quinta-feira, abril 21, 2016

A ideologia da corrupção - DEMÉTRIO MAGNOLI

O GLOBO - 21/04

No elenco de financiamentos do BNDES no exterior, destacam-se países carentes de instituições independentes de controle sobre os negócios estatais


Otávio Marques de Azevedo contou a história de um crime em três atos. Cumprindo prisão domiciliar após acordo de delação premiada, o ex-presidente da Andrade Gutierrez expôs, em audiência judicial, na sexta passada, o funcionamento de um esquema de propina ligado às obras da Usina Siderúrgica Nacional da Venezuela. Cada ato tem um protagonista distinto: pela ordem, o então presidente Lula, o glorioso BNDES e João Vaccari Neto, à época tesoureiro do PT. Nos dois atos iniciais, tomados isoladamente, não há crime. Mas a Justiça os investiga à luz do terceiro, que é o grand finale.

O primeiro ato concluiu-se em setembro de 2008, com a assinatura do acordo entre a Andrade Gutierrez e a estatal venezuelana de siderurgia para a construção de um usina no estado de Bolívar orçada em US$ 1,8 bilhão. Pelo acordo, a obra seria financiada pelo BNDES, bancos privados e o governo da Venezuela. Segundo Marques de Azevedo, o triunfo da empreiteira brasileira, que enfrentava concorrentes italianos, decorreu de um acerto entre presidentes: “A Andrade conversou com o Lula, que pediu diretamente ao Hugo Chávez para que olhasse para o Brasil”.

O segundo ato consumou-se em dezembro de 2010, quando o BNDES liberou o financiamento de US$ 865,4 milhões para a obra. Entre 2009 e 2013, o Tesouro transferiu mais de R$ 300 bilhões ao BNDES, obtidos por emissão de títulos de dívida pública, assegurando os capitais que converteram o banco público no “melhor banco de investimento do mundo”, na frase célebre de Eike Batista. A usina venezuelana era apenas mais uma das inúmeras obras beneficiadas por empréstimos subsidiados na América Latina e na África.

O grand finale deu-se no início de 2011, por meio de um ajuste entre Vaccari e a Andrade Gutierrez, que se comprometeu a repassar ao PT uma propina equivalente a 1% do valor do financiamento do BNDES — ou seja, US$ 8,654 milhões. A cobrança da propina não constituiu surpresa: Marques de Azevedo fora comunicado em 2008 pelo então presidente do PT, Ricardo Berzoini, de que a “taxa partidária” de 1% tornava-se uma norma em todos os contratos com o governo, e não apenas nos negócios com a Petrobras.

O ato final da operação siderúrgica na Venezuela é um crime óbvio, de responsabilidade direta de Vaccari. Contudo, os dois atos prévios, que o propiciaram, só serão tipificados como crimes se as investigações revelarem seu nexo material com o terceiro. Previsivelmente, Lula e o BNDES alegam que agiram nos limites da lei e de suas atribuições, desconhecendo por completo a destinação final da parte dos recursos públicos desviada para o PT. Qualquer um tem o direito de acreditar nisso, no saci-pererê, na cuca ou na mula sem cabeça.

O acerto de Lula com Chávez inscreve-se na tradição da “diplomacia de negócios” conduzida por chefes de Estado e governo. Nos anos 1960, o presidente Charles De Gaulle qualificou um primeiro-ministro japonês que visitava países estrangeiros com comitivas de empresários como “vendedor de transístores”. De lá para cá, a prática japonesa disseminou-se nas relações internacionais. Ao menos em tese, Lula pode argumentar, como faz, que operou na Venezuela (e em tantos outros países) pelo bem dos “interesses nacionais”, uma expressão aberta às mais diversas traduções.

No episódio venezuelano, o ato mais interessante não é o primeiro nem o terceiro, mas o segundo. Um compromisso genérico de financiamento do BNDES constou do acordo empresarial firmado em 2008, mas a liberação efetiva de recursos demandou mais de dois anos. Nota do banco garante que a operação “obedeceu a todas as etapas usuais” de análise. No âmbito judicial, uma acusação solicitaria a comprovação de que Lula interferiu no processo decisório do BNDES. Contudo, o ato do banco merece exame no domínio da ciência política.

O BNDES apela ritualmente a um discurso de fundo ideológico para justificar seus subsídios a obras de empreiteiras brasileiras no exterior. Basicamente, o banco diz que gera rendas e empregos no Brasil, além de contribuir com a capacitação tecnológica de empresas nacionais. O argumento, reminiscente do “Brasil-Potência” de Ernesto Geisel, esquiva-se de confrontar o problema econômico do custo de oportunidade dos financiamentos. A União arca com um valor total de subsídios concedidos pelo BNDES em torno de R$ 184 bilhões. Em 2014, os dispêndios da União com pagamentos desses subsídios atingiram R$ 21,3 bilhões, cerca de um quarto do orçamento federal de Educação. Não seria melhor poupar os contribuintes dessa sangria ou, alternativamente, investir esses capitais na tão necessária modernização da infraestrutura brasileira?

Sob o estandarte neonacionalista do BNDES, repousa uma ideologia da corrupção. De fato, a lógica proclamada pelo banco dispensa Lula de interferir explicitamente nos mecanismos decisórios do BNDES, pois a aprovação dos projetos de empreiteiras brasileiras no exterior era quase automática, derivando de uma tradução ideológica do “interesse nacional”. Nesse contexto, a análise dos projetos em colegiados técnicos funciona, essencialmente, como uma mão de tinta fresca destinada a ocultar decisões apriorísticas, adotadas na esfera política.

Vaccari é um acaso deplorável, o bandido oportunista que se esgueirou por uma janela entreaberta no santuário do “interesse nacional”? No elenco de financiamentos do BNDES no exterior, destacam-se países carentes de instituições independentes de controle sobre os negócios estatais. A lista abrange, entre outros, os casos notórios de Venezuela, Cuba e Angola, cujos regimes não precisam prestar contas a ninguém. Nesses países, quantos Vaccaris cobraram, alegres e soltos, o “imposto partidário” sobre os recursos desembolsados pelo banco público brasileiro?

Evidentemente, a Lava-Jato jamais poderá responder a essa pergunta. Com a palavra, o BNDES.

Foi Lula que começou - CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O GLOBO - 21/04

A crise foi produzida meticulosamente pela prática de um típico populismo latino-americano


A presidente Dilma tem razão. Ela não é a única culpada pela crise brasileira. Lula iniciou os estragos.

É difícil marcar datas em política econômica — os erros, assim como os acertos, demoram a aparecer — mas pode-se dizer que Lula começou a introduzir um viés de esquerda-populista por volta de 2005, quando reagia ao mensalão. Nesse ano, em junho, Dilma Rousseff assumiu a Casa Civil, passando a ser um contraponto ao então todo poderoso ministro da Fazenda Antônio Palocci.

Ficou assim: de um lado, a política econômica neoliberal, ortodoxa, tocada pela dupla Palocci/Henrique Meirelles (presidente do Banco Central) e, de outro, a oposição interna, à esquerda, de Dilma. Ao longo do tempo, a balança pendeu para o lado de Dilma, afinal escolhida candidata em 2010.

Essa disputa se materializou em torno de dois temas-chave: superávit primário versus aumento de gastos públicos praticamente sem limite; buscar a meta de inflação de 4,5% versus tolerar inflação mais alta.

Alguns momentos importantes dessa disputa: em novembro de 2005, Dilma produziu relatório dizendo que Palocci estrangulava o governo com seu controle de gastos; logo em seguida, Dilma desqualificou como tosco e rudimentar um plano de ajuste fiscal de longo prazo, defendido por Palocci; em março de 2006 Palocci caiu, substituído por Guido Mantega, aliado de Dilma e que comandaria a “nova matriz”, causa imediata do atual desastre, no primeiro mandato da presidente.

No final do governo Lula, o único pilar da política econômica ortodoxa que permanecia de pé era o BC de Meirelles. A dupla Dilma/Mantega tentou derrubá-lo. Lula quase topou, acabou desistindo. Seria uma complicação inútil, mesmo porque Meirelles entregava inflação em torno da meta e juros baixos para o momento. Com a saída de Meirelles, já no governo Dilma, o populismo imperou sem limites.

E Lula aplaudiu. Ele havia topado a ortodoxia não por acreditar nisso, mas por medo. Iniciou seu governo, em 2003, sob imensa desconfiança. O dólar havia chegado a R$ 4,00 quando ele foi eleito (seria o equivalente hoje a seis reais), houve fuga de capitais, alta de juros e da inflação. A percepção era clara: Lula vai desmontar o Real, a estabilidade fiscal, o regime de metas de inflação.

A montagem de uma equipe super-ortodoxa começou a mudar essa sensação. A ação efetiva dessa equipe — logo de cara produzindo o maior superávit nas contas públicas da era do Real — virou o jogo. A estabilidade deu ganho de renda e permitiu a volta do crédito, com a consequente expansão do consumo. Acrescente aí o boom das commodities — o Brasil exportou duas vezes mais pelo triplo do preço — e Lula nadou de braçada. Sobrou dinheiro, sobraram dólares.

Curioso: sobrou dinheiro para gastar e começar a introduzir o populismo. Lula fez isso de diversas maneiras: aumento do gasto com funcionalismo, tanto com mais contratações quanto com reajustes salariais generosos; aumento real do salário mínimo, que indexa aposentadorias e outros benefícios pagos pelo governo; aparelhamento do Estado e estatais com os companheiros; e distribuição de verbas públicas aos sindicatos e movimentos sociais.

Mas o movimento mais forte se deu no lançamento de um plano megalomaníaco de investimentos tanto do governo quanto de estatais. E empurrou bancos públicos para negócios arriscados e/ou duvidosos.

O melhor exemplo desse desastre está na Petrobras. Em 2008, Lula obrigou a empresa a adotar um programa de construção de quatro refinarias (das quais duas foram abandonadas e duas nem chegaram a um terço, a preço muito maior), ao mesmo tempo em que ampliava sua atuação para outras áreas e na exploração do petróleo.

Ficou assim: a ideologia indicava que se podia aumentar o gasto público sem limite; a má gestão levou a maus investimentos; e a corrupção, de que só soubemos com a Lava-Jato e que vem desde o primeiro mandato de Lula, completou o desastre.

Parecia tudo bem enquanto durou o dinheiro obtido com a estabilidade e o boom das commodities. Dilma achou que estava tão bem que resolveu sepultar de vez o ajuste fiscal e as metas de inflação.

Hoje, diz que era impossível perceber a chegada da crise. Lula também tira o corpo.

Mas esta crise foi produzida meticulosamente pela prática de um típico populismo latino-americano.

Dilma e o STF - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 21/04

Dias Toffoli afirma que processo de impeachment aprovado na Câmara e que agora está no Senado garantiu ampla defesa à presidente; petista, porém, deve repetir a estratégia amanhã na ONU

Ministros do Supremo Tribunal Federal rechaçaram ontem a alegação da presidente Dilma de que o impeachment aprovado na Câmara é um golpe. Argumentando que as regras foram definidas pela Corte e respeitadas pelos deputados, o decano do STF, Celso de Mello, afirmou que a acusação de Dilma é um “gravíssimo equívoco”. Para o ministro Dias Toffoli, o processo assegurou amplo direito de defesa, e alegar golpe agora é uma “ofensa às instituições brasileiras”. Também a ex-senadora Marina Silva (Rede) condenou a estratégia de defesa de Dilma. A presidente, porém, deve repetir o discurso amanhã na ONU, em Nova York. Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, o tucano Aloysio Nunes afirmou que, se ela usar a tribuna da ONU para se defender e voltar a falar em golpe, será um “desserviço ao país”. Antes mesmo de o Senado votar a admissibilidade do impeachment, previsto para o dia 12 de maio, a presidente Dilma pode ser objeto de um inquérito sobre obstrução da Justiça, e o ex-presidente Lula poderá ter sua sorte decidida pelo Supremo Tribunal Federal devido a um processo criminal que nada tem a ver com o julgamento dos mandados de segurança que foi adiado ontem pelo STF.

A situação de Lula continua exatamente como estava: tem foro privilegiado em conexão com a presidente Dilma. Se o Supremo Tribunal Federal só retomar a análise dos mandados de segurança, acrescidos dos agravos regimentais que estão com o ministro Teori Zavascki, depois que o impeachment for aceito pelo Senado, e a presidente for afastada de suas funções, essas ações perdem o objeto quando outro for nomeado para a Casa Civil pelo novo presidente, no caso, Michel Temer.

Provavelmente isso acontecerá, já que não há previsão para o STF retomar o tema, pois o novo Código de Processo Civil ampliou muito os prazos, que agora são contados em dias úteis, o que provoca uma série de atrasos.

A questão da obstrução da Justiça é penal e depende do parecer do Ministério Público. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, está com todos os processos relativos ao ex-presidente Lula, por determinação do ministro Zavascki, desde a investigação sobre o sítio de Atibaia e o tríplex do Guarujá até as interceptações telefônicas, inclusive aquele em que ele combina com a presidente Dilma receber o termo de posse antecipadamente, para usar “se houver necessidade”.

Dentro de poucos dias o procurador-geral deve devolver os processos para o relator Teori Zavascki, e poderá agir de várias maneiras quanto à possível obstrução da Justiça, que tem relação com os mandados de segurança, mas pode ter relação também com a questão penal.

Vai depender de o Ministério Público formular uma representação, pedir um inquérito. Janot pode dizer que há pelo menos indícios de que houve um crime, e pedir a abertura de um inquérito contra a presidente. Nesse caso, vai dizer se esse novo inquérito vai ter que ficar junto com os que estavam lá em Curitiba com o juiz Moro, ou pode liberar a parte do ex-presidente Lula para Moro.

Ou pode não pedir nada contra a presidente, e liberar o resto referente a Lula para Moro. Até hoje, o ministro Teori Zavascki tem concordado quase que integralmente com as posições do procurador-geral da República, e, pelas manifestações de Rodrigo Janot em pareceres sobre o mesmo assunto, o mais provável é que ele peça a abertura de inquérito contra a presidente Dilma. Os processos contra Lula deverão voltar para a jurisdição do juiz Moro em Curitiba.

Sucessão

Outro dia me referi a uma suposta “linha sucessória”, e ontem fui corrigido por um especialista. Na verdade, só existe um sucessor legal do presidente brasileiro, que é seu vice, que o (a) substitui em eventualidades, como agora que a presidente viajou para Nova York, ou o (a) sucede em caso de vacância permanente, se ela for impedida de continuar no cargo pelo Senado. Os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, assim como o presidente do Supremo, não fazem parte da linha sucessória, mas apenas substituem o (a) presidente por um período de no máximo 90 dias, para convocar eleições. Do ponto de vista constitucional, portanto, Michel Temer não terá vice-presidente, assim como Itamar Franco e Sarney não tiveram. Mas, para evitar qualquer susto, é previsível que o Supremo Tribunal Federal tome uma decisão no sentido de retirar da presidência da Câmara Eduardo Cunha, como pede o procurador-geral da República. Além do mais, a interpretação de que ele não poderia assumir a Presidência devido a ser réu no STF, levantada pelo deputado Miro Teixeira, ganha adeptos no Supremo.


Consertar o estrago - ROBERTO FENDT

ESTADÃO - 21/04

Não é pelo lado externo que residem os maiores desafios à retomada do crescimento da economia brasileira

O estrago é grande e há muito por consertar. Os principais indicadores do estrago estavam à vista de todos há muito: a paralisia da economia e o aumento do desemprego; a deterioração dos indicadores sociais; e a trajetória explosiva da dívida pública. A recessão se estenderá por 11 trimestres até o fim deste ano e, caso entre por 2017, será a maior e mais profunda retração econômica da história do Brasil. A correção do estrago depende tanto da evolução da economia mundial quanto da retomada da confiança dos consumidores e investidores.

Ao contrário do que muitos pensavam, a economia global não está tão ruim assim. A Grécia não foi excluída da zona do euro e da União Europeia. O país não provocou a debacle econômica da Euro- pa nem sua crise de liquidez contagiou outros países do continente.

Ao contrário do que muitos pensavam, os países do núcleo duro do G20 estão praticando uma coordenação informal de políticas macroeconômicas. A União Europeia, o Japão e a China puseram em prática políticas monetárias expansionistas para fazer face à crise. O Federal Reserve – banco central dos Estados Unidos – prudentemente reduziu o número de altas da taxa de juros programadas para este ano. Caso não o fizesse, estaria contribuindo para derrotar os esforços das demais grandes economias para retomar o crescimento global.

Ao contrário do que muitos pensavam, a China não se tornou um problema para a economia mundial. O “novo normal” chinês, com a mudança de estratégia de privilegiar o investimento e a produção para a exportação por outra, calcada no consumo interno, está ocorrendo com um soft landing, uma desaceleração suave do crescimento – que ainda se situa, conforme os dados do primeiro trimestre deste ano, na ordem de 6,7% ao ano.

Tampouco a mudança na política cambial chinesa iniciou um processo de “desvalorizações competitivas”. Ajustada a paridade cambial a uma cesta de moedas de seus principais parceiros, o valor do renminbi está flutuando em torno de 6,45 renminbi por dólar. Esse valor não difere muito da paridade cambial de 6,48 vigente nas semanas que se sucederam à desvalorização de agosto do ano passado.

Da mesma forma, após perder US$ 100 bilhões mensais de suas reservas internacionais entre novembro de 2015 e janeiro de 2016, a saída líquida de divisas do país estabilizou-se em torno de US$ 30 bilhões nos dois meses seguintes – perda confortável para quem dispõe de reservas da ordem de US$ 3,3 trilhões.

Incertezas. Nem tudo são flores no cenário externo, contudo, já que incertezas persistem. O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta uma retomada mais saudável da economia mundial somente em 2017. Mas, a despeito disso, o quantum das exportações brasileiras aumentou 37% na comparação de fevereiro deste ano com fevereiro do ano passado – compensando com folga a perda de 19% no índice de preços das exportações.

Não é pelo lado externo, portanto, que residem os maiores desafios à retomada do crescimento. O encaminhamento da solução para a crise política ajuda, por reduzir as incertezas. Ajuda também o fato de as taxas do CDS brasileiro (instrumento financeiro utilizado para compensar o comprador na eventualidade de calote do devedor) terem se reduzido dos 500 pontos básicos, em janeiro de 2016, para a faixa dos 320 pontos, atualmente.

Consertar o estrago passa por resolver os problemas mais imediatos, como restabelecer a confiança dos agentes econômicos de que há luz no fim do túnel. As tão adiadas reformas terão de sair do papel. O crescimento explosivo da dívida pública deverá ser estancado. O investimento privado, retomado.

Tão importante quanto, o novo governante deve ser mais que um gestor; o momento requer um líder. O gestor, por mais competente que seja, decide apenas o que fazer; o líder motiva as pessoas a desejarem o que precisa ser feito. Sem essa liderança, não será possível retomar o diálogo entre o Poder Executivo e o Congresso Nacional, indispensável para passar as medidas que permitirão a retomada do crescimento e do emprego.

Dilma põe interesses pessoais e do PT acima do país - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 21/04

Presidente usa prerrogativa do cargo para, da tribuna da ONU, denunciar um golpe inexistente e, com isso, mancha a imagem do Congresso e do Supremo Tribunal


Em clássico exemplo de ato falho, Dilma deixou escapar que nas eleições se “solta o diabo”. Transcorria 2013 e, no ano seguinte, na campanha à reeleição, ela demonstraria na prática o que entendia pelo termo: aprofundou o uso da contabilidade criativa para mascarar o crescente déficit fiscal, pedalou bilhões ao obter crédito disfarçado em banco público e usufruiu da ácida criatividade contra adversários do marqueteiro João Santana, há algum tempo cumprindo temporada na carceragem de Curitiba. E, no final, deu tudo certo. Em termos, porque ganhou a eleição, mas, devido a alguns dos demônios que liberou, enfrenta processo de impeachment, já aprovado na Câmara e em tramitação para ser julgado no Senado.

A presidente continua colocando o diabo à solta. E cada vez mais, com a decisão extemporânea de viajar para Nova York, a fim de participar da solenidade de assinatura do Pacto de Paris, sobre o clima, na sexta, pretexto para aproveitar o palanque internacional e fazer o discurso mentiroso do “golpe”.

Assim, Dilma assume a postura de dignitários de “repúblicas bananeiras”, tendo um comportamento bizarro perante a diplomacia internacional. Pior: com a própria presidente fazendo ataques à ordem instituída do seu país, contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Ineditismo absoluto — no mau sentido — na História do Brasil.

É evidente que o governo e o PT executam uma estratégia de comunicação a fim de passar a sua versão errada do impeachment para a imprensa estrangeira.

Daí as entrevistas coletivas em que Dilma responde apenas a perguntas de jornalistas estrangeiros. Querem desinformar a imprensa internacional, na impossibilidade de fazerem o mesmo com o jornalismo profissional brasileiro.

A tese do “golpe”, construída como forma de manter a militância mobilizada, saiu da rua e invadiu o Planalto, por meio dos discursos feitos pela presidente em comícios organizados nos salões do Palácio. E foi adiante até se infiltrar na defesa da presidente, brandida no Congresso e no STF pelo advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo.

Agora, a própria presidente se vale da prerrogativa de ser representante máxima do país em fóruns diplomáticos para usar a tribuna da ONU, de maneira oportunista, a fim de tratar de um problema político pessoal e do seu partido.

A diplomacia brasileira sempre foi respeitada no mundo, pela seriedade e o profissionalismo. Agora é usada de forma rocambolesca. Infelizmente, de tudo isso deverão restar arranhões na imagem das instituições do país perante governos e empresas internacionais.

Ministros do Supremo, como o decano Celso de Mello, já se pronunciam contra esta manobra de comunicação do Planalto.

Ontem, ele foi objetivo: “Até agora, tudo (o processo de impeachment) funcionou em perfeita ordem.” Dentro das regras constitucionais.

Mas Dilma e PT parecem acreditar na teoria do nazista Joseph Goebbels de que uma mentira dita mil vezes vira verdade. Mesmo que eles prejudiquem o Brasil.


Dilma perdeu a noção - LUIZ CARLOS AZEDO

CORREIO BRAZILIENSE - 21/04

NAS ENTRELINHAS

Seria ridículo, se a situação não fosse trágica. A viagem da presidente Dilma Rousseff hoje para a assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, com objetivo de utilizar a cerimônia de assinatura do acordo sobre o clima, celebrado em Paris no ano passado, para denunciar a suposta existência de um golpe de Estado em curso no país será um vexame mundial. Há duas semanas o Palácio do Planalto realiza um intenso trabalho de divulgação internacional dessa versão sobre o pedido de impeachment em tramitação no Congresso, para influenciar a opinião pública mundial, seja por meio dos correspondentes estrangeiros, seja mobilizando diplomatas e representantes petistas no exterior.

Dilma pretende fazer um discurso de cinco minutos diante dos demais chefes de Estado, no qual repetirá o mantra de que não existe crime de responsabilidade para a aprovação do seu impeachment pelo Congresso e de que a democracia brasileira está ameaçada, o que é falso. A narrativa obteve certa repercussão internacional porque é difícil mesmo entender o funcionamento das nossas instituições políticas. O Congresso Nacional exerce suas prerrogativas conforme rito definido pelo Supremo Tribunal Federal, cujo presidente, Ricardo Lewandowski, presidirá o julgamento do impeachment no Senado. A versão de "golpe parlamentar", mesmo assim, será reforçada junto aos principais líderes mundiais, como o presidente norte-americano, Barack Obama, e a primeira-ministra alemã, Angela Merkel.

Ironicamente, quem assumirá a Presidência durante a viagem será o vice Michel Temer, que Dilma acusa de golpista e traidor, o que torna situação ainda mais ridícula, pra não dizer kafkiana. É tão sem sentido que o vice-presidente pretende permanecer em São Paulo, para não fazer um mise-en-scène, no mínimo, constrangedor. Essa pantomina, que desmoraliza o Brasil externamente, porém, joga por terra o discurso petista de que a mobilização popular contra o governo, que foi iniciada nas manifestações de 2013, seria obra da direita fascista, apoiada pela mídia e financiada pelo imperialismo, de olho no petróleo da camada pré-sal e nas demais riquezas nacionais.

Ontem, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, reiterou que os procedimentos do processo de impeachment respeitam a Constituição. Segundo ele, Dilma exerce em plenitude as atribuições constitucionais de seu cargo, que "lhe dá legitimidade para atuar no plano internacional", mesmo desgastada pela aprovação da abertura do processo de impeachment pela Câmara, por 367 votos a favor do impeachment, 137 contra, além de sete abstenções e duas ausências. Celso de Mello disse, porém, que oSupremo Tribunal Federal, "ao julgar uma Arguição de Descumprimento de preceito Fundamental, deixou claro que o procedimento destinado à abertura do processo de impeachment observa os alinhamentos ditados pela Constituição da República."

A narrativa petista do golpe, que mobiliza os militantes petistas e parcela da esquerda, começa a constranger os ministros do Supremo Tribunal Federal(STF). Ontem, a Corte adiou o julgamento da ação que suspendeu a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil (medida liminar do ministro Gilmar Mendes), a pedido do ministro-relator da Operação Lava-Jato, Teori Zavascki, que pleiteou mais tempo para examinar duas outras ações sobre o mesmo assunto, uma do PSDB e outra do PPS.

Desmanche
O parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre a liminar de Gilmar Mendes é favorável à anulação da nomeação de Lula para a Casa Civil e recomenda que as investigações da Operação Lava-Jato sobre o ex-presidente sejam remetidas de volta para o juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba. A decisão do STF, em sessão brevíssima, foi previamente combinada entre os ministros e sinaliza que a Corte pretende aguardar a decisão do Senado sobre a admissibilidade do pedido de impeachment, que resultará no afastamento da presidente Dilma Rousseff por 180 dias, para decidir o destino de Lula.

Enquanto Dilma viaja, o governo se desmancha. Os ministros Eduardo Braga (Minas e Energia) e Hélder Barbalho (Portos) entregaram os cargos ontem, apesar dos apelos da presidente. Com isso, nove ministérios estão sem titular: Aviação Civil, Casa Civil, Cidades, Ciência e Tecnologia, Esporte, Integração Nacional e Turismo. Para complicar a situação, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, perdeu completamente o controle sobre a situação fiscal, descumprindo a meta de superavit fiscal de 0,5% do PIB. Se o Congresso não autorizar um deficit primário de 1,55% do PIB, equivalente a R$ 96 bilhões, o governo não poderá pagar fornecedores e funcionários, ou seja, depois de quebrar o país, Dilma levou seu governo à falência.

A exportação do vexame - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 21/04
Se a presidente Dilma Rousseff realmente levar adiante a ameaça de aproveitar uma reunião de líderes mundiais amanhã na sede da ONU para dizer-se vítima de “golpe”, que é como ela e os petistas chamam o processo constitucional de sua destituição, protagonizará o maior vexame que um chefe de Estado brasileiro terá dado no exterior em toda a história do País.

Como se não bastasse o constrangedor escarcéu criado pelo marketing embusteiro do PT a respeito da alegada ilegalidade do impedimento de Dilma – tese sustentada mesmo diante do fato cristalino de que o processo está seguindo rigorosamente o que manda a Constituição, sob as bênçãos de um Supremo Tribunal Federal constituído majoritariamente por ministros indicados por presidentes petistas –, agora a presidente pretende “exportar” a tese segundo a qual forças malignas se articularam para atraiçoá-la e afastá-la do cargo.

A oportunidade para isso, segundo informam os auxiliares da presidente, será a cerimônia de assinatura do Acordo de Paris sobre Mudança do Clima. Ou seja, Dilma está disposta a reduzir uma solenidade de tamanha importância histórica, em que chefes de Estado de todo o mundo firmarão o compromisso com o combate à mudança climática, a um reles palanque para seu esperneio. Dilma poderia encerrar sua carreira política de maneira menos desonrosa, sem expor o Brasil a tal opróbrio.

O esforço para que a versão a respeito do “golpe” seja levada a sério por governos e pela opinião pública de outros países faz parte de uma tentativa espúria de fazer equivaler o processo de impeachment contra Dilma às práticas do regime de exceção instalado em 1964. Naquela época, a resistência à ditadura alimentou a opinião pública internacional com informações sobre a tortura e a censura no País, do que resultou uma crescente pressão de governos importantes, como o dos Estados Unidos, contra o regime militar. Fiel à delirante imaginação petista, é esse tipo de reação que Dilma espera conseguir agora, embora os brasileiros gozem de todas as liberdades e direitos democráticos.

Os tempos, evidentemente, são outros e, embora se possa fazer ressalvas à qualidade das instituições, o fato é que vige no Brasil a plena democracia, que permite inclusive que Dilma e seus truculentos apoiadores pronunciem as asneiras que bem entenderem. Portanto, não surpreende que nenhum governo estrangeiro de respeito tenha, até agora, dado ouvidos às ridículas denúncias dos petistas. Restou, para consolo da tigrada, o apoio do gerontocrata de Cuba, Raúl Castro, e de Nicolás Maduro, o arremedo de caudilho que arruinou a Venezuela.

Mesmo assim, Dilma não esmorece em sua campanha para envergonhar o Brasil. Sempre que pode, concede entrevistas a correspondentes estrangeiros, na esperança de fazê-los acreditar que há uma conspiração em curso no País. Na última dessas entrevistas, Dilma atribuiu a crise atual a um “processo de desestabilização” orquestrado pela “oposição derrotada” e disse que há no Brasil um “veio golpista adormecido”. Segundo ela, “o impeachment sistematicamente se tornou instrumento contra presidentes eleitos” desde Getúlio Vargas.

Com isso, Dilma comete o despautério de dizer que o impeachment é necessariamente um instrumento golpista, embora tenha previsão constitucional. Ademais, se o recurso ao impeachment de um presidente é “golpe”, como sugere Dilma, então o PT, que defendeu o afastamento de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, é a vanguarda do golpismo nacional.

Enquanto Dilma enxovalha o Brasil lá fora, aqui dentro o PT, fiel a seu espírito autoritário, trata de reafirmar sua disposição de derrubar um eventual governo de Michel Temer. O presidente do partido, Rui Falcão, avisou que o PT “não vai permitir” que Temer governe. “É muito mais do que oposição parlamentar só. É dizer para a população que, com um governo ilegítimo, não tem paz, não tem tranquilidade, tem luta”.

Trata-se de uma anunciada tentativa de golpe contra o sucessor constitucional de Dilma, caso esta venha a ser impedida. Isso, sim, deve ser denunciado mundo afora.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

JUSTIÇA DOS EUA QUER DILMA EXPLICANDO ‘PETROLÃO’

Se não tivesse imunidade diplomática, ao desembarcar em Nova York nesta quinta, 21, a presidente Dilma seria chamada a explicar à Justiça americana seu comportamento omisso na presidência do conselho de administração da Petrobras, enquanto ocorria o “petrolão”, um dos maiores esquemas de corrupção já vistos no mundo. O Itamaraty teve de atuar para evitar uma saia justa: o indiciamento da presidente, com base nas reformas de regras de Wall Street após a crise de 2008.

COMPRA CRIMINOSA
Justiça dos EUA apura a compra criminosa da refinaria de Pasadena: avaliada em US$ 42,5 milhões, custou US$1,3 bilhão ao Brasil.

ELA SABIA
Depoimentos na Lava Jato, como o ex-diretor Nestor Cerveró, mostram que Dilma sabia da negociata em curso para a compra de Pasadena.

GATUNAGEM
Tramita na Corte Federal de NY uma class action (ação conjunta) de investidores contra prejuízos causados pela gatunagem na Petrobras.

INDENIZAÇÃO
Nessa class action, investidores internacionais exigem da Petrobras indenização total de US$ 98 bi, equivalentes a R$ 350 bilhões.

PRIORIDADE DE TEMER É DEFINIR 5 MINISTROS CAPITAIS
Michel Temer estabeleceu como prioridade a definição dos ministros da Economia, Banco Central, Casa Civil, Defesa e Justiça, confirmando-se sua posse em 12 ou 17 de maio, possíveis datas para o Senado instaurar o processo, obrigando Dilma a se afastar do cargo. Esse grupo de ministros precisa estar pronto para assumir o poder com ele, no mesmo dia. Mas a ideia é tomar posse com todo o novo ministério.

PRIORIDADE ZERO
A maior preocupação de Temer e seu “núcleo duro” são os rumos da economia. Pretendem lançar um plano de recuperação o quanto antes.

NOTÁVEIS
Ainda não há definição, apenas consultas. Murilo Portugal, Henrique Meirelles e Gustavo Franco são fortes para o Ministério da Economia.

BANCO CENTRAL
Para o Banco Central, Temer sonda muitos nomes, incluindo a permanência do atual titular do cargo, Alexandre Tombini.

A VINGANÇA DO ITAMARATY
Deve ser retaliação ao impeachment: o Itamaraty designou Américo Fontenelle para cuidar do relacionamento com o Congresso. Ex-cônsul em Sidney, foi afastado sob acusação de assédio moral e sexual.

DUPLA SERTANEJA
O diplomata Américo Fontenelle fará dupla, na assessoria do Itamaraty no Congresso, com João Carlos Gomes, chamado de “João do Pulo” pelo serpentário pelas supostas “caronas” nas promoções da carreira.

TÔ FORA
“Caititu fora de bando vira comida de onça”, disse o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), pai do ministro Hélder (Pesca), desembarcando do governo Dilma. E ficando livre a votar pelo impeachment no Senado.

DILMA NA FRIGIDEIRA
Senadores foram chamados ao 4º andar do Planalto para uma reunião com Ricardo Berzoini (Governo) e José Eduardo Cardozo (AGD). Queriam saber a temperatura do impeachment. O governo frita.

AUTOESTIMA É TUDO
O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) continua com autoestima elevada. Após garantir que nada faria que manchasse sua reputação, disse que não dará motivos para ser chamado de “canalha”.

DESISTÊNCIA
Com suspensão do julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre a posse de Lula na Casa Civil, ganha força no PT a recomendação para que o ex-presidente desista do cargo antes de uma negativa do STF.

SAÍDA PREPARADA
Um dia após a aprovação do impeachment na Câmara, a Presidência da República abriu licitação para compra de 15 mil litros de combustível para abastecer a “frota de veículos oficiais” da Segurança Presidencial em... Porto Alegre, terra da presidente Dilma, onde tem casa e família.

ADIÓS, CHICOS
Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) ironiza a viagem de Dilma a Nova York. “Ela tenta reescrever a história, fazendo-se de vítima. Talvez seja a última oportunidade de dar tchau à ditadura dos irmãos Castro”, diz.

PENSANDO BEM...
...como a imprensa do EUA nunca dá espaço a presidentes de 3º mundo, Dilma vai gastar uma fortuna na viagem a Nova York para ter seu discurso que só vai repercutir... no Brasil.