sábado, março 31, 2012

Viúvas da ditadura - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 31/03/12
Um avião de propaganda vai circular hoje na orla carioca saudando o golpe militar de 1964.
Foi contratado pelo grupo de coronéis da reserva que também organiza os saltos de para-quedas hoje na Praia da Barra.

Em tempo
Tomara que tudo transcorra sem incidentes como convém numa democracia, regime de governo golpeado há 48 anos.

Enfim, livres
O juiz Vigdor Teitel, da 11 a-Vara Federal, decidiu que os técnicos de futebol não têm que prestar contas aos Conselhos Regionais de Educação Física.
Em São Paulo, teve fiscal do conselho entrando em campo para expulsar técnico que não fosse vinculado à entidade.

Tá podendo
Dilma, na viagem dia 9 aos EUA, dará palestras em Harvard e no MIT, em Massachusetts.

No mais
De Chico Alencar, um dos maiores frasistas do Congresso:
— Não é pra demonizar o DEM do Demóstenes, mas, a esta altura, nem banho de “Cachoeira”, muito menos de “Arruda”, limpa a sua imagem. O senador, envergonhado, parece aquele de quem “Agripino” (Grieco, não Maia!) dizia: “Passou a vida correndo atrás de uma ideia, mas não conseguiu alcançá-la.”

A melhor amiga
O selo Lua de Papel, do grupo LeYa, comprou os direitos de publicação do best-seller “Queria que estivesse aqui”, do americano Pete Nelson.
O livro fala da amizade entre um homem e sua cadela, que até lhe dá conselhos. Sai em abril.

Anita, de volta
Anita Prestes, filha de Luís Carlos Prestes, é, digamos, osso duro de roer.
Ela atirou ontem no PCdoB que, na véspera, no programa de TV, associou a imagem de seu pai ao partido.

Segue...
Anita diz que o PCdoB foi criado em 1962 após cisão com o PCB e com Luís Carlos Prestes.
Para ela é inaceitável ligar a imagem do pai “a um partido que apoia o novo Código Florestal e que é absolutamente acrítico às medidas neoliberais dos governos Lula/Dilma, imerso em denúncias de corrupção”.
É. Pode ser.
Trama diabólica
Parece novela. Um morador do Península, na Barra, foi preso acusado junto com dois PMs de matar uma pessoa conhecida de olho num seguro de vida de R$ 2 milhões.
A vítima foi envenenada, mas resistiu. O “falso amigo”, então, a asfixiou dentro de um carro.

Pedófilo da Tijuca
A 2 a- Câmara Criminal do Rio negou, por unanimidade, a reforma da sentença dada a Paulo Maurício de Lima Barcelos, acusado de abusar sexualmente de cinco crianças em uma creche, da qual era dono, na Tijuca.
A pena é de 9 anos.

Peixe fora d’água
O ministro da Pesca, Marcelo Crivella, inaugurou ontem uma escola de música na Igreja Metodista do Morro da Providência.
Quando começou a tocar a música “Peixe vivo” (aquela que diz: “Como pode um peixe vivo viver fora da água fria”), o ministro começou a rir.

Temporão Callado
Está na reta final a produção do CD “Primeira nota”, de João Callado e Fernando Temporão, filho do ex-ministro da Saúde.
Há participações, entre outros, de Tereza Cristina, Marcos Sacramento e Soraya Ravenle.

Duplo sentido
Martinho da Vila almoçava com Ingrid Guimarães, na Feira de São Cristóvão, após dar entrevista ao programa dela no GNT, quando a bela desabafou atacando um prato de rabada:
— Hoje em dia, Martinho, a mulher dizer que gosta de rabada é falta de educação.
Há controvérsia.



ANGÉLICA MOSTRA hoje, em seu programa “Estrelas”, na TV Globo, a visitinha que fez ao consultório odontológico de Carlos Machado, o ator que viveu o vilão Ferdinand na novela “Fina estampa”. É que, como se sabe, o moço tem dupla identidade. Mas nenhuma secreta. Ele também é dentista e sócio da Beauty Dental Clinic, em Copacabana. Quando não está gravando, é lá que Carlos passa suas tardes

Nudez - SÉRGIO TELLES


O Estado de S.Paulo - 31/03/12


O comportamento compulsivo incide muitas vezes sobre atividades reprimidas, censuradas e passíveis de punição legal, como o jogo, o sexo, o uso de drogas. Por esse motivo, os que incorrem em tais práticas tão proibidas podem ser vistos como detentores de invejáveis ousadia e liberdade pela maioria cumpridora de deveres e submetida às sanções socialmente estabelecidas. E está aí o paradoxo da compulsão, pois aquelas pessoas são tudo, menos livres e ousadas. Estão acorrentadas à repetição incessante do mesmo desempenho que jamais lhe proporciona a tão buscada satisfação.

Não se pode esquecer que a droga, o sexo e o jogo são negócios geradores de uma forte economia paralela negada pelo mercado oficial. Se isso ocorre é por atenderem a uma realidade humana cuja complexidade não é reconhecida adequadamente, motivo do fracasso das medidas tomadas em relação a eles, como mostra o suposto combate internacional ao tráfico de drogas.

Não se trata de substituir a hipocrisia moralista por um diagnóstico médico ou psicológico, e sim de não negar o sofrimento dos praticantes de tais atividades e as consequências danosas que elas têm sobre suas vidas, como bem mostra o filme Shame, de Steve McQueen, com Michael Fassbender no papel de um compulsivo que vive em Nova York. Como era de se esperar, para ele o sexo nunca é a via para o prazer e sim o aguilhão que o conduz à procura de um gozo mortífero. As razões do desespero que inutilmente procura esconder atrás de sucessivos orgasmos são evocadas pela irmã frágil e suicida, que insinua um passado familiar traumático.

O filme teve nos Estados Unidos um inesperado efeito colateral decorrente dos momentos do nu frontal de Fassbender, gerador de muitos gracejos. George Clooney deu o tom da gozação ao mencionar, num programa de televisão de grande audiência, que Fassbender poderia jogar golfe sem taco, bastando mover o corpo de um lado para outro. Outros colunistas disseram que Fassbender não fora indicado para o Oscar por "inveja do pênis" por parte dos membros da academia...

Aproveitando a deixa, James Wolcott, colunista da revista Vanity Fair escreveu um divertido artigo, The Hung and the Restless, uma espécie de história do pênis no cinema americano. Nele lista os filmes em que o tabu do nu frontal masculino foi derrubado, entendendo a diferença no trato da nudez de cada um dos sexos como decorrente do fato de vivermos numa sociedade machista, na qual o corpo da mulher é objeto de desejo fetichisado e a nudez masculina suscita pânico homossexual, leitmotiv de infindáveis piadas entre os homens.

A meu ver, a crescente tolerância com a nudez nos filmes de Hollywood não pode ser dissociada da liberação da pornografia proporcionada pela internet. O número impressionante de acessos aos sites pornográficos evidencia o apelo que esse material tem frente ao público, especialmente o masculino, fazendo com que os cineastas se sintam mais seguros de acrescentar em seus filmes ingredientes dali provenientes. É o que ocorre com Shame. A roupagem mainstream - grande produção, bons atores, roteiro sofisticado e "sério" - mal esconde a realidade de um soft porn caça-níqueis.

Mas essa não é uma questão simples. A linha divisória entre pornografia e criação artística é difícil de traçar, sujeita que é a sutis determinações socioculturais. É o que mostra o uso da nudez na arte. Exaltada por gregos e romanos, a nudez entrou em relativo ostracismo com a implantação do cristianismo, voltando à cena com estardalhaço na Renascença. Michelangelo foi acusado de obscenidade e imoralidade ao expor o afresco O Julgamento Final na Capela Sistina, desencadeando um movimento de censura que exigia a remoção ou dissimulação das partes pudendas das figuras nuas ali pintadas.

O que teve início com Michelangelo cristalizou-se no Concílio de Trento, quando, entre tantas outras deliberações, ficou estabelecido que nada que pudesse estimular a concupiscência e a luxúria poderia ser exposto na arte patrocinada pela Igreja. Em outras palavras, a nudez estava definitivamente banida e condenada. Na bula papal de 1557, Paulo IV tornou obrigatório o uso de folhas de figueira para esconder os genitais das imagens pintadas ou esculpidas antes da proibição. A medida foi aplicada com empenho pelos papas Inocêncio X (1574-1655) e Clemente XIII (1693-1769).

Essa zelosa atitude foi retomada por Pio IX (1792-1878). Sob seu comando, todos os mármores da antiguidade clássica existentes no Vaticano tiveram seus falos destruídos e por cima das mutilações foram colocadas as folhas de figueira. Episódio semelhante ocorreu em 1897, quando a rainha Vitória foi presenteada pelo grão-duque da Toscana com uma réplica idêntica do David de Michelangelo. A estátua deixou a rainha escandalizada, motivo de sua imediata remoção para o museu de Kensington Gardens, onde foi providenciada uma folha de figueira que deveria ser colocada em defesa do pudor das damas que eventualmente aparecessem por ali em visita.

Se tudo isso nos parece lamentável e risível é por não atentarmos para o fato de que, de certa forma, resquícios dessa atitude persistem na atualidade, como estamos vendo nas repercussões em torno do nu frontal de Fassbender.

Em nossa cultura, a nudez feminina é corrente, chega a ser banalizada, o que não ocorre com a masculina, que continua sendo objeto de uma repressão maior. Isso se deve aos aspectos machistas apontados por Wollcott. O próprio machismo é um dos incontáveis efeitos imaginários da diferença anatômica existente entre os sexos, tal como Freud mostrou. As consequências psíquicas inconscientes dessa diferença não podem ser menosprezadas. Ter ou não ter o falo assume um papel de extraordinária importância no mundo mental de homens e mulheres. Símbolo de força e potência vital criadora, invejado e atacado, ameaçado permanentemente com possibilidade da castração, o falo ora se confunde com o pênis e se exibe orgulhosamente, ora se oculta misterioso atrás de folhas de figueira, panos e véus, afirmando uma mística e transcendente inacessibilidade, recusando-se a ser equiparado a um mero e vulgar órgão sexual masculino. Será por causa da forte carga significante do falo que a nudez masculina é mais censurada que a feminina?

O Ministério da Justiça acaba de lançar um Guia Prático da Classificação Indicativa estabelecendo o que crianças e adolescentes podem ver na televisão e no cinema. Fica ali liberada a nudez, desde que ela seja "sem conotação sexual". Entende-se a intenção do Ministério em proteger crianças e menores, mas será possível dissociar o nu do sexual, do erótico? Não é a nudez que expõe a animalidade do corpo, as vergonhas da carne, a diferença dos sexos? Poderá ela algum dia ser vista com naturalidade? Estaria o Concílio de Trento totalmente equivocado ao atribuir à nudez o estímulo à luxúria e a concupiscência?

Bruxa do 506 x Trombadinha do T03 - JORGE BASTOS MORENO

O GLOBO - 31/03/12

lTranscrição resumida e editada do debate entre as feras:
SRA. CLARISSA GAROTINHO — ( ...) O fato é que ela é desrespeitosa mesmo. Chamou os meus irmãos de pivetes e a mim de trombadinha. Aqui, na Alerj, tem a “Bruxa do 506”, apaixonada pelo Sr. Cabral, querendo fazer todas as vontades dele e perseguindo os deputados de oposição.
A SRA. CIDINHA CAMPOS (Pela ordem) — Não vou falar da trombadinha, mas do pai dela, o trombadão. (...) A trombadinha...
A SRA. CLARISSA GAROTINHO — Eu não vou aqui ficar discutindo com pessoas insanas. Ela chama a todos de loucos. Louco e insano é quem atenta contra a própria vida. Fico com receio de discutir com ela, e ela resolver cortar os pulsos novamente.
A SRA. CIDINHA CAMPOS — Sr. presidente, quem vai falar agora é a “Bruxa do 506”, mas é melhor ser a “Bruxa do 506” do que a “trombadinha do T03”. ( ...) Eu era quase uma adolescente que, por amor, cortou os pulsos. As marcas ficam (estão aqui até hoje), mas o aprendizado também. E isso não quer dizer que eu seja doida, porque os canalhas não se matam. Aliás, os canalhas vivem muito. Portanto, na família Garotinho, isso não vai acontecer.

Are baba!
Dilma desembarca hoje da Índia.

E já tem reunião neste domingo com seus ministros.

Sob medida
Em Demóstenes Torres homenageio Mestre Millôr sobre o político prevaricador:

“Com o passado que tenho, aceito qualquer presente.”

Galho
Wilder Pedro Moraes, empresário da construção civil, é o suplente que poderá assumir o Senado se Demóstenes renunciar.

Só que Moraes está preso no mesmo galho.
Atualmente secretário de Infraestrutura de Goiás, o suplente foi sócio de Carlinhos Cachoeira.

Hoje, Cachoeira e Moraes são inimigos viscerais.
É que o contraventor estendeu a sociedade, à revelia do empresário, tomando-lhe a mulher, com quem hoje é casado.

Evento
Lula, que não é bobo nem nada, quer retornar triunfalmente à política.
E pretende fazê-lo unindo Marta e Haddad na campanha eleitoral em São Paulo.

Teimosia
Todo mundo fica paparicando a Marta, na esperança de que ela apoie Haddad.
A senadora relutante fará parte da visita de Dilma a Obama, como convidada especial da Presidência da República.
Não adianta esse salamaleque todo!
A Marta quer é um ministério só para ela.

Apresentação
Transcrevo ao lado trechos de um debate entre as deputadas Cidinha Campos e Clarissa Garotinho no plenário da Assembleia Legislativa esta semana.
Clarissa se refere à colega como “bruxa”, e Cidinha, a ela como “trombadinha”.

Lista dos mortos
E Cidinha leu a lista:
“Aristóteles, Antero de Quental, Camilo Castelo Branco, Florbela Espanca, Getulio Vargas, Hemingway, Judy Garland, e Maiakovski:
Provavelmente, a ‘trombadinha’ do ‘T03’ nunca tenha lido nada disso. Mário de Sá-Carneiro se suicidou; Pitágoras! Eu até lembrei. Pitágoras fez o Teorema do Sistema Decimal: o quadrado da hipotenusa. Ela vai confundir com o obtuso ao quadrado, que é outra coisa: esse é o pai dela!
Tem ainda Santos Dumont, Stephen Wike, o idiota do Sócrates, tem Tchaikovsky, tem Virgínia Woolf.
Para desgraça da ‘Trombadinha’ do ‘T03’, eu sobrevivi. Se não, estaria aí, incólume, falando o que quisesse, se achando bonitinha, de uma família que só tem prestado maus serviços à população, deixado um rastro de agonia pelo Estado do RJ.”

(a transcrição na íntegra, no blog Rádio do Moreno)

Datas
Graças ao ex-ministro Nelson Jobim, o 31 de Março, aniversário do golpe, foi banido do calendário deste país democrático.

Só fica mesmo o niver da produtora Paula Lavigne.

‘S’il vous plaît’
Por falar em calendário, quando Dilma pediu ao Eduardo Paes a decretação de ponto facultativo nos três dias da Rio+20, Cabral quase desmaiou com a resposta afirmativa do prefeito:

— Depois a gente repõe. Implorou o viajante:

— Faça, não! Meus dias em Paris já são tão curtos...

Requisito
Dilma insiste em botar dona Luiza, a do Magazine, no Ministério das Pequenas Empresas, que ainda está no papel. O PT quer Okamoto. Um deles argumentou:

— Ela não gosta de falar! E Dilma:

— Por isso mesmo.

Na chincha - SONIA RACY

O ESTADÃO - 31/03/12


O Procon-SP convocou as 38 empresas que mais geraram queixas ao órgão em 2011. Quer que assinem um plano de metas para reduzir a quantidade de reclamações.

As empresas têm de responder esta semana ao órgão se participarão do esforço – que, a princípio, vai durar um ano.

Bem calculado
Em lançamento de livro, semana passada, em Brasília, Chalita encontrou-se com Ricardo Lewandowski, presidente do TSE, e atirou: “O senhor vota onde?”.

Surpresos com a pergunta, pessoas que estavam na roda da conversa, inclusive Dias Toffoli, alertaram que o candidato àPrefeiturade SPpoderia ser acusado de propaganda eleitoral antecipada.

Chalita despistou, arrancando risos: “Mas eu não pedi voto!”.

Calculado 2
Aliás, Chalita, que foi seminarista, e Toffolli, que tem um irmão padre, conversavam longamente sobre a história da Igreja Católica.

Papo vai, papo vem, Chalita propôs escreverem um livro juntos sobre o assunto. O ministro do STF não respondeu.

Oinc oinc
Mapa do voto da prévia tucana registrou: 130 militantes saíram de casa para... votar em branco ou nulo. “É muito espírito de porco”, esbravejou Fábio Lepique.

Tenda dos Milagres
Está quase tudo pronto para a exposição de Jorge Amado no Museu da Língua Portuguesa. A mostra reunirá livros, documentos e até as camisas floridas do baiano.

A ambientação contará com garrafas de dendê, fitas do Bonfim e cacautorrado. Abre dia 17. Recordista Ponto para Carlito Carvalhosa. Dados do último The Art Newspaper apontaram que sua instalação Sum Of Days foi a segunda mais vista este ano no MoMa, de NY.

Entusiasmado, o artista prepara exposição na Galeria Nara Roesler. Ainda este ano.

Papa y papá
Fidel Castro levou a mulher, Dalia, e dois de seus filhos para conhecerem Bento 16. Ao final do encontro, pediu ao pontífice que lhe desse algumas dicas de livros.

O Papa garantiu que pensaria no assunto... e que, do Vaticano, enviaria uma listinha.


Apagar luzes e acender ideias
Hoje é dia da Hora do Planeta, da WWF. O movimento prega desligar as luzes das 20h30 às 21h30 em todo o mundo. No ano passado, o evento conseguiu a adesão de nada menos que 123 cidades no Brasil. O ato de apagar as lâmpadas é um libelo contra o aquecimento global e os problemas ambientais que a humanidade enfrenta.

Álvaro de Souza, da WWF Brasil, dá exemplos de quem vai apagar o quê por aqui. No Rio, ficarão às escuras a orla de Copacabana, os Arcos da Lapa, o Monumento aos Pracinhas, a Igreja da Penha, o Cristo Redentor e a Catedral Metropolitana. Em São Paulo, Ponte Estaiada, Obelisco, Estádio do Pacaembu e Arcos do Anhangabaú experimentarão o breu. E a Rio+20 influi: “Acho que teremos mais força”.

O Código Florestal será votado antes da Rio+20?

Difícil dizer. As mudanças dos líderes foi um sinal claro de que o governo não estava satisfeito com a qualidade das negociações. E dividiu parte da bancada ruralista. Como a presidente Dilma sentiu a pressão interna e externa contra, acenou para os descontentes a possibilidade de não votar nada antes da Rio+20.

Qual o principal defeito do novo Código Florestal?

Primeiro, ainda não existe uma nova lei. Existem duas propostas, que podem ser votadas como estão ou serem recortadas para montar uma terceira proposta. A outra coisa é o que chamamos Novo Código. É o que está vigente. O original era dos anos 30. Agora, não concordamos com as linhas gerais de ambos. Anistiar quem desmatou ilegalmente até 2008 e reduzir as áreas de preservação permanente faz com que tenhamos a certeza de que este é mesmo o país da impunidade.


E a principal virtude?

Não há nenhuma. Passou-se a ideia de que, se não mudar a lei atual, ficaremos sem comida. De que os pequenos é que precisam que a lei mude, de que havia um consenso entre “ruralistas” e “ambientalistas” quanto à proposta do Senado, de que vai haver um reflorestamento gigante no País. E que, no fundo, no fundo, tudo isso não passa de uma chatice dos que não querem ver o Brasil crescer, porque estão vinculados a empresas internacionais.

O Brasil está atrasado na Rio+20? 

Difícil saber se o atraso é da ONU, do Brasil ou de ambos. Ainda não se sabe o formato definitivo das reuniões que antecedem a conferência e que vêm sendo chamadas de reuniões da sociedade civil, só que com o governo escolhendo nomes. Sequer se sabe se haverá algum documento final.

Lenta construção - LUÍS EDUARDO ASSIS


O ESTADÃO - 31/03/12
O recurso à generalização é um dos artifícios comuns no esforço retórico de se rebater um ponto de vista. Para qualquer discussão, é sempre tentador desqualificar o argumento oposto lançando mão da ideia de que aquilo que se propõe é apenas parte do todo, algo provisório e incompleto. Sempre, por definição, a causa-raiz de um problema pode ser mais ampla, mais abrangente e estar encaixada numa verdade maior. Tudo é incompleto e parcial. Parece ser esse o viés que marca as discussões recentes sobre as medidas que buscam proteger a indústria de transformação da concorrência predatória dos produtos importados.

A crítica de que as iniciativas são tópicas e paliativas passa por cima de alguns pontos essenciais. Em primeiro lugar, convém não esquecer que o "tsunami" monetário que despejou uma bacia amazônica no mercado de moedas e sustentou uma valorização de quase 30% na taxa de câmbio efetiva real nos últimos três anos pode ser uma maldição para a indústria brasileira (que se beneficia dela apenas pelo barateamento dos insumos importados), mas, sem esse choque no preço dos produtos importados, não há como imaginar o forte crescimento dos últimos anos.

A valorização cambial que atormenta a indústria é a mesma que permitiu que o avanço do PIB não se convertesse em inflação mais alta. Portanto, não há escolhas fáceis a esta altura. É possível, sim, promover a desvalorização do câmbio e "ganhar" a guerra cambial. Mas isso vai pressionar a inflação, erodir os salários reais e irritar os eleitores - e assim não vale.

Outro ponto a ser lembrado é que nas atuais condições do nosso bizarro presidencialismo de coalizão não existe simplesmente nenhuma condição de levar adiante uma agenda de reformas estruturais que ataquem as questões de fundo e acelerem a produtividade. A lista das "verdadeiras soluções" é conhecida e inclui uma reforma fiscal que desonere a produção; a redução das despesas governamentais para a formação de poupança; o estímulo à inovação tecnológica; a revisão do sistema previdenciário; e a reorientação do sistema educacional com o objetivo de qualificar a mão de obra. Ora, não só esses objetivos podem ser contraditórios entre si, como não há, do ponto de vista da sociedade como um todo, um mínimo de consenso sobre sua oportunidade, para não falar de sua urgência.

Decerto, seria altamente valioso se o governo pudesse assumir, negociar e implementar uma agenda de reformas estruturais. Ainda comemoramos o fato de o Brasil ser hoje a sexta maior economia do mundo, mas damos pouca atenção ao incômodo de que nossa renda per capita no conceito de paridade de poder de compra é a 62.ª do planeta, 15 posições atrás da do México e 17 lugares atrás da Argentina. No ritmo que crescemos nos últimos dez anos - um bom período -, demoraremos ainda cerca de dez anos para alcançar o nível atual da renda per capita do México e cerca de 14 para nos igualarmos aos argentinos. Portanto, estamos atrasados e crescer mais rápido é um imperativo. Mas é ilusório pensar que um governo que foi capturado por reivindicações corporativas e que não consegue decidir qual bebida servir na festa da Copa do Mundo poderá encaminhar mudanças de fundo na forma da organização da economia.

A agenda que se cobra de um governo que se equilibra numa coalizão de 18 partidos não existe fora dele. Antes de ser um reflexo da falta de vontade política, a inapetência oficial por uma estratégia de longo prazo reflete apenas a falta de convicção da própria sociedade.

Resta caminhar lentamente, aparando arestas e rebarbas. A aprovação da jornada de trabalho flexível, a criação do fundo de previdência dos funcionários públicos e o sucesso na concessão dos aeroportos mostram que mais vale dar pequenos passos do que discutir uma grande jornada que nunca acontecerá.

A paralisia do Dnit - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 31/03/12


Quase nove meses depois da faxina nos seus quadros de direção, feita pela presidente Dilma Rousseff após denúncias de um esquema de cobrança de propinas no Ministério dos Transportes, ao qual é vinculado, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) continua paralisado.

Anunciado em dezembro, com atraso de quase um ano, o ambicioso programa de recuperação e manutenção de 32 mil quilômetros de rodovias, mais de 40% da malha federal, deveria estar totalmente contratado até novembro, mas praticamente não saiu do papel. Por falta de novos contratos, as obras em execução, que em janeiro deveriam corresponder a 15.104 quilômetros de estradas, poderão se reduzir a apenas 1.316 quilômetros em dezembro, alertam as empreiteiras responsáveis pelas obras. Já ruim e perigosa, a malha poderá ficar pior.

Pode ainda não estar concluída a tarefa de limpeza administrativa, iniciada com a substituição dos antigos diretores por militares e funcionários de outros órgãos federais com experiência em auditoria e controladoria, o que retarda as decisões. A necessidade de eliminação de irregularidades apontadas pelo TCU nos editais de licitação também contribuiu para atrasar a assinatura dos novos contratos.

Mas é muito provável que, mesmo sem essas dificuldades, o Dnit não teria conseguido realizar sua tarefa no prazo esperado e na velocidade exigida pelas necessidades do País. Reportagem publicada recentemente pelo Estado (19/2) mostrou a falência estrutural e o descalabro administrativo do Dnit, que, sem funcionários com qualificação e em número suficiente para realizar suas tarefas essenciais, não pode executar os programas colocados sob sua responsabilidade - que são muitos e essenciais para melhorar a infraestrutura de transportes.

"O Dnit não tem condições de tocar o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)", admitiu ao Estado o diretor executivo do órgão, Tarcísio Gomes de Freitas, um auditor da Controladoria-Geral da União colocado no cargo para tentar pôr alguma ordem administrativa e operacional no Dnit.

O atraso na execução do programa anunciado no fim do ano passado é a consequência mais do que previsível do despreparo do órgão responsável pela execução de um dos maiores orçamentos do governo federal. Os dados levantados pela Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor), e publicados pelo jornal Valor (28/3), não deixam dúvidas quanto à paralisia do Dnit. Em 2009, o órgão lançou editais de licitação para a contratação de obras em 313 lotes de rodovias, no valor de R$ 14,3 bilhões. Esses números diminuíram em 2010 e caíram abruptamente em 2011, quando foram lançados editais para 196 lotes, ao custo de R$ 1,9 bilhão.

O programa do Dnit prevê a ampliação de 2 para 5 anos do prazo de duração dos contratos de restauração e manutenção das rodovias, para que seja possível a execução de obras mais amplas do que as ações pontuais que vinham sendo feitas com base nos contratos anteriores. Alguns contratos novos, com a duração de cinco anos, já estão sendo licitados, mas ainda não foram lançados os editais para a contratação da manutenção de 19 mil quilômetros de estradas.

Parece quase impossível que todos os contratos referentes a 32 mil quilômetros de obras estejam assinados até novembro, como esperava o Dnit. É possível que boa parte dos contratos se resuma a operações tapa-buracos, como as feitas em caráter de emergência no fim do primeiro governo Lula.

A falta de novos contratos está forçando as empreiteiras a demitir pessoal. "Já estamos em crise", disse o presidente da Aneor, José Alberto Pereira Ribeiro.

Era indispensável sanear administrativa e financeiramente o órgão público, que acumulava suspeitas e denúncias de práticas irregulares. Mas agora é preciso que, ao combate aos mal feitos, a nova diretoria acrescente competência e eficiência técnica e operacional à sua gestão, dentro dos limites permitidos pela precária estrutura do órgão.

As duas correntes - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 31/03/12


O DEM está dividido quanto à condução do caso do senador Demóstenes Torres (GO). Um grupo, capitaneado pelo líder do partido na Câmara, deputado ACM Neto (BA), defende a expulsão sumária. Outro, liderado pelo presidente da sigla, Agripino Maia (RN), quer dar espaço para Demóstenes tentar se defender. Por isso, a reunião da Executiva, marcada para terça-feira, foi suspensa.

"Todo mundo devia trazer um letreiro na testa. Que é pra gente saber: quem é que presta e quem é que não presta” — Dunga, compositor de samba

Cativando o público interno
Na sessão em que a Câmara aprovou a Lei Geral da Copa, na quarta-feira, o líder do PMDB, Henrique Alves (RN), aproveitou para vender sua candidatura à presidência da Casa. Ele foi várias vezes aplaudido, principalmente quando assumiu o compromisso de que, uma vez presidente da Casa, vai acabar com o desgastante processo de liberação das emendas. "O Orçamento já era para ser impositivo há muito tempo", afirmou.

Reagindo às acusações de fisiologismo, Alves disse: "Emenda não é concessão do governo. É direito nosso. Um deputado não é só para votar leis. Ele também é interlocutor de suas bases eleitorais".

UMA VERSÃO. O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), esteve ontem com o ex-presidente Lula. Acompanhado pelo senador Jorge Viana (PT-AC), ambos conversaram durante duas horas com Lula. Bem-humorado com a volta da normalidade, o ex-presidente tratou como lenda o noticiário sobre sua interferência no governo Dilma: "Fiquei cinco meses fora. A Dilma resolveu tudo, trocou de líderes e de ministros. E eu não podia nem falar, quanto mais interferir".

Dois estilos
A primeira coisa que o experiente líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), fez foi dizer que não é candidato a presidir a Casa. Já o novato líder no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), tem sido dúbio sobre o tema.

Outro lado
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), escreve: "Em momento algum, na minha interinidade na Presidência da República, falei a frase "Este é o meu momento", nem utilizei qualquer expressão que pudesse insinuar tal ideia".

Acordo na biblioteca
Após a crise gerada pela demissão do editor da "Revista de História da Biblioteca Nacional", Luciano Figueiredo, ficou decidido ontem que a Sociedade de Amigos da Biblioteca cuidará exclusivamente da administração da publicação, enquanto o conselho editorial passa a responder tanto pelo conteúdo como pela indicação do diretor de redação. O conselho foi contra a demissão de Figueiredo.

Intrigante
Todos querem saber quem é o "ministro" citado pela Operação Vega da Polícia Federal. Numa das páginas, diz: "Resumo. Quenia - Kenia - Demissão - Senado - Caça às Bruxas - Fantasma - Zé Vicente - Assessor - Ministro - 99619461".

Amarrado
Lideranças do PT reclamam da demora de Fernando Haddad em montar a coordenação de sua campanha. Dizem que ele está receoso de propor nomes e enfrentar reações no partido. Reclamam que Haddad quer que Lula resolva.

PEGO pela Operação Caixa de Pandora, o ex-governador José Arruda (DF) durou 13 dias no DEM. O senador Demóstenes Torres (GO) segue no partido 27 dias após cair na Operação Monte Carlo.

NO DEM ninguém estranhou o fato de Demóstenes Torres chamar Carlinhos Cachoeira de "professor". Contam que ele tratava assim seus interlocutores.

O ADVOGADO Antonio Carlos de Almeida Castro explica por que pediu para Demóstenes se calar: "É kafikiano que a PGR não tenha dado à defesa o direito mínimo, básico, de ter acesso às provas".

A piada que oprime - CONRADO HÜBNER MENDES


O Estado de S.Paulo - 31/03/12


Alguns membros de uma jovem geração de comediantes no Brasil perderam o tom. No seu repertório incluíram, entre outras coisas, piadas que relativizam a gravidade do estupro, reciclam clichês pré-abolicionistas, espalham desinformação histórica e repisam estigmas de todo tipo - de classe, de gênero, de feição física, estética, e assim por diante. Piadas, pois, sem muita nuance ou sensibilidade crítica. Parte do público se cansou e, mais atento a essa modalidade de discriminação, passou a denunciar ou até a recorrer às vias judiciais. Embora, ao que parece, tais reações tenham surgido a partir de episódios isolados nos últimos meses, a ocasião suscita, uma vez mais, a pergunta sobre as responsabilidades e os limites do humor (e da profissão de humorista).

A pergunta, de imediato, poderia ser abordada pelo ângulo jurídico. Teríamos, nesse caso, de investigar se há algum choque entre direitos individuais ou coletivos, tanto do humorista quanto daqueles que se sintam afetados pela piada, e resolver o caso concreto a partir desse contraste e ponderação. Essa pergunta, porém, pressupõe outra mais importante e abrangente: numa sociedade comprometida tanto com a proteção da liberdade quanto com a promoção da igualdade, como lidar com a piada discriminatória? Independentemente do que diga a lei, até onde se deve tolerar o humor que fere esses valores? Supondo que nosso dever de tolerância não seja ilimitado, como e quando reagir?

Num mundo imaginário de sujeitos inteiramente autônomos, delega-se tal problema à consciência dos indivíduos e ao debate público. Críticos culturais, jornalistas e cidadãos em geral dariam conta de manter o mau gosto e o preconceito sob controle, sem necessidade de intervenção do aparato legislativo e judicial. Todos seriam igualmente livres para se expressar e as ideias que, eventualmente, resistissem ao escrutínio público e à censura social sobreviveriam. As outras, reprovadas no teste de qualidade, cairiam no esquecimento. O próprio humorista, para se manter relevante, teria de negociar informalmente com o seu público as margens do aceitável. Calibraria, a partir daí, uma medida de autocontenção para não desaparecer nesse livre e exigente mercado de piadas. Em suma, a autorregulação se bastaria.

O pacote da autorregulação do humor e da comunicação social não é só um devaneio teórico. Ao contrário, cumpre papel crucial nas interações cotidianas. Apesar disso, praticamente nenhuma democracia liberal o comprou por inteiro. Descrentes da capacidade de a "mão invisível" prevenir violações e abusos de direitos, sistemas jurídicos tiveram de aparar as arestas. Perceberam, por exemplo, que, em nome de valores como a dignidade, seria desejável prever sanções contra abusos da liberdade de expressão, como os tipificados pelo que chamamos de "crimes contra a honra" (a calúnia, a injúria ou a difamação).

Outros sistemas jurídicos, entre eles a maioria das democracias contemporâneas, não pararam por aí. Ao notarem que o abuso da liberdade de expressão, mais do que ofender a honra de indivíduos particulares, pode também silenciar ainda mais os grupos em situação de exclusão estrutural, passaram a coibir práticas discriminatórias em sentido mais amplo. Entenderam que a promoção da igualdade de status requer o combate ativo à exclusão não apenas socioeconômica, mas também simbólica. Certos grupos vulneráveis e sistematicamente privados de canais de expressão receberam essa proteção adicional (como os negros no Brasil, por meio da lei que sanciona o racismo).

Tais normas jurídicas não impõem restrições à liberdade apenas para proteger outros valores, não a subordinam a outros direitos supostamente mais importantes. Preocupam-se, antes de tudo, em preservar as mínimas condições sociais em que a própria liberdade possa ser exercida. Voltando ao caso deste texto: o ataque verbal ao autorrespeito de pessoas que, por suas próprias circunstâncias e características, já encontram enormes obstáculos para driblar os estigmas que lhes atribuem pode corroer, curiosamente, as condições de tolerância e reciprocidade necessárias para a própria existência do humor.

Os alvos desse estilo de humor são os mais fáceis e previsíveis: as mulheres, os deficientes, os negros, os homossexuais, os gordos, os imigrantes. Não que esses grupos, como tantos outros, não possam servir de matéria-prima para piadas inteligentes. Existe, no entanto, uma diferença entre a piada que oprime, pura e simplesmente, e a piada que convida a um exercício de autoironia, que é engraçada porque estimula os ouvintes a rirem de si mesmos, sem pôr sua própria dignidade em jogo. A linha entre uma coisa e outra não é tão tênue assim.

Na sua obsessão juvenil por serem politicamente "incorretos", alguns humoristas acabam fazendo o oposto. Numa cultura política opressora como a brasileira, nada mais politicamente "correto" e seguro do que se proteger atrás do opressor, nada mais bem-comportado do que falar exatamente o que ele quer ouvir. Não subverte as regras do jogo, não desestabiliza as relações de poder e ofende exatamente aqueles que a nossa História já se encarregou de subjugar. É um tiro no próprio pé.

O humorista, enfim, pode ser um agente de transformação cultural e política ou pode ser exatamente o contrário. A piada pode ajudar a desarmar, ridicularizar e reverter um preconceito, ou pode ser veículo para disseminar um pegajoso discurso de desprezo, disfarçado pelo manto do humor. Praticar o humor do primeiro tipo exige coragem moral, ousadia intelectual e empatia. Dá mais trabalho. Já o segundo se consegue com boa dose de preguiça mental, docilidade política e submissão ao senso comum. Comediantes que deixaram uma herança libertária e emancipatória perseguiram o primeiro caminho. Entre os novos comediantes brasileiros, alguns ainda desconhecem tal diferença. Não são estes que merecem nossa risada.

Investigação interpretada - WALTER CENEVIVA

FOLHA DE SP - 31/03/12

Quando um órgão do Judiciário investiga outro, ele não atua como segmento da polícia



HERMENÊUTICA é a arte-ciência da interpretação e compreensão de palavras e fatos. Seu exercício compõe tarefa difícil, mas imprescindível para o direito. A tarefa envolve a compreensão de vocábulos de conteúdo jurídico, em país cuja Constituição tem o português como idioma nacional (art. 13). Tomo o exemplo atualíssimo do verbo investigar e do substantivo investigação, em face de providências do Conselho Nacional de Justiça referentes ao Judiciário.

O primeiro exercício de hermenêutica corresponde à valoração das palavras tomadas individualmente. O dicionário "Aurélio" situa o investigar como a tarefa de achar, pesquisar, indagar, inquirir as causas de um fato. No "Houaiss", é procura metódica e consciente para descobrir algo. A origem das palavras também ajuda a compreensão, conforme se colhe no "Dicionário Etimológico" de José Pedro Machado: desde o século dezesseis investigar vem do latim "investigatione", enquanto busca atenta, confirmada no "Dicionário de Morais".

O intérprete também pode apoiar-se em outros idiomas latinos. Refiro o exemplo italiano, no "Vocabolario" de Nicola Zingarelli, em tradução literal. Ali "investigare" consiste em procurar, examinar ou indagar com cuidado e atenção. A finalidade daquele que investiga é a mais variada possível, desde as ciências físicas até o trabalho policial.

Em língua francesa, o "Petit Robert" define "investigation" como busca essencial e sistemática sobre qualquer objeto, exemplificando com a averiguação policial, a do fisco, do jornalismo investigativo e da investigação científica. A língua espanhola mantém a mesma linha no "Diccionario Del Español Moderno" de Martin Alonso: investigar é diligenciar para descobrir uma coisa.

Quando um órgão do Judiciário investiga outro, não atua como segmento da polícia. Qualquer que seja o método de busca, a conclusão se mantém, sem que o termo investigação assuma conteúdo depreciativo ou policialesco em face da pessoa investigada.

Basta ver a diferença das acepções técnicas, em português, quando se pensa no resultado ou nos métodos seguidos por aquele que investiga. Para De Plácido e Silva o investigador indaga com cuidado, segue o rastro, perscruta indícios relativos a fatos, tanto que no direito penal é o procedimento técnico composto pelo inquérito. Maria Helena Diniz lembra em seu dicionário jurídico que a investigação pode ser científica, administrativa, criminal e até psicológica. Claro que também se destina a apuração de delitos, podendo corresponder até a uma devassa, quando confirmada a ilicitude de conduta coletiva.

Trazendo exemplo de idioma não latino cabe ler o "Black's Law Dic-tionary". Editado desde 1891, inclui "investigation" no rol de ações destinadas (em tradução livre) à finalidade de seguir, "passo a passo, paciente trabalho de averiguação ou observação".

Ninguém está livre de ser investigado. Os fatos podem ser ou não ser relacionados com o crime, seja o investigador policial, cientista ou jornalista. Na situação que caminha para ser definida no Tribunal de Justiça de São Paulo, a investigação confirmará ou negará a legalidade de fatos econômicos. Aberta ao conhecimento de todos, mais que punir culpados, cumprirá o dever essencial de isentar os inocentes.

Revoguem a anistia (do mensalão) - GUILHERME FIUZA


O GLOBO - 31/03/12

As comemorações do golpe de 64 ganharam um alento este ano. O patético "parabéns pra você" no 31 de março, data inaugural da ditadura militar, andava quase inaudível na caserna, quando ganhou um reforço de peso. Dessa vez, o Brasil inteiro ouvirá os nostálgicos dos anos de chumbo - graças à ex-guerrilheira Dilma Rousseff.
No final dos anos 70, quando o regime autoritário chegava ao seu último capítulo, o general João Figueiredo assumiu a Presidência da República com um inesquecível brado "democrático": avisou que ia "prender e arrebentar" quem fosse contra a abertura política. Figueiredo fez escola. Na polêmica sobre a Comissão da Verdade, Dilma Rousseff botou para quebrar, em nome da democracia.
A presidente do governo popular mandou amordaçar militares da reserva que criticaram duas de suas ministras. As auxiliares de Dilma haviam defendido a revogação da Lei da Anistia - o pacto nacional para a saída da ditadura. Os militares contrariados publicaram um manifesto de repúdio no site do Clube Militar. Dilma mandou o Exército apagar o texto e enquadrou os militares como insubordinados. Quem for contra a Comissão da Verdade, ela prende e arrebenta (ou pelo menos censura).
Era o que faltava para ressuscitar as almas penadas leais ao golpe de 64. Autoritarismo é vitamina para elas. Mas ser a favor do regime militar também não pode. O governo de esquerda aceita o pensamento de direita, desde que ninguém o manifeste. A democracia popular tem dono: ame-a ou deixe-a.
Foi com esse espírito que um bando de militantes de partidos filiados ao poder central foi para a porta do Clube Militar, no Centro do Rio. Lá dentro ocorria uma homenagem ao movimento de março de 64. Do lado de fora, em defesa dos direitos humanos e da verdade, os manifestantes fecharam a Avenida Rio Branco na marra. Atiraram ovos contra seguranças do prédio, incendiaram cartazes e tentaram agredir militares que saíam do evento, provocando a reação da polícia que tentava protegê-los e transformando a Cinelândia em praça de guerra. Um show de democracia.
A Comissão da Verdade pretende investigar os crimes cometidos pela direita no poder. O país não pode mesmo dormir tranquilo sobre certos disparates, como a versão militar de que Vladimir Herzog se suicidou na cela do DOI-Codi. É um escárnio. O problema dessa revisão é que não se encontrará a verdade no passado sem saber onde ela anda no presente.
Hoje o Brasil é governado pela esquerda. E a esquerda combateu a ditadura, defendendo a democracia, a liberdade e os pobres. Como essa autoridade moral foi usada no poder? De várias formas - algumas delas não contabilizadas. Quando estourou o escândalo do mensalão, Delúbio Soares, então poderoso tesoureiro do PT, negou o flagrante com convicção: "É uma conspiração da direita contra o governo popular." O ex-guerrilheiro José Dirceu, apontado como chefe da quadrilha, caiu em desgraça, mas fez sua sucessora na Casa Civil: a "querida companheira de armas" Dilma Rousseff. Em meio às tramoias, a mística da resistência à ditadura estava intacta.
A virtude de mulher-coragem, ex-refém dos militares, levou Dilma longe. Candidata a presidente, transformou em ministra da Casa Civil a obscura companheira Erenice Guerra, também ungida pela mística da militância de esquerda. Enquanto Erenice caía por tráfico de influência, descobria-se que Dilma se fizera passar pela atriz Norma Bengell numa foto da Passeata dos Cem Mil, em 1968, divulgada por sua campanha. O que seria dela sem a ditadura?
Dilma não teria sido eleita - nem qualquer outro afilhado revolucionário de Lula - se os companheiros do mensalão tivessem sido punidos. Ali estava, para quem quisesse ver, a conversão de um partido e de uma causa "libertária" em sistema de perpetuação no poder, a partir de um planejado assalto ao Estado. Transcorridos quase sete anos, essa fraude política sem precedentes permanece misteriosamente no colo do Supremo Tribunal Federal, prestes a sumir do mapa pela extinção do processo.
Aí a Justiça brasileira terá legalizado as palavras do general Lula: "O mensalão não existiu." Haverá uma Comissão da Verdade para desenterrar o crime dos heróis da resistência?
Enquanto o mito não se desmancha, as vítimas profissionais da ditadura vão fazendo o seu pé de meia. Na série de revoluções ministeriais, os comunistas se destacaram partilhando o dinheiro do Esporte entre as ONGs amigas do PCdoB. A imprensa burguesa bombardeou essa distribuição de renda e o ministro caiu, mas a companheira Dilma manteve o cargo com a agremiação. Em comunismo que está ganhando não se mexe (ainda mais em véspera de Copa do Mundo).
Assim como o ex-guerrilheiro Fernando Pimentel, que uniu forças com a amiga Dilma e se tornou um próspero consultor, muitos companheiros viverão em paz sob a anistia do mensalão. Essa, ninguém revoga.

Império dos advogados - HÉLIO SCHWARTSMAN


FOLHA DE SP - 31/03/12

SÃO PAULO - Honorários de sucumbência. O nome até assusta, mas o assunto é importante e diz respeito a todos os que um dia poderão utilizar os serviços de um advogado.

Imaginemos um caso em que a parte vencedora de um processo tenha gastado R$ 2.000 em honorários advocatícios contratuais para receber R$ 10.000. Se ela não for ressarcida da despesa, obterá apenas 80% do seu direito -uma flagrante injustiça.

Para evitar esse tipo de situação, o Código de Processo Civil (CPC), em seu artigo 20, estabeleceu: "A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios".

Até aqui, tudo bem. O problema, como alerta artigo dos juízes federais José Jácomo Gimenes, Marcos César Romeira Moraes e Rony Ferreira publicado no "Consultor Jurídico", é que tramita na Câmara o projeto de um novo CPC em que, por força de um lobby eficiente, a titularidade dos honorários de sucumbência é transferida da parte vencedora para o advogado.

Não haveria muito a questionar se, com essa medida, os causídicos deixassem de cobrar antecipadamente por seus serviços. Mas, como isso não está explícito, são grandes as chances de o vencedor no processo ter de arcar com os honorários contratuais devidos a seu advogado e ainda perder o direito à indenização paga pelo sucumbente. Ou seja, o advogado triunfante seria duplamente remunerado.

A manobra já fora tentada antes, quando da aprovação do Estatuto da OAB (lei nº 8.906), em 1994. A coisa só não foi para a frente por causa justamente da redação do CPC.

A matéria também já foi objeto de uma ação direta de inconstitucionalidade em que o Supremo limitou os efeitos do estatuto.

Na feliz expressão do ministro Joaquim Barbosa, a norma pretendia substituir o "rule of law" (império da lei) pelo "rule of lawyers" (império dos advogados).

Pecado mortal - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 31/03/12


Ainda que, juridicamente, Demóstenes Torres (DEM-GO) aposte no sucesso da estratégia de pedir a anulação das provas obtidas na Operação Monte Carlo, que prendeu seu amigo Carlinhos Cachoeira, sua situação no campo político se tornou insustentável. O tiro de misericórdia foi o vazamento de grampos de 2009 nos quais aparece discutindo com o contraventor projeto que poderia "regulamentar" os jogos de azar.
Ao se defender na tribuna do Senado, Demóstenes disse que não sabia das atividades ilegais do amigo. Mentir para os pares é o caso mais clássico de quebra de decoro, que já levou outros senadores ao cadafalso.

Reprise Para a Polícia Federal, a estratégia da defesa de Demóstenes lembra a usada para melar a Operação Castelo de Areia. A investigação -que envolveu políticos, agentes públicos e construtoras- foi engavetada em 2010, quando o STJ anulou os grampos que a integravam.

Mundo da lua Na última vez que conversou com a cúpula do DEM, Demóstenes afirmou que acreditava no arquivamento do processo no Conselho de Ética. Depois disso, afirmou, tiraria uma licença de quatro meses.

Na real Caciques do partido, no entanto, afirmam que agirão com o senador como procederam com José Roberto Arruda, que foi expulso após o mensalão do DEM no governo do DF. "Ninguém vai segurar o Demóstenes", diz um membro da Executiva.

Tempo quente O esquema de segurança da Cúpula dos Brics foi tão rigoroso que os hóspedes do hotel Taj, onde Dilma Rousseff estava hospedada, foram impedidos de utilizar a piscina na véspera do encontro para inspeções do serviço secreto.

PhD 1 Em sua visita a Harvard, no dia 10, a presidente assinará acordo com representantes da principal universidade norte-americana. O convênio prevê bolsas de pós-graduação para estudantes brasileiros, de rara presença na instituição.

PhD 2 Dilma também se encontrará com a reitora Drew Faust e discursará para alunos e professores durante o fórum da Kennedy School of Government, escola de pós-graduação com ênfase na área de política de Harvard.

Dobradinha Sem agenda pública desde as prévias, José Serra reapareceu ontem ao lado de Geraldo Alckmin na inauguração de ambulatório médico de especialidades em Mogi das Cruzes. Na terça-feira, ele deve acompanhar o governador na entrega do Poupatempo da Lapa.

Menos Em rápida e fortuita conversa com o secretário Rodrigo Garcia (Desenvolvimento Social) ontem, durante voo para Mogi, Serra reclamou da pressão do DEM pela vaga de vice na sua chapa à prefeitura paulistana.

Golden boys Na montagem de sua equipe de campanha, o ex-governador pretende incorporar três nomes da chamada "nova geração" do tucanato paulista: Luís Sobral (finanças), Daniel De Bonis (programa de governo) e Felipe Sigollo (agenda).

Obsoleto A reunião de hoje do conselho político da candidatura de Fernando Haddad pode ser a derradeira. Os próprios membros do grupo acham que ele perderá a função depois da definição da coordenação da campanha, já que não tem poder decisório e é muito amplo.

Visita à Folha Luiz Fux, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), visitou ontem a Folha, onde foi recebido em almoço.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

tiroteio

"O choque de gestão no transporte não pode ser brincadeira de faz de conta, como pilotar ferrorama. A falta de planejamento de Alckmin está deixando a população a pé."
DO LÍDER DO PT NA ASSEMBLEIA PAULISTA, ALENCAR SANTANA, sobre o argumento do governo de São Paulo de que as panes nos trens metropolitanos são resultado da eficiência da gestão tucana na ampliação do sistema.

contraponto
Pivô da discórdia

No auge da crise no Congresso, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) se encontrou com o ministro Aldo Rebelo (Esporte) e não resistiu à provocação:
-Você é o responsável pela paralisia da Câmara!
Aldo desconversou:
-Eu? Mas estou licenciado do mandato de deputado!
-Sim -, respondeu Alencar -, o "impasse Aldo" está na pauta, com a Lei Geral da Copa, cuja aprovação urgente o ministro defende, e o Código Florestal, cuja versão da Câmara que você relatou os ruralistas querem recuperar...

PROGRAMAÇÃO ESPORTIVA NA TV


9h - Canadá x França, Mundial masc. de curling, Sportv 2

10h - Rio de Janeiro x Vôlei Futuro, Superliga fem. de vôlei, Globo

10h30 - Nuremberg x B. de Munique, Campeonato Alemão, Bandsports e ESPN

11h - Manchester City x Sunderland, Campeonato Inglês, ESPN Brasil

11h - QPR x Arsenal, Campeonato Inglês, ESPN HD

12h - Cruzeiro x São Bernardo, Superliga masc. de vôlei, Sportv

13h - Catania x Milan, Campeonato Italiano, ESPN e ESPN HD

13h20 - Blackpool x Southampton, Campeonato Inglês (2ª divisão), ESPN Brasil

13h30 - Torneio de Miami, tênis (final fem.), Bandsports

15h - Osasuna x Real Madrid, Campeonato Espanhol, ESPN e ESPN HD

15h45 - Parma x Lazio, Campeonato Italiano, ESPN Brasil

16h - Macaé x Vasco, Estadual do Rio, Sportv

16h - Nancy x PSG, Campeonato Francês, Sportv 2

18h - São José x Paulistano, NBB, Sportv 2

18h10 - River Plate x Ferro Carril, Campeonato Argentino (2ª divisão), ESPN Brasil

18h30 - Mogi Mirim x Paulista, Campeonato Paulista, Sportv

0h30 - AFC, artes marciais mistas, RedeTV!

A comédia dos Brics - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 31/03/12


Haverá pelo menos uma sequência cômica na próxima reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20), marcada para junho no México. A presidente Dilma Rousseff e seus companheiros do grupo Brics vão protestar contra a grande emissão de dólares, euros e libras, acusando os bancos centrais do mundo rico de impor um desajuste cambial aos emergentes. Ao mesmo tempo, vão exigir dos governos do mundo rico políticas mais eficientes de recuperação econômica. Em contrapartida, americanos e europeus poderão cobrar da China, como fazem há muitos anos, providências sérias para corrigir a desvalorização excessiva do yuan, um pesadelo para os empresários industriais da maior parte do mundo, incluídos os brasileiros. O governo chinês, com seu costumeiro ar de inocência, tem acusado as autoridades americanas de negligenciar o valor do dólar, a principal moeda internacional de reserva. O representante da China deverá ficar muito feliz com a parceria brasileira nessa briga. Brasília tem raramente acusado Pequim de manipulação cambial. Prefere jogar a culpa dos problemas nacionais nas velhas potências imperialistas, embora a competição mais dura e mais devastadora para a indústria brasileira venha do Oriente.

O espetáculo será ainda mais divertido para quem se lembrar de um evento recentíssimo. China e Estados Unidos ficaram do mesmo lado, quando o Brasil tentou provocar na Organização Mundial do Comércio (OMC) um debate sobre a manipulação cambial e seus efeitos nas trocas internacionais. Americanos e chineses fizeram o possível para matar a discussão e trabalharam para transferir o assunto para a reunião do G-20.

Como de costume, nenhuma decisão consequente a respeito do câmbio deverá resultar do encontro no México. A reunião das 20 principais potências desenvolvidas e emergentes poderá ser um sucesso por algum outro motivo - especialmente se contribuir para a superação da crise europeia. Um passo importante para isso é a decisão dos governos europeus de elevar de 500 bilhões para 700 bilhões os recursos disponíveis para ajuda a políticas de estabilização. Isso deverá facilitar o trabalho do FMI de coletar dinheiro dos emergentes para operações de socorro aos próprios europeus.

O G-20 perdeu muito de sua capacidade de mobilização desde a superação da primeira fase da crise internacional. Mas ainda é mais relevante que o grupo Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O despreparo desses países para ações conjuntas de grande alcance foi mais uma vez confirmado na reunião de cúpula de Nova Délhi, na quarta e na quinta-feira. O grupo é novo e isso poderia, talvez, explicar o escasso valor prático das confabulações de seus ministros e chefes de governo. Mas o problema é muito mais sério. Esses países partilham poucos interesses com suficiente importância para transformá-los em aliados ou para levá-los a constituir um bloco. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou os grandes emergentes como aliados estratégicos, mas nunca houve reciprocidade efetiva. Ao contrário: preteriram o Brasil mais de uma vez, em suas ações diplomáticas e comerciais, e sempre deram mais importância a entendimentos com parceiros regionais ou com as potências do mundo rico.

Não houve surpresa na retórica balofa da Declaração de Nova Délhi, recheada de manifestações de preocupação com a crise internacional, cobranças dirigidas a europeus e americanos - como se estes se importassem - e apelos a soluções pacíficas para a crise no Oriente Médio, para a matança na Síria e para os desentendimentos entre o Ocidente e o Irã. Nada, nesse documento, é leitura indispensável.

Seus 50 artigos chochos se completam com um Plano de Ação de Nova Délhi. Os quatro primeiros itens se referem a encontros ministeriais "à margem" de reuniões da ONU, do FMI e de outros eventos multilaterais. Encontros "à margem" de eventos oficiais importantes são rotineiros há muito tempo. O resto chega a ser mais fraco. Muito mais emocionante pode ser uma ata da reunião de um clube de dominó.

Correção - O editorial de ontem O desafio depois da cura contém imprecisões no título e no texto. No caso, não se trata de cura do câncer, mas de remissão da doença.

O barão e os Brics - PAULO NOGUEIRA BATISTA JR


O GLOBO - 31/03/12

Na quinta-feira, ocorreu a quarta cúpula dos líderes dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) em Nova Dehli. O encontro teve grande repercussão internacional. O "Financial Times", por exemplo, publicou ontem reportagem de primeira página sob o título "Brics pedem mais poder no FMI". O "Washington Post" destacou a oposição dos Brics à retórica de ação militar contra o Irã e a Síria.
Na "Declaração de Dehli", que formaliza os resultados da cúpula, os Brics trataram extensamente de temas econômicos e financeiros. Indicaram a sua insatisfação com o funcionamento do Banco Mundial e do FMI, acolheram positivamente os dois candidatos de países em desenvolvimento à presidência do Banco Mundial, e iniciaram a discussão de um possível novo Banco de Desenvolvimento para financiar projetos nos Brics e em outros países em desenvolvimento, entre diversos outros temas.
Os líderes dos Brics expressaram, por exemplo, preocupação com o ritmo lento das reformas das cotas e da governança do FMI e enfatizaram que os esforços em andamento para aumentar a capacidade de empréstimo do Fundo somente serão bem-sucedidos se houver confiança de que todos os membros da instituição estão verdadeiramente empenhados em reformá-la (íntegra em www.itamaraty.gov.br).
A Declaração de Dehli foi forte, e até contundente em certos aspectos, mas há muita controvérsia sobre o real significado dos Brics. Os críticos e céticos sustentam que o agrupamento é artificial, mais emblema ou sigla do que realidade política. Apontam para as enormes diferenças entre os integrantes e duvidam de que os cinco países possam, de fato, atuar de forma coordenada. "Tigre de papel", dizem alguns.
É inegável que as dificuldades de coordenação dos Brics são consideráveis.
Sou testemunha, pois tenho participado, desde 2008, desse processo no âmbito do FMI e do G-20. Quando cheguei a Washington, em 2007, os Brics não existiam como realidade política. Na época, era realmente uma mera sigla (inventada por um economista do Goldman Sachs).
Na diretoria do FMI e no G-20, a atuação conjunta dos quatro países (a África do Sul só se juntou ao grupo em 2011) começou em 2008, por iniciativa da Rússia. A primeira cúpula dos líderes realizou-se em Yekaterinburgo, na Rússia, em 2009.
Os Brics têm altos e baixos, momentos de proximidade e de distância, mas uma coisa é certa: esta tem sido a nossa principal aliança desde 2008, pelo menos no que se refere a G-20 e FMI.
O diretor-executivo da Rússia no FMI, que está aqui há 20 anos, disse em seminário recente na Brookings Institution, em Washington, que o surgimento dos Brics foi a maior mudança na governança do FMI desde a sua chegada à diretoria da instituição. Posso confirmar. De fato, a nossa atuação conjunta tem sido uma alavanca importante em vários temas estratégicos.
O que os Brics têm em comum, para além de todas as diferenças, é fundamentalmente o seguinte: são países de mercado emergente de grande dimensão econômica, geográfica e populacional. Por isso mesmo, todos eles têm capacidade de atuar com autonomia em relação às potências ocidentais - EUA e Europa. Isso vale sobretudo para os quatro integrantes originais do grupo, mas, creio, que crescentemente também para a África do Sul.
O chanceler Antonio Patriota acertou em cheio, no meu entender, quando comparou a coordenação entre os Brics à nossa aproximação com os EUA no início do século XX, época do Barão do Rio Branco. "Um grande legado do barão", disse Patriota, "é a capacidade de apreensão das mudanças. Na época em que o dinamismo econômico e o eixo de poder mudavam da Europa para os Estados Unidos, ele teve a capacidade de estabelecer uma boa relação com os EUA. Transferindo para hoje, o movimento equivalente é a coordenação com os Brics."

Encontro adiado - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 31/03/12

Parece uma maluquice que, quase 50 anos depois do golpe militar que fechou o Congresso, suspendeu direitos constitucionais, prendeu, cassou, exilou, torturou, matou e ocultou cadáveres, ainda seja preciso explicar que isso não se comemora. Nas divergências dos últimos dias o país mostrou os equívocos nascidos do silêncio. A democracia confundiu não punir com não saber. Assim, adiou um encontro inevitável.

Não foi a Comissão da Verdade que trouxe um conflito velho de volta à mesa. Ele sempre existiu, e se nunca apareceu foi pela antiga mania nacional de achar que o melhor caminho para evitar uma fratura é fingir que ela não existe. A questão jurídica que fique entregue à Justiça; outra completamente diferente é a busca dos fatos e circunstâncias das mortes de pessoas que estavam nas mãos do Estado.

Rubens Paiva desapareceu quando estava dentro de instalações do I Exército, no Rio; Vladimir Herzog foi morto quando estava dentro do II Exército, em São Paulo. Passaram-se 41 anos do primeiro fato; 36 anos do segundo fato. A ditadura acabou há 27 anos. O país ainda não encontrou tempo para repor os fatos históricos, corrigir versões canhestras dadas à época, quando a imprensa foi silenciada, e de fazer uma reflexão madura sobre esses, e tantos outros, fatos trágicos.

Congelado pelo silêncio, o debate voltou como se o Brasil tivesse entrado num túnel do tempo. Uma discussão que não ocorre no momento certo não se desenvolve e, portanto, não pode ser superada. É espantoso que o Brasil tenha tentado contornar por tanto tempo o incontornável trabalho de entender cada um dos inúmeros eventos sobre os quais a ditadura impôs sua versão, omitiu fatos e ocultou documentos.

Que os militares da reserva se reúnam num clube com suas ideias emboloradas e as exponham para sua plateia de convertidos, ou comprometidos, é exercício da democracia e da liberdade de expressão que negaram ao país nas duas décadas que o governaram. O que está errado não é que eles em seus pijamas mantenham suas convicções. O erro é que os que na democracia têm comandado as Forças Armadas permanecem com a mesma versão delirante dos fatos e a transmitem aos seus subordinados numa reprodução inaceitável de um conjunto de valores perigoso para a democracia.

O silêncio de quem está com a farda não engana ninguém. Assim que se aposentam, usam a liberdade que recebem para expor as mesmas velhas ideias. Nunca houve autocrítica. Não é um clube de velhinhos de um lado e um Exército atualizado do outro. Quando o assunto é o que houve entre 1964 e 1985, jovens oficiais, que nada têm a ver com aquele tempo, estão sendo ensinados que as Forças Armadas livraram o Brasil de perigos e não cometeram erros.

O que leva jovens militantes para a porta do Clube Militar é o acinte de tantos anos depois ainda comemorarem o que deveria ser repudiado. Os militares da ativa durante anos na democracia celebraram a data de 31 de março dentro dos quartéis e não foram impedidos. Deveriam ter sido impedidos de fazerem isso há mais tempo. A celebração de qualquer fato histórico é um momento de renovação e afirmação de um conjunto de valores e convicções. Nesse caso, o que estava sendo celebrado e confirmado foi o que produziu uma tragédia no país. Não se conserta cabeça torta dos militares formados na lógica daquele tempo, mas a democracia deveria ter impedido, há mais tempo, que dentro das Forças Armadas esses mesmos pensamentos fossem impunemente reproduzidos.

Os comandantes têm repetido aos seus comandados a sua versão da história. Por serem instituições hierarquizadas, não são contestados. Essa versão continua sendo apresentada como verdade nos cursos internos das escolas de comando. Ensinam aos jovens nos colégios militares os mesmos disparates.

Quando os governos civis fingiram que não viam as celebrações - em nome de não reabrir um velho conflito - estavam permitindo que novas gerações fossem formadas na convicção de que as Forças Armadas estavam certas quando assaltaram o poder em 1964. Para uma república tantas vezes interrompida por surtos autoritários é uma displicência inaceitável. A omissão dos governos democráticos atrasou avanços institucionais e a integral submissão dos militares ao poder civil.

Manter comemorações, explícitas ou veladas dentro dos quartéis, equivale a permitir nos Estados Unidos a defesa dentro do governo da política de segregação racial; ou na África do Sul a defesa do Apartheid; ou na Alemanha os ideais do nazismo. Pode haver nos Estados Unidos, África do Sul ou Alemanha quem defenda essas aberrações. Mas nenhum desses três países admitiria que esses ideias fossem defendidos dentro de órgãos governamentais.

É bem possível que a Comissão da Verdade não chegue aos fatos, que documentos destruídos ou levados para as suas casas pelos militares envolvidos nos crimes cometidos pela ditadura nunca apareçam. Mas o Congresso decidiu que a Comissão fosse criada e ela precisa fazer seu trabalho. Não é instância de punição. É de busca da informação. Se isso reabre velhas feridas, produz conflitos no Centro do Rio, troca de farpas em artigos de jornal não é problema com o qual seus integrantes devam se preocupar. Ainda que tarde o Brasil busca informações. E o país não pode se constranger nesse esforço. O silêncio nunca foi o melhor remédio para as divergências. O debate amadurece convicções e permite a superação dos traumas nacionais.

Ueba! Demóstenes soltou pum! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 31/03/12

Se o Demóstenes for pro PMDB? Vira PMDBóstenes! Ele fez cocô na sala e limpou com o tapete!

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Os juros caíram! Primeiro de Abril. Rarará.
Predestinado do dia: "Vendo ovo de Páscoa. Falar com Ovídio". E já foram ao supermercado hoje? É tanto ovo pendurado no teto que você tem que fazer compras de quatro, de gatinhas.
Túnel de ovo! A Volta do Túnel de Ovo de Páscoa! Eu peguei um. Não pra comprar, mas pra abrir caminho! Rarará! Você quer um desodorante? Não tem, tem ovo! Quer um sabão em pó? Não tem, tem ovo! Tem ovo até do Batman! Mas o ovo do Batman é do Robin. Tem dono!
E tem ovo com a cara do Demóstenes. Tô adorando essa história do senador Demóstenes com o bicheiro Cachoeira, mafioso dos jogos de azar! Deu azar mesmo!
E a manchete do Piauí Herald: "Destino de Demóstenes será decidido no blackjack". No videopôquer! No videopôquer e na porrinha! O Demóstenes tá com cara de quem foi pego soltando pum na aula!
E o Demóstenes é do DEM. Desespero em Marcha! Rarará! E, já que eles são de Goiás, podiam fazer uma dupla sertaneja: Cascatinha e Cachoeira! Esse DEM já quis dizer Deixa Eu Mandar, Deixa Eu Mamar e depois virou DEMolidos e DEMitidos. E agora um novo significado: Desespero em Marcha!
DEM vem de Democratas. E como eles fazem pra transformar o Agripino Maia em democrata? Rarará! E tinha um filme antigo chamado "Amei um Bicheiro". Com Demóstenes e Cachoeira! E, como disse o chargista Amarildo: "Se cair o DEM do Demóstenes, vira Óstenes!". É como ficar pelado. É verdade!
Uma vez um padre foi celebrar uma missa numa praia de nudismo. E os nudistas: "Tira a roupa! Tira a roupa!". Aí ele tirou. "Agora tira o óculos." "Os óculos eu não tiro. Não quero ficar pelado."
Aliás, o único problema de praia de nudismo é o tamanho do pingolim. Se for grande, todo mundo olha. E, se for pequeno, olham mais ainda. Rarará!
E se o Demóstenes for pro PMDB? Aí vira PMDBóstenes! Rarará! Este Demóstenes fez cocô na sala e limpou com o tapete! Como dizia a minha avó: "Nunca confie em quem tem cara de coroinha"! Rarará!
E amanhã é Primeiro de Abril. PAC é Primeiro de Abril, Companheiros! E eu sonhei com o Demóstenes e vou jogar na zebra! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

Afinal, o que quer o Brasil? - FERNANDO RODRIGUES


FOLHA DE SP - 31/03/12

BRASÍLIA - Por dever de ofício, acabo indo a recepções para autoridades estrangeiras aqui em Brasília. Numa delas, bem recente, havia deputados suecos. Um deles perguntou, secundado pelos demais: "Afinal, o que quer o Brasil?".
Não entendi. O sueco detalhou. Queria saber qual é "o objetivo do Brasil na arena global". Disse ter conhecimento do potencial do país e da atual fase de crescimento. "Mas não está claro para mim por que a Suécia deveria dar apoio ao Brasil no plano internacional".
E prosseguiu: "O Brasil quer fazer parte do Conselho de Segurança da ONU. Mas para quê? Vejo o Brasil como um país que parece querer ser amigo de todos internacionalmente. Quando você é amigo de todos, não consegue o respeito nem o apoio necessário".
Uma mulher, também deputada sueca, quis saber por que o Brasil insiste em não condenar países que não defendem os direitos humanos. Citou Cuba. Os suecos, como se sabe, não são o que se pode chamar de conservadores. A crítica não continha nenhum viés ideológico.
Os parlamentares suecos visitaram ministros em Brasília. Um deles relatou: "Perguntei a todos sobre os objetivos da política externa brasileira. O máximo que consegui ouvir foi que a política externa do Brasil visa a garantir o crescimento do país. É um objetivo doméstico. É difícil conseguir apoio de outros países só para benefício próprio".
Lembrei-me dessa conversa por causa da viagem de Dilma Rousseff à Índia. O foco da presidente no cenário internacional tem sido quase 100% sobre o crescimento do país. Não é ruim. Mas é pouco para ser protagonista mundial.
Para terminar, um dos suecos arrematou, sem dó: "O Brasil tem de escolher. Deseja ser apenas um país ou uma nação? Uma nação coloca uma alma na sua política externa. Não entendi ainda qual é a alma da política externa brasileira".