quinta-feira, abril 07, 2011

ALBERTO TAMER - Toma, que o dólar é teu


Toma, que o dólar é teu
ALBERTO TAMER
O Estado de S.Paulo - 07/04/11



A economia brasileira vai bem, as outras vão mal, o que é ruim. Atrai mais dólares, que valorizam o real, o que ajuda conter a inflação com importações baratas, mas prejudica as indústrias e as exportações. Até agora, US$ 35,2 bilhões, quase 45% a mais que em todo o ano passado.

O refrão é velho. Tem dinheiro demais. Não se encontra a solução adequada para equilibrar crescimento, inflação e contas externas. A novidade - são duas em uma - é que a agência de classificação de risco Fitch disse que o Brasil melhorou ainda mais. Falta apenas acertar o ajuste fiscal, o que, parece, já está fazendo.

Ao mesmo tempo, o FMI decidiu aceitar que os países-membros controlem o fluxo de capitais que valorizam excessivamente suas moedas. Mas só devem fazê-lo depois de esgotar todas as medidas internas.

A cartilha do FMI. Para não se aventurar em medidas heterodoxas, como controle de capitais, o Fundo anunciou uma "cartilha" com propostas a serem adotadas pelos países emergentes, como o Brasil, que estão sendo inundados por capitais externos e continuam aumentando as reservas cambiais. A cartilha é só para os emergentes, é lógico, não para os países ricos. Os países do G-7, que andam mal das pernas, tiveram que trazer os juros para perto de zero - negativos em termos reais - e ainda não se recuperaram da crise que eles mesmos provocaram. E, acreditem, o FMI nem menciona a China que não está nem aí para o que o FMI ou OMC dizem.

Sem paixões. Esse é um tema delicado do qual se deve aproximar sem paixões inspiradas por nacionalismo. O Fundo deixou claro que cada país deve agir de acordo com situações específicas. Ninguém está sendo obrigado a nada, o Fundo dá a entender, mesmo porque é apenas uma "cartilha".

Mas o que está acontecendo na economia mundial que levou a essa situação atípica de desequilíbrios financeiros em que alguns países emergentes tenham acumulado reservas e outros se endividaram? E como corrigir isso?

Martin Wolf, principal economista do Financial Times, e de longe, o melhor entre os analistas da imprensa mundial, em artigo de ontem, transcrito pelo Valor, cita vários estudos que chegam a uma conclusão interessante. O que está havendo, diz o presidente do Banco da Inglaterra, Mervyn King, é uma espécie de subida "morro acima". Há muito tempo o setor privado vem tentando enviar um grande fluxo líquido de captais dos mais lentos países ricos para os países emergentes, mais dinâmicos.

Numa forma mais ou menos caricatural, mas compreensiva, os países ricos trazem os juros reais para perto de zero e injetam liquidez nos seus mercados. Mas esses capitais, por causa do menor rendimento e risco maior, correm para os países emergentes, que acumulam reservas superiores a US$ 4 trilhões. Esses dólares que entram nos emergentes, são transformados em reservas e dívida interna, mas só até certo ponto. Depois, os governos pegam esses dólares e investem de novo no mercado financeiro, mesmo com prejuízos, numa espécie de "toma que o dinheiro é teu".

E então? O recado para o G-7 é tratem de fazer o que fizemos na crise financeira, estimulem os mercados internos, cuidem de seu sistema financeiro, encontrem um equilíbrio interno. Crescendo, vocês vão produzir mais, empregar mais, importar mais, exportar mais. Não é fácil, lembram Martin Wolf, Meryn King, do Banco da Inglaterra, e Alan Taylor, da Universidade da Califórnia, mas os países do G-7 precisam começar a agir em algum momento.

O que falta nos países ricos é decisão política do G-7. Talvez porque acreditam que os países emergentes poderão continuar crescendo ad infinitum, sustentando sozinhos, a recuperação mundial. Enquanto isso, pedem ao FMI que os enquadrem quando levantam barreiras e mandam o excesso de dólares de volta. Então que cada um, como o Brasil, vai agir como pode, se defendendo de assaltos de liquidez vindos de fora, usando a arma do câmbio e do controle de capitais indesejáveis. Não é a solução ideal, mas é o que se pode fazer enquanto eles, os ricos, não fazem nada. E não há nenhum FMI da vida que altere isso...

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