sábado, junho 07, 2014

O túnel - ANDRÉ GUSTAVO STUMPF

CORREIO BRAZILIENSE - 07/06

É muita coisa ao mesmo tempo. Políticos presos, diretor da Petrobras atrás das grades, renúncia do ministro Joaquim Barbosa, Copa do Mundo, inflação, queda da atividade industrial e eleição. A mistura de tantos ingredientes está produzindo tremores de intensidade variável na sociedade nacional. Ninguém está distante ou infenso ao que ocorre no Brasil de agora. A presidente Dilma, que teve a reeleição garantida, agora faz com que seus marqueteiros corram atrás do enorme prejuízo.

A Copa do Mundo coloca os nervos à flor da pele. O pessoal fica tenso dentro e fora do gramado. Os brasileiros são ciclotímicos. Ou o time é uma maravilha, ou tudo está perdido. Os comentaristas de futebol faziam acrobacias verbais, escorregando nas concordâncias, para alcançar platitudes histriônicas e nacionalistas.

Mas é a Copa do Brasil. O mundo inteiro está com os olhos voltados para este canto de mundo, do qual muitos ouvem falar, mas ninguém sabe direito como funciona. E se funciona. É o momento ideal para fazer greves, protestar, colocar a cara na televisão e defender qualquer ideia, por mais esdrúxula que seja. Os aeroviários no Peru anunciaram a decisão de parar poucos dias antes do início dos jogos. A perspectiva de greve na aviação se alastrou por toda a América do Sul. A Copa, portanto, é sul-americana.

A Copa vai passar. Terminará em julho. O problema maior é a economia. Os índices de atividade industrial estão caindo. A inflação está subindo. O comércio exterior está murchando. Os antigos e maravilhosos superavits estão se tornando minguados. Isso não muda no curto prazo. Tanto assim é que o estado-maior da campanha da presidente Dilma já acendeu todos os sinais de alarme e partiu para o contra-ataque. Ela e o ex-presidente Lula vão aparecer em público, juntos, nos próximos encontros com potenciais eleitores.

Os políticos caminham segundo o calendário do futebol. Durante os intensos dias de Copa do Mundo, o Congresso não vai funcionar, na prática. Esforço concentrado aqui, outro acolá, mas, na realidade, Suas Excelências vão aproveitar os dias de festas juninas misturadas ao futebol para buscar votos no eleitorado. Quando os jogos terminarem, as convenções partidárias já terão escolhido os candidatos e restarão apenas a campanha e as mazelas nacionais. É impossível esconder com tapumes os números da economia.

Os aeroportos, que estão longe de serem concluídos, vão esconder seus problemas com placas de sinalização ou coisa parecida. É solução de engenheiro. Mas, na política, dois mais dois nem sempre é igual a quatro. Do governo será cobrada a promessa de eficiência, boa gestão e compromisso com o crescimento econômico. Nada disso foi conseguido nos últimos quatro anos. Ao contrário, a administração, medida pelo crescimento do PIB, só fica na frente dos governos de Floriano Peixoto e Collor de Mello. Mas a oposição terá a responsabilidade de se apresentar como alternativa real de poder.

A Copa do Mundo começa na próxima quinta-feira. Depois dessa data, o debate político estará temporariamente suspenso. Gols do time de Felipão serão muito mais importantes que eventuais declarações de candidatos. Após esse período, tudo deverá se modificar. Se o Brasil vencer, o mau humor atual tende a arrefecer. Se não, é possível que a atmosfera fique ainda mais carregada. Política e futebol não se misturam. São elementos diferentes. Mas a proximidade de um evento como a Copa do Mundo e a eleição presidencial será um teste formidável de sabedoria e compreensão para todos os brasileiros.

As agências de risco e outras instituições econômicas andaram brincando com seus computadores e chegaram à conclusão de que o Brasil tem mais chances de ser campeão. Em segundo lugar, aparece a Alemanha. Essas entidades são perigosas. Costumam errar muito. O futebol é aleatório e, exatamente por isso, desperta paixões e provoca grandes euforias e maiores depressões.

A sensação, nestes dias que antecedem o início da Copa, é que o país vai entrar em um túnel escuro, tanto no futebol quanto na política. Ninguém sabe o que o espera no outro lado. A campanha oficialmente começa em julho, mas, na prática, aqui, ali e na internet ela já se manifesta. As paixões do futebol não terminam de um dia para o outro. Elas prolongam. Esse sentimento pode chegar até outubro. A verdade é que, neste momento, ninguém, nem videntes nem as instituições econômicas, é capaz de predizer o que espera o Brasil após o término da Copa do Mundo.

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