domingo, março 23, 2014

A fita crepe - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA -23/03

Sempre fiquei intrigada com mulheres que posam para fotos virando-se de costas, dando apenas uma espiadinha para a câmera por cima do ombro. Que as Mulheres Melões e Melancias façam isso, é compreensível: estão oferecendo às lentes o produto que as tornou famosas. Porém, no sofisticado tapete vermelho, acontece o mesmo. Divas em seus vestidos longos de grife oferecem ao mundo uma visão frente e verso, e não só a bem torneada Jennifer Lopez, mas também sílfides como Anne Hathaway, Cate Blanchett e Naomi Watts. Provavelmente para mostrarem suas escápulas em um exclusivo decote Dior, para exibirem o colar da Tiffany que pende pelas costas, para que reparem no corte de cabelo batidinho na nuca, ou em alguma tatuagem, vá saber. Mas gosto de pensar que elas dão essa viradinha por um motivo mais divertido: para provar que não há fita crepe ajustando a roupa ao corpo.

Nem sempre as roupas que a gente vê nas revistas caem feito uma luva no corpo das modelos. Aliás, quase nunca. Metros e metros de fita crepe ajustam camisas, grudam vestidos na cintura, afunilam a perna da calça – quando não esticam o pescoço da criatura ou puxam sua barriga, numa espécie de cirurgia plástica instantânea. Acontece não só dentro dos estúdios. Já escutei casos hilários de mulheres que foram flagradas em festas com uma fita crepe escondida atrás da orelha, a fim de estender uma pelezinha saliente que não deu tempo de remover com bisturi.

Estou exagerando, claro, mas nem tanto. Há uma frase célebre de bastidor: não haveria cinema sem a fita crepe. E também não haveria a fotografia, a televisão, as mostras de decoração e arquitetura. Todos os expositores sabem que sem fita crepe não é possível construir uma ilusão.

Sem desprestígio aos alfinetes, às joaninhas, aos pregadores de roupa, aos clipes e demais acessórios de primeiros socorros de uma produção, mas é inegável que fita crepe é o quebra-galho soberano: funciona para tudo. Prende, cola, ajeita, segura, amarra. É o salvador dos cenários, o braço direito dos iluminadores, e, como já se disse, a melhor amiga dos figurinistas. Você não precisa ser atriz de Hollywood para testar: basta conferir o efeito de uma camiseta exposta no manequim da vitrine de uma loja e depois experimentar o efeito vestindo-a em você mesma, dentro do provador. Pois é, alguns vitrinistas também recorrem a essa espécie de “photoshop” artesanal.

Não pretendo ser estraga-prazer, ao contrário, espero estar salvando seu dia: quando você for às compras e a roupa não cair tão bem no seu corpo como cai no da Alessandra Ambrósio, não excomungue os deuses nem a si mesma. Até as mais perfeitas das beldades, aquelas que ganham milhões de dólares para fotografar com lingeries divinas, já contaram com a ajuda bem terrena de uma fita crepe que custa menos de 10 reais.

A ilha está com todos e não abre - JOÃO UBALDO RIBEIRO

O Estado de S.Paulo - 23/03

Hoje em dia, tem gente que, não sei qual a razão, não gosta de lembrar-se muito disto, mas quem está por dentro de nossa História sabe que, sem o empenho decisivo dos itaparicanos, o Brasil não teria conquistado sua independência política, não me canso de repetir aqui. Os tempos são muito outros e lá se foi a época em que imperadores e nobres nos visitavam. É fugaz a glória deste mundo e quem hoje cavalga, amanhã pode ser cavalgado, já advertiam os antigos. Não é sem certo amargor que essa situação é vista e receio que a posição majoritária tem sido de descrença e repúdio quanto aos governantes, pelo menos na voz de alguns itaparicanos de destaque.

- A merdiocridade continua a dominar este país! - exclama, indignado Jacob Branco, em discurso no Bar de Espanha. - A gente procura, procura e só acha merdíocre! Eu, que já fui fanático pela nossa participação na guerra da Independência, hoje tenho minhas dúvidas. É bem possível que os portugueses já previssem que esta esculhambação nunca ia dar certo e, aí, para a gente não desconfiar, fingiram que estavam querendo continuar a encarar este abacaxi. Eles devem ter ficado muito aliviados, quando a jogada deu certo e conseguiram se livrar do pepino que eles mesmos criaram. Nossa posição só pode ser contra os merdíocres! Portanto, contra todos os políticos, sem exceção! Vocês viram agora a reforma do ministério. Antigamente ministério era para governar, hoje é para ficar trocando um merdíocre por outro, conforme a necessidade do momento. Já temos 39 ministérios, mas sempre se pode botar água no feijão. Há muitas áreas ainda sem ministério, pode haver o Ministério da Mandioca, o Ministério do Ambulante e do Camelô, o Ministério das Festas Populares e muito mais, basta precisar, a fim de comprar algum apoio.

O radicalismo de Jacob de fato parecia ter contaminado toda a coletividade. Pode ser que uma pesquisa feita antes de fatos que se desenrolaram recentemente revelasse que o grau de rejeição aos políticos era talvez o mais alto do país. Mas quem, entre seus cidadãos, conta com Zecamunista deve estar sempre preparado para uma surpresa. Durante vários dias, ele ficou trancado em casa e até se acreditava que estava viajando, na disputa de algum carteado.

- Eu não estava viajando - esclareceu ele. - Estava calculando um esquema de bolões para a Copa, pela internet. Vai movimentar um belo volume de dinheiro.

- E pode fazer aposta e bolão na internet?

- Claro que pode. Aqui tudo pode, onde é que você nasceu e foi criado?

- É verdade. E o pessoal parece meio desanimado, ninguém quer votar em ninguém, ninguém acredita em ninguém.

- Ah, isso não. Quer dizer, não acreditar em ninguém está certo, mas não apoiar ninguém está muito errado. Precisamos é justamente do contrário. No começo, eu pensei em fazer um seminário especial, mas teve quem achasse que era seminário com padre, batina e latim, ficou muito complicado. Aí eu estou criando a Agência Socialista de Distribuição de Renda Eleitoral. É um esquema simples, com base numa premissa indiscutível. É uma coisa de grande alcance socioeconômico.

- Qual é essa premissa?

- O candidato se elege e passa mais pelo menos quatro anos no bem-bom, quando não a vida toda. Já o eleitor só ganha desgosto. Não é justo, agora vamos de Realpolitik, andei lendo sobre o assunto e cheguei a excelentes conclusões. Quer dizer, vamos ser realistas, não vamos querer desentortar a realidade, é dar murro em ponta de faca. Não, senhor, a Agência de Distribuição de Renda Eleitoral terá como obter proveito direto com o voto, beneficiar o eleitor. Já vimos que o voto em si não costuma mudar nada, porque o eleito nunca mais vai nem falar com o eleitor até a eleição seguinte, como de costume. O negócio é aproveitar e malhar na hora certa, que é a hora em que o candidato dá importância ao eleitor. Hoje isso só é praticado de forma muito desorganizada, a agência vai corrigir tudo, pelo menos aqui na ilha. Mas quem quiser adotar o modelo da Agência pode ir em frente, eu considero uma ideia muito interessante para o eleitor.

- E como é que funciona a Agência?

- É muito simples, como eu já disse. O candidato registra a candidatura na Agência. Aí, quando ele pedir o voto a alguém, este alguém diz a ele que espera algum retorno, de forma que ele deve procurar a Agência. Na Agência, o pedido é analisado, cadastrado e cobrado na hora, para repasse ao eleitor. Sem cadastramento e pagamento, o eleitor não vota. A Agência vai procurar a melhor oferta e conduzir todas as negociações com o candidato.

- Mas que oferta é essa?

- Imagino que, basicamente, vai ser dinheiro, acho que a maior parte vai querer dinheiro mesmo, mas isto não exclui outras vantagens mais tradicionais, como uma dentadura, por exemplo. Estaremos prontos para qualquer proposta, o eleitor é soberano. Uma coisa é certa: o voto vai ser valorizado. E, depois da eleição, não importa o resultado, outro passo essencial é declarar apoio integral aos eleitos. Quem quer que ganhe, a gente apoia, estamos com os vencedores, damos festa, puxamos o saco e aplaudimos em praça pública. Nunca mais a ilha estará afastada do poder. E, como sempre, será por um Brasil melhor. Através do voto comprado e pago decentemente, aliado ao adesismo construtivo, vamos aperfeiçoar a nossa democracia. Comigo agora é na Realpolitik, estou em sintonia com a realidade e sigo os profissionais.


Deixa comigo - FABRÍCIO CARPINEJAR

ZERO HORA - 23/03


Sofro de cacoete de vereador. Prometo antes de cumprir, me comprometo antes de pesar as consequências.

Minha generosidade é de véspera. É como assinar antes de escrever a carta. É como preencher um cheque e não abrir a conta.

Sempre posso tudo. Antes de fazer, já estou falando, já estou comemorando, já estou acertando detalhes.

Atropelo ao tirar a palavra da boca. Não verifico a disponibilidade, não sondo as chances, subestimo esforços anteriores, já confesso que será barbada, que convivo com gente capaz de facilitar o trâmite e que basta um telefonema.

É um exagero só, passo a impressão de que experimento o centro do poder de qualquer assunto. Para impressionar os envolvidos, transformo meros conhecidos em grandes amigos, converto pessoas importantes - que jamais encontrei – em confidentes.

Improviso um gabinete na varanda. Armo uma tenda de milagres na cozinha.

Em vez de ficar quieto e resolver, em vez de solucionar secretamente e anunciar o feito apenas quando realmente é certo, assumo a pendência na primeira conversa. Não declaro meus limites, muito menos respeito às peculiaridades de cada situação.

A honestidade depende do senso de realidade. E fantasio de modo inconsequente.

Há uma falsa onipotência me reinando, um Napoleão adormecido em minha mente, um Kublai Khan sedado em meu sangue.

Sim, gostaria de ajudar, mas a vontade maior é de se sentir importante ajudando. Como se precisasse eternamente do voto dos meus amigos.

Prometi um emprego ao Diego, prometi encontrar uma editora para Beto e Éverton, prometi um marchand para Tiago, prometi apressar uma cirurgia para Geverson... Todos estão esperando religiosamente. Já foram meses, e não obtive nenhum resultado. Não vingou minha influência, não rendeu minha lábia, não alcancei nenhum privilégio. Tentei, e tampouco fui ouvido, igual a eles.

E agora, o que respondo?

Serei obrigado a dizer um “não” constrangido quando poderia ter dito um “não” altivo.

Eu me decepciono frustrando os outros. Criei expectativas à toa. Mexi com destinos e alegria familiares impunemente. Não respeitei ciclos da vida e a ordem natural da burocracia, procurei demonstrar facilidades irreais.

Meu comportamento não decorre da falta de popularidade, é megalomania mesmo. Sou um hospital de caridade sem leitos, sou uma creche infantil sem brinquedos.

Deveria ser cassado, isso que nem tenho cargo eletivo.

A sexagenária Petrobrás - SUELY CALDAS

O Estado de S.Paulo - 23/03

Em maio a Petrobrás completa 60 anos de história. Às voltas com denúncias de bilionárias negociatas, um ex-diretor preso como bandido, outro que fugiu às pressas para a Europa, uma presidente que se diz enganada pela diretoria, uso político do governo a torto e a direito, valor de mercado despencando, endividamento a galope, parece não haver muito a festejar. Mas há. Apesar dos governantes, a sexagenária construiu uma história de sucesso, que teve como principais protagonistas engenheiros, geólogos, funcionários anônimos dedicados e capazes, que descobriram petróleo em Campos e na mega-área do pré-sal, triplicaram as reservas de óleo, fizeram da empresa campeã em tecnologia de pesquisa e exploração em águas profundas e a colocaram no pódio das grandes petrolíferas do mundo.

Desde que Juracy Magalhães, ex-interventor de Getúlio Vargas na Bahia, assumiu o primeiro cargo de presidente, em maio de 1954, a Petrobrás teve 34 presidentes até hoje. É função disputada, cobiçada, passaporte para uma carreira de sucesso ou para enriquecimento garantido. Exercê-la exige certo malabarismo político - para aderir ou se esquivar de interesses políticos e econômicos bilionários, como o caso da Refinaria de Pasadena. Há os que escolhem uma coisa ou outra. O advogado Luís Octávio da Motta Veiga, por exemplo, escolheu se esquivar: denunciou as interferências do ex-presidente Fernando Collor nos negócios da empresa e durou só sete meses no cargo.

Dona de um orçamento bilionário capaz de enriquecer ou condenar ao ostracismo fornecedores do Brasil e do exterior, a Petrobrás sempre foi objeto de cobiça de presidentes, parlamentares, governadores, enfim, da classe política com poder de influenciar decisões de negócios - lícitos, ilícitos, lucrativos ou ruinosos para ela. Os diretores passam bom tempo do dia atendendo políticos e ouvindo seus pedidos.

Na ditadura, o presidente Ernesto Geisel, que também presidiu a empresa, nomeou para dirigi-la o advogado Shigeaki Ueki. Nos corredores, funcionários atribuíam a Ueki negócios ilícitos - não comprovados, pois jamais foram investigados (o ditador só investiga o que quer). Na democracia, o ex-presidente José Sarney deixou sua marca em vários negócios, o mais escandaloso deles liderado pelo padrinho da governadora Roseana Sarney, o general Albérico Barroso Alves, que cobrava propina de banqueiros para operar duplicatas da BR Distribuidora. Fernando Collor foi mais ousado: seu ministro Pedro Paulo Leoni Ramos montou um esquema para cooptar funcionários de carreira e desviar negócios da Petrobrás para empresas desconhecidas do meio petrolífero que lucravam superfaturando ou subfaturando operações comerciais ou cobrando comissão de empreiteiras. Em seus sete anos à frente da estatal, nas gestões Itamar Franco e FHC, Joel Mendes Rennó foi alvo de suspeitas de irregularidades e a maior delas envolvia a empresa Marítima, de German Efromovich, que ganhava contratos milionários atuando como mera intermediária.

Mas, de todos os ex-presidentes, Lula foi insuperável. Não que interferisse diretamente ou em benefício pessoal, mas institucionalizou e banalizou na empresa o loteamento de postos de comando para partidos políticos que apadrinhavam funcionários de carreira para ocupar cargos de direção, em troca de toda sorte de negociatas em favor do partido. O caso do ex-diretor Paulo Roberto Costa, afastado em 2012 e preso na quinta-feira pela Polícia Federal, não é o único. Se antes funcionários resistiam e denunciavam a corrupção de diretores importados de fora, a partir de Lula passaram a procurar padrinhos para serem promovidos. Com isso negócios fraudulentos e lesivos aos cofres da Petrobrás se multiplicaram na longa gestão de Sérgio Gabrielli, demitido por Dilma Rousseff em 2012.

Dilma acabou com o loteamento e compôs uma diretoria técnica. Mas sobrou para ela administrar os casos da gestão anterior. Agora terá de explicar em detalhes por que apoiou, por que foi omissa, não investigou nem puniu os responsáveis pelo prejuízo de US$ 1,2 bilhão na compra de Pasadena.


À moda dos generais - JOSÉ ANÍBAL

O GLOBO - 23/03

A presidente tem mão forte sobre o setor desde que assumiu o Ministério de Minas e Energia



‘Eu prendo e arrebento”, disse o general Figueiredo ao falar sobre os que poderiam se opor à abertura política (1979). “Eu faço e pronto. Dane-se quem não concordar”, poder-se-ia atribuir à presidente Dilma Rousseff em 2012, quando resolveu “criar” um novo modelo para o setor elétrico do Brasil. Danou-se!

A trama foi bem urdida. Afinal, a presidente tem mão forte sobre o setor desde que assumiu o Ministério de Minas e Energia, há 11 anos. Como devia saber o que estava fazendo, todos aplaudimos quando disse que queria reduzir o preço da energia no Brasil. Não disse como. Mas logo ficou claro: com o chapéu dos outros.

Bem embrulhado, o pacote veio por medida provisória. Aos consumidores residenciais, prometia uma conta com desconto de 15% a 20%. Aos consumidores industriais, uma redução até maior, para estimular a produtividade/competitividade. O ponto de partida, logo vimos: uma tunga de R$ 10 bilhões nas empresas estaduais de geração de energia, especialmente São Paulo, Minas e Paraná, três governos do PSDB.

Sem nenhum diálogo, a presidente Dilma Rousseff quis dar uma de general. Os estados não aceitaram, preservando suas empresas, que são um ativo das suas populações. A Eletrobras foi obrigada a aceitar a tunga, contra a vontade de todos os seus acionistas — a exceção foi o próprio governo federal — e hoje está na UTI.

Não conseguindo fazer com o chapéu dos outros, e para manter o propósito político-eleitoral, a presidente não quis conversa (regras de transição, por exemplo, nem pensar). Ao contrário, repicou na impulsividade e na insensatez e decidiu que o Tesouro Nacional bancaria a conta reduzida. Mais uma vez de forma populista e demagógica, pegou com mão grande recursos do Tesouro, dos impostos que todos pagamos, para manter seu propósito de governar para a reeleição.

Para os consumidores/contribuintes, o desconto na conta já custou mais de R$ 10 bilhões e as previsões são de que ultrapassarão R$ 20 bilhões até o fim do ano. Estamos pagando o desconto na tarifa em dobro e com o dinheiro dos impostos que poderia ser investido na agenda das ruas: educação, transportes/mobilidade urbana, saúde (R$ 10 bilhões são suficientes para cem grandes hospitais), segurança, habitação.

Para piorar, a escassez de chuvas está tornando a geração de energia no Brasil uma das mais caras do mundo, com o megawatt-hora chegando a R$ 820, oito vezes mais do que o custo médio. Isto e mais os desastres sucessivos na gestão do setor, incluindo a implantação de parques eólicos no Nordeste, aptos a gerar energia mas sem linhas para a transmissão, criam o pior momento para o setor em toda a sua história.

Em paralelo, o setor sucroenergético, com empresas quebrando e com a vitalidade combalida pelos erros grosseiros do governo, vê o país importar etanol de milho dos EUA para suprir a demanda do Nordeste. Nossa maior empresa, a Petrobras, perde valor a cada dia, vítima da gestão predatória que o governo lhe impõe.

As medidas decididas pelo governo dia 13 passado confirmam a dimensão dos estragos no setor e apontam para mais impostos. O que tem de novo é o cinismo total: anunciam aumento na conta de luz, mas, como a madrinha da aventura da conta baixa que ficou muito mais cara é candidata, fica para o ano que vem! É de esperar que esta escola de desacertos e custos enormes para toda população não consiga evoluir além das eleições.

A impressão que fica é de que a presidente, com postura autocrática, quase imperial, decidiu não poupar nenhum tomate do tomateiro do setor. Pisou em todos e ainda fica repetindo a arenga de que está tudo sob controle. Talvez sob controle do tempo, presidente.

O mau negócio bom de Dilma - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 23/03

Executivo que teria iludido Dilma é demitido por ter feito negócio ruim que o governo diz ter sido bom


NA TV, POLÍTICOS do PT aparecem travestidos de analistas financeiros, a explicar que a compra da refinaria foi um bom negócio para a Petrobras. Mas, então, no mesmo dia, demitem o diretor da Petrobras acusado de enganar a presidente Dilma Rousseff, de induzi-la a aprovar um negócio... ruim? Não era bom o negócio da compra da refinaria de Pasadena, patrocinado por esse mesmo diretor?

A coisa não melhora.

Nestor Cerveró era diretor da Petrobras até meados de 2008, quando Dilma Rousseff diz ter compreendido que a empresa fizera um mau negócio bom, ou o que seja, na compra da refinaria. Cerveró, porém, caiu para o lado, passando a dirigir as finanças da BR Distribuidora, empresa da Petrobras.

O que houve? Se o negócio foi bom, mesmo sem nunca ter sido, o que Cerveró fazia na direção da BR até sexta-feira? Se era de fato bom o negócio, o que houve? Teria baixado o espírito da Rainha de Copas na presidente, que mandou a Petrobras cortar a cabeça de Cerveró?

A coisa não melhora.

No jogral que ensaiaram para defender o bom negócio ruim da compra da refinaria, os governistas papagueiam o argumento de que, "no contexto da época", o negócio era bom. Pode ser.

O preço do petróleo e a margem de lucro das refinarias decolavam então para as alturas, no embalo da China e da mãe de todas as bolhas financeiras, parida pelos "gênios do mal" (Wall Street) do "Império do Mal" (Estados Unidos), que inflava o preço de todos ativos, financeiros, reais ou imaginários feito um papel podre imobiliário.

O valor da empresa de fato subiria com a perspectiva de retorno alto e crescente. Tudo normal, mas não deixa de ser divertido que o pessoal do PT defenda que a mãe de todas as estatais surfasse na bolha do "capital financeirizado", como gostam de dizer.

De qualquer modo, a sério, o preço da refinaria ainda parece ter tomado carona num rabo de foguete. No relatório anual do grupo ao qual pertence a Astra, se dizia que o negócio da refinaria de Pasadena "calhou de ser um sucesso operacional e financeiro além de qualquer expectativa razoável", graças à sociedade com a Petrobras.

Mais divertido é que, quaisquer que sejam os critérios da defesa governista dos negócios da Petrobras, "de mercado" ou "neodesenvolvimentistas", tudo acaba em ruína.

O "critério de mercado", de fato "normal", explicaria o preço pago pela refinaria de Pasadena, que, porém, acabou em lambança de mais de US$ 1 bilhão. Qual seria a explicação das perdas "neodesenvolvimentistas"?

Por exemplo. O tabelamento de preços faz a Petrobras perder dezenas de bilhões de reais. A refinaria semibolivariana de Pernambuco vai custar muito mais que o projetado.

Ainda não está claro se valia a pena comprar Pasadena (vão publicar a avaliação financeira?). Não está claro por que houve encrenca com a Astra, o que fez a empresa belga se valer da cláusula que obrigava a Petrobras a comprar a sua parte. Não é pública a fórmula para calcular o valor da refinaria nessa cláusula. Não está clara a sobrevida e morte nada severina do diretor Cerveró.

Tudo isso parece muito esquisito. Ainda assim, o prejuízo de Pasadena parece merreca perto das perdas da Petrobras com outros negócios e com a política do governo.


O vestibular dos governantes - GAUDÊNCIO TORQUATO

O Estado de S.Paulo - 23/03

Que tal um vestibular para candidatos à Presidência da República e aos governos dos 27 Estados da Federação? Combinemos, para começo de conversa, as três regrinhas principais do concurso.

Primeira: os eleitores darão as notas aos candidatos. Segunda: os aprovados serão os que obtiverem a melhor média nos quesitos conhecimento das realidades do território que terão de administrar; projetos de governo que contemplem as demandas de áreas, comunidades, classes sociais e categorias profissionais; comprovação de viabilidade das ações propostas e capacidade de realizar os programas nestes tempos de escassez de recursos econômicos. Terceira: os candidatos darão conhecimento público de seus planos em tempo adequado para que os julgadores (os eleitores) possam compreender propostas, assimilar ideias, estabelecer comparações, refletir sobre as diferenças e semelhanças e, a partir desse quadro, atribuir o veredicto, conferindo aos melhores a nota mais alta.

Não deveriam ser esses os critérios para selecionar os governantes da res publica? A resposta seria afirmativa se o processo de escolha obedecesse a critérios racionais, lógicos, pelos quais os perfis mais preparados e as melhores propostas deveriam ganhar a preferência do eleitorado. Infelizmente, parcela importante de nossa população votante fundamenta as suas escolhas em impulsos emotivos, que se desenvolvem ao sabor das circunstâncias, ora por empatia gerada por um candidato, ora em retribuição a benefícios recebidos, e não raro pela proximidade entre o eleitor e o político, construída ao longo do tempo e firmada sobre uma base de conhecimento e intimidade. A emoção também joga votos na direção oposta, sendo esse o caso de comunidades revoltadas contra serviços públicos ou, ainda, quando elas identificam autoridades e candidatos na responsabilidade (mesmo indireta) por eventos dramáticos, como casos policiais e fenômenos naturais de impacto destruidor.

O processo emocional alastra-se por todos os grupamentos, sendo mais forte nas margens, por conta de aflições do cotidiano e de passivos que as administrações deixam nos arredores de comunidades carentes. Mas a ascensão de grupamentos da base ao meio da pirâmide tem contribuído para o alargamento das fronteiras do voto racional. Esse também é um fato. A mobilidade social, a interação de grupos até então distantes, o acesso ao consumo e ao lazer, a exposição midiática das demandas comunitárias vão formando correntes que passam a cobrar resultados dos governantes. Nessa teia se expande o voto racional.

O fato é que o pleito deste ano, tendo como pano de fundo intensa mobilização social, sugere a aplicação de uma prova para os governantes, até como modelagem para resgatar os escopos a cargo do Estado. Como é sabido, a política tem deixado de ser missão para ser profissão e, por consequência, os projetos de poder - pessoal, grupal, partidário - tomam o lugar dos projetos de governo. O eleitorado acaba votando no indivíduo, na imagem que dele pinça, e não em ideário.

A competitividade eleitoral - e, mais que isso, a polarização entre petistas e tucanos - arrefeceu, nos últimos tempos, a construção de um projeto nacional, contemplando definição de rumos, metas, estratégias e linhas de desenvolvimento. Tucanos ainda hoje mostram as retas do Plano Real, não avançando um passo na estrada do amanhã; petistas continuam a reverberar os feitos do programa de distribuição de renda (Bolsa Família e afins), com o qual inaugurou o ciclo "nunca antes na História deste país". Mas onde estão as pistas mais largas para a decolagem da Nação? Será que vale a pena perder tempo de campanha com o PT anunciando feitos (já conhecidos), o PSDB denunciando malfeitos (já conhecidos) e o PSB brandindo refrãos em torno do que "deve ser feito"? Haverá interesse em ouvir a verborragia eleitoreira, todos gastando a voz com a lengalenga das promessas? E as metas para o amanhã nas frentes da infraestrutura técnica (transportes, energia, telecomunicações, saneamento básico, etc.)?

Eis o imbróglio da falta d'água. Não adianta culpar São Pedro por não abrir as torneiras celestes para jogar água nos reservatórios do Sudeste. Afinal, que obras se impõem para administrar catástrofes, algumas previsíveis? Ou os candidatos ignoram a esteira de destruição puxada pelas enxurradas de janeiro na Serra Fluminense, as enchentes no Sul, no Norte e no Centro-Oeste, a velha crônica sobre a seca no Nordeste? A transposição do Rio São Francisco, o atraso na Transnordestina, as obras inacabadas em todos os espaços, continuará isso a alimentar a querela entre sujos e mal lavados?

Qual o papel do Estado para atenuar as intermitentes crises econômicas? Se a economia é a locomotiva, qual a receita para mantê-la correndo sem deixar para trás os carros dos trens políticos e sociais? Que parafusos precisam ser renovados?

E o Estado de bem-estar? Há condições de expandir os benefícios além da capacidade de arrecadação? Quais as saídas para programas assistencialistas, que nos moldes atuais sinalizam um buraco sem fim? Há diques para suportar o tufão da Previdência, com débito este ano de R$ 50 bilhões? O que os candidatos pensam sobre justiça tributária, endividamento do setor público, capacidade de investimento do Estado, políticas fiscal, monetária e cambial?

Nas unidades federativas, o que os atores enxergam nos cenários? Vão enfocar demandas e prioridades? Que cinturões precisarão ser apertados ou afrouxados para conter e administrar o peso do corpo estatal?

Como se pode constatar, o vestibular faz-se necessário, principalmente no ciclo de transparência que escancara as malhas administrativas. Dois conselhinhos no pé do caderno de anotações: candidatos, formem equipes competentes para preparar respostas às questões e falem a verdade, claramente. Sem firulas.

Rasgando a fantasia - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 23/03

BRASÍLIA - A Petrobras foi a estrela das eleições de 2010 e pode ser novamente na de 2014 - às avessas.

Durante toda a campanha de Dilma, Lula martelava que a oposição privatizaria a Petrobras, enquanto produzia mais de dez eventos para impregnar o imaginário popular com a ideia de que a empresa símbolo do país, o petróleo e os novos poços eram obras suas.

Botava sua candidata debaixo do braço, fantasiava-se com o macacão cor de abóbora e o capacete da Petrobras e borrava as mãos de óleo, insistindo numa autossuficiência no setor que nunca chegou.

Como ensina o marqueteiro João Santana, e o ilusionista Lula está careca de saber, campanhas não trabalham com a realidade, mas com símbolos, emoções e o imaginário coletivo. Se as versões não correspondem aos fatos, danem-se os fatos.

Os fatos, porém, são implacáveis. Mais cedo ou mais tarde, acabam rasgando fantasias e mentiras de palanque. Depois de Lula e Dilma, a Petrobras vive um desastre, deixou de ser a maior empresa do país nas Bolsas, ninguém mais fala em pré-sal, o belo programa do álcool evaporou. E os escândalos estão aí, exigindo explicações e um mínimo de coerência.

CPI não vai sair, porque a maioria governista é avassaladora, e mesmo que saísse não iria longe, porque já não se fazem CPIs como antigamente. Mas a operação Pasadena --pela qual a Petrobras pagou US$ 1,18 bilhão por uma refinaria que antes valia US$ 42,5 milhões-- mexe não só com símbolos, emoções e o imaginário popular. Mexe com a realidade e no sentido oposto ao de um presidente ofendendo regras e o bom senso metido num macacão cor de abóbora e criando ilusões na massa.

É por isso que Dilma diz uma coisa, Lula acha outra, Gabrielli se debate, Cerveró é demitido seis anos depois, de repente, e não há respostas minimamente satisfatórias à sociedade, aos acionistas e à própria história --que vai além de campanhas e de ilusionismos.

A derrota, na ação e no pensamento - ZANDER NAVARRO

O Estado de S.Paulo - 23/03

O que é um camponês? Num mundo comandado pela vida urbana, é pergunta que se tornou excêntrica. Todos nós, no entanto, intuímos sobre o seu significado, lembrando as famílias rurais "presas à natureza", seja pela pobreza extrema ou, então, por formas de dominação exercidas por terceiros.

No passado feudal, aristocratas subjugaram os camponeses para criar os "servos da gleba", mecanismo que garantia as provisões da corte. Foi expressão analisada por Raymond Williams, um culto marxista galês e um dos fundadores, nos anos 1960, dos chamados "estudos culturais" e da Nova Esquerda inglesa. O termo foi dissecado em seu pequeno livro Palavras-chave, publicado em 1976 e lançado entre nós longas três décadas depois. Na obra, camponês obedece à designação acima, mas o autor adverte que aquele sentido original havia "praticamente deixado de existir na Inglaterra no final do século 18".

As transformações produtivas substituíram-no por novas acepções relacionadas à expansão capitalista no campo. Antes uma classe cativa, transformou-se em outra, agora a dos trabalhadores livres. E assim desapareceram os camponeses como categoria de análise, o termo sendo então usado apenas como abuso verbal - "pessoas comuns, caipiras".

Se o significado de camponês e seu respectivo processo social são consagrados na literatura científica e na vida real, por que autoridades governamentais brasileiras vêm forçando um fantasioso discurso em torno da existência de "novos camponeses" no País? À luz do extraordinário desempenho da agropecuária no Brasil - em breve o maior produtor mundial de alimentos, superando os EUA -, por que esse surpreendente obscurantismo? Por que autoridades e seus muitos pesquisadores chapa-branca imaginariam existir a possibilidade de uma volta ao passado?

Sigamos: e "povos tradicionais" o que seriam? Essa é outra expressão da narrativa dominante em nossos dias, destinada a desenvolver uma interpretação que possa corresponder não às realidades agrárias, mas apenas à ideologia de grupos partidários incrustados no Estado. Existiriam povos tradicionais no Brasil, excetuadas as comunidades indígenas? Novamente há aqui a idealização romântica que lembraria as centenárias comunidades rurais europeias, portadoras de facetas culturais específicas - e tradicionais. Omite-se que o adensamento da tradição exige longo tempo histórico de interação humana para ser enraizado e se traduzir em costumes e hábitos próprios, concretizando a autoidentificação de determinado grupo social. A História brasileira, no entanto, é muito diferente: somos uma nação de migrantes, ziguezagueando continuamente entre as diversas regiões do País, sem chances históricas para constituir uma cultura distinta em regiões particulares. Por isso nossa matriz cultural é rasa, facilmente mutável e resistimos à estabilidade. A maioria dos brasileiros nem sequer mora no seu local de nascimento e, assim, como poderia ter ocorrido o desenvolvimento de tradições e, por conseguinte, a constituição de povos ditos tradicionais?

A lista prossegue: o que dizer de certa agroecologia, objeto de diversas chamadas públicas e editais do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do CNPq ou do Ministério do Desenvolvimento Social, nos quais nunca é oferecida a definição da palavra? Ou seja, recursos públicos distribuídos fartamente sem nem mesmo existir clareza alguma do que isso significaria em termos concretos. E a expressão agricultura familiar, que é hoje tão fortemente institucionalizada? Tem sido usada acriticamente. Sabem todos que a lei que a formalizou em 2006 sugere que os pequenos produtores não devem contratar assalariados e, adicionalmente, não ter outras fontes de renda que não as da atividade agrícola? Só então se credenciariam às políticas governamentais. Como justificar tamanha patranha? Por que pequenos produtores não podem contratar assalariados, alguém explicaria?

A história da esquerda, no Brasil ou internacionalmente, tem sido repetidamente pontuada por contínuos equívocos, práticos e teóricos, ou erros monumentais, alguns de intensa dramaticidade, pois implicaram vítimas. Apresenta, é certo, um lado virtuoso, sobretudo quando suas lutas impulsionaram a exigência política dos direitos ou uma ação mais democratizante do Estado, em diversos países. Parece inegável, contudo, que um de seus ramos, a esquerda agrária, sempre esteve à deriva e fez a opção pela cegueira, desde seu nascedouro. Marx nunca se interessou pelo mundo rural nem ofereceu nenhuma teorização a esse respeito, obcecado pelo surgimento do capitalismo industrial. Sobre o campo e suas transformações deixou notas esparsas e desinteressadas. Sem o seu farol, seus seguidores julgaram que o campo obedeceria à mesma dinâmica econômica da industrialização. Por exemplo, o aumento de assalariados rurais, o que não ocorreu em nenhuma região rural conhecida.

No caso brasileiro, a esquerda agrária no poder desde 2003 tem observado um evidente fracasso em suas ações e, reiteradamente, produzido apenas a mentira como sua meta política. A produção agropecuária vem-se concentrando em rapidíssima velocidade, consagrando a agricultura de larga escala, e a única questão social atual, no campo brasileiro, é o encurralamento da pequena produção rural. Nenhuma política operada tem produzido resultados práticos relevantes. São bisonhas suas ações, cujo fundamento é, sobretudo, a ignorância interpretativa sobre o mundo rural brasileiro e suas tendências principais. Ainda mais grave, a área agrária da Esplanada dos Ministérios é autista e hostil a qualquer debate, presa a ideologizações de infantilidade assustadora. É preciso mudar, com urgência, ou o campo petista entrará na História pela porta indesejada: vai consagrar o maior processo de concentração jamais visto num setor da economia brasileira.

Sem açúcar nem afeto - DORA KRAMER

O Estado de S.Paulo - 23/03

Para fins de análise do ambiente pré-eleitoral, muito mais significativos que os números da pesquisa do Ibope divulgados na noite de quinta-feira foram os efeitos provocados pela boataria nos três dias anteriores, de que a presidente Dilma Rousseff apresentaria acentuada queda nos índices de intenção de votos.

Era pura especulação. Ou, a julgar pela euforia prévia que se via nos corredores do Congresso e pelo otimismo do mercado financeiro materializado na valorização das ações da Petrobrás, Eletrobrás e Banco do Brasil na Ibovespa, torcida forte.

A pesquisa mostrou Dilma no mesmo patamar de 43% na preferência do eleitorado, bem à frente dos oponentes e ainda dentro do limite em que o Palácio do Planalto considera ser possível acreditar em vitória no primeiro turno.

Conviria, porém, que assessores palacianos prestassem atenção a esse dado de realidade algo inusitado. Não é normal que notícias de caráter negativo para o governo gerem uma expectativa positiva na economia e na política.

Natural, principalmente no caso de governante que se posiciona com o favoritismo da presidente da República, seria o contrário. O porto visto como seguro para políticos, investidores e empresários em geral é o governo. Em tese, a oposição representa a dúvida.

Quando se tem um acontecimento como esse da semana passada é sinal de que há mudança de ares. No mínimo. Durante três dias o zunzum correu em Brasília e São Paulo. Dizia-se que uma pesquisa do Ibope registraria uma queda significativa de Dilma.

No Congresso, notadamente na Câmara, os deputados cumprimentavam-se numa alegria quase infantil. Vingativa. Como se a suposta derrocada confirmasse que a opinião pública teria dado razão aos parlamentares no embate que haviam tido com a Presidência, sob o comando do PMDB.

Na Bolsa de Valores, três dias seguidos de alta nas ações das estatais atribuídas pelos próprios operadores à expectativa da queda de Dilma nas pesquisas é o reflexo do desagrado com a política governamental.

O esperado, porém, não aconteceu. Mas os boatos e a reação a eles evidenciaram o ambiente de mau humor generalizado com a presidente. No ambiente do Congresso, uma pergunta simples - "Se Dilma não ganhar, para onde vai a base hoje governista?" - recebe uma resposta objetiva: "Para Eduardo Campos ou Aécio Neves, qualquer um dos dois, tanto faz, pois são políticos e compreendem muito melhor o mundo político".

A preocupação desse pessoal é com a perspectiva de piora nas relações de Dilma com o Congresso caso ela seja reeleita. Como não poderia mais concorrer a mandato algum, os parlamentares acham que a tendência seria que ela deixasse de lado de vez o Legislativo. Por esse raciocínio, a recomposição da harmonia no Parlamento passaria pela eleição de um dos candidatos da oposição. Ou pela candidatura do ex-presidente Lula.

Dentro do PT já começam a se inquietar mesmo aqueles que não achavam que era hora de voltar. Ninguém sabe a confusão que o voluntarismo de Dilma é capaz de arrumar e se reduz a esperança de que ela se reinvente a fim de transpor os percalços da campanha.

Refém. A necessidade de barrar a CPI da Petrobrás e nova série de convocações para explicar a compra da refinaria em Pasadena reforçam o poder do PMDB, que na crise ficou ao lado da presidente. Vale dizer, o vice Michel Temer, o presidente do Senado, Renan Calheiros e o senador José Sarney.

A bancada da Câmara não pretende ajudar e espera que o Palácio não atue em tom de retaliação. Se houver ameaças e confrontos, a animosidade latente pode se tornar de novo evidente.

A saída para o governo nesse caso será fingir que quer "apuração rigorosa" e, nos bastidores, atuar com suavidade e habilidade para que nada aconteça.

De GetulioVargas@Edu paraDilma@Gov - ELIO GASPARI

FOLHA DE SP - 23/03

Como eu, a senhora pratica a diplomacia do silêncio, ela não traz popularidade, mas é a melhor para nós


Excelência, Escrevo-lhe para felicitá-la. A senhora restabeleceu uma diplomacia discreta, diria mesmo de recusa a exibicionismos inúteis. Há dificuldades na Venezuela, e agora surgiu a crise da Crimeia, mas estamos fora dos holofotes.

Peça ao Sarney a poesia "A carga da Cavalaria Ligeira", de Lord Tennyson. Ela conta o ataque de cavaleiros ingleses contra uma tropa turca artilhada durante a Batalha de Balaclava, na Guerra da Crimeia do século XIX. Li-a ontem para minha amada Aimée. Foi um desastre produzido por generais ineptos, mas o poema mostra como as potências fabricam mitos heroicos.

Minhas dificuldades foram maiores que as suas. Consegui ficar neutro durante a Guerra Civil Espanhola. Até onde pude, mantive-me longe do conflito europeu. Sem fanfarra, em maio de 1941, avisei ao embaixador japonês que, se um país americano fosse atacado, nós seríamos solidários.

Em dezembro, eles bombardearam Pearl Harbor. Os americanos exigiam o controle de uma base aérea no Saliente Nordestino, pois, sem a rota de Natal a Dacar, ficariam aprisionados pelo Atlântico. Cedi. Lidei com embaixadores impertinentes e tive pavões no Ministério das Relações Exteriores. O Oswaldo Aranha achava que era o gerador do mundo, centro do universo.

Depois que saí da vida para entrar na História, há 60 anos, vieram o Juscelino com a tal de "Operação Pan-americana", o Jânio com a "Política Externa Independente", o Castelo Branco com a "interdependente", e o sr. Luiz Inácio da Silva, que se tornou um papagaio de pirata de crises internacionais. Usei essa expressão que hoje é comum aí, mas não sei se o fiz corretamente. As diplomacias de slogans são apenas propaganda política. Os generais mandaram tropas para ocupar a República Dominicana, num episódio que hoje se procura apagar. Chegamos ao ponto de o general Médici cobrar ao presidente Nixon a deposição de Fidel Castro. Outro dia, o Nixon me perguntou por que ele fez aquilo.

Diplomacia sem fanfarra tem um custo. Criticam-nos de todos os lados, acusando-nos de omissão. Há quem a ataque por estar próxima dos bolivarianos e também por ficar distante. Algum gabola da União Europeia resolveu botar fogo na Ucrânia sem prever a reação da Rússia. Em 1956, os americanos insuflaram a rebeldia húngara e, em 1962, a dos cubanos de Miami. Fracassaram e abandonaram os aliados. O Pedro II lembrou-me de que manteve nossa neutralidade durante a guerra civil mexicana, quando os rebeldes fuzilaram-lhe o primo-irmão Maximiliano. Os franceses, que haviam insuflado sua aventura, abandonaram-no.

Quando nos metemos a buscar um papel maior que nossa importância internacional, invariavelmente acabamos dificultando a defesa dos nossos verdadeiros interesses.

Parabéns, senhora.

Com todo o respeito, 


Getulio Vargas



CENA BRASILEIRA

O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, visitava o presídio de Porto Alegre quando um major da brigada pediu a palavra e contou que "somos 12% da população do estado e 40% da população carcerária": "Deve ter alguma coisa errada".

Mal terminou a frase, ouviram-se mumunhas para que o major calasse a boca. Barbosa pediu que o deixassem falar. Em seguida, respondeu: "Eu percebi".

O que incomodou os áulicos? As estatísticas ou o fato de um negro levantar esse assunto para outro negro? 



PACIFICADOR

O secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, zangou-se quando um pesquisador apontou a "pacificação" das estatísticas de homicídios do estado.

Depois da morte de Cláudia Silva Ferreira, arrastada pela viatura que devia levá-la ao hospital, o repórter Marcelo Gomes informou o seguinte: 


O subtenente Adir Serrano Machado, que estava na cena, viu-se listado em 57 "autos de resistência" em que morreram 63 pessoas. Seu colega Rodney Archanjo está em outros cinco, com seis mortos.

De duas uma, ou as estatísticas da polícia do Rio assemelham-se às reuniões dos conselhos do comissariado, ou policiais como Machado e Archanjo são versões modernas do Sargento York, o soldado americano da Primeira Guerra, magistralmente representado por Gary Cooper. Sozinho, York matou 28 alemães e capturou 132.

Como disse o viúvo de Cláudia, ao governador Sérgio Cabral: "Se não tivesse aquele cara que filmou, este seria só mais um caso. Tomou tiro, entrou no hospital e morreu"


CHEGOU A CONTA DA BOLSA CONSELHO

A prática é velha: reforça-se o orçamento dos hierarcas nomeando-os para conselhos de empresas. Ela vale tanto na administração federal como nas dos estados. Tome-se o exemplo de Dilma Rousseff. Em 2006, como chefe da Casa Civil, tinha um salário mensal de R$ 8.362. Em 2007, ganhava R$ 8.700 mensais como conselheira da Petrobras e de sua distribuidora. À Casa Civil, ela ia todo dia; aos conselhos, uma vez a cada dois meses (e às vezes chegava atrasada). 


O conselho de Itaipu, joia da coroa do comissariado, paga R$ 19 mil. Em 2012 havia 13 ministros nas bolsas Conselho, e os doutores Guido Mantega e Miriam Belchior fechavam os meses com um total de R$ 41,5 mil. A comissária Belchior estava no conselho da BR Distribuidora, para quê, não se sabe.

Quando o PT estava na oposição, reclamava disso. No governo, acostumou- se. Agora chegou a conta. Como integrante (e presidente) do Conselho da Petrobras, Dilma é responsável pela aprovação da ruinosa compra de uma refinaria em Pasadena, nos Estados Unidos. A repórter Andreza Matais obteve do Planalto uma nota, escrita pela doutora, informando que a decisão foi tomada com base num relatório "técnica e juridicamente falho". A ver. A ruína estava em duas cláusulas do contrato, e elas viriam a custar US$ 820 milhões à empresa. A explicação segundo a qual esses dispositivos só chegaram ao conhecimento dos conselheiros depois da aprovação do negócio é plausível. Mesmo que a doutora só tenha percebido a ruína depois, era a poderosa chefe da Casa Civil. Quem pode tirar quaisquer dúvidas sobre o caso é o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que está preso na Polícia Federal.

Numa estrutura séria, seria demitido o presidente da empresa, ou iriam embora os conselheiros que se julgaram desinformados. Os conselhos de estatais não são sérios, são bicos. O caso da refinaria acertou a testa da doutora Rousseff, a gerentona que pode ser acusada de viver num mundo de verdades próprias, mas nunca se meteu em transações tenebrosas. A vida é arte, errar faz parte. Enquanto houver hierarcas em boquinhas, o erro será a arte.

Águas turvas - BELMIRO VALVERDE JOBIM CASTOR

GAZETA DO POVO - PR - 23/03

O negócio feito pela Petrobras com a empresa belga Astra Oil (aliás, dirigida por um ex-funcionário seu, como informa a imprensa) é inexplicável sob qualquer aspecto e para qualquer pessoa, com a exceção talvez da doce Polyana, que não vê maldade em nada, e da Velhinha de Taubaté, aquela parente do Luis Fernando Verissimo que é a única pessoa do país que acredita no que diz o governo.

Vamos lá: em 2006, a Petrobras – que não é nenhum boteco de venda de bananas e que deve ter um exército de advogados, analistas, técnicos, assessores e consultores de nível internacional – aceita pagar US$ 360 milhões por 50% de uma refinaria adquirida pelo vendedor (a tal empresa belga) por US$ 42 milhões menos de dois anos antes. Depois, é obrigada a comprar o restante da refinaria, pois havia duas cláusulas, uma de “put” (que qualquer estagiário sabe representar um direito/obrigação de comprar algo em uma data futura – no caso, o restante da refinaria) e que teria sido negligenciada pelo diretor internacional, Nestor Cerveró, no resumo que apresentou ao Conselho de Administração a respeito do negócio. Como consequência desse imbróglio todo, a Petrobras acabou perdendo um processo de arbitragem, ratificado por um juiz norte-americano e gastando mais de US$ 1 bilhão (é isso mesmo, do seu, do meu, do nosso dinheiro)!

Três perguntas apenas: o Conselho de Administração da Petrobras aprova o negócio baseado apenas em um resumo executivo do diretor internacional, Nestor Cerveró? Resumo, aliás, que era – segundo alega a então presidente do Conselho – tecnicamente falho e incompleto? O tal exército de advogados, analistas, assessores, técnicos e consultores não estudou o negócio antes que ele chegasse ao Conselho? Se estudou, a que conclusões chegou? Se achou que era um bom negócio, como se explicaria que, quando a Petrobras tentou se livrar da refinaria, vendendo-a, só recebeu uma proposta de US$ 180 milhões pela empresa toda? E, depois que saiu do Conselho e teve de ser materializado em contratos internacionais, ninguém se preocupou com as tais cláusulas antes que os mesmos fossem firmados?

Terceira: o tal Nestor Cerveró, que teria omitido da alta direção da empresa dois “detalhes” que vieram a lhe causar um prejuízo próximo de US$ 1 bilhão (e que com isso teria incorrido em grave falha por falta de exação no cumprimento de suas obrigações como diretor), sofreu alguma sanção? Denunciado à CVM? Processado? Preso por tão estranha omissão? Ou é verdade que, depois de feito o negócio, deixou a diretoria da Petrobras... para assumir a direção financeira da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, demonstrando que continuava a gozar da confiança da empresa e de seus dirigentes?

Devo ter entendido mal. Ou então... Tudo é tão estranho – ainda mais quando a Polícia Federal prende por suspeita de lavagem de dinheiro outro ex-diretor da estatal, Paulo Roberto Costa, que recebeu um Land Rover de um doleiro como “retribuição de serviços de consultoria” – que sinto no fundo de minha cabeça uma voz que martela em meu cérebro a frase que um querido amigo gosta de repetir: aceito qualquer coisa, menos que queiram me passar um atestado público de estupidez e burrice irrecuperáveis.

De corpo e alma - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 23/03
A primeira entrevista mais longa para a televisão do ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo tribunal Federal, dada ao jornalista Roberto D'Ávila no seu programa de estreia na Globonews, é um depoimento revelador de como pensa e age um dos principais atores da atual cena pública brasileira. Ele não apenas anuncia formalmente que não será candidato a nada nas eleições deste ano, como faz questão de separar sua atuação da vida política, da qual diz preferir se manter alheio. Ocupando um dos principais gabinetes na Praça dos Três Poderes, ele se diz distante de "tudo o que se passa aqui (nessa Praça dos Três Poderes) que tenha caráter político".
Retira também do processo do mensalão, do qual foi relator e alvo das críticas dos petistas, qualquer caráter político na sua atuação, mas reconhece que ele trouxe "um desgaste muito grande, com uma carga política exagerada, um pouco turbinada pela mídia também". Ressalta que, por estratégia, tomou sempre as principais medidas ouvindo o plenário.

Certas penas não foram muito pesadas?, pergunta o entrevistador, e Barbosa rebate: "Ao contrário. Eu examino as penas aplicadas nesse processo e as comparo com as penas aplicadas aqui no STF pelas turmas, só que em casos de pessoas comuns, e (quem fizer a comparação) vai verificar que o Supremo chancela em habeas-corpus coisas muito mais pesadas".

Ele não atribui à transmissão pela TV das sessões um papel importante nas atuações dos ministros, e fala de sua própria experiência: "A televisão me incomodava muito nos primeiro meses, depois me acostumei e nem noto que há televisão". Durante toda a entrevista o ministro procurou colocar-se como uma pessoa diferente do que o pintam, tanto em relação à sua carreira quanto ao seu comportamento na vida pública.

"No Brasil a vida pública é quase um apedrejamento.

Acompanho a vida institucional de alguns países e noto uma diferença fundamental. Noto no Brasil um processo paulatino de erosão das instituições e esse apedrejamento parece fazer parte disso. Exercer a função pública no Brasil, na visão de muitos, tornou-se um anátema. As críticas são muito acerbas e às vezes infundadas, fruto de incompreensão de como funciona o Estado", comentou, denotando algum ressentimento.

A certa altura, comentando a descrição que fazem dele como uma criança pobre que teve que superar obstáculos para chegar onde chegou, Barbosa deixou clara sua posição: "Ao contrário do que dizem de mim por aí, penso que raras pessoas no Brasil, incluindo pobres e as vindas da elite, tiveram e souberam aproveitar as oportunidades que eu tive.

Não sinto isso como superação, as coisas foram acontecendo".

Mesmo assim, lamenta que "pouca gente olha o meu currículo, só vê a cor da pele". Ele diz que o racismo, que, confessa, já o fez chorar quando criança, "você sente sempre, mesmo quando ministro do STF". Citando Joaquim Nabuco, que disse que o Brasil levará séculos para se livrar da carga da escravidão, ele diz que seus traços "estão presentes nas coisas mais comezinhas, na repartição dos papéis na sociedade, aos negros posições mais baixas e salários menores".

Ele se diz uma exceção, mas ressalta que jamais deixa que sua presença no STF seja uma desculpa para o racismo brasileiro. Barbosa não acha que seja uma missão sua combater o racismo, mas espera que sua presença possa tirar a carga racial das escolhas para o Supremo. "Espero que os presidentes (daqui para frente) saibam escolher bem pessoas para cá, que escolham um negro com naturalidade".

O senhor não é às vezes muito rude?, perguntou Roberto D'Ávila a certa altura, e Barbosa foi incisivo: "Tem que ser, o Brasil é o país dos conchavos, do tapinha nas costas, o país onde tudo se resolve na base da amizade. Eu não suporto nada disso".

Ele rejeita a acusação de que fica brabo quando é vencido, mas admite que "às vezes" se arrepende de palavras mais duras, mas justifica: "Sou um companheiro inseparável da verdade. Não suporto essa coisa do sujeito ficar escolhendo palavrinhas para fazer algo inaceitável. E isso é da nossa cultura. 

A CPI não pode esperar - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 23/03

Embora não tenha relação com a decisão que levou a Petrobrás a fazer o que há de ter sido o pior negócio de sua história - a compra da Refinaria de Pasadena, onde enterrou perto de US$ 1,2 bilhão -, a prisão do ex-diretor de Refino e Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa dá razão a todos quantos, no Congresso Nacional, defendem a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar, entre outras ocorrências obscuras na petroleira, a transação que pode ter acobertado ilícitos como superfaturamento e lavagem de dinheiro. Apesar da relutância do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à ideia, o senador Aécio Neves, pré-candidato do PSDB ao Planalto, pretende pedir na próxima terça-feira a abertura de uma investigação a cargo de deputados e senadores, a chamada CPI mista.

Costa - que tinha enorme influência na Petrobrás na gestão José Sérgio Gabrielli - foi um dos redatores do contrato em que a empresa se atolou, e ainda ajudou o então diretor da sua área internacional, Nestor Cerveró, a produzir o resumo executivo, "técnica e juridicamente falho", como diz agora a presidente Dilma Rousseff, no qual se teria baseado, quando encabeçava o Conselho de Administração da estatal, em 2006, para autorizá-la a investir em Pasadena. Ao lado de Gabrielli, da sua sucessora Graça Foster e de Cerveró, Costa foi intimado a depor no inquérito em curso desde o ano passado no Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Tamanha era a sua desenvoltura junto aos políticos que ele foi guindado ao primeiro escalão da Petrobrás, em 2004, com o apoio do PP e as bênçãos dos sobas peemedebistas José Sarney e Renan Calheiros.

Mas, passados seis anos, Costa foi incluído na lista de executivos dos quais Graça queria se livrar - e, a partir daí, como consultor e dono de empresa, parece ter mergulhado em águas ainda mais turvas do que aquelas em que teria nadado de braçada na estatal. Acabou enredado em um esquema de branqueamento de valores da ordem de R$ 10 bilhões, que operava em sete Estados e no Distrito Federal, desmanchado pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal (PF), com a prisão de 24 suspeitos. Costa teve a prisão temporária decretada por um juiz federal do Paraná por suas lucrativas ligações com o megadoleiro Alberto Youssef, figura de primeira grandeza no caso Banestado (a remessa ilegal para o exterior de US$ 30 bilhões, ao longo dos anos 1990). Na moradia do ex-pezzonovante da Petrobrás, a polícia achou R$ 751 mil, US$ 181 mil e € 11 mil em dinheiro vivo.

O órgão suspeita que Costa mexia os seus pauzinhos para que a petroleira assinasse contratos milionários com uma certa Labogen Química, do setor de fármacos, cujo controlador oculto seria Youssef. "Pode-se estar diante de mais uma ferramenta para sangria dos cofres públicos", alerta a PF, aludindo a relatórios de inteligência segundo os quais a Labogen visa a "objetivos bem distintos de seu objeto social". Matéria-prima para uma investigação parlamentar há de sobra, portanto. O fato de ser este um ano eleitoral não deve adiar a sua eventual instalação para 2015. Possivelmente poderá dar dores de cabeça para os políticos que apadrinharam Costa e Nestor Cerveró - em relação a este, aliás, o senador petista Delcídio Amaral e o colega Renan Calheiros, do PMDB, travam uma animada disputa de "toma que o afilhado é teu".

Mas sustentar que a CPI teria o poder de prejudicar a candidatura Dilma, ainda que a oposição o queira, é um fraco pretexto. "Não acuso a presidente de improbidade", apressou-se a ressalvar o adversário Aécio Neves. "Ela é uma pessoa de bem." O seu problema, como se sabe, é outro: os autodestrutivos impulsos autoritários que, no caso, a levaram a dar "um tiro no pé", como o ex-presidente Lula teria avaliado, segundo a Folha de S.Paulo, a decisão de "trazer para dentro do Planalto" o imbróglio da refinaria. O veículo foi a nota com que a sucessora atribuiu o seu apoio à compra de 50% da instalação ao documento de Cerveró que omitia cláusulas críticas do contrato. Antes, ela rasgou o texto convenientemente anódino que lhe enviara a amiga Graça Foster para tirar Pasadena do mapa das atribulações da empresa. Pior para as duas.


A inflação da comida - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 23/03
Desde o começo do ano, o brasileiro que vive com renda média de até R$ 3 mil (ou seja, a maioria) tem tido dificuldade de acreditar nos índices oficiais de inflação. Reportagem do Correio Braziliense, com base em pesquisa exclusiva do instituto Data Popular, revelou na semana passada que o consumidor está incomodado com o aumento dos preços que mais pesam no orçamento.
Mais do que obrigá-las a aumentar o esforço para encontrar os preços mais em conta, o incômodo está levando famílias de classe média e baixa a cortar prazeres, como ir a restaurantes ou fazer pequenas viagens nos feriados e fins de semana. Além, é claro, de adiarem sine die a compra de bens duráveis.

Para 61% dos 2.017 entrevistados em 53 cidades de várias regiões do país, o aumento de preços dos alimentos é o que mais incomoda no momento. Produtos de limpeza (59%), educação (56%) e roupas (52%) vêm em seguida.

O consumidor tem razão. A alta dos alimentos é a maior preocupação dos especialistas em inflação neste começo de ano. A falta de chuvas em grande parte do país e a queda na produção de trigo e soja em celeiros importantes do exterior estão frustrando a expectativa de que a colheita de safra gigante no Brasil daria por encerrado um ciclo de altas que dura três anos.
A prévia da inflação do IBGE, medida pelo IPCA-15, divulgada na semana passada, acabou confirmando a constatação das pessoas que vão todas as semanas às compras de frutas, legumes, carnes e cereais. O índice médio aumentou 0,73% em relação a fevereiro, com boa "ajuda" dos alimentos, que subiram 1,11% e acumulam alta de 6,39% em 12 meses.

Mas não é fácil explicar para a dona de casa - perplexa com o que pagou pelo quilo da batata (45% de aumento desde janeiro) - que o índice de inflação oficial é média dos preços de centenas de produtos, cada um com um peso relativo na composição do custo de uma cesta. Ou seja, a inflação que ela percebe é diferente da inflação de pessoas com outros hábitos de consumo.

Nem por isso o depoimento deixa de ser importante. Pelo contrário. O que a maioria dos entrevistados pelo Data Popular está informando é que este é ainda um país pobre. Por essa razão, o custo da comida tem muito peso no orçamento da maioria dos brasileiros. Dados do IBGE revelam que a alimentação corresponde a 19,8% das despesas de consumo da população, mas, nas famílias mais pobres, esse item chega a pesar 27,8% das despesas totais.

São detalhes que parecem escapar a economistas do governo e certos meios acadêmicos, que consideram exagerada a preocupação com as metas de inflação. Ainda não entenderam que mantê-la presa a uma meta baixa (a nossa, de 4,5%, é alta demais) é o que permite à economia absorver as oscilações de preços que dependem de fatores climáticos. Não fazer esse dever de casa pode custar a elevação dos juros ou, pior ainda, a perda ainda maior do poder de compra dos salários.

Os subsídios do BNDES - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 23/03

Com a autorização dada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para a renegociação da parcela de R$ 194,07 bilhões da dívida que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem com o Tesouro Nacional, e que deve resultar em condições financeiras mais favoráveis para a instituição estatal, deverá crescer o subsídio implícito nessas operações, que está previsto em R$ 15,67 bilhões só em 2014. O custo, ainda que não seja explícito, será pago pelo contribuinte.

Desde 2009, na tentativa de reduzir o impacto da crise mundial sobre a economia brasileira, o Tesouro vem repassando recursos vultosos para o BNDES, com o objetivo de assegurar à instituição condições de apoiar mais fortemente os programas de investimentos. Como o Tesouro capta esses recursos a determinado custo e o banco os empresta a juros inferiores aos do mercado e aos custos em que incorre o governo, a operação é subsidiada. Em janeiro, dado oficial mais recente, a dívida do BNDES com o Tesouro somava R$ 415,1 bilhões. É uma parte dessa dívida que será renegociada.

Dado o montante da dívida, qualquer diferença entre a taxa paga pelo Tesouro para a captação dos recursos e os juros cobrados pelo BNDES do tomador do empréstimo implica somas muito elevadas. Para captar recursos, o Tesouro emite títulos, que coloca no mercado. São papéis corrigidos por índices de inflação, pela taxa de câmbio ou pela TR, mais os juros básicos. Já nos seus financiamentos, o BNDES cobra a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), atualmente fixada em 5% ao ano, bem abaixo da remuneração paga pelo Tesouro.

Desde 2009, as regras para o BNDES quitar os empréstimos tomados junto ao Tesouro vêm sendo alteradas. Elas já tiveram como base o custo de captação externa (nos casos em que o Tesouro tomou os recursos no exterior) e a TJLP com ou sem acréscimo de juros (sempre muito baixos, de no máximo 2,5% ao ano). A renegociação autorizada pelo ministro da Fazenda deverá estender a aplicação da TJLP sem juros a todos os contratos que serão revistos.

O valor do subsídio implícito nessas operações vinha oscilando entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões ao ano. Em demonstrativo enviado em dezembro do ano passado ao Congresso como informação complementar à proposta orçamentária para 2014, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda estimou em R$ 15,67 bilhões o subsídio a ser concedido neste ano pelo Tesouro nos empréstimos ao BNDES. Já era um valor 52% maior do que o estimado para 2013 (de R$ 10,31 bilhões), mas, com as novas vantagens para o banco, a diferença será ainda maior.

Em documento aprovado pelo plenário em 2012, o Tribunal de Contas da União (TCU) estimou em R$ 72,3 bilhões o valor do subsídio implícito nas operações entre o Tesouro e o BNDES entre 2011 e 2015. O aumento constante do saldo das transferências de recursos do Tesouro para o banco e a concessão de novas facilidades para a quitação desses empréstimos devem tornar o montante ainda maior.

Teria sido bom se, como previu o governo ao anunciar o plano - para o então presidente Lula, a crise mundial chegaria ao País como uma "marolinha" -, o programa de apoio aos investimentos por meio de empréstimos do BNDES tivesse produzido os resultados esperados. Mas foi um período em que o BNDES concentrou suas operações num grupo de empresas selecionadas por seus diretores, financiando até mesmo aquisições de companhias que operam exclusivamente no exterior, o que teve pouco efeito sobre o desempenho da economia brasileira e sobre a geração de empregos.

Apesar do grande e rápido aumento dos recursos postos à disposição do banco, empresas que tradicionalmente encontram problemas para financiar seus programas de modernização e ampliação continuaram com dificuldades de acesso aos créditos, como as de pequeno e de médio portes. Nem por isso, porém, o custo para os contribuintes diminuiu. Ao contrário, cresceu e, com a renegociação agora autorizada, deve crescer ainda mais depressa.

Limites previdentes - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 23/03

Considerando o cenário das contas públicas e as características demográficas do país, é inevitável reformar o modelo da Previdência 

Na avaliação do Planalto, o ministro Garibaldi Alves (Previdência) provocou certo estrago na imagem do país ao comentar, supostamente sem razão, previsões de gastos constantes do Orçamento. 

Segundo disse ao jornal "Valor Econômico", Alves considera subestimado o deficit previdenciário calculado pelo governo. O rombo neste ano chegaria a R$ 50 bilhões, ou R$ 10 bilhões a mais que a cifra estimada pela equipe econômica. 

Mais tarde, o ministro viu-se obrigado a se retratar. Se sua versão não fosse oficialmente desmentida, investidores teriam ainda mais motivos para desconfiar das metas de poupança do governo. 

O ataque de sinceridade, todavia, fez mais que evidenciar descompassos na gestão das contas públicas. Serviu para recolocar em pauta o deficit da Previdência, tema tão delicado no presente quanto importante para o futuro do país. 

Verdade que, nos últimos anos, tem-se mantido em torno de 1% do PIB a quantia destinada ao financiamento da Previdência. O problema é que essa relativa estabilidade decorre do aumento da formalização da mão de obra, que permitiu aumento da arrecadação. Esse processo, como é óbvio, tem um limite. 

Mais importante do que isso, as tendências demográficas para as próximas décadas suscitam justificadas apreensões quanto ao aumento desse desequilíbrio. Hoje, mesmo com uma população jovem, os gastos previdenciários do Brasil equivalem a 11% do PIB (7% para o INSS e 4% para o funcionalismo público). São níveis comparáveis aos de países desenvolvidos, que têm parcela bem maior de idosos. 

Por enquanto, o percentual de brasileiros ativos cresce em ritmo superior ao da população total. Isso logo mudará, enquanto a fatia de pessoas com 60 anos ou mais passará de 10%, em 2010, para 19%, em 2030, e 29%, em 2050.

A imagem mais frequente para tal elevação de gastos sem contrapartida na arrecadação é a de uma bomba-relógio. A situação é ainda mais complexa dado que o Orçamento do país já não tem muita elasticidade, por assim dizer. 

Ninguém ignora que a cobertura social cresceu de forma expressiva nos últimos 20 anos. Os programas de combate à pobreza produziram resultados marcantes, e o poder de compra do salário mínimo elevou-se em 150% desde 1994. 

Também é fato que só foi possível destinar mais recursos a tais finalidades graças ao crescimento ininterrupto da carga tributária, que passou de 25% para 36% do PIB no período, índice superior até ao patamar de alguns países ricos. 

Não será possível, assim, manter altas continuadas do gasto social em relação ao PIB sem que os tributos comprometam ainda mais a economia e, a rigor, a própria sustentabilidade de tais programas. 

Dados o cenário das contas públicas e as características demográficas do país, é forçoso concluir pela inevitabilidade de uma reforma da Previdência. São três os pontos fundamentais que fazem o Brasil destoar do padrão: a idade mínima para aposentadoria, os critérios de concessão de pensões por morte e a indexação do piso dos benefícios ao salário mínimo. 

O aumento da expectativa de vida precisa se traduzir na extensão do tempo de trabalho. Homens aos 55 anos ou mulheres aos 52 não podem mais ser considerados idosos --e, no entanto, essa foi a média de idade das aposentadorias em 2013. 

Sem que prosperasse, surgiu como sugestão, há pouco tempo, a fórmula 85/95, na qual os números (que precisariam ser bem estudados) se referem à soma da idade com o tempo de contribuição exigido, respectivamente, de mulheres e homens. Haveria, além disso, idade mínima para aposentadoria no caso dos futuros participantes. 

Quanto às pensões por morte, hoje quase não há restrições. O país gasta 3% do PIB nessa rubrica, quando a média mundial fica em torno de 1%. O viúvo ou a viúva recebe o valor integral e de maneira vitalícia, sem que importem idade do sobrevivente ou se tem renda própria, entre outras liberalidades que precisam ser revistas. 

Por fim, há a controversa indexação constitucional do piso previdenciário ao salário mínimo, um mecanismo que assegura a correção dos valores pagos. O benefício decerto deve ter seu poder de compra preservado, mas não corrigido acima da inflação. Tal restrição não necessariamente se aplica ao salário mínimo. A vinculação, além de pressionar o deficit, limita ganhos reais num caso e os atribui indevidamente no outro.

 Reformas dessa natureza não são incompatíveis com o combate à pobreza e à desigualdade, que pode ser levado adiante por meio de programas de transferência de renda e investimentos em áreas estratégicas, como saúde e educação. 

Se não passar por mudanças, a Previdência, em vez de fomentar a solidariedade intergeracional, deixará uma conta impagável para as gerações futuras.

O tamanho da irresponsabilidade - GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 23/03

Há duas versões para o prejuízo bilionário que a Petrobras levou com a refinaria de Pasadena; ambas mostram descaso com o que já foi orgulho nacional



Dias atrás, quando neste espaço comentamos as traquinagens do “blocão” de deputados insatisfeitos com a presidente Dilma Rousseff, afirmamos que a criação de uma comissão externa e o convite a Graça Foster, presidente da Petrobras, para explicar denúncias de propina eram peixe pequeno diante de vários outros fatos envolvendo a estatal. Um deles era o prejuízo bilionário que a empresa teve com a aquisição de uma refinaria no Texas. Na semana passada, a guerra de versões que envolveu a própria Dilma e executivos da petrolífera comprovou o tamanho da irresponsabilidade dos gestores da empresa, e o descaso com que a administração petista trata o que um dia foi orgulho nacional.

Recordando a história: em 2005, a belga Astra Oil comprou uma refinaria de petróleo em Pasadena, nos Estados Unidos, por US$ 42,5 milhões. No ano seguinte, a Petrobras comprou 50% da refinaria por US$ 360 milhões (ou seja, 17 vezes o que os belgas haviam pago). A compra, ocorrida quando Lula era presidente da República e José Sérgio Gabrielli presidia a estatal, foi aprovada pelo Conselho de Administração da Petrobras, que à época tinha três petistas graúdos: Antonio Palocci (então ministro da Fazenda), Jaques Wagner (então ministro de Relações Institucionais e hoje governador da Bahia) e a própria Dilma, então ministra da Casa Civil. Todos os três votaram a favor do negócio. Em 2008, a Astra e a Petrobras se desentenderam e os belgas foram à Justiça americana, baseando-se em uma cláusula que constava do contrato e determinava que, em caso de briga entre sócios, a outra parte deveria comprar a totalidade das ações da refinaria. Em 2012, os belgas ganharam a ação e a Petrobras teve de desembolsar outros US$ 820 milhões pelos 50% que eram da Astra. Em 2012, quando a estatal tentou vender a refinaria, recebeu uma oferta de US$ 180 milhões. No ano passado, Graça Foster desistiu de vender a unidade, alegando que é preciso investir nela para ter um retorno melhor.

Ou seja, um prejuízo bilionário do qual agora ninguém quer ser o pai (ou a mãe). Dilma, confrontada com sua aprovação ao negócio em 2006, usou a tática já empregada por seu mestre, Lula, a do “eu não sabia”. Em nota, Dilma alegou que baseou sua decisão em um resumo executivo “técnica e juridicamente falho”, elaborado pelo diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró (que acabou de embarcar para uma viagem de férias no exterior), e que teria omitido tanto a cláusula “put option”, a que obrigava a compra da totalidade das ações em caso de desavença entre os sócios, quanto a cláusula “marlin”, que garantia à Astra um lucro de 6,9% ao ano independentemente do desempenho da refinaria. Segundo Dilma, só em 2008 o Conselho de Administração soube das cláusulas – se elas fossem conhecidas já em 2006, a Petrobras nunca teria fechado o negócio, argumenta a presidente.

Os executivos da Petrobras contra-atacaram: dois deles deixaram claro à Folha de S.Paulo que todos os membros do Conselho de Administração tinham acesso total e irrestrito à documentação completa sobre Pasadena. Ou seja, se eles não sabiam de tudo, tinham como saber. A afirmação coloca Dilma e os demais conselheiros em uma grande saia-justa. O empresário Jorge Gerdau, que também fazia parte do conselho, deu entrevista confirmando a versão de Dilma; o ex-presidente da Petrobras Gabrielli disse ao Jornal Nacional, na quinta-feira, que cláusulas “put option” são comuns em contratos como o de Pasadena.

Na menos pior das hipóteses, estamos diante de um caso de negligência que teve um custo bilionário para a Petrobras: um relatório mal-feito, que omitia fatos importantes, e conselheiros com o desconfiômetro desligado, que deram seu aval a uma transação sem se interessar por seus detalhes. No pior cenário – o de que Dilma e os conselheiros sabiam de tudo e mesmo assim aprovaram a compra –, somar-se-ia à irresponsabilidade pura do Conselho o fato de Dilma ter mentido ao dizer, em nota, que não sabia de nada (se quiser seguir Lula à risca, as próximas etapas de Dilma seriam afirmar que foi traída e, por fim, que a refinaria não existe). A negociação merece todas as investigações que estão sendo realizadas – Polícia Federal, Ministério Público e Tribunal de Contas da União estão no caso. Que tudo seja posto em pratos limpos, mostrando como o aparelhamento político da Petrobras está aos poucos destruindo a maior empresa do país.


Saneamento básico é patinho feio da infraestrutura - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 23/03

Ao atual ritmo de investimentos, a meta de universalização dos serviços de distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto somente será atingida em 2050



O Brasil está muito próximo de universalizar um serviço essencial: a energia elétrica. Programas bem estruturados, e que tiveram sequência nos governos Fernando Henrique, Lula e Dilma mobilizaram recursos públicos e privados para que se conseguisse levar a rede elétrica a residências isoladas no meio rural e em todas as áreas urbanas. As moradias ainda não atendidas aguardam apenas a conclusão de obras ou a adoção de soluções, já definidas, para receber a tão sonhada eletricidade.

O desafio da universalização já havia sido vencido na telefonia e pouco a pouco vem se estendendo a outros serviços de telecomunicações, como o que permite a transmissão de voz, dados e imagens pela internet.

O programa Minha Casa, Minha Vida tem contribuído para redução do déficit habitacional brasileiro.

Mas, infelizmente, não se pode comemorar o mesmo em um serviço essencial para as pessoas: o saneamento básico. Ainda que, com apoio de parcerias público-privadas, concessões ao setor privado e melhora na gestão de companhias estaduais, o segmento tenha saído do marasmo em que se encontrava, o avanço relativo dos serviços básicos de saneamento de 2004 a 2012 deixa o país na 112ª posição em uma lista de 200 nações, segundo o Instituto Trata Brasil, organização que se dedica a acompanhar a evolução do tratamento de esgotos.

Na energia elétrica e nas telecomunicações, as soluções puderam ser implementadas com mais rapidez devido a facilidades técnicas. O saneamento básico depende de obras civis mais demoradas e de envolvimento direto das prefeituras. A construção de redes de saneamento básico tem sido um dos mais importantes condicionantes para a liberação de licenças ambientais em construção de hidrelétricas, por exemplo. Redes coletoras são assentadas, assim como estações de tratamento, mas as ligações domiciliares, geralmente a cargo dos poderes municipais, não ocorrem e dão margem a atritos e disputas judiciais.

Autorizações para projetos mais populares do programa Minha Casa, Minha Vida também estão condicionadas à existência prévia de rede de coleta de esgoto, e isso cria um jogo de empurra entre prefeituras e companhias estaduais concessionárias do serviço.

Devido a impasses como esses é que o Instituto Trata Brasil prevê que, ao ritmo atual dos investimentos, a universalização dos serviços de saneamento básico só ocorrerá em 2050, dentro de 36 anos, em vez de ser atingida em 2030, como estabelecido em um plano nacional governamental. É um nó que precisa ser desatado, porque saneamento básico significa qualidade de vida, com melhora substancial do estado de saúde da população atendida por esses serviços, e não pode continuar sendo o patinho feio da infraestrutura.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“A ação de criminosos... envergonha a nossa sociedade”
Dilma Rousseff sobre o clima de insegurança dos cidadãos do País que ela preside


GENERAL TEME CASSAR CONDECORAÇÃO DE MENSALEIROS

Já não se fazem chefes militares resolutos, como antigamente. O comandante do Exército, general Enzo Peri, ainda se finge de morto para não ter que cumprir o que determina o decreto 4.207/02: cassar a Medalha do Pacificador, conferida aos mensaleiros José Genoino, João Paulo Cunha (PT) e Valdemar Costa Neto (PR), todos cumprindo pena de prisão por corrupção, em sentença transitada em julgado.

BATALHA SANGRENTA

O general Enzo teme a mais apavorante batalha: encarar Dilma, caso cumpra o decreto, cassando a condecoração dos meliantes petistas.

TÁ LOUCO? EU, NÃO!

Segundo fontes militares, o general Enzo Peri não conseguiu que seu chefe, ministro Celso Amorim (Defesa), levasse o assunto à presidente Dilma.

VERGONHA

Mantendo a honraria aos meliantes, o general os nivela, por exemplo, a Sérgio Vieira de Melo, falecido herói brasileiro na luta pela Paz mundial.

ME ERRE

Indagado com insistência, através da assessoria, o general Enzo Peri não informa se cumprirá o decreto, cassando a medalha dos mensaleiros.

CERVERÓ ASSESSOROU PETISTA EM ‘NOVOS NEGÓCIOS’

O operador da compra superfaturada da refinaria de Pasadena, Nestor Cerveró, indicado pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS) para a Petrobras, assessorou o “desenvolvimento de novos negócios” quando a estatal era chefiada por José Eduardo Dutra, ex-presidente do PT. Ele se envolveu em temas internacionais e na negociação de acordos e contratos, quando nasceu o “negócio da China”: a compra da refinaria.

NÓS, OS OTÁRIOS

A belga Astra Oil comprou a refinaria por US$ 42,5 milhões, em 2005, e vendeu 50% dela à Petrobras, em 2006, por US$ 360 milhões.

CHAME O LADRÃO

A negociata seria ainda mais danosa: uma cláusula marota obrigaria a Petrobras a comprar da Astra Oil os outros 50%. Por US$ 860 milhões.

UNIDOS NA CAUSA

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) virou fã do ministro Marco Aurélio Mello, presidente do TSE: “Ele é feminista de carteirinha”.

100% PMDB

Apesar do interesse tucano, o PMDB pode ter “chapa pura” em Minas: Clésio Andrade governador e Leonardo Quintão vice. O ex-ministro Antonio Andrade, que retoma a presidência do partido, corre por fora.

O HOMEM QUE CALCULAVA

Antes de ser preso por lavagem de dinheiro, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa pretendia construir com dólares e reais quatro minirrefinarias de sua empresa REF, num investimento de R$ 1 bilhão.

OS ALVOS

O “blocão”, que agora se restringe a PMDB, PSC, PTB e PR, além da oposição, marcou almoço, na terça-feira (25), na residência de Paulo Pereira (SDD). Na pauta, Marco Civil da Internet e denúncias contra a Petrobras.

SEM PAPAS

A língua afiada do líder do PR, Bernardo Santana (MG), ganha fama. Em reunião no Ministério dos Transportes, o deputado Fernando Giacobo (PR-PR) pediu uma cadeira mais baixa para Santana tocar os pés no chão. “O que alcança o chão é sua língua”, provocou.

PÉRIPLO

Na tentativa de fazer frente à pressão do governador Ricardo Coutinho (PSB) sobre prefeitos, o PSDB tem realizado maratona de reuniões em municípios da Paraíba para reforçar candidatura própria ao governo.

INCONFIÁVEL

O PMDB-RN ainda teme fechar acordo com a ex-governadora Wilma de Faria (PSB) para disputar o Senado, com Henrique Alves para governador. Segundo peemedebistas, ela já o traiu três vezes.


PODER SEM PUDOR

ALUGUEL DE CAPITAL

O falecido vice-presidente José Alencar contou certa vez que ainda era jovem quando pediu empréstimo ao irmão para abrir o próprio negócio, pagando-lhe juros de 1,5% ao mês. Um amigo, na época, ficou escandalizado:

- É crime! A Lei de Usura do Getúlio Vargas, de 1933, limita os juros a 1%!

Alencar tentou renegociar, mas o irmão desqualificou a “usura”:

- Não são juros, é o aluguel que você paga pelo uso do meu dinheiro…