projetos discutidos após os protestos de junho, poucos viraram leis. A responsabilização de pessoas jurídicas por corrupção e o fim do voto secreto nas cassações de mandatos foram, enfim, aprovados. O Congresso também desonerou as empresas de transporte coletivo do PIS-Pasep sobre o faturamento, destinou royalties do Pré-Sal para educação e saúde e deu aval ao programa Mais Médicos.

Outros projetos, como o Regime Especial de Incentivos para o Transporte Coletivo Urbano e Metropolitano de Passageiros (Reitup), a exigência de ficha limpa para servidores públicos, a caracterização da corrupção como crime hediondo e a destinação de 15% da receita líquida da União para a saúde, foram aprovados apenas em uma das casas legislativas. Com isso, ainda não tiveram votação final. Esses projetos estão, portanto, numa lista de respostas dos parlamentares que, como a totalidade das demandas feitas ao Executivo, pelos que foram à rua protestar, ainda não chegaram à população.

A tendência é que, durante o segundo semestre, o Legislativo vote projetos apenas em semanas de "esforço concentrado". A desaceleração das votações no Congresso pode fazer com que o Supremo tribunal Federal (STF) ocupe o espaço de dar respostas às demandas da população e seja novamente acusado de assumir prerrogativas do Parlamento.

Em 1º de julho de 2013, no primeiro dia do recesso do Judiciário, o ministro José Toffoli concedeu liminar dando 120 dias para o Congresso aprovar lei de proteção dos usuários de serviços públicos. Toffoli - que, hoje, preside o Tribunal Superior Eleitoral - atendeu a um pedido feito pela Ordem dos Advogados do Brasil no auge das manifestações de junho. "É inevitável observar que o caso em tela coincide com a atual pauta social por melhorias dos serviços públicos", disse o ministro.

A lei que beneficia os usuários de transporte deveria ter sido aprovada 120 dias depois da Emenda Constitucional no 19, que é de 1998. Ela está com um atraso de 16 anos.

Dois dias após a decisão, a Câmara aprovou com urgência um projeto sobre o assunto do ex-senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE) que estava parado desde 2002. O requerimento permitia levar o texto diretamente ao plenário, o que não foi feito. O relator do projeto, deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), afirmou que está com o texto pronto, esperando pelo ingresso na pauta de votações.

As manifestações de junho levaram o Congresso a acelerar alguns projetos de lei que, em seguida, com o fim do calor diário dos protestos, voltaram a tramitar em ritmo mais lento. O Reitup foi aprovado em duas semanas, no auge das manifestações durante a Copa das Confederações. Depois, o texto foi para a Câmara e, sob pressão dos governos estaduais, não andou. A transformação da corrupção como crime hediondo também passou no Senado e parou na Câmara.

Amanhã, começam as convenções partidárias e, no segundo semestre, o Legislativo será esvaziado pelas campanhas.

Essas criam a possibilidade de novas manifestações, com novas demandas. A população deve voltar a fazer cobranças e espera-se que o Parlamento e o Executivo encontrem espaço para retomar votações, obras e projetos importantes para o país.

O coletivo do trânsito - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 09/06

Criar ciclovias e vias para ônibus é importante, mas sistema de transporte público precisa de mais qualidade, o que inclui expandir o metrô


O projeto da Prefeitura de São Paulo de construir 400 km de ciclovias até o fim de 2016 vai ao encontro de uma tendência que já é realidade em algumas das principais metrópoles do mundo. O ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg (2002-2013), por exemplo, implantou 450 km de vias para ciclistas, retirando espaço de faixas antes reservadas a automóveis.

Também na capital paulista os carros perderão parte da área para estacionamentos --cerca de 40 mil vagas, segundo estimativa oficial.

Desde que conectados a terminais de ônibus, estações de metrô e outros destinos relevantes, os percursos ciclísticos poderão ser uma alternativa real de deslocamento. Mais que modismo de jovens de classe média, esse é um meio de transporte usado cotidianamente por cidadãos de baixa renda em bairros periféricos da cidade.

Mas, sendo parte diminuta do sistema, as ciclovias não são a solução para a mobilidade.

As faixas exclusivas de ônibus, por sua vez, também têm alcance restrito. Embora propiciem ganhos de tempo para os usuários, o que não é pouco, elas não bastaram para desincentivar o uso do automóvel e agilizar deslocamentos.

Apesar dos mais de 300 km de faixas criadas pelo prefeito Fernando Haddad (PT), o número de passageiros de ônibus não aumentou. A velocidade média do trânsito em geral e os índices de congestionamento, estes subiram.

Tais resultados não devem ser entendidos como sinal de que a iniciativa vai na direção errada. Na realidade, mostram que a equação não fechará sem o concurso de outros fatores, como o aumento da frota de ônibus, a qualidade desses veículos e o planejamento de linhas. Se a prefeitura deve muito nesses aspectos, a dívida do governo do Estado é ainda maior no que lhe diz respeito --o metrô.

Meio de deslocamento por excelência das grandes cidades, a malha metroviária paulistana, com 74 km, é vexatória. Santiago (Chile), com metade da população, possui 102 km. Cidades como Londres e Xangai têm mais de 400 km.

Uma rede de metrô ampla e eficiente, conectada a outros modais, é crucial para esta ação decisiva: incentivar o motorista de carro a usar transporte público.

Corredores de ônibus inteligentes, faixas exclusivas e ciclovias têm papel a cumprir, mas não haverá deslocamento urbano aceitável em São Paulo enquanto o metrô continuar tão aquém da demanda.

A lista do TCE - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 09/06

Tribunal de Contas divulga nomes de gestores públicos que tiveram suas contas reprovadas. É mais uma ferramenta de consulta para o eleitor



É impossível votar bem se não se conhece o candidato. Mesmo conhecendo-o, a chance de errar é imensa. Por outro lado, a propaganda eleitoral, que influi pesadamente para a decisão que se vai tomar na urna, além de geralmente insuficiente é também enganosa. Portanto, compete ao eleitor que quer fazer valer seu direito de cidadão com consciência e responsabilidade cívica buscar todos os meios a que tiver acesso para encontrar dentre os candidatos aqueles que melhor se afinem com sua própria posição política ou ideológica e, sobretudo, se o postulante apresenta uma vida pregressa limpa do ponto de vista ético.

Uma das ferramentas colocadas à disposição do eleitorado paranaense é a relação divulgada pelo Tribunal de Contas do Estado com 1.275 nomes de gestores públicos que não comprovaram a regularidade de todos os seus atos no exercício dos mandatos que exerceram. Da relação constam ex-prefeitos, reitores, presidentes e diretores de estatais, deputados, vereadores. A presença na lista não impede automaticamente que eles se candidatem, mas pode servir para que adversários ou o Ministério Público peçam a impugnação das candidaturas.

Assim, no mínimo pelo critério de exclusão desses nomes, a escolha pode ser facilitada. Mas há ponderações que precisam ser feitas: o fato de os gestores relacionados não terem passado pelo crivo do TCE não significa, necessariamente, que todos devam ser peremptoriamente alijados da disputa e desde logo condenáveis por suposta malversação de recursos públicos. Por uma simples razão: a análise do Tribunal de Contas se circunscreve às formalidades legais e burocráticas dos atos públicos e não julga, a priori, se estão inquinados com vestígios de corrupção. Basta a não apresentação de um simples formulário de informação exigido pelo processo legal de prestação de contas para que o administrador seja incluído na lista dos inelegíveis. O importante é a culpa ou o dolo; a caracterização de um crime visível e insanável de improbidade administrativa – o que, definitivamente, não é o caso de todos os relacionados.

Inversamente, é possível revestir de aparente regularidade e legalidade formais atos que, em sua essência, escondem os mais nefastos crimes contra o erário e contra o interesse público. E seus autores possivelmente não constarão da listagem do TCE. Mas isso não desmerece o trabalho do Tribunal de Contas, que mostra estar cumprindo seu papel institucional de fiscalizar e de exigir a correta destinação dos recursos públicos e, por consequência, de apontar os gestores que afrontaram contra princípios e regras da administração pública. E, por isso, torna-se importante fonte de orientação para os eleitores, mas não a única.

Num país cujos políticos prezam tão pouco pela conduta ilibada, cabe aos eleitores valorizar seus votos extirpando da vida pública os que não são merecedores de sua confiança. Certamente, outros canais de informação estarão disponíveis para que o voto de cada um seja consciente e de qualidade, capaz de contribuir para a mudança da triste realidade que vivemos.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

ESTEVES E HAMYLTINHO VIRAM PERSONAGENS DA CPI

Além de André Esteves, amigo de figurões do PT e dono do banco BTG, deve virar personagem da CPI Mista da Petrobras o empresário Hamylton Padilha, vulgo “Hamyltinho”, uma das pessoas mais influentes e poderosas nos negócios da estatal. Como “investidor”, ele disponibilizou a Esteves um “negócio da China”, na África: US$ 1,5 bilhão por poços de petróleo da Petrobras avaliados em US$ 7 bilhões.


INDAGAÇÕES

A oposição quer saber por que ofereceram a operação africana a André Esteves, amigo Lula, a preço de banana. E quanto Hamyltinho faturou.


COMPENSAÇÃO

Esteves e Hamyltinho entraram na lista que personagens a serem expostos na CPMI, para compensar a blindagem das empreiteiras.


PELO RALO

A Petrobras produzia e explora petróleo em Angola, Benin, Gabão, Líbia, Namíbia, Nigéria e Tanzânia, onde investiu US$ 4 bilhões.


PROFUNDEZAS

Hamylton Padilha é velho conhecido do setor. Passou por suas mãos o negócio da Petrobras com plataforma P-36, que afundou em 2001.



DEFESA DE VARGAS TENTA MANOBRAS PROTELATÓRIAS

Operador do doleiro Alberto Youssef junto ao governo Dilma, o ex-vice-presidente da Câmara André Vargas (PR) agora acusa o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PSD-SP), de ofender Código de Ética. Em carta enviada aos membros do Conselho, o advogado Michel Saliba alegou que era atribuição do relator, e não de Izar, negar a suspensão do processo de cassação do mandato do ex-petista.


EMBROMATION

A defesa de Vargas pediu sobrestamento do processo até a conclusão de sindicância na Corregedoria ou desfecho de investigações no STF.


HOMEM-BOMBA

Com medo de Vargas abrir o bico, o PT trabalha no Conselho de Ética para blindar o ex-correligionário, que agora xinga Dilma e os petistas.


NADA MUDA

Para evitar que Vargas recorra na Justiça, Izar combinou de passar ao relator Júlio Delgado (PSB-MG) a decisão sobre pedido de suspensão.


ITAÚ NA OPOSIÇÃO

O herdeiro do Itaú Unibanco, Ricardo Marino, filho de Milu Villela, disse, em Londres, que cresceram as chances de Dilma Rousseff perder as eleições. A afirmação foi para uma plateia de banqueiros, financistas e investidores em evento do Instituto Internacional de Finanças.


EUFORIA

Mais uma vez a Bolsa reagiu com entusiasmo à nova derrapada de Dilma nas pesquisas. Com a notícia da queda de 4%, o Ibovespa subiu 3,04%, sexta-feira. Ações da Petrobras dispararam mais de 8%.


FAZENDO ÁGUA

O Ministério Público Federal prorrogou as investigações sobre suposta compra irregular de apê avaliado em R$ 5 milhões do comandante Moura Neto, à beira-mar no Rio. A Marinha estourou prazos.


TROCO GOIANO

O pessoal de Michel Temer desconfia que os convencionais do PMDB de Goiás, ligados a Íris Rezende, ficarão contra o apoio à reeleição de Dilma. Pelo sim, pelo não, Íris tem falado com Eduardo Campos (PSB).


FALTA CINTURA

Presidente do PPS, Roberto Freire não esconde a insatisfação com Romário (PSB), que cogita disputar o Senado na chapa de Lindbergh Farias: “Como articulador político, ele é um ótimo finalizador no futebol”


SAIU NA FRENTE

O deputado Leonardo Picciani (PMDB) garante que “ninguém no Rio terá exército maior” que o presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG), que participou de ato com a presença de 1,4 mil lideranças de 17 partidos.


TUCANOS SE BICANDO

Aécio Neves é pressionado a intervir nas brigas do PSDB do Pará e Paraíba. As cúpulas tucanas querem impedir que os senadores Mário Couto (PA) e Cícero Lucena (PB) disputem a reeleição.


DIA DE COOPERAR

Cooperativas de todo o país realizam em 6 de setembro o “Dia C”, para valorizar o trabalho voluntário. Coordenadas pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), entidades oferecerão, por exemplo, atendimento médico gratuito, envolvendo mais de 200 mil voluntários.


PROFECIA

Com Dilma caindo nas pesquisas e adversários parando, é grande a chance de o candidato Fuleco ganhar as eleições contra o Cacareco.