sábado, abril 24, 2010

NAS ENTRELINHAS

Sobre bombas e entrevistas 

Leonardo Cavalcanti
CORREIO BRAZILIENSE - 24/04/10

Imagine você — minha senhora, meu senhor — ter um amigo que, na hora de pedir um favor, o procura pessoalmente, mas no momento de informar sobre a impossibilidade de convidá-lo para uma festa manda uma terceira pessoa
 

Entrevistas com políticos são quase sempre falsas, como quase sempre falsos são os políticos. Eles falam o que querem. E quando não querem, fogem dos temas e, por mais preparado, um repórter acaba refém de respostas mentirosas ou pela metade. Os jornais, porém, sempre pautaram o ping — que, no jargão jornalístico, é o recurso de usar perguntas e respostas no papel. Tal contradição ocorre porque de uma forma ou de outra, nós, jornalistas, esperamos que o entrevistado fale algo novo, uma revelação, ou pelo menos analise de forma diferente da comum sobre determinado acontecimento. Quase sempre o tiro é na água. As entrevistas acabam se transformando num martírio para o leitor. Há exceções.
E uma dessas exceções ocorreu na quarta-feira, na entrevista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Correio. Nela, Lula antecipou como iria rifar Ciro Gomes. O petista falou mais, principalmente sobre as estratégias de campanha de Dilma nos palanques estaduais. Mas fiquemos com Ciro, o homem-bomba, que ontem explodiu. Na terça-feira, o dia em que Lula concedeu a entrevista à reportagem deste jornal, Ciro ainda era uma bomba a ser desarmada. Ao ser questionado sobre o deputado do PSB, o presidente foi claro: “Pretendo conversar com Ciro na medida em que a direção do PSB entenda que já é o momento”. A revelação em uma frase. Lula, tal qual um comandante militar, enviaria a campo um cabo-armeiro — no caso os políticos do PSB — e tentaria se manter à distância da bomba.
Os cuidados 
O petista antecipava ali a estratégia montada com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). O presidente não iria dizer diretamente para Ciro que ele estava fora do páreo pelo Planalto. Isso seria feito pelos donos do PSB, mas indiretamente. Chegariam para o político cearense e apresentariam a relação de apoios à candidatura própria. Apenas oitos dos 27 diretórios regionais do partido estão firmes com Ciro. O restante deles é mais pragmático e precisa de alianças. Os integrante do PSB tentariam dizer tudo isso com a maior elegância para evitar uma explosão de fúria do homem que quer ser presidente do Brasil, mas para isso precisa de um partido que o apoie. O plano partidário foi colocado em prática na manhã de quinta-feira. Deu tudo errado. Ciro, que cada vez menos frequenta Brasília, saiu da cidade irritado, pegou o primeiro voo em direção a São Paulo. Irritado, prestes a explodir. Lula sabia que isso iria acontecer, por isso mandou o PSB na frente.
O problema é que quando precisou de Ciro, Lula pediu pessoalmente para ele transferir o título para São Paulo. O deputado não queria, mas concordou. Na entrevista ao Correio, entretanto, Lula disse “ter achado interessante quando ele (Ciro) transferiu o título para São Paulo porque era uma probalidade”. Veja bem, Lula não achou apenas “interessante”, o petista queria Ciro candidato a governador para infernizar a vida do tucano José Serra. Não conseguiu. Porque o homem-bomba queria a Presidência. O curioso é que no momento em que era necessário informar a Ciro sobre a saída da corrida eleitoral, Lula enviou interlocutores. Imagine você — minha senhora, meu senhor — ter um amigo que, na hora de pedir um favor, o procura pessoalmente, mas no momento de informar sobre a impossibilidade de convidá-lo para uma festa manda uma terceira pessoa.
O estouro
O problema para Lula é que todo mundo sabe que Ciro não vai ficar simplesmente calado. Vai atacar, como ameaçou ontem mesmo, antes do raiar do dia. Reportagem do portal IG apontou que Ciro já começava a mandar recados para Lula, Dilma e o PMDB. “Lula está navegando na maionese”, disse Ciro, segundo o site. “Ele está se sentindo o Todo-Poderoso e acha que vai batizar Dilma presidenta da República. Pior: ninguém chega para ele e diz: ‘Presidente, tenha calma’. No primeiro mandato eu cumpria esse papel de conselheiro, a Dilma, que é uma pessoa valorosa, fazia isso, o Márcio Thomaz Bastos fazia isso. Agora ninguém faz.” Resumo da história. Lula avisou o que iria fazer, achou que iria dar certo. Deu no que deu. Ciro está longe da disputa ao Planalto, mas não do calcanhar de Dilma.

FERNANDO RODRIGUES

Ciro apostou. E perdeu

FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SÃO PAULO - 24/04/10

BRASÍLIA - Haverá uma profusão de análises sobre o fim da pré-candidatura de Ciro Gomes a presidente da República. O cardápio era variado entre as avaliações já disponíveis ontem. Foi humilhado por Lula, destratado pelo PSB, o PT destrói quem aparece à sua frente ou Ciro pecou pela ingenuidade.
O tempo dirá qual dessas ou de outras avaliações são verdadeiras ou apropriadas. Do ponto de vista dos fatos, deu-se algo muito simples. Ciro fez uma aposta. Sua previsão não deu certo, e ele perdeu.
A estratégia cirista era conhecida. Ele próprio a relatou em detalhes mais de uma vez acomodado à frente de uma das mesas de tampo de mármore branco nas quais é servido o intragável café de coador da Câmara dos Deputados. Anotei ponto a ponto sua explicação na tarde de 7 de outubro passado:
"O lugar marcado para mim é ficar em terceiro lugar na eleição e ser protagonista no segundo turno. Mas há uma fresta para eu ser o segundo. E uma fresta minúscula para eu ser o primeiro. O Serra vai recuar no ano que vem. Aí entra o Aécio, mas lá atrás nas pesquisas. Eu fico em primeiro lugar".
Em resumo, a aposta era dividida em três etapas: 1) o tucano José Serra ficaria com receio de perder e não seria candidato a presidente; 2) a petista Dilma Rousseff continuaria empacada abaixo de 20%; 3) Aécio Neves assumiria a vaga do PSDB ao Planalto, mas em patamar bem baixo nas pesquisas.
O passo seguinte seria Ciro conquistar o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com medo de ser expelido do Planalto, o PT buscaria uma alternativa heterodoxa, dando apoio ao nome do PSB.
Enquanto pitonisa eleitoral, Ciro foi só um político. Suas previsões estavam todas erradas. Mas, como ele desejava ser presidente, talvez não tenha tido muita escolha. Precisava apostar e pensar alto. Apostou e perdeu. Simples assim.

GOSTOSA

BRASÍLIA -DF

O cerco de São Paulo
Luiz Carlos Azedo


CORREIO BRAZILIENSE - 24/04/10 

O PT lança hoje a candidatura do senador Aloizio Mercadante ao governo de São Paulo, num evento em que a ex-ministra Dilma Rousseff pretende fazer um discurso conclamando os paulistas a porem um fim na longa hegemonia tucana na administração do estado. Para desafiar o ex-governador José Serra (PSDB), Dilma pretende comparar os investimentos e as realizações do governo Lula, dos quais se considera a principal gestora, com as ações do governo FHC no estado.

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Dilma precisa dos votos de muitos paulistas para vencer as eleições. Hoje, a avassaladora vantagem de Serra no estado, com 29,8 milhões de eleitores, neutraliza sua vantagem estratégica junto aos 35,9 milhões de eleitores do Nordeste. A candidatura de Mercadante, que vai para o sacrifício, é uma das âncoras de Dilma em São Paulo. A outra é a elevada aprovação do presidente Lula no estado. A parada é dura: o tucano Geraldo Alckmin larga com 61% de intenções de voto na corrida de volta ao Palácio dos Bandeirantes.

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O problema de Dilma é que toda a estratégia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para derrotar o tucano José Serra e elegê-la, até aqui, teve como eixo o isolamento político de São Paulo. A elite paulista foi estigmatizada como arrogante, exclusivista e preconceituosa. E de costas para o Nordeste e a pobreza do país. Depois do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o tucano José Serra personificaria esse estigma.
 

Brasília, 50 anos

A partir de hoje, atores da companhia teatral Caixa Cênica vão representar personagens históricos durante as visitas guiadas ao Congresso. Serão sete cenas, com oito atores, que reproduzem momentos marcantes do Parlamento brasileiro e da mudança da Capital para o Planalto Central. No início da visita, no Salão Negro, Juscelino Kubitschek conta aos turistas como adotou o sonho de Brasília, ao ser questionado por um eleitor em um comício na pequena cidade de Jataí (GO), logo no início da campanha que o levou à Presidência da República. Lucio Costa, Joaquim Cardozo, Oscar Niemeyer, Israel Pinheiro, Ulysses Guimarães e Ruy Barbosa são os personagens encenados. 


Fora
O bilionário empresário João Carlos Cavalcanti desistiu de ser vice na chapa do ex-ministro da Integração Nacional Geddel Vieira Lima(PMDB) — foto — ao governo da Bahia. Teria atendido aos apelos da família e dos sócios. Cavalcanti é acionista de empresas que têm a participação do grupo Votorantim e da MMX de Eike Batista, além de Daniel Dantas. 


Berro

Ciro Gomes pode estar conformado com a falta de apoio da cúpula do PSB, mas não é bom cabrito. Depois de admitir publicamente que a cúpula do PSB vai mesmo retirar sua candidatura a presidente da República, em entrevista ao SBT, ontem, disse que vai espernear até a reunião da Executiva, marcada para terça-feira. Atira contra o presidente do PSB e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e critica a soberba do presidente Lula. Diz que gosta de Dilma Rousseff, mas que ela é despreparada para enfrentar Serra na campanha eleitoral e que a aliança do PT com o PMDB não passa. A propósito, argumenta que o tucano ganha mais com sua saída, pois apoiaria a petista no segundo turno se fosse candidato. 


Sorriso

O tucano José Serra comemora o naufrágio da candidatura de Ciro Gomes como aquele cara todo engessado que sobreviveu ao trágico acidente de carro: não pôde rir. Além de se livrar dos ataques de Ciro na campanha, vai herdar a maioria dos votos do candidato do PSB. 


Colegas
Michel Temer (foto) anda com o prestígio em alta no mundo jurídico, no qual é reconhecido como grande constitucionalista. Na sexta-feira, o presidente da Câmara reuniu pesos pesados do mundo jurídico. Além dos ministros Eros Grau (STF) e Asfor Rocha (STJ), advogados dos principais escritórios do país e o presidente da OAB, Ophir Cavalcanti, estiveram presentes. O encontro terminou com
uma foto dos presentes na residência oficial. 



Maiores

O Brasil emplacou cinco empresas entre as 100 maiores do mundo: a Petrobras aparece em 18º, seguida do Bradesco (51º). As demais são o Banco do Brasil (52º), a Vale (80º) e a holding Itausa (82º). Na lista das 2 mil empresas mais importantes da economia mundial da conceituada revista Forbes, 33 são brasileiras. 



Alvo/ A batata do ex-governador Joaquim Roriz está assando. O Ministério Público Federal continua defendendo a intervenção no Distrito Federal, mas a prioridade dos procuradores já é impedir que o pré-candidato do PSC ganhe as eleições e volte a comandar os destinos de Brasília.
Arrocho/ Servidores da Secretaria do Trabalho do GDF estão em pânico com o telefonema que os alertou de suas novas funções. Quem não arregaçar as mangas pode ir parar no olho da rua.
Prova/ O juiz Marcelo Pereira da Silva, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, autorizou a realização das provas discursivas do concurso para Auditor Fiscal do Trabalho, amanhã, na Escola de Administração Fazendária (Esaf)

REGINA ALVAREZ

Dever de casa
Regina Alvarez

O GLOBO - 24/04/10

A América Latina saiu-se bem na crise, mas ainda há um importante dever de casa por fazer se a região quiser competir, em condições de igualdade, com os concorrentes asiáticos nas próximas décadas. O Itaú Unibanco fez uma análise apontando os principais gargalos que ameaçam a região: carência de infraestrutura; déficit de mão-de-obra qualificada; e entraves aos negócios estão no topo dessa lista.

O economista Tomás Málaga lembra que o bom desempenho na crise decorre do acúmulo de reservas que os países fizeram, aproveitando o apetite da China por commodities. As reservas serviram de colchão, que foi usado no auge da desconfiança para a proteção das moedas. Mas Málaga ressalta que esse cenário não se sustentará eternamente. Por isso, é tão importante aumentar a poupança nacional para financiar investimentos em capital humano, capital físico e infraestrutura.

— A taxa de poupança na América Latina é muito baixa em relação aos asiáticos, que possuem taxas acima de 30%. O Brasil, por exemplo, tem poupança em torno de 16% do PIB. O Chile é quem se sai melhor, com 25%. Mas ainda é muito pouco — destaca.

O fundamental, na visão do economista, é financiar os investimentos que resultem em vantagens comparativas futuras. E para isso defende incentivos que atraiam os esforços do empresariado e o capital humano qualificado.

— É muito importante aproveitar esta boa fase da região para garantir a competitividade futura — diz.

Alguns dados incluídos no estudo do Itaú Unibanco indicam com clareza as deficiências da região. No ranking Doing Business 2010, elaborado pelo Banco Mundial, o país mais bem colocado da América Latina é a Colômbia, que aparece na 37aposição, em uma lista de 183 países. O Chile está em 49olugar; seguido pelo México, em 51o. A Argentina é 118ocolocado, enquanto o Brasil aparece na 129aposição.

A baixa qualificação da mão-de-obra fica evidente na quantidade de pessoas que ainda permanecem abaixo da linha de pobreza na região — quase 190 milhões — e nas notas obtidas por alunos de 15 anos no PISA, o exame educacional coordenado pela OCDE.

— Tudo isso evidencia que as empresas da região não encontram facilidades para operar e isso as torna menos competitivas num cenário global — conclui.

O dia seguinte

O sinal verde dado ontem pelo governo grego ao pacote de ajuda do FMI tem um sentido simbólico forte, mas quanto aos resultados práticos pairam muitas dúvidas. A primeira intervenção do Fundo na zona do euro terá um impacto positivo, pois alivia a crise fiscal de curto prazo, mas não vai resolver os problemas da Grécia, observa o economista Gustavo Loyola, da consultoria Tendências. Os problemas são estruturais: produtividade baixa, capacidade de emprego baixa. E o remédio do FMI é amargo. Vai exigir um ajuste fiscal forte, que vai inibir o crescimento no curto prazo.

— Será que a Grécia vai aceitar o sacrifício? Terá condições políticas de fazer o ajuste? Como fazer a população aceitar esse remédio amargo? — indaga Loyola, lembrando que o país é parlamentarista e que já se observa uma forte reação da sociedade a medidas mais duras.

Na visão do economista Luis Otávio Leal, do banco ABC Brasil, o mercado continuará atento aos problemas da Grécia e dos demais países da zona do euro que têm uma situação fiscal parecida, como Portugal e Espanha.

— O empréstimo resolve o problema de rolagem da dívida deste ano, não do ano que vem — destaca.

Leal e Loyola acreditam que a crise da Grécia pode servir de lição para outros países, inclusive para o Brasil.

Com a criação da zona do euro, os gregos se beneficiaram dos juros baixos e do crédito farto e desperdiçaram tudo isso sem construir as bases para o crescimento sustentável.

— Mais do que nunca está valendo a frase de Milton Friedman, “Não existe almoço grátis” — diz Otávio Leal.

Consumo de luxo

A estimativa da Azimut Yachts, estaleiro italiano especializado em embarcações de luxo, é de que o mercado náutico brasileiro crescerá mais de 10% este ano.

De acordo com Luca Morando, CEO da Azimut do Brasil Yachts, o Brasil se tornou prioridade para a empresa, com um mercado consumidor de 800 mil famílias, dispostas a pagar entre US$ 1 milhão a US$ 8 milhões por uma embarcação. Esse mercado está concentrado em São Paulo (50%); Rio de Janeiro (20%) e Santa Catarina (20%).

À frente

A Azul anunciou cinco novos voos saindo de Belo Horizonte, a partir de 1º de julho: São Paulo/Campinas, Porto Alegre, Porto Seguro, Recife e Fortaleza. Assim, a capital mineira passará à frente do Rio, hoje a segunda cidade melhor servida pela companhia, com três voos. A empresa tentou montar no Rio a sede de suas operações, mas as restrições à liberação de voos no Santos Dumont empurraram a Azul para Campinas.

Formigas

A agência Fitch estima que metade das perdas de US$ 1,7 bilhão das empresas aéreas europeias ainda pode ser recuperada com a remarcação de passagens.

A avaliação é que a crise provocada pelas cinzas do vulcão Eyjafjallajokull só não é maior porque as companhias aprenderam a fazer caixa após o colapso vivido no setor com os atentados de 11 de Setembro, nos Estados Unidos.

GOSTOSA

ARI CUNHA

Vacinar o povo
ARI CUNHA

CORREIO BRAZILIENSE - 24/04/10


Logo mais vai entrar no calendário o mês de Maria. Vacina para os idosos não apareceu. Salve-se a reserva dedicada às senhoras grávidas. O governo esquece-se de que idosos também têm direito a um lugar ao sol. O tempo mudou, o frio chegou, a secura criou novos contornos. Umidificadores nos dormitórios, na casa inteira. Até os colibris que se servem da água que pingava dos coqueiros perderam sua fonte de bebida. Ficam flutuando, correndo os coqueirais e o pouco que conseguem está no fim dos filetes. A natureza é sábia para com os irracionais. Os pensantes ficam de lado, porque Deus lhes deu o livre-arbítrio. Do imposto, o governo não abre mão. Os contribuintes ficam sem assistência. Louve-se a Deus, o salvador da vida.


A frase que não foi pronunciada

“Aos 80 anos, o melhor presente é um futuro cheio de paz.”
Presidente Sarney, aniversariante do dia, fazendo um balanço da vida.




Ato de dirigir
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Cresce no Brasil, desmesuradamente, o número de motoristas. Nem todos têm o hábito de comunicar pela seta que vão mudar de faixa. Mesmo aqui em Brasília, onde o tráfego é disciplinado e ninguém buzina, quando se ouve a duração do som, entende-se. Alguém, sem avisar, entrou na faixa do vizinho.
Cuba
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Cidadão cubano tem pagamento ínfimo do trabalho. Desde o tempo de Fidel Castro as fábricas liberavam a produção para que cada um tivesse seu ganho. Mesmo assim, a sede pelo ganho é salvação. Estávamos em Havana. No hotel, o PPG era vendido a US$ 35 dólares a caixa. Fora disso, os ambulantes vendiam a US$ 5. Um brasileiro que estava no nosso grupo comprou grande quantidade. Chegando a Brasília, havia curiosidade em torno do medicamento. Ele vendeu ao preço da embalagem e o comprador ficou agradecido.
Traços
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Datena recebeu a candidata Dilma e repetiu quatro vezes que ela era muito mais bonita pessoalmente. Chegou até a dizer que a Matilde estava “correndo risco aí em casa”. Dilma Rousseff mostrou tranquilidade no canal do povão e só ficou nervosa quando lhe davam tempo para a resposta, o que vai exigir mais treinamento para os debates.
Então, tá
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O instituto de línguas Ilal continua funcionando sem problemas no início da W3 Sul. Mesmo depois de assinar, sem credenciais para isso, o diploma de segundo grau de milhares de estudantes. Agora funciona só como escola de idiomas.
Passivo
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Tião Viana quer votar o projeto de lei antifumo na semana que vem. O senador vai enfatizar a proteção aos não fumantes. Para se ter uma ideia, na Escócia as internações com doenças coronárias caíram 17% 10 meses depois de adotadas as novas regras.
Consome dor
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Caesb e CEB deixaram de oferecer o nada consta pelo portal. O serviço existe, mas está constantemente em manutenção. O Banco do Brasil acabou com o serviço de reclamação por escrito no portal. Por seu lado, o contribuinte pode se acalmar. Depois da tormenta no GDF, o carnê do IPTU começa a chegar às residências.
Em frente
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De um lado do cabo de guerra, o PT. Do outro, o juiz Fausto de Sanctis. Depois da Operação Satiagraha, o juiz determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal da Bancoop. O fundo de investimento da cooperativa habitacional criado em 2004 também está sob lentes. O que torna o assunto uma disputa de forças é o temor dos investigados. Onde há fumaça há fogo.
Erro
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Vale uma entrevista com a ex-ministra Margarida Procópio sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. É impossível o poder público impedir o uso de drogas, assaltos e mortes se os menores repetem com tranquilidade que voltarão em breve a cometer crimes porque estarão soltos em pouco tempo. A proteção à criminalidade precisa ser mudada com urgência. É só aceitar o erro.
Discussão
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Todos sabem que o senador Suplicy discorda que os magistrados tenham 60 dias de férias. Bem que o senador Cristovam poderia entrar na questão para discutir o descanso remunerado dos professores de universidades públicas. É mais longo do que os do Executivo, do Judiciário e do Legislativo.



História de Brasília

Os fiscais da prefeitura devem tomar conhecimento de que diversas firmas, na W3, nas proximidades do Colégio Dom Bosco, fizeram tapume para iniciar a construção, com o que conseguiram iludir a prefeitura. Fizeram, em seus terrenos, casas de madeira e, com o nome do engenheiro responsável em vistosa placa, passam como “morando na construção”. (Publicado em 2/3/1961)

J. R. GUZZO

REVISTA VEJA
J. R. Guzzo

Pobres e ricos

"Melhor seria se houvesse menos gente empenhada 
em defender os pobres. Todos juram que estão a seu favor, 
mas se estivessem mesmo deveria haver no Brasil número
muito menor de pobres. Já os ricos, que não têm defensor, 
nunca estiveram tão bem"

Promete ser uma arma muito utilizada pelo governo, ao longo da campanha eleitoral, falar sobre o perigo que os pobres deste país passariam a correr se a candidata Dilma Rousseff não for eleita para a Presidência da República. Entre as instruções a respeito do que ela deve dizer em seus discursos, ora em avaliação pelas equipes de propaganda da candidatura oficial, parece haver bastante entusiasmo com a tentativa de colar nos adversários uma intenção secreta: governar contra os pobres e a favor dos ricos. A ideia geral, aí, é deixar os outros candidatos, sobretudo o principal deles, numa situação sem saída. Se falarem em mexer no Bolsa Família, nos aumentos reais do salário mínimo e em outros benefícios, estarão mostrando sua verdadeira cara; se prometerem não mexer em nada, estarão mentindo.
A dificuldade desse tipo de plano, como de tantos outros, é combinar com o adversário para que ele cumpra a sua parte. O ex-governador José Serra, a ex-ministra Marina Silva e quem mais houver em campanha não vão anunciar, por exemplo, que acabarão com os pagamentos do Bolsa Família se forem eleitos. Por que diabo fariam uma coisa dessas? Ao contrário, vão assumir o compromisso de manter tudo como está; se quiserem caprichar, podem até dizer que o governo está pagando muito pouco e prometerem um belo aumento a partir de 2011. Nenhum candidato vai, da mesma forma, sair por aí anunciando planos de congelar os salários, cortar o crédito ou eliminar os programas de casa própria. Resta à ex-ministra, nesse caso, a alternativa de sustentar que os opositores dizem uma coisa, mas querem, na realidade, fazer exatamente o contrário. Mas aí é entrar em território incerto; acusações de mentira sempre têm duas mãos, e, numa disputa eleitoral que ameaça bater todos os recordes em matéria de tapeação, chamar o outro lado de mentiroso pode acabar em lucro zero.
Quanto aos pobres, em si, provavelmente seria melhor se houvesse menos gente empenhada em defendê-los. Todos juram que estão a seu favor, mas se estivessem mesmo já deveria haver no Brasil, a esta altura do século XXI, um número muito menor de pobres. Já os ricos, que não têm nenhum defensor, nunca estiveram tão bem quanto agora. Não há sinal de que algum deles tenha ficado mais pobre nesses últimos sete anos, salvo os que se meteram, por sua própria conta, em maus negócios – nada que tenha a ver com alguma decisão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele mesmo, por sinal, já disse que jamais os ricos e as grandes empresas ganharam tanto dinheiro quanto em seu período na Presidência. Poderia dizer, também, que nunca a quantidade de milionários brasileiros cresceu tanto como hoje. Segundo o último balanço do banco de investimentos Merrill Lynch, que calcula anualmente o número de cidadãos com patrimônio financeiro superior a 1 milhão de dólares pelo mundo afora, o Brasil ganhou 33 000 novos milionários entre 2004 e 2008. Dá, em média, um novo milionário por hora.
Não existe nada de errado com nenhuma dessas coisas, é claro. O problema do Brasil, em matéria de renda, não é a quantidade excessiva de ricos – é que há pobres demais. Mas sem dúvida é curioso, em cima dos números atuais, que a candidata oficial acuse os opositores de pretender governar para os ricos. O que poderiam fazer de tão diferente assim, em relação ao que já vem acontecendo? Produzir dois novos milionários por hora, quem sabe, em vez de apenas um? Naturalmente, nada disso faz sentido, mas é o que acontece quando estratégias de campanha se resumem a ficar procurando, o tempo todo, alguma maneira de falar mal dos outros candidatos. Os fatos reais, no caso desse palavrório sobre pobres e ricos, têm bem pouco interesse para quem acusa. O que importa é jogar uns contra os outros, na esperança de impressionar o lado onde há mais eleitores.
Os pobres do Brasil, sabidamente, não precisam de várias coisas; entre elas estão debates desse tipo, em que a ânsia de machucar o adversário pode fazer ruído no noticiário de campanha, mas não lhes põe um real a mais no bolso. Também não precisam de solidariedade, simpatia ou "políticas de renda". O que melhora de verdade a sua situação, como ficou comprovado no mundo dos fatos, são a multiplicação das oportunidades de emprego e a estabilidade da moeda na qual o seu trabalho é pago. O compromisso que mais lhes interessa no momento, por parte de quem pretende chefiar o próximo governo, é este – crescimento sem inflação. Não é o suficiente, num país que precisa melhorar em quase tudo. Mas é indispensável.

O ABILOLADO E A MENTIROSA



ROLF KUNTZ

Pobres vão pagar caro pela crise dos ricos 
Rolf Kuntz

O ESTADO DE SÃO PAULO - 24/04/10 

Só neste ano, 64 milhões devem cair na pobreza extrema, aponta estimativa do Banco Mundial


O mundo poderá ultrapassar a meta de redução da extrema pobreza até 2015, apesar da crise, mas outros objetivos, como a diminuição da mortalidade infantil e a ampliação do acesso ao saneamento, provavelmente ficarão prejudicadas, segundo o Banco Mundial. Além disso, o número de pessoas muito pobres será maior do que poderia ter sido, se o crescimento econômico não tivesse diminuído nos últimos dois anos e os programas sociais não tivessem sido afetados.

Em todo o mundo, o contingente de pessoas em extrema pobreza deverá diminuir de 1,8 bilhão em 1990 para 918 milhões em 2015. O resultado seria bem melhor, se 53 milhões, de acordo com o banco, não ficassem presas na miséria por causa da crise e de seus desdobramentos. Essa estimativa inclui 20 milhões na África Subsaariana.

No fim de 2010, haverá 64 milhões a mais de miseráveis, por causa da recessão, de acordo com o Relatório de Monitoramento Global 2010 apresentado ontem por diretores do Banco Mundial (Bird) e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Parte desse acréscimo será eliminado nos próximos anos, com a melhora da economia.

As Metas do Milênio foram adotadas oficialmente em 2000 pela Organização das Nações Unidas (ONU). Os governos se comprometeram a cortar pela metade a proporção de pessoas com renda inferior a US$ 1,25 por dia - de 22% em 1990 para 11% em 2015. Provavelmente será possível chegar a 15% de pessoas em pobreza extrema, em termos globais. Mas o desempenho dos países será muito desigual e muitos não conseguirão cortar a proporção pela metade.

Na África Subsaariana, a redução será de 57,6% em 1990 para 38%. Poderia ser 36%, sem os efeitos da crise. Mesmo em 2020 a região continuará fora da meta, com 32,8% de pessoas muito pobres, pouco mais que metade da parcela calculada para 1990.

A erradicação da pobreza extrema é a meta número um. As outras são a universalização da educação primária, a promoção da igualdade de gênero, a redução da mortalidade infantil, a melhora da saúde materna, o combate à Aids e a outras doenças contagiosas, a sustentabilidade ambiental e a cooperação global para o desenvolvimento. O mundo provavelmente alcançará as metas de paridade entre meninos e meninas na educação primária e secundária até 2015, de acordo com as novas projeções. Quase dois terços dos países em desenvolvimento chegaram à paridade de gênero em 2005. Mas as mulheres continuam em desvantagem na educação superior.

Dificilmente se alcançará o objetivo de reduzir em 75% a mortalidade materna até 2015. Em relação à mortalidade de crianças com menos de cinco anos, só foi possível, até agora, alcançar 40% do objetivo fixado.

A crise e seus desdobramentos deverão resultar num acréscimo de 1,2 milhão de mortes de crianças com menos de cinco anos entre 2009 e 2005. Essa projeção inclui 265 mil bebês. As estimativas estão associadas com a previsão de más condições de nutrição e de acesso a água limpa e a padrões de saneamento.

O Brasil foi muito menos afetado pela crise, em termos de emprego e de renda, que a maioria das economias emergentes e em desenvolvimento. Além disso, já cumpriu a maior parte das metas mais importantes, como a redução da pobreza extrema, a universalização do ensino primário e a diminuição da mortalidade infantil. Mas o País partiu, nos anos 90, de condições bem mais favoráveis que as das economias em desenvolvimento.

Nesta crise, as economias emergente e em desenvolvimento estão pagando por problemas criados no mundo rico. As dificuldades enfrentadas pelos países em desenvolvimento não resultaram, desta vez, de erros cometidos internamente. Quase todos entraram na crise com inflação baixa, contas externas mais ou menos em ordem e situação fiscal bem melhor que a de uma década atrás. Os efeitos da crises "poderiam ter sido muito piores, se os países em desenvolvimento não tivessem melhorado suas políticas e instituições nos últimos 15 anos", comentou o vice-diretor gerente do FMI Murilo Portugal. Apesar disso, ressalvou, o impacto da crise nas condições de vida pode ser muito sério, pois a margem de segurança é estreita para muitas pessoas, até nos melhores tempos.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Agronegócio "financia" importação de máquinas
MARIA CRISTINA FRIAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 24/04/10

O agronegócio irá evitar uma queda maior do superavit da balança comercial brasileira neste ano. O saldo entre as exportações e as importações totais do país deverá ser de US$ 12 bilhões, cerca de US$ 13 bilhões menor que o do ano passado, segundo cálculos da RC Consultores.
As importações devem subir cerca de 25%, para US$ 160 bilhões, enquanto as exportações tendem a crescer apenas 13%, para US$ 172 bilhões.
"O que irá salvar a balança comercial neste ano será o agronegócio", afirma Fábio Silveira, sócio da RC Consultores.
Esse será o setor com o melhor desempenho dentro da balança, com superavit de US$ 49,2 bilhões, segundo a consultoria. Os itens que devem impulsionar as vendas externas são as carnes, o açúcar e o café.
Enquanto o setor agrícola irá gerar um enorme saldo para a balança, a categoria de bens de capital irá apresentar deficit de US$ 37,7 bilhões -quase US$ 12 bilhões a mais que em 2009.
O crescimento da economia e a restrita competitividade das exportações brasileiras de máquinas são os principais motivos para o aumento do deficit da categoria, diz a consultoria.
"Os dados mostram que é o agronegócio que irá financiar mais uma rodada de modernização da indústria brasileira."
Com o reajuste no preço do minério de ferro, as exportações do produto irão saltar dos US$ 13,2 bilhões em 2009 para os US$ 19,6 bilhões neste ano, segundo a consultoria. Essa alta, porém, não será suficiente para dar um alento à balança.
Perfil de diretor financeiro altera lucro, diz pesquisa
Mais da metade dos diretores financeiros de empresas no mundo ainda não possuem capacidade analítica aliada à eficiência na condução das operações.
A conclusão é de pesquisa da área de consultoria da IBM, que abordou 1.900 diretores financeiros em 81 países, incluindo o Brasil.
Quatro perfis de executivos foram identificados.
Cerca de 33% são consolidadores de resultados, ou seja, mantém o departamento em funcionamento com pouca produtividade e direcionado a apuração de resultados. "Esse é um tipo de executivo que contribui para a empresa, mas ainda é limitado. Um terço no mundo está nessa categoria", diz Ricardo Gomez, executivo da unidade de consultoria da IBM.
Outros 32% são gestores eficientes, que focam a produtividade do setor financeiro, mas ainda carecem de habilidade analítica.
O perfil que deve crescer, formado por 23% dos diretores, é o dos integradores de valor, que contribuem de fato para os resultados financeiros e o desempenho dos negócios, segundo o estudo.
O restante, 12% são consultores parciais, isto é, se envolvem nas decisões de negócios, mas com dificuldade, pois têm limitações na produtividade das finanças.
"A capacidade analítica é uma parte da administração financeira mais nova. Antes era só a contabilidade."
BANHO SEM EMBAÇO

A marca de móveis sob medida Ornare, que há mais de 20 anos produz armários luxuosos para quartos, passa a desenvolver móveis para "salas de banho".
A sócia-diretora da empresa, Esther Schattan, evita a palavra banheiro para o cômodo que pode ter uma cuba de até R$ 5.000, puxadores de cristais Swarovski e vidros que não embaçam durante a banho.
"Começamos com armários e closets, que são móveis de área seca. Em 2006, entramos com cozinhas, de área molhada, o que nos deu experiência para agora começar nesse projeto", diz.
A empresa tem hoje cerca de 800 funcionários nas duas fábricas em Cotia e nas lojas da marca em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Belo Horizonte e Miami (EUA).
EM DUPLA
Rodobens Consórcio e Consórcio União se associaram para formar uma nova empresa, a União Rodobens Consórcio. A companhia nasce com administração de R$ 1 bilhão de ativos e mais de 55 mil cotas na carteira. Será formada pela migração dos clientes do Consórcio União e parte da carteira dos clientes da Rodobens Consórcio. A nova empresa comercializará cotas de imóveis, automóveis, motos, caminhões, além de consórcios de serviços. A meta é atingir uma carteira de R$ 4,5 bilhões de ativos ao final de três anos.
PAGAMENTO
O uso dos cartões em setores que tradicionalmente não aceitavam os meios eletrônicos, como clínicas médicas e escolas, segue em alta. Segundo dados da Redecard, o volume transacionado pelos segmentos moveleiro, seguros, distribuição, educação e saúde cresceu 96,7% entre os anos de 2005 e 2009. Saúde e educação foram os principais responsáveis pela expansão. A Redecard fechou acordo com o Sindjorsp (Sindicato dos Vendedores de Jornais e Revistas de SP). Em São Paulo, há mais de 5.000 bancas.

com JOANA CUNHA e ALESSANDRA KIANEK

GOSTOSA

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO

Um vaga-lume na selva

EDITORIAL

O Estado de S.Paulo - 24/04/10

O que o presidente Lula e sua comitiva não encontraram, na comemoração do aniversário da demarcação da Reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, foi a divisão que lá havia, há um ano, entre os índios favoráveis à demarcação contínua e à expulsão dos brancos produtores de arroz ou pecuaristas daquelas terras e os que se opunham à expulsão dos arrozeiros, porque dependiam deles para sua sobrevivência. Desta feita, o que Lula encontrou foi uma completa união: tanto os que eram favoráveis como os que eram contra a exclusividade da ocupação indígena daquelas terras se tornaram solidariamente contra a demarcação tal como foi feita.
É que os dois grupos sentiram fortemente os efeitos da queda de produção e da falta de trabalho. Seus meios de sobrevivência escassearam e, de lá para cá, os chefes de família têm tido de se contentar com o que suas mulheres recebem do Bolsa-Família e do programa de cestas básicas.
O pretendido entusiasmo, que se esperava dos grupos de índios convocados e organizados pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR) - entidade que comandara mobilizações em favor da demarcação contínua - para recepcionar o presidente da República em Maturuca, cantar o Hino Nacional em dialeto macuxi e exibir outras formas de vitoriosa alegria, ficou obnubilado pela frustração e tristeza dos que haviam perdido o trabalho de uma vida inteira ou até de mais de uma geração.
Os fazendeiros obrigados a deixar suas terras consideravam os festejos programados pelo Planalto uma "verdadeira afronta". O Estado de segunda-feira mostrou, por exemplo, o caso do pecuarista Joaquim Correa de Melo, de 87 anos, um dos que em 22 de março de 2009 foram obrigados, por decisão do STF, a "deixar para trás uma vida inteira". Sua família residia e produzia na Fazenda Caracaramã, à beira do Rio Maú, no município de Normandia, desde 1816.
O governador de Roraima, José Anchieta Junior (PSDB), apesar de convidado pelo Planalto, não compareceu à festa, já que era inteiramente contrário à demarcação contínua e à expulsão dos fazendeiros, responsáveis por significativa produção agropecuária. Foram muitos os protestos, expressos em faixas e outdoors. E as descontraídas brincadeiras do presidente Lula - que colocou um cocar na cabeça e ameaçou usar do arco e flecha contra fotógrafos - não empolgaram ninguém.
Não empolgaram porque não são motivo de festa a paralisação da economia da região, o fato de as pessoas terem de sobreviver à custa de programas sociais e a sonegação, por parte da Fundação Nacional do Índio (Funai), de assistência aos que se opuseram à demarcação e à expulsão dos arrozeiros - conforme a queixa dos índios da Vila Ticoça, onde vivem 60 famílias.
A despeito de todas as evidências dos problemas criados pela demarcação contínua e das manifestações contrárias àquela comemoração, o presidente Lula não se deu por achado. "Era como se nós fôssemos o demônio, porque diziam que a gente iria tirar a terra que Roraima precisava para produzir", disse o presidente. Acrescentou que, apesar de considerar a demarcação "um marco histórico", evitou ir antes à região por causa da divergência que se estabeleceu no Estado de Roraima.
Nisso o presidente acertou: agora já não há divergência, porque todos - com a exceção do Conselho Indigenista e da Funai - ficaram contra a demarcação contínua e a expulsão dos fazendeiros.
O presidente Lula, no entanto, vê apenas o que lhe interessa. Se, por um lado, considerou que todos os índios estão muito felizes com a demarcação da Raposa-Serra do Sol, por outro, não deixou de perceber que as instalações de luz e banheiro que encontrou eram provisórias e se destinavam ao uso da comitiva de autoridades.
E não resistiu à tirada demagógica: "Na hora em que eu virar as costas, vocês vão ficar no escuro outra vez, como se eu fosse um vaga-lume", disse ele. E prometeu que o ministro de Minas e Energia voltará a Maturuca levando luz à localidade.
Teve a prudência de não dizer quando.

RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA
RUTH DE AQUINO
Pobreza extrema é coisa de mulher
RUTH DE AQUINO
Revista Época
RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br
Só um planejamento familiar sério, rigoroso e nacional poderá livrar nossas mulheres de uma equação perversa. As mais pobres engravidam cedo demais. E são abandonadas. Nenhum programa de habitação ou de educação poderá ter sucesso enquanto as adolescentes continuarem engravidando nas famílias indigentes ou pobres. Hoje, mais da metade das famílias em extrema pobreza nas dez principais cidades do Brasil é chefiada por mulheres.
“O Bolsa Família só funciona com famílias chefiadas por homens”, afirma o economista André Urani. “O programa não chega à mãe precoce, abandonada. Ela não tem mobilidade para tirar seu CPF ou ir ao lugar onde se recolhe o benefício. Não tem creche. Não tem como trabalhar. E, mesmo que consiga ser contemplada com o Bolsa Família, não consegue sair da extrema pobreza.”
O Brasil comemora, com justiça, a redução da pobreza e o aumento da classe média. Nas dez principais cidades havia, em 1993, 6,3 milhões de pessoas em extrema pobreza. Em 2008, esse total caiu para 3,5 milhões. Uma queda de 44%. Mas, entre as famílias chefiadas por mulheres, o número de indigentes (com renda mensal de até R$ 104) aumentou de 1,6 milhão para 1,8 milhão. O fenômeno se repete em todas as faixas de pobreza, com renda mensal até R$ 503. Há algo errado, portanto, com a estrutura da família.
Recentemente, ao assistir, na TV Globo, a uma reportagem sobre o lixo, senti um embrulho no estômago. Duas catadoras de lixo tinham 21 anos, estavam grávidas e já tinham dois filhos. As crianças catavam comida e tudo o que fosse aproveitável. As mães achavam normal. A prioridade era sobreviver.
O país está bem melhor. Milhões têm hoje acesso a bens de consumo inimagináveis há 15 anos. Por isso mesmo, não me conformo com a situação de meninas, moças e mulheres que caem na armadilha de parir e interromper estudos que poderiam garantir uma vida mais digna e feliz.
“Ser mulher, para muitas adolescentes, ainda equivale a ser mãe”, afirma a psicanalista Diana Dadoorian, autora do livroPronta para voar, sobre gravidez na adolescência. Para Diana, o problema não é falta de informação. “Nunca antes os jovens tiveram tanta informação sobre contraceptivos.” O problema é falta de educação.
O Brasil não vai se livrar da miséria enquanto não tratar 
das mães adolescentes, pobres e abandonadas
As adolescentes pobres frequentemente só tiram carteira de identidade quando engravidam. Elas desejam esse filho. Se podem cuidar de um monte de irmãos pequenos, podem também ter um filho e se juntar com o namorado. O bebê funciona como um passaporte para a visibilidade, na família e na comunidade. Cruel, mas é assim.
Se o país não ajudar a mulher pobre a planejar sua família, com uma assistência social focada e persistente, não haverá “Minha Casa, Minha Vida” que chegue. Como dar um apartamento a uma família que vai triplicar de tamanho sem renda que a sustente? Nas favelas, fazem puxadinhos, lajes. Nos conjuntos, é impossível aumentar a casa clandestinamente.
Na recente tragédia do Rio, o vice-governador Pezão chegou a uma casa ampla e semidemolida na Favela do Complexo do Alemão. “Moravam sete pessoas ali. A mãe e o pai, a filha grávida de 15 anos com o namorado, o filho de 14 anos, que já era pai de uma bebezinha de 1 ano, e a mulher do filho, com 15 anos”, diz Pezão. Essa família será reassentada num apartamento de dois quartos, com 45 metros quadrados. Estão felizes porque terão uma casa segura e nova para chamar de sua.
Mas por quanto tempo se espremerão nesse espaço? Quantos bebês nascerão? Pelas regras do PAC, essa família não poderá vender o apartamento nos próximos cinco anos. Quem vai fiscalizar? Quem garante que não repassarão o apartamento a um parente e voltarão para um barraco mais amplo, numa encosta de risco? Como esses adolescentes com filhos vão se inserir no mercado de trabalho? Por quanto tempo as meninas continuarão casadas? Em que momento serão abandonadas?
Nenhum país tem casa, escola e emprego para absorver com dignidade tantas famílias que começam antes do tempo, sem maturidade, sem trabalho, sem educação, sem noção e sem renda. Não há subsídio nem esmola que chegue. Sem planejamento familiar, essa conta não fecha.