sexta-feira, fevereiro 11, 2011

CELSO MING

Difícil acreditar 
CELSO MING 

O Estado de S.Paulo - 11/02/2011

O governo parece ter sido apanhado de surpresa com a baixa credibilidade suscitada por seu pacote de cortes no Orçamento da União.

O fato é que, depois de tanta tergiversação e da manipulação das contas públicas como as que ocorreram no ano passado, não dá mesmo para acreditar, sem provas materiais adicionais, em tudo o que repetem os ministros da área econômica.

O que houve foi o anúncio de que viria uma redução de despesas correntes de R$ 50 bilhões (ou 2,7%) no Orçamento aprovado pelo Congresso. Mas os detentores do tesourão oficial ainda não foram capazes de dizer onde aconteceria e isso já é, por si só, fator de incerteza. Não é com afirmações de que será reduzido o ritmo de viagens internacionais e suspensos concursos para preenchimento de vagas no funcionalismo público que teremos compressão das despesas públicas em magnitude suficiente para evitar que "a inflação extrapole a meta" de 4,5% neste ano.

Convém observar que não é apenas a área da Fazenda que vem atuando com déficit de credibilidade. O próprio Banco Central (BC) já não consegue conduzir as expectativas como há um ano. Neste momento está a reboque da percepção que os agentes econômicos vêm tendo do comportamento da inflação. No passado, os dirigentes do BC sempre foram reticentes quanto à eficácia de medidas prudenciais no combate à inflação. De repente, no entanto, passaram a insistir em que se repare na força dos seus efeitos e querem que todos pautem sua cabeça com essas novidades. O fato é que o Banco Central demorou demais a admitir a virulência da inflação.

Em todo o caso, há na iniciativa de anunciar os cortes um reconhecimento importante do governo: o de que as excessivas despesas públicas são causa relevante do atual surto de inflação. Até agora, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vinha negando essa relação, seja porque não quisesse alarmar a sociedade, seja porque pretendesse manter as pressões para que o Banco Central não aumentasse os juros.

Ao contrário, Mantega insistia em que as causas da atual disparada de preços se limitavam a fatores sazonais, ou externos (choque de commodities), ou, ainda, a destemperos climáticos. A consequência dessa postura é a de que não seria preciso fazer nada para que a inflação cedesse em seguida: "vai passar".

Se agora fica admitida a necessidade de cortes, então fica também reconhecida a existência da inflação de demanda, provocada pela forte geração de renda que se seguiu à disparada do gasto público com fins eleitorais, que, por sua vez, gerou forte descompasso entre procura e oferta de bens e serviços.

O ministro Mantega também justificou os cortes como necessários para abrir espaço para a redução dos juros. A bem da verdade, os atuais cortes orçamentários não parecem suficientemente fundos a ponto de dispensar maior aperto monetário. Assim, seria mais apropriado afirmar que o corte das despesas, desde que efetivado, poderá evitar certa expansão dos juros básicos. Em todo o caso, o que disse Mantega é suficiente para entender que até agora a política fiscal foi obstáculo para o controle da inflação.

O governo Dilma começa com enorme capital político. Se os cortes forem mais bem especificados e se forem seguidos de demonstração de firmeza do governo na condução da política fiscal, conseguirá virar a opinião pública a seu favor.

CONFIRA

O buraco é mais embaixo

O diário Clarín, de Buenos Aires, afirmou que o crescente superávit do Brasil no seu comércio com a Argentina (de US$ 4,1 bilhões em 2010) se deve à falta de competitividade da economia argentina que "não se corrige com negociações comerciais".

Fora do baralho

O durão Axel Weber anunciou sua desistência de se recandidatar à presidência do Bundesbank (banco central da Alemanha). Isso significa que ele também vai desistir de ser candidato a presidente do Banco Central Europeu. Estão abertas as apostas sobre o sucessor do atual presidente, Jean-Claude Trichet, cujo mandato terminará em março.

Quatro candidatos

O jornal Le Figaro aponta quatro nomes: o italiano Mario Draghi (que tem contra ele críticas de quando passou pelo Goldman Sachs); o luxemburguês Yves Mersch; o finlandês Erkki Liikanen; e o alemão Klaus Regling (presidente do Fundo Europeu de Estabilização Financeira).

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