quinta-feira, julho 24, 2014

Futuro do empréstimo - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 24/07


Os bancos que estão concedendo o novo empréstimo às distribuidoras estão convencidos de duas coisas: primeiro, que as empresas não vão quebrar porque o governo vai salvá-las custe o que custar; segundo, que esse não é um empréstimo de apenas um ano. Há uma grande chance de o valor ser rolado por dois ou três anos. Estão sendo empurrados pelo governo a assumir esse risco.

A conta ficou tão alta que, qualquer que seja o resultado da eleição, será difícil repassar tudo para a conta do consumidor e das empresas em 2015. A presidente Dilma, se for reeleita, terá ainda mais dificuldade de aprovar o aumento na conta de luz que permita o pagamento dos empréstimos. Eles ficaram altos demais. Chegam agora ao gigantesco valor de R$ 17,7 bilhões.

Os integrantes do governo admitiram aos banqueiros que o cálculo que levou ao pedido de empréstimo de R$ 11,2 bilhões estava errado. Mas garantiram que com esses R$ 6,5 bilhões fecha-se a conta do rombo das distribuidoras de energia em 2014. Há dúvidas sobre isso.

O BNDES também não gostaria de ter entrado na operação. Isso explica a declaração de Luciano Coutinho em Londres de que “se ela (a operação) for feita não será com funding do Tesouro nem com TJLP, mas sim nas mesmas condições dos bancos privados”.

Se o BNDES fosse dar esses recursos com dinheiro do Tesouro e cobrando a TJLP, estaria, na verdade, fazendo mais uma alquimia. O Tesouro está empurrando os bancos para emprestar e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) para se endividar porque é a forma de evitar o impacto desse gasto nas combalidas contas do superávit primário. Se fosse feito com dinheiro do Tesouro via BNDES, ficaria evidente o truque. O BNDES acaba de receber recursos do Tesouro, teria que pedir mais algum.

Fontes que acompanham as negociações informam que o BNDES ainda não encontrou a forma de concessão desse empréstimo que se encaixe em seu estatuto. Não chega a ser empréstimo de capital de giro porque o prazo é longo. “Capital de giro é três meses e isso será de um ano, no mínimo”, disse-me uma fonte. O banco, respondendo a pedidos de esclarecimentos, me disse, através da assessoria de imprensa, que ninguém da instituição falaria sobre a operação antes que ela seja aprovada pela diretoria, e que “não fará qualquer operação que seja contrária aos seus regulamentos internos”. A dúvida que eu tinha é que no mercado se diz que para enquadrar a operação seria necessário alterar o estatuto. Tomara que não se chegue a tal disparate.

O banco está muito exposto ao risco do setor elétrico. Foi o financiador de Belo Monte, financiou o grupo Bertin na sua aventura fracassada na energia. Agora, dará um empréstimo a ser pago com o aumento da conta de luz de 2015 para cobrir rombo das distribuidoras.

O governo preferia que todo o empréstimo fosse concedido pelos bancos privados, mas diante da reclamação deles de que estariam com o risco muito concentrado, decidiu-se que o BNDES também teria que participar com R$ 3 bilhões. Do pool original, BTG Pactual disse que não participaria desta vez porque acaba de fazer uma grande aquisição no exterior; outros dizem que não tinham como negar.

O setor elétrico produz um fio desencapado por dia, e as autoridades dão respostas insuficientes. O ONS comemora a alta do nível dos reservatórios no Sul, mas eles respondem por apenas 7% da energia hidrelétrica produzida no país. O importante é o Sudeste e o Centro-Oeste que fornecem 70%. E nas duas regiões o nível está em 34%. Operador Nacional do Sistema faria melhor seu trabalho se alertasse para os riscos.

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