quinta-feira, novembro 05, 2009

ROBERTO MACEDO

Não há bom PAC sem Papi

O Estado de S. Paulo - 05/11/2009


Em contraste com seu nome, o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal segue em baixa velocidade. Em lugar de assumir a culpa, o que mancharia o currículo de sua candidata presidencial, a ministra Dilma Rousseff, o governo escolheu um bode expiatório, o Tribunal de Contas da União (TCU), acusado de paralisar obras do PAC. O TCU deve ter suas razões. Presumo também que trabalhe por amostragem, e deve ter fiscalizado apenas uma pequena parcela das obras que o governo empacotou no PAC. E desde 2003 o atual governo convive com o TCU. Por que só reclama agora?

O PAC é também marcado pela sua pequena dimensão em face das necessidades nacionais. Outra marca é a sua maternidade, atribuída pelo presidente Lula à mesma ministra. Ora, esta última característica do PAC, mais o seu reduzido tamanho e sua idade, fazem lembrar um Baby PAC.

Para superar seu tamanho diminuto, o PAC precisaria de um Papi, um Plano de Aceleração da Poupança e do Investimento. A poupança é dada pela diferença entre renda e consumo e o investimento é aquela parcela da produção destinada à expansão da capacidade produtiva, na forma, por exemplo, de novas fábricas, máquinas, fazendas e obras de infraestrutura.

Na avaliação dessas duas variáveis, os economistas olham os países por suas taxas de poupança e de investimento como proporção do seu produto interno bruto (PIB). Em cada país, as duas costumam mostrar valores não muito distantes e a crise econômica internacional em andamento serviu para evidenciar a necessidade de o Brasil ampliá-las, pois os países que as têm mais elevadas viram seu PIB cair muito menos que o brasileiro.

Tomando-se a taxa de investimento, na China ela alcança perto de 40% do seu PIB. Com a crise, esse país teve sua taxa de crescimento do PIB reduzida de valores perto de 10% ao ano para cerca de 8% em 2009, conforme as últimas previsões. Na Índia, que investe um valor próximo de 30% do PIB, seu crescimento passou de uma taxa próxima de 8% ao ano para uma previsão perto de 6% neste ano.

Já o Brasil é marcado por taxa de investimento inferior até mesmo à dos países desenvolvidos, onde valores próximos de 20% são comuns. Dado que já são ricos, não precisam investir tanto. Quem os visita percebe claramente, por exemplo, sua infraestrutura muito melhor que a nossa. Numa visão mais geral, são países já construídos.

Há muito tempo neste país - e em forte contraste com a grande e premente necessidade de o seu PIB crescer mais - a taxa de investimento é muito baixa, e caiu ainda mais com a crise. O Brasil é um país em construção, mas com poucas obras, e mal equipadas. Segundo os dados mais recentes do IBGE, no segundo trimestre de 2009 essa taxa de investimento alcançou ridículos 15,7% do PIB, depois de ter alcançado sofríveis 18,5% no segundo trimestre de 2008, vindo de apenas 14,8% no segundo trimestre de 2003!

Em contraste com a China e a Índia, o PIB brasileiro, sem a força de uma taxa de investimento maior, cresceu 5,1% em 2008, causando enorme satisfação a quem se contenta com pouco e não pensa no futuro. O impacto da reduzida taxa de investimento foi mais claro em 2009, em que as previsões para o crescimento do PIB se situam em torno de um valor pouco acima de zero!

Quanto à taxa de poupança, na segunda-feira este jornal publicou ampla matéria sobre o assunto, mostrando que nossa poupança interna, que em 2007 estava em reduzidos 17,5% do PIB, caiu em 2008 para 16,9% e estima-se que este ano ficará em 14,4%. Tal poupança é claramente insuficiente para as nossas necessidades de investir e crescer. Só não leva a um desastre maior porque ainda contamos com a poupança que vem de outros países, a qual subiu de 0,2% do PIB em 2007 para 2% do PIB em 2008, devendo alcançar 1,3% do PIB em 2009. Somando essas duas poupanças, a nacional e a que vem do exterior, chega-se a valores próximos das taxas de investimento mencionadas. E essas de poupança são também muito baixas se observarmos os países que crescem mais. A matéria também calcula que em 2010 a poupança externa subiria rapidamente para 5,3% do PIB, enquanto a interna ficaria ainda menor(!), estimada em 13,4% do PIB.

Assim, no Brasil há esse quadro em que a poupança interna é muito baixa e precisa ser completada pela poupança externa. Mesmo assim, no total é pequena e os investimentos que enseja são muito reduzidos. Uma das razões mais importantes é que os estímulos para poupar no Brasil são fracos. Em particular, muitas pessoas parecem acreditar que cabe ao governo prover suas necessidades em matéria de aposentadoria e saúde, o que ele faz muito mal, exceto para os seus funcionários, que assim têm razões ainda menores para poupar.

Outro grave problema, e também ligado a esse, pois financia a festa de consumo, é a carga tributária muito alta no Brasil, alcançando 36%(!) do PIB. Mas, mesmo assim, o setor público, excluindo estatais, investe muito pouco. Conforme dados de 2007 levantados pelo economista José Roberto Afonso, e objeto de matéria neste jornal em 21/6, com esse setor investindo apenas 1,7%(!) do PIB o Brasil aparecia em penúltimo lugar entre 135 países relacionados segundo essa taxa em ordem decrescente.

Dessa forma, em termos de crescimento do PIB o governo é como uma máquina que com seus impostos retira muito dinheiro de quem poderia investir mais que ele, prejudicando assim esse crescimento. Precisaria poupar e investir mais, além de estimular os cidadãos e as empresas na mesma direção.

É clara, portanto, a necessidade de ampliar nossas taxas de poupança e de investimento. Sem um Papi forte e eficaz o PAC não tem condições de fazer jus ao nome, mesmo tendo sua mãe ao lado de um tutor com faixa presidencial.

Roberto Macedo, economista (USP e Harvard), professor
associado à Faap é vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo

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