segunda-feira, outubro 01, 2012

Prejuizaço - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 01/10

Ao vender sua participação na CSA, o grupo ThyssenKrupp deverá amargar um prejuízo aqui nos trópicos que pode chegar a 3 bilhões de euros, segundo gente que acompanha a transação.
É que o grupo alemão enterrou na usina carioca uns 5 bilhões de euros e dificilmente conseguirá mais de 2 bi de euros por suas ações. Se isso ocorrer, o prejuízo alemão vai superar o da estatal francesa EDF. Ela comprou a Light, em 1996, e passou o negócio adiante depois de perder aqui uns US$ 4 bilhões.

Calma, gente
No governo federal se cunhou a expressão TPD (Tensão-Pré-Dilma), que ataca auxiliares convocados para reuniões com a presidente.

A vez de um tucano

O STJ se prepara para julgar em brevíssimo tempo processo sobre as relações do governador de Goiás, Marconi Perillo, com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. A abertura do processo foi feita a pedido do próprio tucano.

Trabalho em dobro
Gilson Dipp, ministro do STJ e presidente da Comissão da Verdade, que completa hoje 68 anos, tem sido o principal elo entre Dilma e o Poder Judiciário.
O trabalho desse gaúcho pode aumentar com a posse do "pavio curto" Joaquim Barbosa na presidência do STF.

Na banheira com JK
O escritor mineiro Autran Dourado, falecido ontem, era um dos mais próximos amigos de JK, de quem foi secretário de Imprensa.
Ele conta no livro "Gaiola aberta" (Rocco) que, não raro, despachava com o presidente tomando banho:
— Me incomodava sobretudo ele ficar se ensaboando na banheira.

NOSSA MARILYN MONROE

Veja que coisa mais linda, mais cheia de graça, Deborah Secco, 32 anos, brilhando aqui como Marilyn Monroe para o aniversário de 12 anos da “Quem’, que será comemorado com edição especial da revista, nas bancas quarta-feira. Ela e mais seis famosas posaram para o ensaio “Toda mulher tem um lado Marilyn Monroe”, no Copacabana Palace, no Rio, para o fotógrafo Reynaldo Gama Jr. É como se diz em Frei Paulo: que Deus ilumine tanta beleza e a nós não desampare. 

Shows unidos
Empresas do setor de eventos e grandes shows, como Geo, XYZ e IMX/Rock in Rio, um negócio que não para de crescer no país, vêm conversando sobre a formação de uma associação.
Entre as pautas de interesse comum está a meia-entrada.

Segue...
Em um festival de música, por exemplo, até 90% dos fãs se dizem estudantes.
Nem na Coreia se estuda tanto.

Nossa língua

O MinC liberou que o Instituto Telemar (Oi Futuro) arrecade R$ 1.567.402 em incentivos fiscais destinados ao Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa.
Inclui as categorias poesia, crônica, romance e conto, além de livro do ano.

Viva Gullar

O historiador Ivan Alves Filho vai dar a aula inaugural no Departamento de Letras da Universidade de Bolonha no dia 15 de outubro.
O tema será Ferreira Gullar, nosso grande poeta.


Rosto polêmico
Wilson Lázaro, curador da exposição de Bispo do Rosário na Bienal de São Paulo, nega as acusações do crítico Frederico Morais e de Flávia Corpas de que estaria modificando o trabalho do artista, a ponto de colocar na obra este rosto de criança, acima:
— Nada foi alterado. Temos documentação mostrando isto. O rosto apenas tinha saído do quadro com o passar do tempo. O que fizemos foi repor.
Há controvérsia.

Agora é oficial
Será no Rio, ano que vem, a Clinton Iniciativa Global, a megarreunião de empresários, políticos e celebridades por ideias para um mundo melhor.
Há sete anos, Bill Clinton realiza este encontro quase sempre em Nova York, com a presença de brasileiros como Nizan Guanaes.

Jogo sujo

Ao parar o carro, quinta à noite, num sinal da Praia do Flamengo, sentido Botafogo, no Rio, um advogado teve o vidro atingido por algo volumoso.
Era... cocô de gente. A "bomba" foi lançada de um apartamento.

Rio Irajá
Em outubro começa a obra da Unidade de Tratamento de Rio (UTR), no Rio Irajá. O secretário Carlos Minc estima que isso retire 12% de toda a poluição da Baía de Guanabara. A Petrobras entrou com R$ 40 milhões.

Carne trêmula - MELCHIADES FILHO

FOLHA DE SP - 01/10


BRASÍLIA - "Vem rápido, pai, que vai aparecer a barriga do Ronaldo!" A TV mostrava a estreia da série sobre a batalha do ex-jogador de futebol contra o excesso de peso.

Não sei bem o quê, mas algo isso deve significar. Quando eu era adolescente, atiçavam-nos com as Garotas do Fantástico. Antes, estico a memória, eram os musicais, os maiôs de paetês, as pernas. Ai, Sandra Bréa... Hoje nos dão a pança descomunal, o umbigo retesado, os 118 kg de luxúria e preguiça.

O mito Ronaldo não foi construído somente com gols e troféus, mas com uma sequência singular de episódios de superação. Joelhos estourados, cirurgias em série, maratonas de fisioterapia. Desfalques de agentes, casamentos tumultuados, passagem pela delegacia. Quando as parcas da crônica davam o atacante por liquidado, lá vinha ele zombar do destino e dos zagueiros.

É uma grande ideia colocá-lo para emagrecer em público durante três meses. Nada tão difícil quanto trocar hábitos ruins por saudáveis. Ronaldo nos provará que até isso é possível. Basta ter força de vontade.

Claro que interessa, também, afinar a imagem do garoto-propaganda da próxima Copa do Mundo -e turbinar as pretensões do candidato a assumir a direção do futebol brasileiro pós-2014. Não estranhe, ainda, se derem um jeito de monetizar até a taxa de triglicérides do ex-craque.

Mas algo não encaixa direito nesse "soft porn" da saúde -e não só a falta de sex appeal das imagens.
Na largada, o Fenômeno acordou cedo, comeu salada e se exercitou. Nada de cerveja nem de cigarro. Todo esse esforço, porém, veio temperado de tiradas sarcásticas, olhares de lado e sorrisos maliciosos, como a nos lembrar que, a cada esforço sobre-humano de redenção de Ronaldo, a vida lhe proporcionou novos tombos da carne.

A cintura vai diminuir, aposto. Mas duvido que deem cabo do Ursinho Ted dos boleiros e das periguetes.

Governo de homens e almas - VINICIUS MOTA

FOLHA DE SP - 01/10


SÃO PAULO - A maioria dos paulistanos rejeitaria, informa o Datafolha, candidatos a prefeito apoiados seja pela Igreja Católica, seja pela Igreja Universal. Trata-se de uma típica resposta de eleitorado evoluído, para o qual a religião tornou-se, e já faz tempo, um assunto privado.

Não foi sempre assim, obviamente. Desde que nasceram, as religiões apresentaram vocação holística. Para melhor governar as almas e a conduta do homem em relação ao divino, era providencial apoderar-se das estruturas de repressão e persuasão que hoje conhecemos como Estado.

Em plena democracia ateniense antiga, Sócrates foi condenado à morte, acusado de renegar o sistema de crenças vigente. Se a religião não era exatamente o poder, ela oferecia um acervo de respostas e de pessoas posicionadas para exercê-lo.

Na famosa sentença de Jesus - "Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus"-, lê-se também uma sábia tentativa de despistar os governantes romanos e judeus dessa inevitável vocação política dos movimentos religiosos da época. Da época ou de todos os tempos?

As religiões de hoje ativeram-se à esfera privada de moto próprio ou são mantidas nessa condição, a contragosto, pelo fato de a esfera política ter-se emancipado, na tradição ocidental, a partir do século 16?

Uma religião pode, em sua essência, abdicar da ambição hegemônica na sociedade sem arriscar-se a perder o seu caráter religioso? A trajetória do próprio Lutero, um dos pivôs daquele movimento civilizatório do Ocidente, é carregada de ambiguidades a esse respeito.

Deixamos a era da religião estatal, o que não ocorreu no islã. Mas não atingimos, e talvez nunca atingiremos, a era da religião radical do indivíduo, em sua relação direta e particular com o divino.
Talvez porque isso signifique, na prática, a morte da religião.

Ética Pública - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 01/10

Há poucos dias, lamentei, neste espaço, a aposentadoria compulsória do ministro Cezar Peluso, do STF, em momento crucial da Corte, atendendo à legislação que fixa a idade-limite de 70 anos no setor público brasileiro.
A ela soma-se agora outra baixa relevante para o país: o jurista, e também ex-ministro do STF, Sepúlveda Pertence renunciou à presidência da Comissão de Ética Pública da Presidência da República. E não por limite de idade.
Elegante como sempre, Pertence atribuiu sua saída à "radical mudança na composição da comissão", consumada com o afastamento de dois membros indicados por ele, substituídos por nomes agora avalizados pelo Planalto.
Pertence não disse, mas é fato, que os afastados emitiram pareceres desfavoráveis ao governo e, certamente por este motivo, não foram reconduzidos às suas posições.
A falta de uma explicação clara por parte da Presidência da República para este importante desfalque em um grupo de tão alto nível, autoriza a sociedade brasileira a buscá-la em atos e fatos que emanam do Palácio do Planalto.
Não há novidade no jeito petista de ver e tratar a questão da ética pública. Lembro que, em 2008, o então presidente dessa mesma comissão, Marcílio Marques Moreira, entregou o cargo três meses antes do fim do seu mandato. Ao renunciar, lamentou: "Não temos nenhuma força. Temos apenas a nossa consciência e a nossa autoridade moral". E mais não disse -e nem precisava.
Este episódio reforça a compreensão de que alguns pretensos avanços propagados pelo governo Dilma Rousseff não se concretizaram. A faxina ética é uma delas.
Não se conhece providência efetiva para as graves denúncias que derrubaram um número recorde de ministros. Os problemas continuam -obras e projetos inacabados, orçamentos multiplicados a esmo, benevolências de toda ordem para alguns grandes grupos econômicos, o veto, contraditório, feito à isenção dos impostos que incidem sobre a cesta básica, e agora a confirmação do pífio crescimento da economia representado pelo PIBinho de 1,5%.
As práticas políticas também são as mesmas. A deselegante troca da ministra da Cultura em razão da disputa eleitoral em São Paulo e a publicação de uma nota oficial da Presidência da República em resposta a críticas feitas ao PT por um adversário, o ex-presidente FHC, não deixam mais qualquer dúvida quanto à irremediável mistura entre o público e o partidário. É a prevalência das causas de um partido -o PT- sobre os interesses de Estado.
Como dizem os antigos, não há como tapar o sol com a peneira. A emblemática desistência de Sepúlveda é mais um alerta. Mais uma vez perde o Brasil e perdem os brasileiros.

Último tango na Argentina? - SIN-MING SHAW

Brasil Econômico - 01/10


Às vezes, temos a impressão de que a Argentina e as crises econômicas andam juntas desde a criação do país, como gêmeos siameses. De fato, a Argentina foi o único país desenvolvido que, entre a Segunda Guerra Mundial e os dias de hoje, conseguiu deixar esse grupo por questões de má administração.

Apesar de todos os fracassos, no entanto, as elites dominantes do país sempre mantiveram a altivez, considerando o país como igual às nações mais fortes do mundo e, portanto, nunca temerosas de enfrentá-las.

Em Buenos Aires, por exemplo, é procurar briga sugerir que o futebol argentino não é o melhor do mundo, embora tenha vencido a Copa do Mundo apenas duas vezes, atrás do Brasil (cinco), Itália (quatro), e Alemanha (três) - e igual ao pequeno vizinho, Uruguai. Embora muitos especialistas, jogadores e torcedores coloquem o brasileiro Pelé como o melhor jogador de todos os tempos, é prudente não contestar a insistência local de que tanto Maradona ou Lionel Messi, dois jogadores locais, são melhores.

Economistas do setor privado vêm sendo alertados que divulgar números diferentes dos oficiais poderia resultar em acusações criminais, por disseminação de rumores falsos. Qualquer um que vá a supermercados ou use táxis sabe o ritmo da escalada de preços.

Recentemente, em um táxi em - quem diria - Hong Kong, um jovem dançarino de tango de Buenos Aires ficou visivelmente agitado com seu anfitrião quando o futebol brasileiro foi colocado como estando à frente do argentino.

Tal bravura, ou atrevimento, permite à atual presidente do país, Cristina Fernández de Kirchner, insistir em dizer que a inflação na Argentina - atualmente saindo de controle, bem acima dos 20% - continua abaixo dos 10%. Em 2007, Fernández substituiu estatísticos profissionais do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos1 por indicados políticos quando a agência começou a divulgar índices que mostravam uma aceleração alarmante. Desde então, os números oficiais e a realidade seguiram caminhos separados2.

Além disso, economistas e acadêmicos do setor privado vêm sendo alertados que divulgar números diferentes poderia resultar em acusações criminais, por disseminação de rumores falsos. De fato, um acadêmico foi multado em US$ 125 mil3 por divulgar números da inflação substancialmente maiores do que os dados oficiais indicavam.

Naturalmente, quando se controla a agência oficial de estatísticas, você pode divulgar o índice de inflação que quiser; isso, no entanto, não altera o preço do pão. Qualquer um que compre comida em supermercados ou use táxis sabe que a verdadeira inflação anual nos últimos anos foi de 20% a 30%. O mercado chegou a seu próprio veredicto, refletido na diferença entra a taxa de câmbio oficial de 4,6 pesos argentinos por dólar e a do mercado paralelo, que recentemente chegou a 6,8 pesos, com alguns economistas já sussurrando que a marca de 8 pesos pode ser alcançada em um futuro não tão distante.

A Argentina não apenas se negou a pagar os US$ 100 bilhões em dívidas externas, com sua inadimplência há dez anos; também rejeitou as críticas sobre a expropriação em abril da petrolífera espanhola Repsol. A Argentina ofereceu-se a compensar a empresa pelo valor de mercado "justo", a ser determinado em data futura - presumivelmente quando o preço das ações, que caiu quase 60% de início e ainda continua 40% abaixo, saia do chão.

Mesmo enquanto as evidências de uma crise econômica continuam a se acumular - o sinal mais recente foi a limitação de compra nos supermercados a uma garrafa de óleo de cozinha por cliente, o governo não dá sinais de preocupação. As autoridades desafiaram o Fundo Monetário Internacional (FMI), ficaram inadimplentes em suas dívidas e orgulhosamente proclamam que a Argentina transcendeu a economia tradicional. O governo ainda "negocia" com o FMI sobre qual a melhor forma de reunir, mensurar e divulgar os dados inflacionários, como se isso não fosse realizado rotineiramente por estatísticos capacitados no resto do mundo.

A atitude orgulhosa da Argentina pode ter levado o país a tornar-se uma economia de segunda categoria, mas essa mesma atitude serviu-lhe bem em sua grande contribuição à cultura mundial: o tango, reconhecido pela Unesco4, como parte da "herança cultural intangível".

Ano após ano, na Competição Mundial de Tango, dançarinos argentinos dominam as principais colocações do Tango de Cenário, mais glamouroso e difícil do que a outra categoria, Tango de Salão. Neste ano, não foi diferente, as três principais duplas eram da Argentina.

Dançar tango bem não é apenas uma questão de habilidade técnica, que pode ser aprendida por qualquer pessoa. Os japoneses são mestres inigualáveis em tais habilidades e vêm competindo desde o início das competições internacionais de tango, em 2003. Em 2009, uma dupla japonesa, Hiroshi e Kyoko Yamao, fez história ao vencer o campeonato de Tango de Salão, em que a ligação amorosa entre os dançarinos é mais importante que a atitude arrogante. No Tango de Cenário, em que a atitude é fundamental, apenas uma japonesa, conseguiu chegar ao topo - e dançando com um parceiro argentino.

Juan Fabbri, dono do Tango Porteño e Esquina Carlos Gardel, dois dos clubes de tango mais importantes e caros em Buenos Aires, acredita que o que falta aos estrangeiros (inclusive a mim, aluno de tango há anos) é o fator "El Cachafaz". El Cachafaz é o apelido do lendário dançarino do início do século XX - José "Benito" Bianquet. Esse nome é uma gíria, traduzida como "lunfardo", e evoca "atrevimento, perigo, virilidade, travessura e audácia".

Mario Morales, grande coreógrafo de tango, que treinou vários campeões, explicou-me de forma ligeiramente diferente. "Para dançar o tango bem, você precisa "corazón" [coração, em espanhol] e paixão. Os estrangeiros são mais circunspectos. Nós argentinos talvez entremos primeiro com nosso coração e pensemos depois."

Essa percepção possivelmente seja a melhor explicação de por que a Argentina se sobressai no tango - e por que não consegue permanecer no primeiro mundo, do qual já fez parte. (Tradução de Sabino Ahumada).

Protecionismo "espúrio e fraudulento" - MARCELO DE PAIVA ABREU


O Estado de S. Paulo - 01/10


A presidente Dilma Rousseff abriu, de novo, os trabalhos da Assembleia-Geral da ONU. Não se pode dizer que seu discurso tenha sido um sucesso estrondoso. A oratória certamente não está entre as virtudes da presidente. Ainda assim, quanto à forma, houve avanço em relação ao ano passado. Foram evitadas metáforas canhestras e incompreensíveis para a maioria da plateia. Não houve reincidência no uso de pleonasmos. Nem menção à sua vida pessoal.

Quanto à substância, mais uma vez, a melhor parte foi a política. Houve manifestação de repúdio à ação militar que pretenda intervir na Síria em crise. Reiteração da incitação ao reconhecimento do Estado Palestino como membro pleno da ONU, pré-requisito para a manutenção de uma paz estável no Oriente Médio. E defesa do fim do bloqueio econômico a Cuba, "país irmão". Destoante, talvez, tenha sido a referência oblíqua ao compromisso do Mercosul e da Unasul para que sejam evitados "retrocessos" políticos, certamente com o episódio paraguaio em mente, sempre acompanhado de memória seletiva de inspiração bolivariana.

Já no terreno econômico, a substância do discurso foi bem mais objetável. A presidente insistiu na denúncia das políticas macroeconômicas das economias desenvolvidas: políticas fiscais ortodoxas e políticas monetárias frouxas. Infelizmente, as críticas à China, incluídas no discurso do ano passado para contrabalançar a censura aos EUA e à União Europeia, desapareceram. Como conciliar a denúncia das políticas das economias desenvolvidas como "ortodoxas" com as expansões de liquidez promovidas pelo Fed? Não se sabe bem o que embasa a insistência no argumento de que as consequências das expansões monetárias sobre as taxas cambiais seriam mais importantes que o impacto de tais medidas sobre o nível de atividade nos EUA e, direta ou indiretamente, sobre as exportações brasileiras. Ademais, a terceira fase do afrouxamento monetário promovido pelo Fed, em contraste com as etapas anteriores, está direcionada especificamente à compra de papéis garantidos por hipotecas.

No discurso do ano passado, a presidente mencionou, em meio a outra saraivada de reprimendas endereçadas a todos os azimutes, "novas formulações para um mundo novo", aparentemente referindo-se à política econômica adotada pelo governo brasileiro. Para que tais críticas não sejam mero exercício retórico, seria desejável que fossem acompanhadas de propostas concretas. De qualquer forma, não está o Brasil promovendo, "de forma artificial", a desvalorização do real? Não há inocentes na história das manipulações cambiais. O que varia é o tamanho dos países e, consequentemente, o impacto das suas políticas.

Na parte mais questionável do discurso, a presidente começou bem, referindo-se ao protecionismo como algo a ser combatido por "espúrio e fraudulento". Está absolutamente certa. Mas, infelizmente, seguiu em frente e justificou os aumentos tarifários promovidos pelo Brasil como medidas de "defesa comercial", destinadas a compensar as flutuações cambiais promovidas pelos grandes protagonistas na economia mundial. O que o Brasil fez não foi "defesa comercial". Defesa comercial tem que ver com medidas antidumping ou salvaguardas. Por aplicar tarifas bem menores do que as tarifas máximas registradas na Organização Mundial do Comércio (OMC), o Brasil pode aumentá-las até o máximo de 35% para produtos industriais. Os países desenvolvidos, de seu lado, aplicam as suas tarifas máximas registradas na OMC, bem abaixo dos 35%.

É verdade que, ao aumentar tarifas sobre certos produtos industriais, o País não violou seus compromissos na OMC. Mas a história não acaba aí. No âmbito do G-20 houve acordo, desde a reunião de Washington, em 2008, sobre o congelamento dos níveis de proteção, um standstill, no jargão diplomático. Além disso, o governo do Brasil vem criando regras tributárias que penalizam as importações com alíquotas mais altas de tributos indiretos internos, com base no seu conteúdo local. Não vai ser no grito - ou com discursos enfáticos, para ser mais diplomático - que o governo conseguirá desmentir a interpretação de que o aumento do protecionismo é parte integrante da sua estratégia econômica. E política, se for levada em devida conta a distribuição de favores setoriais.

Mesmo que a equipe econômica visse repentinamente a luz e deixasse de tentar repetir fórmulas do passado de difícil aplicação no mundo atual, o caminho não estaria livre. As propensões protecionistas em Brasília são inspiradas e potencializadas pelo exemplo argentino. As recentes elevações de tarifas foram geradas por iniciativas do vizinho, imerso no que parece ser mais um pântano de difícil superação. O Brasil teria, assim, as mãos atadas quanto à adoção de um regime comercial mais liberal, mesmo que quisesse fazê-lo. As recentes declarações presidenciais argentinas, tratando de driblar críticas à qualidade das estatísticas oficiais e à falta de liberdade de imprensa, parecem bisonhas, certamente ao público fora da Argentina. Nunca foram tão fortes os incentivos para que o Brasil reavalie custos e benefícios das relações com o vizinho.

As polêmicas da MP 579 - JOSÉ ANÍBAL

BRASIL ECONÔMICO - 01/10


 Muito se tem falado a respeito da Medida Provisória nº 579, que trata da renovação das concessões de energia elétrica e estabelece a redução do valor das tarifas. O pacote do setor elétrico, anunciado pelo governo federal no dia 11 de setembro, traz consigo uma série de polêmicas e incertezas. Não por acaso, foram feitos 431 pedidos de emenda constitucional para a comissão mista do Congresso analisar. Logicamente, ninguém é contra a redução do chamado Custo Brasil.
Diminuir o preço da energia é importante para toda a sociedade. As famílias adquirem maior poder de consumo e as indústrias e o comércio tornam-se mais competitivos. Todavia, alguns aspectos precisam ser esclarecidos. É importante destacar que todos os estados são afetados pela queda de receita com o ICMS. Como a base arrecadatória será menor, o ICMS recolhido também será reduzido. São Paulo, por exemplo, deverá perder cerca de R$ 1,3 bilhão anualmente com a redução média de 20,2% no preço da energia. Rio de Janeiro, R$ 500 milhões, Paraná, R$ 400 milhões, e assim por diante. É uma enorme contribuição dos estados e municípios para a redução da conta de energia. Chamou a atenção o fato de a decisão ter sido tomada unilateralmente pelo governo federal. Há pelo menos quatro anos se discute o que fazer com as concessões a vencer (algumas já vencidas) e agora a MP determina aos interessados que se posicionem até o dia 15 de outubro sem saber quais serão os critérios e condições para a renovação.
Deveriam, no mínimo, ter ocorrido audiências públicas para as partes envolvidas poderem expressar seus interesses e propostas. Afinal, o governo indicou no primeiro semestre que as mudanças na legislação seriam feitas por Projeto de Lei, mas acabou optando pela MP, do que resultam alguns atropelos. A metodologia a ser adotada para a indenização dos ativos e passivos não amortizados também gera muita dúvida. A incerteza é tanta que no dia subsequente ao anúncio da MP 579 as ações das empresas de geração, transmissão e distribuição tiveram uma queda próxima a 30%. No início da semana passada, o Fórum Nacional de Secretários de Estado para Assuntos de Energia se reuniu em São Paulo para avaliar a MP. É extensa a contribuição que o Fórum oferece ao debate. Elaboramos um documento para apresentar ao Congresso, ao Ministério de Minas e Energia e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Em seguida, uma delegação do Fórum esteve em Brasília para reuniões com o presidente do Senado, José Sarney, o relator da comissão mista, Renan Calheiros, e o presidente da Aneel, Nelson Hubner.
Os representantes do Parlamento se comprometeram a promover amplo debate na comissão e com o governo. É o que queremos. Esta é a oportunidade para avançarmos na definição de um planejamento estratégico e inovador para o setor, com o propósito de criar estabilidade e confiança quanto aos investimentos que garantam a segurança no fornecimento de energia associada a uma política para redução de tarifas.
É um grande desafio para o qual os estados estão aptos a contribuir dentro do princípio federativo do compartilhamento efetivo, e distante do fato consumado.

Justiça e cidadania - PAULO GUEDES

O GLOBO - 01/10

Apesar da péssima aparência, é ainda possível uma interpretação construtiva da complexa dinâmica da política brasileira. Os sucessivos escândalos e a desmoralização da classe política seriam fenômenos transitórios. Manifestações de uma transição inacabada do Antigo Regime para a Grande Sociedade Aberta. Dessa obra incompleta vem a necessidade de aperfeiçoamentos institucionais para a correção de práticas políticas degeneradas. O que traz, portanto, uma dimensão histórica ao julgamento do mensalão. Sob esse olhar, o impeachment de Collor há 20 anos teria sido o momento de afirmação do Congresso, com a demarcação da independência do Poder Legislativo. Da mesma forma, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estariam agora demarcando a independência do Poder Judiciário pela condenação da compra de apoio parlamentar por representantes do Executivo. Seria também concebível uma interpretação bastante cética sobre tudo isso. Collor teria caído porque era de "direita" e seu tesoureiro, PC Farias, não quis "mensalizar" o butim. Por arrogância e inexperiência, enfrentou simultaneamente 1) uma "esquerda" hegemônica que se julgava a única responsável pela redemocratização e 2) um establishment conservador e corrupto. A queda de Collor teria revelado o lubrificante da "governabilidade", essa busca disfuncional e despolitizada de sustentação parlamentar, sempre movida a corrupção, tráfico de influência e desvio de recursos públicos. O STF inicia nesta semana o julgamento do antigo núcleo político do partido do governo por corrupção ativa. Mas é importante transcendermos a excitação do momento e as ferozes disputas partidárias. "A virtude cívica é o fundamento do Estado. Sem ela, nenhuma sociedade poderia subsistir. Daí a concepção pedagógica das penalidades, não só como retribuição às faltas cometidas mas também para a intimidação preventiva de faltas futuras e o aperfeiçoamento das práticas políticas. Este era o espírito político do Estado constitucional e jurídico em Atenas em meados do século V a.C. Há uma dimensão educativa no direito e na legislação que contribui para a formação de cidadãos em uma democracia", registra Werner Jaeger, em "Paideia: a formação do homem grego" (1936).

Inversão de papéis - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 01/10


Em fevereiro de 2009, no aniversário do PT, Dilma Rousseff circulou pela primeira vez entre os militantes como a pré-candidata do partido à Presidência da República. O début foi necessário para fazer com que os petistas vissem na figura da então ministra da Casa Civil uma aposta viável. Naquele tempo, a “mãe do PAC” era considerada um tiro no escuro. Havia o receio de que a população olhasse para Dilma e não reconhecesse nela o projeto do presidente mais popular que o Brasil tinha visto nos últimos tempos.

A então ministra passou naquele primeiro teste. No ano seguinte, quando a então candidata precisou dos militantes petistas empunhando bandeiras e pedindo votos nas ruas, ela contou com todos. Agora, essa situação se inverteu. Com a presidente batendo recordes de popularidade, é o PT que precisa de Dilma para mostrar que está diferente, mais maduro e tomou um “banho de loja”, digamos assim.

Essa necessidade de apresentar um PT diferente está cristalina para quase todos dentro do partido da presidente da República. Os petistas acreditam que a receita econômica que ela apresenta hoje ao país e o seu jeito de governar, meio longe das artimanhas da política, são as chaves para os recordes de aprovação nas pesquisas. E são justamente esses os dois aspectos que diferenciam o governo de Dilma do de Lula. E é com a apresentação dessas diferenças que a cúpula do PT acredita ser possível contornar os fatores que prejudicam o desempenho nessa eleição municipal: o desgaste de material e o julgamento do mensalão.

Embora as pesquisas mostrem que o mensalão não tem tanta influência na hora de o eleitor escolher seu candidato, há dentro do PT quem acredite que os militantes ficaram amuados por causa do julgamento e das condenações em série. E nesta última semana de campanha, com os réus do PT em cena no Supremo Tribunal Federal (STF), é preciso animar esses militantes e tentar mostrar que o partido virou essa página. E a presença de Dilma no palanque hoje terá a tarefa de apresentar essa simbologia. A ideia é mostrar que o PT continua firme no que se refere às políticas sociais, mas está diferente no jeito de lidar com a política e com a economia.

Dentro do PT, há a sensação de que ao mudar a política econômica, trocar alguns ministros e não dar guarida ao grupo ligado ao ex-ministro da Casa Civil Jose Dirceu (ela afastou Sérgio Gabrielli da Petrobras), Dilma criou um escudo protetor à sua volta. Esse escudo faz com que ela atravesse esse momento com o frescor de quem acabou de sair do banho. Não é correto dizer que ela fez tudo o que fez já prevendo o julgamento do mensalão. Mas o fato é que as medidas adotadas na economia — inclua-se aí o plano de concessões de serviços públicos à iniciativa privada — e as mudanças na equipe funcionaram também para passar essa sensação de que “não temos nada a ver com aquele passado”.

Enquanto isso, no calor das ruas...

Não se sabe se essa sensação de diferença será percebida nesta última semana de campanha, ou ajudará a levar Fernando Haddad ao segundo turno em São Paulo, principal objetivo do PT esta semana. Ali, vale registrar, os poucos que disseram ao Datafolha não votarem no petista por causa do mensalão fazem falta neste momento. Daí, a necessidade de colocar Dilma no palanque e tentar buscar alguns desses eleitores que se afastaram.

Talvez a participação de Dilma tenha vindo tarde demais (Belo Horizonte o partido considera perdida para a gestão de Márcio Lacerda, do PSB, que é ligado a Aécio Neves, mas também aliado de Dilma e de Lula. A mesma sensação ocorre em Recife, onde o PT também não enxerga chances de vitória).

Mas é preciso levar em conta que a decisão de Dilma, de participar de forma mais efetiva apenas na última semana e em São Paulo, atendendo a um pedido de Lula, tem a ver com o fato de que a presidente considera imprescindível manter seu foco no governo e, afastada da campanha, segurar os aliados para o futuro. Ela tem dois anos inteiros antes de se apresentar novamente como candidata a presidente da República e não quer correr riscos de ver os aliados tomando outros rumos.

Nesse sentido, Dilma espera que o PT entenda sua posição neste primeiro turno da campanha. Ela sabe que, se o governo for mal e os aliados correrem léguas, talvez não sobre uma Dilma inteira, digo, com aprovação o suficiente para manter o PT no comando do governo federal por mais um mandato. Afinal, se o PT precisa de Dilma hoje para conquistar prefeituras, precisará mais ainda em 2014. E, desde os tempos antigos, quem vive de batalhas sabe que as cidadelas são importantes, mas acima delas está o reino inteiro, no caso, o Planalto.

O ímã do jornalismo - CARLOS ALBERTO DI FRANCO


O Estado de S. Paulo - 01/10


Gay Talese, um dos fundadores do New Joumalism (Novo Jor­nalismo) - uma maneira de des­crever a realidade com o cuida­do, o talento e a beleza literária de quem escreve um romance -, é um crítico do jornalismo sem alma e sem graça. Seu desa­pontamento com a qualidade de certa mídia pode parecer radical e ultrapassada. Mas não é. Na verdade, Talese é um ena­morado do jornalismo de quali­dade. E a boa informação, inde­pendentemente da plataforma de veiculação, reclama compe­tência, rigor e paixão.

Segundo Talese, a crise do jornalismo está intimamente relacionada com o declínio da reportagem clássica. "Acho que o jornalismo, e não o Times, está sendo ameaçado pela inter­net", pondera. "E o principal motivo é que a internet faz o trabalho de um jornalista pare­cer fácil. Quando você liga o laptop na sua cozinha, ou em qual­quer lugar, tem a sensação de que está conectado com o mun­do. Em Pequim, Barcelona ou Nova York... Todos estão olhan­do para uma tela de alguns cen­tímetros. Pensam que são jorna­listas, mas estão ali sentados, e não na rua. O mundo deles está dentro de uma sala, a cabeça está nurna pequena tela, e esse é o seu universo. Quando querem saber algo, perguntam ao Google. Estão comprometidos ape­nas com as perguntas que fa­zem. Não se chocam acidental­mente com nada que estimule a pensar ou a imaginar. Às vezes, em nossa profissão, você não precisa fazer perguntas. Basta ir às mas e olhar as pessoas. É aí que você descobre a vida como ela realmente é vivida."

A crítica de Gay Talese é um diagnóstico certeiro da crise do jornalismo. Os jornais perdem leitores em todo o mundo. Multiplicam-se as tentativas de in­: terpretação do fenômeno. Se­minários, encontros e relatórios, no exterior e aqui, procu­ram, incessantemente, bodes expiatórios. Televisão e internet são, de longe, os principais vilões apontados. Será?

É evidente que a juventude de hoje lê muito menos. No en­tanto, como explicar o estron­doso sucesso editorial do épico O Senhor dos Anéis e das aven­turas de Harry Potter? Os jo­vens não consomem jornais, mas não se privam da leitura de obras alentadas. O recado é muito claro: a juventude não se entusiasma com o produto que estamos oferecendo. O problema, portanto, está em nós, na nossa incapacidade de dialogar com o jovem real.

Mas não é somente a juventude que foge dos jornais. A cha­mada elite - as classes A e B - também tem aumentado a filei­ra dos desencantados. Será inviável conquistar toda essa gen­te para o mágico mundo do jor­nalismo? Creio que não. O que falta, estou certo, é ousadia e qualidade.

Os jornais, equivocadamente, pensam que são meios de co­municação de massa. E não são. Daí derivam erros fatais: a inú­til imitação da televisão, a inca­pacidade de dialogar com a ge­ração dos blogs e dos videogames e o alinhamento acrítico com os modismos politicamen­te corretos. Esqueceram-se de que os diários de sucesso são aqueles que sabem que o seu público, independentemente da faixa etária, é constituído por üma elite numerosa, mas cada vez mais órfa de produtos de qualidade.

Num momento de ênfase no didatismo e na prestação de ser­viços - estratégias úteis e necessárias -, defendo a urgente ne­cessidade de complicar as pau­tas. O leitor que precisamos conquistar não quer o que pode conseguir na TV ou na internet. Ele quer qualidade informati­va: o texto elegante, a matéria aprofundada, a análise que o ajude, efetivamente, a tomar de­cisões. Quer também mais ri­gor e menos alinhamento com unanimidades ideológicas.

A fórmula de Talese deman­da forte qualificação profissio­nal. "A minha concepção de jor­nalismo sempre foi a mesma. E descobrir as histórias que valem a pena ser contadas. O que é fora dos padrões e, portanto, desconhecido. E apresentar essa história de uma forma que nenhum blogueiro faz. A notí­cia tem de ser escrita como fic­ção, algo para ser lido com pra­zer. Jornalistas têm de escrever tão bem quanto romancistas." Eis um magnífico roteiro e um formidável desafio para a con­quista de novos leitores: garra, elegância, rigor, relevância.

O nosso problema, ao menos no Brasil, não é de falta de mercado, mas de capacidade de conquistar uma multidão de novos leitores. Ninguém resiste à ma­téria inteligente e criativa. Em minhas experiências de consul­toria, aqui e lá fora, tenho visto uma florada de novos leitores em terreno aparentemente árido e pedregoso.

O problema não está na con­corrência dos outros meios, em­bora ela exista e não deva ser subestimada, mas na nossa in­capacidade de surpreender e emocionar o leitor. Os jornais, prisioneiros das regras ditadas pelo marketing, estão pareci­dos, previsíveis e, consequente­mente, chatos.

A revalorização da reporta­gem e o revigoramento do jor­nalismo analítico devem estar entre as prioridades estratégi­cas. É preciso encantar o leitor com matérias que rompam com a monotonia do jornalis­mo declaratório. Menos Brasil oficial e mais vida. Menos aspas e mais apuração. Menos frivoli­dade emais consistência.

Além disso, os leitores estão cansados do baixo-astral da imprensa brasileira. A ótica jorna­lística é e deve ser fiscalizadora. Mas é preciso reservar espaço para a boa notícia. Ela também existe. E vende jornal. O leitor que aplaude a denúncia verda­deira é o mesmo que se irrita com o catastrofismo que domi­na muitas de nossas pautas.

Perdemos a capacidade de so­nhar e a coragem de investir em pautas criativas. É hora de pro­ceder às oportunas retificações de rumo. Há espaço, e muito, para o jornalismo de qualidade. Basta cuidar do conteúdo. E redescobrir uma verdade cons­tantemente negligenciada: o bom jornalismo é sempre um trabalho de garimpagem.

BANDIDOS EM "2D"


Barreiras a importados marcam novo regime - SERGIO LEO


Valor Econômico - 01/10


Os mexicanos, que, a partir de 1º de dezembro, serão governados pelo presidente eleito Henrique Peña Nieto, deixaram claro ao governo brasileiro: não perderam a esperança de ver ampliada a cota de automóveis made in Mexico importados pelo Brasil, já esgotada para pelo menos duas montadoras instaladas no país. Durante os preparativos para a visita de Peña Nieto ao Brasil, há duas semanas, as duas diplomacias chegaram a prever o possível anúncio da expansão, para mais US$ 360 milhões, da atual cota de importação fixada em US$ 1,45 bilhão entre março de 2012 e março de 2013. O anúncio foi vetado pela equipe econômica. Mas ficou em aberto a possibilidade de retornar ao tema, após a posse do novo presidente.

A cota vale para o período entre março de 2012 e março de 2017, e cresce a cada intervalo de 12 meses. Oficialmente, as autoridades brasileiras se negam até a comentar o assunto antes de dezembro, mas já houve quem informasse ao governo mexicano que há chance de aumento da cota para o México no fim do ano. Com essa expectativa, Peña Nieto nem sequer mencionou o assunto no encontro que teve com Dilma, embora tenha saído do gabinete presidencial discursando contra barreiras comerciais e em favor da expansão do comércio entre os dois países.

Em Brasília, pelo menos oficialmente, ninguém relaciona o caso mexicano com o novo regime automotivo, sancionado em setembro pela presidente Dilma Rousseff. Mas é óbvia a ligação entre os dois assuntos. Tanto o novo regime quanto a revisão do acordo mexicano têm o propósito de deter o crescimento das importações de carros, beneficiadas pelas medidas de estímulo ao consumo interno que, pelo receituário do governo Dilma, deveriam incentivar investimento e produção local para sustentar o crescimento econômico.

Novas regras para carros têm de sair entre hoje e amanhã

Há pouco mais de um ano, ao verificar que parte do incentivo à demanda interna estava se desviando para beneficiar fabricantes estrangeiros, o governo apelou a uma medida exótica, o aumento de 30 pontos percentuais no Imposto sobre produtos Industrializados (IPI) para automóveis que não seguissem exigências mínimas de conteúdo nacional, ou não estivessem, como os fabricados no México, abrigados por acordos de livre comércio.

O aumento foi aplicado a partir de dezembro, com acomodações para as empresas que tinham planos de fabricação no país, mas, no começo do ano, o crescimento visível das compras de carros mexicanos (64% em 2011, comparado a 2010) levou Dilma a determinar que se cancelasse o tratado com o México, conforme permitia o acordo. Em dezembro do ano passado, os carros importados, de todas as origens, haviam chegado a 28,5% de todos os automóveis vendidos no país, segundo a Abeiva, associação dos importadoras. Em agosto, de 2012, com as medidas do governo, esse índice baixou para pouco menos de 20% - e, se excluídas as importações que foram liberadas de pagar o adicional de 30 pontos no IPI, os importados com pagamento do tributo adicional somaram pouco menos de 3%.

Os mexicanos escaparam de pagar o imposto, porque preferiram negociar, e, após um pedido do presidente Felipe Calderón a Dilma, acertaram com o Brasil um sistema de cotas crescentes de importação, por três anos, a partir de março de 2012. Quem define quais empresas levam quais cotas é o governo mexicano, mas algumas montadoras, como a Hyundai, já passaram do limite. Para trazer novos carros, têm de pagar por eles o imposto de importação de 35% e o IPI de 10 pontos percentuais.

O governo mexicano, há duas semanas, convocou as empresas que não usaram integralmente as cotas, para redistribuí-las e acomodar as necessitadas. Uma elevação da cota, em cerca de um quarto, permitiria chegar com algum conforto a março, quando entra em vigor nova cota, de US$ 1,56 bilhões, para os 12 meses seguintes.

O temor de uma enxurrada de carros mexicanos deve ser aplacado com o lançamento, afinal, da regulamentação do novo regime automotivo, nesta semana (o governo tem de publicar até amanhã o decreto com as novas regras, para que tenha efeitos tributários a partir do começo de janeiro de 2013). As comercializadoras de carros poderão importar, sem tributação adicional, até 4,8 mil veículos cada, conforme a média de suas importações nos últimos três anos.

As novas regras do que o governo chamou de "Inovar-Auto" trazem novas exigências de conteúdo nacional e investimentos em inovação e engenharia. Mas, sobretudo, são criadas, na prática, com maiores impostos, limites de importação e barreiras de preço praticamente intransponíveis para montadoras estrangeiras sem fábricas no país, especialmente as asiáticas.

A partir de janeiro, o adicional de 30 pontos no IPI passa a valer para todas empresas comercializadoras de automóveis. O novo regime permite só às montadoras credenciadas descontar desse adicional de imposto a pagar uma proporção dos gastos com partes e peças fabricadas no Brasil ou em seus sócios do Mercosul. Quanto maior o conteúdo nacional, maior o abatimento no IPI, até a eliminação dos 30 pontos percentuais. Para aderir ao Inovar-Auto as empresas têm, ainda, de aplicar 0,5% de seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento no Brasil e a manter atividades de fabricação no país.

O sistema foi exaustivamente negociado com as montadoras (as importadoras de automóveis foram excluídas das discussões). Foram amenizadas exigências mais severas imaginadas pelos técnicos, como metas maiores de redução de consumo. Especialistas afirmam que será necessário um esforço das empresas para atender às exigências que restaram, em conteúdo local e investimentos em inovação, mas há dúvidas sobre a capacidade real do governo em fiscalizar o cumprimento da meta de conteúdo nacional. A reação dos fabricantes mostrará se acreditam que o bônus da proteção contra os concorrentes externos compensará o ônus de investir mais para melhorar o produto nacional. Tudo indica que sim.

Ilusão competitiva - PAULO DELGADO


O GLOBO - 01/10


O governo quer ampliar e modernizar a infraestrutura portuária do país e atrair investimentos de R$ 30 bilhões em cinco anos. Para isso, terá que superar as redes de legalidade informal - os clientelismos - que pressionam a autoridade e travam a boa regulação e competitividade do setor. Vai precisar de coragem e método para enfrentar assimetrias de realidade e informação, que encarecem a vida econômica nesses cartórios que são nossos portos. Saindo-se bem podemos ultrapassar a combinação de "confusão e ordem" legal que nos domina e tem levado ao colapso da infraestrutura do país e ao fracasso da construção e manutenção de bens de uso coletivo, mas que, no entanto, não impede a formação de oligopólios de sucesso e abusadas fortunas à sombra do Estado.

A determinação de destravar os portos e avançar no processo de parceria com o setor privado enfrenta duas armadilhas que ameaçam o impacto de uma decisão realmente boa para o crescimento do país. A primeira é imaginar que organizar leilões, baseados no princípio da concorrência por menor preço, num setor que opera em cadeias de comércio altamente internacionalizado, significa competição e garantia de qualidade e eficiência. A segunda é um arcaísmo: admitir, no programa de abertura dos portos, a doação ou outorga de terminais a uma parte do setor privado, constituindo os chamados portos mistos, para que opere, ou continue a operar, sem licitação. Nos dois casos, os clientes não precisarão se interessar pela sorte da nação. Os primeiros porque compensarão o que perderam manipulando o preço do frete que está fora de controle de qualquer agência estatal. Os segundos porque, ungidos com um bem público para uso privado, como não foram submetidos aos custos e obrigações de uma licitação - que exige investimentos, prazos e devolução das benfeitorias ao Estado - competirão desigualmente com os portos licitados, operando carga de contêineres como se fosse carga própria.

É certo e razoável, num país como o Brasil, com forte tradição exportadora de minérios e produtos agrícolas, que existam terminais de carga própria de empresas de granéis e outras commodities. Nesse caso, o porto adaptado para essa carga é parte indissociável do ciclo econômico do produto. Por isso, a regulação deve admitir que os pequenos exportadores associem-se em cooperativas para uso de terminais também próprios, evitando assim sua dependência da opressão sofrida nos terminais dos grandes exportadores.

O recente decreto que abriu os portos contribuiu para diminuir nossas debilidades, aumentando a produtividade total da economia brasileira. Agora, para ir além, é preciso interromper as doações e garantir eficiência e competição depois das concessões. Para desestimular a privatização predatória, as regras do regime jurídico devem ser pró-competição e contra a formação de oligopólios. Se o marco regulatório mirar no princípio do maior investimento e da redução dos custos portuários, será possível fugir do mito da ilusão competitiva dos leilões por menor preço. E ver procedimentos universais sepultarem arcaicas exceções.

Uma estranha e perigosa política - GUSTAVO LOYOLA


Valor Econômico - 01/10


Em diversas declarações nas duas últimas semanas, autoridades do Ministério da Fazenda desnudaram aspectos da atual política econômica que fazem soar alarmes sobre a manutenção da estabilidade monetária e do crescimento sustentado nos próximos anos. Em particular, o ministro Mantega deixou explícita a migração para um regime administrado de taxas de câmbio, assim como constrangeu o Banco Central (BC) com afirmações sobre a trajetória futura das taxas de juros. Na mesma toada, divulgou-se a retomada da maquiagem das contas públicas, por meio do resgate antecipado de títulos públicos em poder dos bancos federais para viabilizar pagamento de dividendos ao Tesouro e consequente geração de resultado primário.

Muito embora os riscos inflacionários no curto prazo sejam relativamente baixos por razões conjunturais, a combinação persistente de uma política de câmbio administrado com a ausência de autonomia do Banco Central na execução da política monetária pode conduzir, no médio prazo, a uma situação de risco para a estabilidade, notadamente se confirmada a tendência de redução do superávit primário (não maquiado) nos próximos anos. Se assim ocorrer, o potencial de crescimento da economia ficaria gravemente comprometido nos próximos anos.

O que se observa é a obsessiva desconstrução da receita de política macroeconômica que vinha até aqui dando bons resultados em termos de crescimento econômico e de controle inflacionário. Não se negava a necessidade de avançar em vários aspectos da política macroeconômica, como no caso das elevadas taxas reais de juros do Brasil quando comparadas com as vigentes no resto do mundo. Igualmente, a situação difícil da indústria brasileira em termos de competitividade merecia políticas governamentais específicas. Contudo, o desmonte gradual do "tripé" macroeconômico - regime de metas para a inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal - não pode ser caracterizado como avanço, ainda que possa agradar certos grupos de pressão próximos ao governo.

Desmonte gradual do tripé macroeconômico não pode ser um avanço, ainda que agrade certos grupos de pressão

Uma particular preocupação, agravada nas últimas semanas, se refere às políticas fiscal e creditícia do governo federal. Como se sabe, no ano passado, o governo obteve um bom resultado fiscal primário, acima dos 3% do PIB, revertendo trajetória de deterioração observada no final do governo Lula. Porém, neste ano e em 2013, a perspectiva é de redução do superávit, principalmente tendo em conta a queda no crescimento da arrecadação, pelo menor ritmo da atividade e pelas desonerações que vêm sendo promovidas pelo governo. Mais grave ainda é a volta da maquiagem das contas públicas, por meio do acionamento da "máquina de inchar superávit primário" que é o moto perpétuo da capitalização dos bancos públicos (notadamente o BNDES) via emissão de dívida pública e da simultânea distribuição de dividendos para o Tesouro.

Especificamente com relação aos bancos federais, e além das implicações fiscais, há o risco de que sua utilização excessiva para turbinar a demanda agregada pelo aumento do crédito possa gerar consequências negativas não apenas no balanço dessas instituições, mas também na estabilidade do sistema financeiro. Com efeito, há uma contradição fundamental entre a política prudencial do BC - adotada em linha com Basileia 3 - de aumento das necessidades de capital das instituições bancárias para evitar sua excessiva alavancagem, com o fornecimento ilimitado de capital pelo Tesouro aos bancos sob seu controle a custo próximo de zero. No longo prazo, essa competição desleal por capital entre os bancos públicos e privados gera incentivos perversos sob o prisma da estabilidade financeira, no que pode ser um verdadeiro tiro no pé em termos de crescimento sustentado.

Por outro lado, a mutação da política cambial em um regime de taxas administradas de facto trouxe implicações não triviais sobre a política monetária, principalmente porque está associada à "flexibilização" do regime de metas para inflação e à crescente interferência do ministério da Fazenda - pelo menos no plano verbal - na autonomia que o BC deve ter na condução da política monetária. O regime de metas para inflação pressupõe a existência de autonomia operacional do BC e a "ritualização" do processo decisório sobre a taxa de juros. Além disso, tal regime é incompatível com a fixação da taxa de câmbio, já que não pode o BC ter duplo mandato. Desse modo, a situação atual traz incertezas nos agentes econômicos sobre o grau de comprometimento do BC com a meta de 4,5%, o que se reflete, aliás, nas expectativas capturadas pela pesquisa Focus, que antecipam uma variação do IPCA acima de 5% em 2012 e também nos próximos dois anos.

Por enquanto, os prejuízos dessa "nova" política macroeconômica são pouco perceptíveis. Além disso, há certa opacidade nessas mudanças, em virtude do próprio ambiente excepcional vivido pelas economias desenvolvidas que, para alguns, perdoa quaisquer pecados cometidos abaixo da linha do Equador. Contudo, está semeada a dúvida sobre qual será a reação do governo, caso a inflação volte a se acelerar no futuro.

Golpes sortidos - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 01/10


RIO DE JANEIRO - Em agosto de 1961, o presidente Jânio Quadros, insatisfeito com os poderes que lhe assegurava a Constituição, mandou ao Congresso uma carta renunciando ao cargo -na convicção, dizem, de que seria imediatamente reconduzido nos braços do povo que o elegera um ano antes. Mas bastou a Jânio se levantar da cadeira para que o presidente da Câmara dos Deputados se sentasse nela, como previsto. O Congresso aceitou a carta e a renúncia. O povo limitou-se a assistir.

Enfim, se já era presidente, para que dar um golpe em si mesmo, na duvidosa expectativa de voltar como um superpresidente? Jânio viu coisas onde elas não existiam e, provavelmente, em dobro.

A 13 de março de 1964, uma sexta-feira, seu sucessor, o presidente João Goulart, fez um comício gigante diante da Central do Brasil, para defender as reformas -agrária, urbana, tributária- que tentava emplacar em seu governo. Queria demonstrar força. Quem não se impressionou foi seu antigo colega de governo, o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que perguntou: "Se já é presidente, para que fazer comício?".

Duas semanas depois, Jango, como o chamavam, foi deposto pelos militares. O comício não lhe serviu de nada, exceto para assustar seus inimigos -que enxergaram nele a preparação para um golpe e o pretexto de que precisavam para o seu próprio golpe.

Nos dois casos, as vítimas desses golpes reais ou imaginários foram presidentes da República, em pleno exercício do mandato e formalmente trajados para tal. Bem diferentes do ex-presidente Lula, que, segundo seus correligionários, está sendo objeto de uma tentativa de golpe, com o julgamento desse mensalão que tanto o estomaga. Mas como se depõe um ex-presidente?

Não se pode mandá-lo para casa, porque é lá que ele já costuma estar. Só se o obrigarem a vestir o pijama.

Debater é preciso, umbiguismo não é preciso - LÚCIA GUIMARÃES


O Estado de S.Paulo - 01/10



"O que a democracia requer é debate público, não informação."
Christopher Lasch


NOVA YORK - Vou desligar a secretária eletrônica, emudecer o celular e não atendo o interfone do porteiro noturno, que combate o tédio com a minha biblioteca. De 10 às 11 e meia da noite de quarta-feira, hora de Brasília, o primeiro e mais importante debate desta campanha presidencial vai monopolizar a nossa atenção. A cobertura da imprensa, alimentada pela máquina publicitária dos dois lados, trata a aproximação do encontro entre Barack Obama e Mitt Romney, em Denver, quarta-feira, num tom que lembra a véspera da luta entre Muhammad Ali e George Foreman, em 1975. Os argumentos dos candidatos estão sendo pesados, seus golpes previstos e o sparring verbal de cada um, na maratona de treinos, foi objeto de inúmeras reportagens.

No ensaio Jornalismo, Publicidade e a Arte Perdida do Argumento, publicado em 1990, o historiador Christopher Lasch afirmou que a preocupação do jornalismo americano com a pureza da objetividade era um desserviço à informação. Lasch morreu em 1994, ano em que Newt Gingrich liderou uma vitória eleitoral republicana e transformou a paisagem política com sua oratória moralista que teve grande sucesso em colar nos democratas adjetivos como "sujo" e "adúltero".

Lasch, autor do clássico A Cultura do Narcisismo, não defendia a polarização tragicômica que se vê hoje na mídia, nem o desprezo por fatos expressado por Karl Rove, ex-assessor de George W. Bush, que se referiu aos jornalistas como "a comunidade que se baseia na realidade".

Mas Lasch antecipou o declínio do debate público num contexto em que fatos viram munição ideológica. Numa tentativa de baixar as expectativas com seu desempenho, o mal-amado Romney disse que não há dúvida que Barack Obama é um homem muito eloquente. Tradução: ele pode mentir melhor.

O sedativo telejornal da rede pública americana ofereceu um momento de frisson no segmento habitual da sexta-feira, conhecido como Shields and Brooks. Um velho jornalista simpatizante democrata, Mark Shields, analisa a semana política com David Brooks, o colunista conservador do New York Times, mas o diálogo entre os dois não costuma exibir grandes rachaduras. Na sexta passada, a âncora perguntou a ambos como se explicava a nova vantagem de Barack Obama nas pesquisas. Shields, ofereceu sua teoria:

"Mitt Romney é o primeiro candidato dos últimos 35 anos que, onde quer que faça campanha, piora. Acho que este é o seu problema real. Quanto mais o público vê Romney, menos gosta dele".

A câmera cortou para a âncora perplexa e um derrotado David Brooks balbuciou seu acordo com o argumento.

Agora, caro leitor, vamos dar um pulinho a Staten Island, a menos querida das cinco regiões que formam Nova York. A revista Atlantic Monthly foi lá primeiro e relata o que chama de a revolução da escrita. Na escola New Dorp, que já foi típica da tragédia da educação pública para os menos favorecidos neste país, 80% dos alunos se formaram sem repetir o ano letivo, em junho passado. Como a escola chegou lá, sem que a composição demográfica dos alunos tenha mudado? Os mesmos 40% que vêm de famílias pobres - um terço hispânicos, 12% negros - são obrigados a escrever. O programa, que vai começar a ser imitado em outros Estados, poderia ser útil em escolas de jornalismo.

Um aluno de 8, 10, ou 15 anos na New Dorp, não escreve redações sobre o que sente, quer ser quando crescer ou o que fez nas férias. É obrigado a articular seus pensamentos em argumentos coerentes, compor pequenos ensaios que sejam persuasivos sobre as ideias que defende. E isto não se aplica apenas à aula de inglês. Os alunos saem de New Dorp tendo escrito sobre história e ciência. Enfim, prontos para debater e defender a democracia, como queria Christopher Lasch.

Quem sabe, se algum graduado de New Dorp se tornar jornalista, vai combater o narcisismo, a doença infantil do bloguismo. E vai poupar seus leitores da egomania de parte do jornalismo digital. Sua ideia de unir o universal ao particular não será blogar sobre um evento mundial inserindo comentários sobre o cachorro quente que comeu durante dito evento. A não ser, é claro, que o vendedor do cachorro quente seja um desempregado que atenda pelo nome de Mahmoud Ahmadinejad.

Até quarta-feira e prometo não blogar sobre o corgi adorável que vai assistir ao debate comigo.

China testa seus limites - EDITORIAL FOLHA DE SP


FOLHA DE SP - 01/10


Contra toda expectativa razoável, escala a tensão entre China e Japão na disputa pela soberania de um punhado de ilhotas rochosas e desabitadas a nordeste de Taiwan, no oceano Pacífico, hoje sob domínio japonês.

As duas maiores economias da Ásia já eram palco de manifestações nacionalistas agressivas em defesa das ilhas Senkaku (para japoneses) ou Diaoyu (para chineses). Nos últimos dias, barcos pesqueiros chineses e da Guarda Costeira japonesa se envolveram em escaramuças com canhões d"água.

Por maior que seja o potencial pesqueiro e petrolífero das ilhas, ele dificilmente compensaria a diminuição do comércio entre os países ou o fechamento de dezenas de fábricas japonesas na China (como já acontece).

A piora das relações se segue, ironicamente, à tentativa japonesa de controlar os atos locais de provocação à China. O governador populista de Tóquio, Shintaro Ishihara, lançara no início do ano uma campanha para comprar o arquipélago, até então alugado pelo governo central japonês de um proprietário privado. O Japão decidiu adquirir as ilhas, mas só logrou aumentar a ira de chineses.

A disputa pelo arquipélago preocupa outras nações porque pode abrir uma era de instabilidade no Pacífico. Por sete décadas, os EUA exerceram hegemonia incontestável naquele oceano. Nos últimos anos, a China tem procurado aumentar seu controle sobre os mares que a circundam, criando contenciosos com diversos países.

Sob o ponto de vista de filipinos ou vietnamitas, por exemplo, um avanço chinês sobre as ilhas pode estabelecer um perigoso precedente na região. A partir dele, a maior potência asiática poderia ver-se encorajada a novas demandas e tentativas de expansão regional.

As autoridades chinesas, por outro lado, instrumentalizam o tradicional nacionalismo a seu favor, em momento delicado de transição de poder no Partido Comunista.

O público interno parece ser o principal motor do comportamento da cúpula chinesa, até porque seria inibidor o risco econômico de um conflito real com o Japão, seu maior parceiro comercial entre as nações da Ásia. Resta esperar que a racionalidade econômica prevaleça sobre sua ambição de afirmação geopolítica.

As avós, essas gostosas - LUIZ FELIPE PONDÉ


FOLHA DE SP - 01/10


Já disse e repito: cem anos atrás se fazia sexo mais e melhor do que hoje. Talvez a culpa desta minha obsessão pela vida sexual antiga seja das minhas avós.
Minha avó materna casou grávida em mil novecentos e bolinha, trabalhou como uma dessas telefonistas sensuais no começo século 20, e falava de sacanagem até os cem anos de idade, e meu avô foi louco por ela até o fim da vida. A paterna foi a primeira (ou uma das primeiríssimas) sufragistas do Brasil, fazendo um recurso ao Poder Judiciário em 1928 pedindo direito ao voto.
Sendo assim, descendo de uma linhagem direta de avós que fundaram a emancipação feminina no Brasil, naquilo que importa: na cama e na urna.
Há 100 anos se fazia sexo mais e melhor do que hoje. Claro, esta é uma afirmação não científica, aviso aos especialistas em estatísticas comparativas da atividade sexual nos últimos 5.000 anos.
Mas como dizia o personagem do subsolo do "Memórias do Subsolo", de Dostoiévski, acreditar na ciência é uma forma de superstição. Não sofro da superstição de crer em demasia nas ciências humanas.
Mas voltando ao que eu queria dizer mesmo, tampouco sofro de outra superstição: não creio na revolução sexual. Melhor dizendo: creio sim na pílula anticoncepcional e no Viagra. O casal "cor de rosa e azul" que fez pelo mundo muito mais do que 200 anos de marxismo.
Aliás, às vezes, em dias depressivos, sou atormentado pela ideia de que o marxismo nunca vai acabar, e aí tomo outras pílulas essenciais, as que combatem este mal imortal da alma, a melancolia.
Sou um tipo basicamente superficial, acho que a psicofarmacologia é o caminho mais curto para resolver os dramas da alma. Mas, minto: nem por isso deixo de crer que uns 30 anos de análise fazem muito bem.
Antes da pílula, as meninas de classe social mais alta, digamos, as colegas da escola, tinham medo de ficar grávidas, por isso praticavam largamente apenas sexo oral e anal. Uma festa. As pobres sempre fizeram de tudo, mesmo porque, como se dizia, uma barriga de um rapaz rico pode garantir uma vida.
A "questão do sexo anal feminino" só nasceu depois da pílula, porque antes era comum como beber água. Agora, os especialistas discutem se sexo anal é saudável e satisfatório para as mulheres. Antes da pílula esta discussão soaria como se é saudável e satisfatório respirar.
O efeito da pílula criando a "ciência do sexo anal feminino", isto é, fazendo do sexo anal feminino uma "questão", é semelhante ao efeito dos cursos de espanhol no Brasil. Absurda comparação? Nem tanto, vejamos.
Antes desses cursos, ninguém achava espanhol uma "língua estrangeira", na universidade todo professor dava texto em espanhol e nenhum aluno gemia. Agora, depois do Yázigi inventar curso de espanhol, o espanhol virou "língua estrangeira". Depois que a pílula libertou o útero da mulher, sexo anal feminino virou uma "questão".
Para mim, a revolução sexual é isso: alguns fatos concretos que as ciências "duras" criaram, e um monte de blá-blá-blá que surgiu a partir daí.
As avós desfilavam o pudor como acessório de sensualidade, com sua cinta liga, sua combinação e lingerie cotidiana. Hoje, mulheres peladas da cabeça aos pés desfilam sua obviedade nua, gritando que são "livres" e não santas ou putas, esquecendo-se que as santas e as putas é que são as mais gostosas.
Mas a ignorância sobre sexo é típica dos especialistas "fundadores" da moderna ciência do sexo.
Bobagens como as ditas pela antropóloga Margaret Mead acerca da adolescência "sexualmente livre e saudável" da enorme e significativa população de Samoa levaram muita gente a crer que basta deixar a moçada transar muito desde os 11 anos que tudo ficará bem.
Outro exemplo é Alfred Kinsey e sua afirmação de que os constrangimentos impostos à vida sexual são a causa de todo sofrimento humano. Para ele, não deveria existir "fronteiras" para a atividade sexual humana.
Gente assim pensa que o único problema de fazer sexo com galinhas seja o fato de não ser consensual. Risadas?
Que nossas avós nos perdoem por sermos tão ridículos.

"ACHO QUE DÁ PARA MEXER SEM DESTRUIR O PRODUTO ” - SONIA RACY

O ESTADÃO - 01/10



Em tempos de redução de custos, Maria Claudia Amaro, da TAM, continua apostando em qualidade de serviços
Responsável por incluir a TAM entre as grandes empresas de aviação do mundo, o comandante Rolim Amaro é parte da história do setor. E ficaria muito feliz, se ainda estivesse por aqui, com a união da TAM com a LAN. Pudera, amigo da família Cueto, controladora da empresa chilena, foi ele que plantou a semente, lá atrás, para que a associação torna-se realidade. “Mas como relacionamento é coisa que você não herda, começamos esta união do começo”, ressalva Maria Claudia Amaro, única filha mulher de Rolim, hoje presidente do conselho da TAM e acionista de peso da Latam Airlines Group. A costura, durante quase dois anos, foi mantida em absoluto sigilo. Deu certo. A Latam funciona com um modelo de go-
verno corporativo que define compartilhamento conjunto das decisões estratégicas relacionadas com o alinhamento de atividades para todo o grupo. Mauricio Rolim Amaro é o presidente do board da Latam; Enrique Cueto, CEO da Latam; e Ignácio Cueto, CEO da Lan. “Digo que a empresa tem três filhos e uma mãe”, brinca. Em tempos em que o setor aéreo sofre prejuízos, Maria Claudia concedeu essa rara entrevista durante almoço no restaurante Rodeio contando um pouco da sua história que se mistura com a da empresa. Aqui vão trechos da conversa.

•Mesmo com o surgimento da Latam, você continua sendo presidente do Conselho da TAM S/A. Portanto, a única presidente mulher de companhia aérea no mundo. Faz diferença ser mulher nessa área? Acho que faz. Primeiro, você é uma das poucas mulheres na maioria dos eventos em que vai. Segundo, você precisa aprender a tentar não brigar com os homens no mesmo nível da disputa masculina e, sim, entrar no universo feminino na troca com eles. Em resumo, você não tenta ser um homem entre os homens. Não, sou uma mulher entre os homens.

•Quando você era criança, brincava de aviãozinho, por exemplo?
(risos) Não, eu brincava de boneca. Mas queria ser astronauta, nunca quis ser aeromoça, como muitas das minhas amigas. Meu pai queria, sim, que eu fosse comissária, mas eu nunca quis.

•Como foi sua introdução na área de aviação?
Foi aprendendo a andar de bicicleta no pátio de um hangar e trombando no farol de um avião. Quase apanhei do meu pai nesse dia, a minha sorte é que fui salva pelos mecânicos. Na verdade, essa é a minha primeira lembrança na TAM: comecei a querer tirar as rodinhas da bicicleta, ela ficou meio bamba e aí não tive coragem de fazer a curva, fui reto para o avião e acabou quebrando o farol. Eu não me lembro que avião era. Daí para frente a vida da gente foi sempre misturada muito com a vida da empresa.

•Conta mais um pouquinho disso. Onde você estudava?
No primeiro momento, sempre ali em volta mesmo. Nós morávamos perto do Aeroporto de Congonhas.

•Então você acordava com barulho de avião e também ia dormir com barulho de avião?
Esse som, para mim, é absolutamente normal, eu já nem me incomodo, passa e eu nem percebo.

•Longe disso você tem insônia? Não, porque não sofro de insônia. Mas, para mim, era absolutamente normal, nós morávamos bem perto, numa travessa da Pedro Bueno. Eu estudava em escolas da região do Campo Belo, sempre por ali. E me lembro que, quando tinha trabalho para fazer para a escola eu ainda sou da época da máquina de escrever elétrica, eu ia para os escritórios e ficava enchendo a paciência das secretárias para elas baterem o trabalho para mim. Eu achava aquilo o máximo, a máquina de escrever elétrica tinha tecla que apagava. De vez em quando, meu pai deixava a gente ir e, às vezes, ficava bravo, porque a gente estava lá atrapalhando as secretárias. Aí, tínhamos de correr dali e ir embora para casa.

•Quando você começou a trabalhar na empresa?
Vindo dos Estados Unidos, oficialmente em 1992. Neste ano completei 20 anos de TAM,ganhei minha medalhinha uma cerimônia que eu adoro. Dou para todos e, neste ano, a festa teve um gosto diferente, porque, além de entregar a medalha para os funcionários de 20 anos, eu recebi a minha das mãos da minha mãe.

•Onde você começou? No serviço de bordo. Antes de voltar para o Brasil, fiz estágio em catering para entender um pouco desse processo de serviço de bordo. Era onde meu pai achava necessário modificar. Estávamos recebendo os quatro primeiros Fokker 100 da frota.

•Que tamanho tinha a empresa? Em 1992, tínhamos quatro Fokker 100, a empresa era muito pequenininha. Nós não tínhamos sequer um milhão de passageiros por ano. Não havia nem departamento de marketing. Comecei fazendo o serviço de bor-
do, porque comida, ah, mulher sabe fazer, dá para as meninas fazerem... aí fomos fazer.

•Quando vocês decidiram que a TAM ia primar pelo serviço? Desde sempre. Isso vem desde a fundação, pela origem no táxi aéreo. O táxi aéreo faz com que o piloto tenha uma interação muito próxima com o passageiro, em função do tamanho da
cabine do avião. Meu pai, quando começou na TAM, lá atrás, em Marília, era um dos pilotos mais jovens. Como ele não era sênior, não tinha a prioridade na escolha. Descobriu, desde muito cedo, que o único jeito de ter a prioridade e a preferência nos voos era ter a preferência do cliente. Então, o que ele fez? Começou a ficar amigo dos clientes fora do voo. Quando o avião pousava, ele se oferecia para ajudar o cliente fora do avião, fazia mais do que precisava fazer. Através disso, foi descobrindo que o serviço a mais era o que fazia o cliente escolher aquele piloto para seus futuros voos. E isso foi fazendo com que ele percebesse que o futuro dependia do serviço que ele prestava aos clientes.

•As empresas no mundo todo estão cortando serviços e barganhando preço. E vocês, ainda estão apostando no serviço?
Acho que isso precisa ser uma crença. Quando isso não é uma crença, é o lugar mais fácil de cortar ao falar
em custos. Eu entendo

perfeitamente, porque companhia aérea é um negócio bastante complexo de se gerir, um negócio de margens muito baixas e custos muito altos. Então, quando você fala em custos, o lugar mais fácil de cortar é nos serviços, porque é o lugar que primeiro aparece. Corta comida, corta bebida, porque isso é o mais fácil. É muito mais complexo olhar processo, é muito mais difícil mexer. Eu acredito em serviço, essa é a minha crença pessoal. Acho que dá para mexer e não destruir o produto.

Você acredita que o consumidor reconhece esse esforço? Acho que sim. Acabamos de ter um exemplo disso. Reduzimos um tripulante nos voos do Airbus 319, negociamos com o sindicato e com as entidades de segurança de voo e tivemos de mexer no serviço de bordo. Mesmo assim, o serviço está sendo elogiado. Inovamos, e o cliente está gostando.

Costumo dizer que aviação é a indústria que reúne todos os percalços empresariais possíveis. Então, por que esse fascínio? Você se sentiu, algum dia, tentada a falar “estou fora”? Acho até que já pensei. Mas nem passa pela minha cabeça não trabalhar. Nasci com sangue de peão e vou trabalhar até o fim da minha vida.

•Vocês deram um passo gigante. Pensam, agora, em dar outro e se associar a mais alguém? Somos, hoje, a primeira empresa no mundo em termos de valor. E acabamos de montar uma associação que é um orgulho para a América do Sul, ainda mais nesse segmento. É cedo para falar nos próximos passos.

•Você acha que o Brasil está evoluindo na velocidade necessária em termos de infraestrutura para abrigar esse crescimento de transporte de passageiros, que é de 20% ao ano? O Brasil está evoluindo na questão da infraestrutura e vai resolver isso mais cedo ou mais tarde. Torço para que seja mais cedo.

•Qual a sua opinião sobre a modelagem de concessão dos aeroportos brasileiros?
Eu sempre disse que, não necessariamente, a privatização é a melhor solução. E continuo dizendo isso. O modelo americano, por exemplo, não é um modelo privatizado. Veja bem, eu não defendo que seja e não defendo que não seja alguma coisa. Defendo apenas que seja um modelo mais eficiente para o consumidor. E não falo aqui como empresária somente, falo tam-
bém como cidadã. Se você traz um modelo no qual o operador é uma companhia privada, ele vai visar o lucro. Se ele vai visar o lucro, vai onerar a operação. Se ele onerar a operação, eu tenho de repassar isso para o bilhete. Essa é uma
questão de lógica. A gente tem de buscar um modelo que seja justo para todos.

•Olhando para o longo prazo, o que você vê para a Latam, para a TAM e para o Brasil? Acho que o Brasil vai resolver o problema da sua infraestrutura de um jeito ou de outro. E acho que resolver a infraestrutura é fundamental para o consumidor, para o País, para as empresas aéreas e para o setor.

•Nessa união, vocês tiveram de escolher entre chilenos e brasileiros?
Não, não houve enxugamento. Nós estamos contratando funcionários.

•Quanto ganha um piloto chileno e quanto ganha um piloto brasileiro?
O custo no Brasil é muito maior do que o custo no Chile. Para você ter uma ideia, é de 40% a diferença do custo de vida no Chile em comparação com o custo no Brasil.

•O que vocês estão pensando em fazer? Porque tiveram um prejuízo gigante...
O segmento todo, o setor inteiro. Nós,hoje, estamos mudando a forma de gerir a TAM. De uma empresa que tinha um olhar único, estamos começando a olhar a TAM dividida por unidades de negócio. Uma unidade de negócio doméstica, uma unidade de negócio internacional, uma unidade de negócio focada na área operacional, que abrange tripulantes, técnicos operacionais, manutenção de aeronaves. Essas áreas são independentes e, com isso, nós passamos a ter alocações de custos e receitas de forma muito apropriada e muito diferente. Não estou dizendo que antes era errado, era apenas outra forma de olhar. Isso começou a fazer com que custos e receitas caíssem e fossem alocados de maneira diferente. É claro que, associada a isso, há uma retração, uma crise no mercado, um problema no crédito brasileiro. Não há dúvida de que o Brasil já não vai crescer a mesma coisa que cresceu no ano passado. Há uma guerrinha tarifária acontecendo neste momento e o mercado está super ofertado.

•E o que vocês vão fazer? O mercado do Brasil cresceu não por meio do aumento da demanda. Cresceu por meio do aumento da oferta. Então, você estimula a oferta, baixa o preço, vem a demanda. Isso é terrível, porque destrói valor em todas as companhias do setor. E esta não é a melhor forma de crescer. Claro que é ótimo ver novos passageiros entrando no avião, é legal demais ver isso. Então, agora, nós temos planos. Mas não vou revelar, olha a concorrência aí.

•O que acha que seu pai diria se estivesse hoje por aqui? Eu acho que ele estaria de acordo com a maneira como nós estamos trabalhando e também muito feliz. Mas o presidente do conselho da Latam seria ele. (risos)

Lei geral do federalismo fiscal - EVERARDO MACIEL


O ESTADÃO - 01/10


A provisoriedade é traço indelével de nossa cultura política. Faltam recursos para a saúde, imediatamente criamos uma contribuição provisória sobre a movimentação financeira.

Chegamos ao requinte de proclamar a República em caráter provisório. O Decreto n.º 1, de 15 de novembro de 1889, editado pelo marechal Deodoro da Fonseca, chefe do governo provisório, tinha a seguinte ementa: "Proclama provisoriamente e decreta como forma de governo da Nação Brasileira a República Federativa, e estabelece as normas gerais pelas quais se devem reger os Estados Federados".

A Constituição de 1988 já foi emendada 70 vezes, sem contar as 6 emendas de revisão. Essa prodigalidade modificativa, que robusteceu o teor exageradamente analítico do texto constitucional, certamente está por merecer um registro no Guinness World Records.

A vocação pela provisoriedade é que explica, também, a atual política fiscal, impressionantemente errática e casuística. Ainda que não tenhamos um projeto de nação, a política fiscal deve ter um mínimo de previsibilidade.

O federalismo fiscal brasileiro é outra vítima do improviso. O modelo construído pela reforma tributária de 1965 foi sendo seguidamente alterado, quase sempre para o pior, de modo que hoje é apenas uma justaposição de regras sem nenhuma lógica.

O Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE) e o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) têm uma orientação claramente redistributiva, a despeito da arbitrariedade dos vigentes critérios de rateio do FPE, fixados pela Lei Complementar n.º 62, de 1989, e declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal. Esses critérios, pretensamente provisórios, perduram há mais de duas décadas.

As demais transferências obedecem a critérios setoriais ou políticos: a cota-parte municipal do ICMS, ao sobrevalorizar o valor agregado na distribuição, acaba privilegiando os municípios com grande concentração industrial, em detrimento das cidades-dormitório que assumem o ônus de prestar serviços aos trabalhadores das indústrias do município vizinho; o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), também provisório, porque tem vigência limitada a 2020, é rateado em função do número de alunos matriculados; os royalties e participações especiais nas receitas decorrentes da exploração de petróleo e gás na plataforma continental são distribuídos com base em critérios claramente políticos, embora legais; as transferências à conta do Imposto Territorial Rural (ITR) e do IPVA têm sentido estritamente devolutivo em relação ao que foi arrecadado localmente.

Constata-se, assim, que inexiste coerência no sistema de transferências, resultando de ações pontuais em momentos distintos, em resposta a demandas isoladas.

Uma forma capaz de superar essas inconsistências seria, como sustentam os professores Sérgio Prado e Fernando Rezende, instituir um regime de equalização de receitas per capita para as transferências de caráter geral, como o FPE e o FPM.

Assim, esses fundos compensariam deficiências de receitas das entidades beneficiárias, inclusive as circunstanciais, gerando um modelo de solidariedade fiscal, a exemplo do que ocorre em federações mais sofisticadas, como a Alemanha, o Canadá e a Austrália.

Infelizmente, esse modelo não pode ser adotado de imediato, porque nossas estatísticas fiscais não oferecem a necessária segurança para operá-lo, sem falar que os conceitos de contabilidade pública perderam substância no contexto da destruição do processo orçamentário brasileiro, cuja reforma deve ser tida como prioridade absoluta.

Diante da impossibilidade de implantar-se, no curto prazo, um regime de equalização de receitas per capita, a opção que resta ao Congresso Nacional, no meu entender, é recorrer aos conhecidos critérios paramétricos (população e inverso do PIB per capita, por exemplo), como forma de, provisoriamente, superar o desafio de aprovar, até o final do ano, uma nova legislação para o FPE. A consequência de uma eventual mora legislativa seria a suspensão dessas transferências, o que seria fatal para as finanças da maioria dos Estados.

O remédio de curto prazo respaldaria também o encaminhamento de discussões sobre os repasses das receitas provenientes dos royalties e participações especiais na exploração de petróleo e gás, tendo em vista que todas as proposições legislativas adotam o FPE e o FPM como regras para as transferências, respectivamente, aos Estados e municípios, ressalvadas as participações das entidades produtoras ou confrontantes, previstas no § 1.º do artigo 20 da Constituição, que se sujeitam a critérios específicos.

Neste quadro, talvez seja a hora de cogitarmos de uma lei geral do federalismo fiscal brasileiro, com regras definitivas quanto à partilha de receitas públicas, à cooperação entre as entidades federativas, à harmonização fiscal, à prevenção dos litígios decorrentes da competição fiscal e à integração das administrações tributárias.

PORTA FECHADA - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 01/10


O poder de uma empresa de fiscalizar computadores e e-mails corporativos de seus funcionários, decorrente do direito de propriedade sobre os equipamentos, não é absoluto quando "colide com o direito à intimidade do empregado". E com outros como o da inviolabilidade de correspondência. A decisão é do TST (Tribunal Superior do Trabalho).

PORTA 2

A corte julgou processo em que funcionário da Mony Participações, da Bahia, pedia indenização de R$ 1,2 milhão. Ele acusou a companhia de arrombar seu armário para ter acesso a um notebook que era emprestado para seu uso pessoal. O funcionário viajava quando o empregador quis o equipamento de volta. A Mony negou, mas perdeu a causa. Terá que pagar R$ 60 mil.

ARQUIVO

De acordo com o TST, empresas "só podem fiscalizar computadores e e-mails corporativos se os empregados forem proibidos de forma expressa de utilizar tais equipamentos para uso pessoal".

CORAÇÃO

Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) têm notado desconforto da colega Rosa Weber na condenação de réus do mensalão. Com longa carreira na Justiça do Trabalho, ela jamais precisava mandar alguém cumprir pena de prisão.

CASO RARO

Na semana passada, Rosa raramente condenou réus por todos os crimes de que eram acusados. Uma das exceções foi o ex-deputado Roberto Jefferson, que respondia por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

UNIFORME DE HOMEM-ARANHA
O lutador de MMA (antigo vale-tudo) Anderson Silva veste roupa colada para ensaio da "RG" que chega hoje às bancas. Em entrevista à revista, ele se diz "patriota", ainda que não seja plenamente reconhecido no Brasil.

"Eu acho que a gente tem um grande problema no país, que é a desconstrução dos ídolos. Nos EUA, fazem questão que os atletas se tornem exemplos para as crianças, pros adultos, pros mais velhos, pras mulheres. E aqui no Brasil, não."

MALAFAINHAS

A Assembleia de Deus Vitória em Cristo, comandada pelo pastor Silas Malafaia no Rio, abriu processo de seleção para sua Escola de Líderes. São 650 vagas para pastores com cônjuges, 700 para os sem cônjuge e mil postos para "jovens com vocação ministerial". Os cursos acontecem em dezembro em Águas de Lindoia (SP).

BENTO LÁ

O conselho da Jornada Mundial da Juventude, que trará o papa Bento 16 ao Rio em 2013, já se prepara para um "boom" da fé. Está fazendo treinamentos para realizar entre 800 e mil catequeses em 400 paróquias.

2014 VEM AÍ

O PSDB vem fazendo pesquisas para medir o peso de dois cabos eleitorais em municípios do interior de SP: a presidente Dilma Rousseff e o governador Geraldo Alckmin. Elas projetam também como seria se a eleição presidencial fosse hoje e eles fossem candidatos. Dilma ganha na maioria das cidades.

MOLDURA

Adam Levine, líder do Maroon 5, comprou uma foto do fotógrafo brasileiro Christian Cravo depois de visitar a exposição dele na galeria Throckmorton Fine Art, em Nova York. A imagem em preto e branco, de um guepardo no Quênia, custou US$ 7.500 e vai enfeitar a casa do cantor em Los Angeles. A mostra fica em cartaz até novembro.

BENTA VIOLÊNCIA

Bento Ribeiro, do "Comédia MTV", está escrevendo um roteiro de longa-metragem. Mas o filme não será humorístico.

"É meio Tarantino, pop e violento", diz ele.

HEBE PARA SEMPRE

Hebe Camargo ganhou homenagem em almofada de sarja de seda com sua frase predileta inscrita: "Aqui, a tristeza dá pulos de alegria".

A designer Bya Barros, que criou a peça, mandou fazer mil delas para pôr à venda.

Curto-circuito

Livro sobre o artista Cabral, tem lançamento hoje na Livraria Cultura da av. Paulista, às 19h.

Sergio Miceli assina o livro "Vanguardas em Retrocesso", lançado hoje na Livraria da Vila do Pátio Higienópolis, às 18h30.

Hortencia de Fátima Marcari promove jantar para Orlando Silva. Amanhã à noite, nos Jardins.

Regininha Moraes comanda hoje comemoração do Dia Internacional do Idoso, no Moinho Eventos. Jair Rodrigues canta no encerramento do evento.

A Bobstore apresenta sua coleção de verão hoje, no shopping JK Iguatemi.

Vai até 24 de fevereiro a mostra com peças de Goeldi, recém-aberta na Pinacoteca de São Paulo.

AGORA É TEATRO

O diretor Esmir Filho estreou no teatro com a peça "Kollwitzstrasse 52", com Julia Feldens, Juliane Elting e Ismael Caneppele no elenco. O roteirista Bráulio Mantovani foi à estreia, no MIS, na quinta.

CEM ANOS DE CULTURA

A arquiteta Fernanda Marques e a atriz Karin Rodrigues foram ao Theatro Municipal para comemoração dos cem anos da Sociedade Cultura Artística, presidida por Cláudio Sonder. Pedro Herz, da Livraria Cultura, também esteve lá.