segunda-feira, abril 01, 2013

Comissão da Verdade - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 01/04

João Barone, o eterno Paralamas, e Zé de Abreu, o ator petista, brigaram no Twitter por causa de Dilma.

— A “presidenta” pede que carreguem nas tintas da Comissão da Verdade. Podia se preocupar é com a seca no Nordeste e outros problemas maiores — escreveu Barone.

A resposta de Zé:— Baterista é tão importante que os Beatles trocaram. E não mudou nada. Calma, gente!

Quase 20 milhões
O MinC liberou a Música em Trancoso Empreendimento, com sede em São Paulo, a captar, via Lei Rouanet, R$ 18.432.685,04 para o projeto “Anfiteatro Música em Trancoso”, um centro cultural no famoso distrito de Porto Seguro, BA.

Aliás...
A verdadeira praia de paulista endinheirado é Porto Seguro.

Bangue bangue
O Estatuto do Desarmamento faz uma década com importante vitória parcial: a compra anual de armas de fogo por famílias brasileiras caiu de 57 mil para 37 mil.

É o que revela pesquisa de Marcelo Neri a ser lançada hoje em seminário sobre o tema no Ipea.

Clube do milhão
“Vai que dá certo”, de Mauricio Farias, com Fábio Porchat e Gregório Duvivier, alcançou em dez dias mais de 1 milhão de espectadores.

A previsão é que o filme supere a marca dos 3 milhões.

As voltas que...
O novo presidente do Instituto Brasileiro de Museus, Angelo Oswaldo, foi contra a criação da autarquia em 2009.

À época ele disse que o projeto enfraquecia a política cultural do país.

Edney internacional
O coleguinha Edney Silvestre será o primeiro autor brasileiro a participar do festival literário Hay, na Inglaterra, que inspirou Liz Calder a criar a Flip no Brasil. Será dia 25 de maio.

“Se eu fechar os olhos agora”, o livro de Edney, além da Grã-Bretanha, sai na França e na Itália no primeiro semestre.

Por falar em Flip...
Cresce o número de festivais literários no Brasil.

Nomes como Frei Betto, Affonso Romano de Sant’anna e Xico Sá participarão da projeto “Navegar é preciso”. Pelo terceiro ano, um barco navegará pelo Rio Negro, de 29 de abril a 3 de maio, com uma programação que inclui encontros literários.

De volta
O publicitário Octavio Florisbal, que comandou a Rede Globo, reassumiu sua cadeira no Conselho Superior do Conar.
Sua volta foi saudada por Gilberto Leifert, presidente da instituição.

Niskier na Sorbonne
Dias 16 e 18, Arnaldo Niskier vai falar na Sorbonne Nouvelle. Os temas: “Rachel de Queiroz, a primeira imortal brasileira” e “Em defesa da lusofonia”.

Tomate de ouro
Dona Inflação atacou sábado na feira da Rua Frei Leandro, no Jardim Botânico, no Rio.O quilo do tomate estava a quase R$ 15. Confira na foto.

Cine protesto
Na sessão de sexta de “O dia que durou 21 anos”, filme de Camilo Tavares que retrata o período da ditadura, no Odeon, no Rio, um espectador mandou um sonoro “FDP” quando apareceu na tela a figura do general americano Vernon Walters.

O militar ajudou nas articulações que levaram à deposição de Goulart, em 1964.

Bienal tricolor
O Fluminense vai ter um estande na Bienal do Livro, em agosto, no Rio. Dois livros já estão garantidos: “Guerreiros desde 1902” e “Fluminense tetracampeão”.

A ideia é convidar um escritor tricolor por dia para dar autógrafos e conversar com torcedores.

Alô, polícia!
Uns cinco ambulantes vendiam sexta, perto da esquina das ruas Uruguaiana com Sete de Setembro, no Centro do Rio, aparelhos de celular Samsung Galaxy III, que chega a custar uns R$ 2 mil. Mas a turma pedia... R$ 300.

Diante de qualquer pedido de desconto, o preço do aparelho caía para R$ 150.

Segue...
Uma das ambulantes, inclusive, ofereceu baixar o preço se o cliente botasse o telefone usado na negociação.

Pelo visto, acabaram de inventar a “lavagem de celular”.

O gozo da pulsão de morte - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 01/04

O que está em jogo é torturar quem não parece estar enquadrado no jogo da pureza moral


Pense na Dinamarca. País perfeito, que, junto de Suécia, Noruega e Islândia (um dos lugares mais fascinantes em que já estive justamente porque é no fim do mundo e ninguém normal vai para lá), forma o paraíso na Terra para essa gente do "queremos um mundo melhor".

A chave para entender esses belos países não é o que gente mal informada acha que é, a saber, seu altíssimo grau de civilização e "consciência social" (em mil anos, termos como esse soarão como hoje soa "raça ariana superior"), mas, sim, seu altíssimo grau de prazer em reprimir tudo que não seja norma e de torturar todos que parecerem estar fora dela (dito de modo psicanalítico, um enorme gozo da pulsão de morte a serviço da repressão e humilhação moral).

O luteranismo puritano do passado escandinavo se transformou na repressão terrível em nome de "sua santidade" o politicamente correto, seja ele ecológico, social, sexual, cultural, ou que diabo for.

O que está em jogo é torturar quem não parece estar enquadrado no jogo da pureza moral. O cinema de Ingmar Bergman, Lars von Trier e Thomas Vinterberg, por exemplo, é um testemunho claro desse gozo mórbido pela hipocrisia do amor à norma.

Mas seria injusto passar a conta para os escandinavos. Nós todos gozamos em torturar quem cai na desgraça de ser um herege. O ódio nos move mais do que o amor, e, antes de tudo, odeio o racista mais do que amo sua vítima de racismo.

Adoramos humilhar, perseguir, destruir homens e mulheres, porque supostamente feriram códigos. Mas a maioria de nós não está nem aí para os códigos. Gosta, sim, de ver o desgraçado reduzido a lixo.

Somos inquisidores natos, prontos a babar em cima da primeira vítima que surgir, principalmente a "moçadinha" por um mundo melhor.

Por isso, na Idade Média levavam as crianças para o programa de domingo, que era ver infelizes arderem. E você, caro leitor, que talvez se ache o máximo, provavelmente levaria o seu filho também para cuspir no herege. Quer ver: o que você acha do pastor Feliciano? Ou de algum machista nojento? Ou de padre pedófilo? Merecem um xingamento básico? Quem sabe, ovo podre? Bruxa e gay hoje não são mais hereges, são parte do status quo "cabecinha".

Por falar em Vinterberg, veja o maravilhoso "A Caça", com o excelente Mads Mikkelsen (o mesmo do "Amante da Rainha") no papel principal de um professor de jardim de infância injustamente acusado de pedofilia por uma aluna.

O filme deveria ser passado nas escolas de magistratura, nas faculdades de psicologia, pedagogia, serviço social e outros quebrantos.

Tudo nele é sofisticado e a serviço de desmascarar o inquisidor que existe em nós. O erro da "moçadinha" para um mundo melhor é não entender que, para descobrir o inquisidor babão em si mesmo, a chave não é pensar em "vítimas oficiais de preconceito", mas sim em quem você odeia por razões que você considera justas.

A questão do filme não é negar o horror da pedofilia (vamos esclarecer antes que algum inquisidor comece a babar em cima de mim), mas, sim, mostrar como funciona nossa velha natureza humana em seus novos objetos de gozo mórbido moral.

A menina, Klara, tendo sido "recusada" em seu amor pelo professor Lucas (Mikkelsen) -ela o beija na boca-, vinga-se dizendo para a diretora da escola (esse ser quase sempre pronto para abraçar qualquer moda, mesmo as modas de horror como a pedofilia) que ele tinha mostrado seu órgão sexual para ela.

Daí, claro, segue-se o "normal": um especialista acaba por dar a bênção "científica" para a acusação de pedofilia contra o inocente Lucas. Ele segue a cartilha de que as crianças nunca mentem e quando negam o suposto abuso é porque estão envergonhadas. De repente, todas as crianças dizem terem sido abusadas.

Por isso, de nada adianta o arrependimento de Klara, que tenta negar o que disse mil vezes (e ela o faz várias vezes, mas nenhum adulto acredita nela). Todos "cospem" em Lucas: amigos e suas mulheres, colegas de trabalho, ex-mulher, quitandeiros.

Teste sua alma de inquisidor: o que você faria se acusassem o professor de sua filhinha de pedofilia?

Moral e cívica - LÚCIA GUIMARÃES

O ESTADO DE S. PAULO - 01/04
Quando abri a mochila no começo do ano letivo e meu pai viu o título do livro da disciplina que não existia no seu tempo, sacudiu a cabeça, pesaroso. Sabia que Moral e Cívica era um artifício imoral da ditadura militar que desprezava a civilidade. Se, na minha infância, a noção de civismo foi associada à cor verde-oliva, na semana passada a expressão ganhou para mim um polimento como o oferecido pelos melhores engraxates da Rua São José, no centro carioca.

Uma mulher de 82 anos, Edie Windsor, viúva de outra mulher, derreteu o coração de uma boa parte do país, pedindo à Suprema Corte que não prolongasse a exclusão social que ela enfrentou durante 40 anos com sua companheira Thea, morta em 2007.

Uma juíza franzina de 80 anos, sobrevivente de duas batalhas contra o câncer, cunhou com seu característico senso de humor oneologismo "casamento desnatado". A juíza Ruth Bader Ginsburg expôs ao ridículo o arrazoado do advogado que defendia a perpetuação do sofrimento de gente como Edie, perguntando porque ele rebaixava a instituição do casamento tentando impor duas castas: a da união integral, disponível para héteros e um casamento diluído para gays. Milhões comemoraram o gol de placa de Ruth, cuja voz trêmula nos argumentos gravados foi ouvida em escala viral.

Quando o público passa dias na chuva e no frio da capital, sem desordem, esperando conseguir uma das poucas vagas disponíveis para espectadores nas sessões da Suprema Corte, a memória de uniformes verde-oliva se torna ainda mais distante.

O casamento entre pessoas do mesmo sexo, como o Gênio que escapou da lâmpada, não será mais aprisionado na garrafa da contracultura. A cara do movimento é Edie. Ou um universitário da Califórnia, um dos 40 mil filhos de casais homossexuais que cresceu sem compreender a pecha de ilegitimidade que o governo federal lhe impingiu com o lamentável Ato de Defesa do Casamento. O ato conhecido pela abreviação Doma que Bill Clinton assinou sozinho, numa madrugada em campanha de reeleição, em 1996, está em julgamento na Suprema Corte. O cálculo eleitoral do ex-presidente que ajudou a reeleger, em novembro passado, o primeiro presidente a defender o casamento gay, lhe custou amizades e parte da reputação. Clinton tem feito o possível para se penitenciar, num reconhecimento extraordinário de que seu oportunismo pode ter atropelado a Constituição.

Mas a discriminação, é bom lembrar, não afeta apenas minorias, sejam elas raciais ou sexuais. A mulher que quer se tornar a primeira prefeita lésbica de Nova York, a mulher cujo casamento com outra mulher foi um dos acontecimentos sociais do ano em 2012, fez outro cálculo eleitoral para discriminar contra a maioria. Falo da maioria, de brancos, mulatos, negros e índios, heterossexuais e gays, jovens mães e homens idosos que não conseguem se aposentar, todos os grupos de empregados da cidade. Christine Quinn, líder da Câmara dos Vereadores e candidata declarada à sucessão de Michael Bloomberg em novembro, passou três anos obstruindo a votação de uma lei municipal que permitiria 5 dias de licença médica remunerada por ano a empregados de empresas com mais de 15 funcionários. Segure seu queixo, caro leitor: se uma pessoa trabalhando em tempo integral numa empresa em Nova York tiver 40 graus de febre e um caso extremamente contagioso de influenza, vai ser mandada para casa com seus germes, é claro, e pode ter seu salário descontado pela falta.

Cristine Quinn, a candidata democrata que tanto lutou contra a própria discriminação, parece achar que ficar doente é uma fraqueza moral ou uma afronta cívica ao lucro de um empregador. Graças em parte a uma denúncia da lendária feminista Gloria Steinem, que ameaçou retirar seu apoio a Quinn, a gritaria foi o bastante para a candidata refazer seu cálculo aritmético eleitoral mas não sem antes diluir o Projeto de Lei. Que o bilionário Bloomberg promete vetar.

A frase mais sensata sobre a compaixão seletiva de gente como Christine Quinn foi pronunciada pelo primeiro político eleito para o Congresso a sair do armário, em 1987. Barney Frank, recém-aposentado aos 73 anos, disse que sua atração sexual por homens é hoje mais tolerada do que sua atração pelo papel do governo na vida dos americanos.

Viola caipira - JOSÉ DE SOUZA MARTINS

O Estado de S.Paulo - 01/04

Foi no Theatro Provisório, na noite de 13 de outubro de 1887, uma quinta-feira, que a viola caipira saiu dos caminhos de roça e dos vilarejos do interior e subiu pela primeira vez a um palco de teatro na cidade de São Paulo. O teatro ficava na Rua Boa Vista. Seria demolido para no lugar se construir o Teatro Santana, em 1900. O violeiro Pedro Vaz levava nos braços seu "rústico pinho popular", a viola de dez cordas de arame. Tocou cateretês, modinhas, valsas, fandangos e lundus, 12 de suas composições para um público culto. Dentre elas, Saudades do Sertão, um fandango sertanejo, e Paulistana, uma valsa dedicada aos paulistanos. Ele se apresentaria de novo, em 1900, no Salão do Grêmio, em Campinas, num "concerto de viola".

Pedro Vaz era fluminense de Resende e primo do poeta Fagundes Varela, que foi aluno da Faculdade de Direito e morou no Brás. Era professor de música. Apresentou-o ao público, em artigo de jornal, o poeta Ezequiel Freire, autor de Flores do Campo, que aqui vivia, também de Resende. Patrocinou sua vinda e apresentação em São Paulo o Dr. Clímaco Barbosa, médico baiano aqui radicado, maçom, abolicionista, que em 1893 participaria da Revolta da Armada contra Floriano Peixoto e seria preso na Fortaleza da Lage, no Rio de Janeiro. A apresentação de Pedro Vaz se deu num cenário politicamente conservador e socialmente progressista. Alguns meses depois, os conservadores fariam a abolição da escravatura, não os liberais.

A apresentação de Pedro Vaz no Theatro Provisório foi um verdadeiro episódio de ascensão social da viola caipira. Até então, era ela instrumento musical de pessoas consideradas ínfimas. Não era incomum, no anúncio de escravos fugidos, sobretudo mulatos, a indicação de que se tratava de um violeiro. São vários os indícios de que a viola libertava o espírito dos cativos, o que os impelia à fuga. A viola era o instrumento da liberdade, dos que viviam à margem do mundo criado pela escravidão.

Entre os tropeiros, geralmente mestiços oriundos da escravidão indígena, os verdadeiros caipiras, era frequente a presença de violeiros tangendo a viola nos ranchos de estrada. Uma dessas modas teve a estrofe registrada por um passante: "Ai viola, viola minha, só tu sabes meus segredos..." A subida da viola aos palcos começou a livrá-la do estigma injusto de instrumento musical de gente à toa.

A ascensão social da viola caipira está diretamente ligada ao movimento cultural e político de formação da nacionalidade, associado ao fim da escravidão e à Proclamação da República. A viola une a inspiração de duas expressões da identidade brasileira: uma pintura de Almeida Júnior, O Violeiro, de 1899, foi presente do fazendeiro José Estanislau do Amaral à sua filha, a pintora Tarsila do Amaral. Pode ser admirada na Pinacoteca do Estado.

Traição - MARION STRECKER

FOLHA DE SP - 01/04

Segundo a empresa Websense, apenas o crescimento de links maliciosos cresceu 600%


Acordei com um e-mail do Gerald Thomas: "Oi, meu amor, fico recebendo coisas do tipo: Marion te adicionou ao TWOO ou algo assim. O que vem a ser isso? Love, J".

O Gerald, um internauta veterano, resolveu perguntar antes de sair clicando no link que recebeu por e-mail. Fez bem.

Embora o e-mail tivesse até uma foto minha, não fui eu que mandei.

Quem mandou foi um site maligno que funciona em 37 idiomas e inferniza o público disparando e-mails a torto e a direito. Ele se aproveita dos contatos do seu computador e do seu Facebook.

O site pertence à empresa belga Massive Media e diz atrair 9,6 milhões de pessoas por mês, citando dados da comScore de novembro do ano passado.

Essa atração é feita com base em traição, o que não chega a ser novidade na internet.

O principal executivo do Twoo, Lorenz Bogaert, prometeu corrigir o "mal-entendido" quando foi questionado. Mas o problema persiste.

Mal tinha respondido ao e-mail do Gerald, recebo um outro com logotipo do Serasa. Trazia um aviso eletrônico de multa do Detran em meu nome e link para um boleto.

Estranhei. Daí me ocorreu pousar o cursor sobre o link enviado para observar a URL que aparecia (aquele endereço eletrônico de um site). Pronto: o endereço não era derivado da família de endereços do Serasa (www.serasa.com.br ou www.serasaexperian.com.br). Apaguei.

Há muitos anos não passo uma semana sem receber e-mails maliciosos, em nome de bancos, empresas ou pessoas, conhecidas ou desconhecidas, com pedidos ou convites, anexos ou links que nada mais são do que armadilhas.

Segundo a multinacional de segurança Websense, baseada em San Diego, Califórnia, apenas o envio de links maliciosos cresceu 600% no último ano. Do total de e-mails em circulação, apenas 21,6% eram legítimos, sendo 76,4% deles spams (e-mails não solicitados), 1,6% phishing (tentativa de recolher nome de usuário, senha ou dados de cartão de crédito) e 0,6% malware (software malicioso).

Como sair ileso? Abrindo mão da curiosidade. Desconfiando de tudo e de todos, especialmente de mensagens que não sejam evidentemente apenas para você. Checando endereços antes de clicar em um link. Não abrindo nenhum anexo a não ser aquele que você já estava esperando. Evitando aplicativos de um modo geral, a não ser que sejam muito bem recomendados.

Vale fazer tudo isso? Não sei.

Fiquei pensando nos jovens que em vez de e-mail usam celular e redes sociais. Lembrei que spam, links maliciosos e softwares maliciosos já aparecem também em celular e redes sociais.

Fiquei matutando sobre quanto tempo e dinheiro gastamos para driblar as arapucas da internet. Pensei no mote que parece ser: "Crie problemas e venda soluções". Ou: "Crie pânico e venda tranquilidade".

Lembrei da arquitetura da violência. Moro num condomínio que se enche de grades e câmeras de segurança enquanto adolescentes são roubados e mortos na calçada da frente. Pensei que as estatísticas servem para explorar o medo e comercializar produtos. Não exatamente para melhorar serviços ou a qualidade de vida das pessoas.

Vá reclamar com o bispo - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 01/04

Os crônicos problemas da telefonia no Brasil estão gerando situações esdrúxulas. Incapazes de fornecer serviços decentes, compatíveis com os preços que cobram e com os lucros que auferem, essas empresas também não cumprem a obrigação de atender a legião de clientes que têm queixas a fazer.

Resultado: os consumidores insatisfeitos têm pedido ajuda à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O volume de reclamações à Anatel é tão grande que a agência teve de ampliar seu call center, ao custo de R$ 17 milhões anuais, bancado com dinheiro público.

Conforme informou o jornal Valor (27/3), a Anatel promete cobrar essa conta das operadoras. "Não é correto que o contribuinte arque com os custos dos problemas que as próprias operadoras geraram", disse o presidente da agência, João Rezende. Nada mais justo. No entanto, a responsabilidade pelo descaso das operadoras em relação a seus clientes é também da Anatel, que foi incapaz, até agora, de fazê-las cumprir suas obrigações, a despeito de todo o barulho midiático gerado por multas, advertências e suspensão de serviços.

Os serviços de telefonia lideram as reclamações dos consumidores contra empresas. A primeira do ranking do ano passado, a Oi, chegou a receber cerca de 120 mil queixas. Em julho de 2012, a Anatel tomou a providência de impedir que a Oi, a Tim e a Claro, as três principais operadoras de celular do País e recordistas de reclamações, continuassem a vender seus pacotes de internet e de telefonia móvel em diversos Estados. Elas só puderam voltar ao mercado depois de se comprometerem a resolver os problemas que infernizam a vida dos clientes, como ligações que caem constantemente e a lentidão das conexões de banda larga. O mesmo aconteceu com a Vivo em 2009.

Ao recorrerem à Anatel, porém, os clientes mostram que as operadoras não tomaram jeito nem se intimidaram com as punições. Já são 30 mil queixas por dia na agência, um crescimento de 67% desde julho do ano passado, justamente quando a Anatel decidiu apertar um pouco as empresas. A partir desse momento, a agência passou a ser vista pelos consumidores como um canal para suas reclamações, não só sobre a qualidade do serviço, mas sobre a cobrança indevida de tarifas e a inclusão em pacotes que não foram contratados.

Além de ampliar seu call center, porém, a Anatel deveria fiscalizar com muito mais rigor, de modo a obrigar as empresas a melhorar a qualidade dos serviços e a fazer os investimentos que prometeram, de modo a justificar seus imensos ganhos. O principal nó do setor é a baixa qualidade da transmissão de dados 3G. A Anatel reconhece que há dificuldade de conexão nos horários de pico e que a velocidade e a estabilidade da transmissão estão muito abaixo das metas estabelecidas. Entre outros problemas, as antenas no Brasil têm capacidade dez vezes inferior às usadas nos Estados Unidos. Assim, parece precipitado falar em tecnologia 4G, já em uso nos Estados Unidos e na Europa e prometida para a Copa de 2014 no Brasil, se nem o serviço móvel 3G está plenamente desenvolvido no País.

Além disso, os consumidores foram estimulados a ter mais de um número de celular, ao adquirir planos de baixo custo, e isso sobrecarrega as redes. No final de 2012, a Anatel chegou a suspender algumas promoções das operadoras por temor de que o sistema não suportasse o tráfego de dados.

A Anatel afirma que está estudando maneiras de aprimorar o sistema de cobrança de multas, para reduzir a impunidade, e as empresas dizem que estão investindo bilhões de reais para melhorar os serviços. Promessas semelhantes foram feitas no passado, mas nada mudou, a julgar pela revolta dos consumidores.

Já são 260 milhões de celulares no Brasil, ou 132 aparelhos para cada 100 pessoas. Nenhum empreendimento dessa magnitude está livre de problemas, mas o que se espera é um comprometimento real das empresas e, principalmente, do governo para que os clientes das operadoras recebam exatamente o serviço pelo qual pagaram, nem mais nem menos.

Remédio Rastreado - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 01/04

Todos os medicamentos fabricados no Brasil passarão a sair de fábrica com um código de barras bidimensional. Em discussão na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior desde 2008, a chamada "norma da rastreabilidade" será publicada nesta semana. Vai ser definido um prazo para que a indústria se adapte à nova determinação.

REMÉDIO RASTREADO 2
O código de barras e pontos visa deixar os medicamentos menos vulneráveis à fraude. Deverão constar em cada caixa de remédio uma sequência de 13 números, mais o número do lote e a data de validade.

Os objetivos são dificultar falsificação, facilitar recolhimento de lotes com problemas e evitar evasão fiscal.

ENERGIA LIMPA
Segundo estudo da Secretaria Estadual de Energia, São Paulo tem potencial para gerar 12 terawatts/hora (TWh) por ano de energia solar, considerando apenas a melhor faixa de incidência do sol anual. O que seria suficiente para abastecer aproximadamente 4,5 milhões de residências em um ano.

ENERGIA LIMPA 2
O dado faz parte de um levantamento que será lançado na quarta-feira pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e pelo secretário José Aníbal, durante a abertura do Seminário Internacional sobre Biomassa, Biogás e Eficiência Energética.

Representantes de Áustria, Alemanha, África do Sul, EUA, Canadá e China participarão do evento no Palácio dos Bandeirantes.

TERRA NOSTRA
Barbara Berlusconi, filha do ex-premiê italiano Silvio Berlusconi, confirmou presença na programação VIP da SP-Arte nesta semana. Namorada do jogador Alexandre Pato, a italiana é fundadora da galeria Black Card Box, em Milão. Ela terá acesso preferencial a uma série de atividades da feira de arte, como visitas a ateliês e a exposições acompanhadas de curadores, jantares e festas.

SHOW
Levemente inspirada no Super Bowl, final do torneio de futebol americano, a Confederação Brasileira de Voleibol contratou Ulysses Cruz, que já dirigiu o "Criança Esperança" (Rede Globo), para transformar as finais da Superliga de vôlei em um megaevento esportivo.

SHOW 2
Intitulada "Isso É Vôlei", a iniciativa visa tornar os campeonatos mais atrativos para patrocinadores e televisão. Diferentemente do evento americano, porém, não haverá apresentações musicais. A ideia é criar gincanas e promoções para engajar o público.

PRONTA PARA O BIQUÍNI
Tainá Muller, na foto com Polaroid, gata do fotógrafo, entra nesta semana na novela das seis da Globo, "Flor do Caribe". Para o papel de Ludmila, a atriz aparecerá muito de biquíni e resolveu emagrecer três quilos. "Fiz uma dieta detox. Cortei glúten, lactose, café. Foi difícil", diz.

Neste ano ela também estará nos cinemas com o filme "As Fantásticas Aventuras de Um Capitão", de Marcos Jorge.

ANTES DE O COELHO CHEGAR
A revista "Billboard Brasil" festejou sua reformulação com show da banda Passion Pit, no hotel Unique, na véspera do feriado. Derrick Green, vocalista do Sepultura, a modelo Michella Cruz, o VJ da MTV Didi Effe e o empresário Facundo Guerra estavam entre os convidados do evento.

TELAS MÚLTIPLAS
A galeria Carbono, especializada em múltiplos, abriu as portas no Jardim Paulista. Os artistas Paulo Pasta, Nino Cais e Caetano de Almeida foram conferir o espaço. A galerista Myra Babenco e Fernanda Arruda circularam pelo vernissage.

EUROPEUS SATYROS
A cantora Neneh Cherry e os diretores Susane Osten e Roy Anderson foram assistir às apresentações do grupo de teatro paulistano Satyros, em temporada na Suécia. A trupe negocia com o grupo sueco Darling Desperados uma produção para o teatro e outra para o cinema.

CONTAR A HISTÓRIA
Único entrevistado do documentário "Falcão - Meninos do Tráfico" (2006) que ainda está vivo, Sérgio Teixeira, 27, escreve o livro "Fortalece" para a editora Favela Objetiva. E MV Bill, que dirigiu "Falcão" junto com Celso Athayde, também publicará pelo selo "CDD até a UPP", sobre a chegada da Unidade de Polícia Pacificadora à Cidade de Deus, no Rio.

AGORA VAI
Gal Costa, que teve problemas na voz e cancelou em cima da hora sua participação na Virada Cultural Paulista do ano passado, está escalada para a edição deste ano. Cantará fora da capital, em duas cidades participantes do evento, que acontece em 25 e 26 de maio.

NA CAMA COM PALOMA
A atriz Paloma Duarte vai viver a sua primeira vilã na tevê. Será Doroteia Ascar na novela "Pecado Mortal", estreia de Carlos Lombardi na teledramaturgia da Record.

Na história passada nos anos 70, ela será uma ninfomaníaca cérebro de uma família de bicheiros. "O papel é uma delícia e promete."

CURTO-CIRCUITO
Frei Betto lança "Aldeia do Silêncio", amanhã, às 19h30, no Itaú Cultural.

A Ovo faz mesa-redonda sobre design e arquitetura, às 19h, no teatro Eva Herz.

O coletivo de bandas de sopro Movimento Elefantes apresenta o show "Projeto Coisa Fina", hoje, às 21h, no Centro Cultural Rio Verde, na Vila Madalena. Classificação etária: 18 anos.

Operação Dudu - VERA MAGALHÃES


FOLHA DE SP - 01/04

À procura de pontos fracos do governador e potencial presidenciável Eduardo Campos (PSB), o PT vai usar a Petroquímica Suape, que acumula prejuízos há três anos, para questionar o sucesso de seu governo em atrair investimentos. Em 2010, o saldo foi negativo em R$ 96 milhões. Em 2012, em R$ 387,4 milhões. Para atrair o complexo da Petrobras, Campos ofereceu mais incentivos fiscais que o petista Jaques Wagner (BA). Lula também agiu para que o polo fosse para Pernambuco.

Conta... Das três plantas previstas no parque, a primeira entrou em operação com quase dois anos de atraso. Além disso, o investimento necessário para erguer o complexo mais que dobrou. Inicialmente, estava orçado em R$ 4 bilhões, mas se prevê que custará R$ 9 bilhões.

... não fecha O negócio está ficando pesado para a Petrobras, que, no meio do caminho, ainda viu seu sócio privado (Vicunha) deixar a empreitada. As obras contam com recursos do PAC e foram financiadas pelo BNDES.

Outro lado O governador afirma que não tem a ver com o prejuízo da Petrobras, decorrente do atraso nas obras. Para ajudar mais a estatal, Campos disse ter prorrogado o limite de uso dos benefícios fiscais concedidos até 2022. Para ele, Suape é o melhor local para uma petroquímica.

Pós-show Mesmo com uma lista de pelo menos 120 fundos de investimento estrangeiros interessados em investir nas próximas licitações de infraestrutura, consolidada após o road-show de projetos no exterior, o governo está preocupado.

Concorrência Planalto e Fazenda acham que terão sucesso nos leilões do pré-sal e dos aeroportos, mas temem problemas com rodovias e ferrovias. Os EUA, em recuperação industrial, estão tirando dos países emergentes potenciais investidores.

Vantagem Pelo menos 18% dos parlamentares que propuseram emendas à medida provisória que desonerou novos itens da cesta básica tentaram legislar em causa própria. O senador Blairo Maggi (PR-MT), produtor de soja, e o deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), dono de fábrica de biscoitos, foram os que obtiveram mais êxito.

Híbrido 1 Aliados de Geraldo Alckmin tentam convencê-lo a fechar acordo com partidos que apoiarão Eduardo Campos e Dilma Rousseff, a despeito de o PSDB lançar Aécio Neves a presidente, e que permita campanha para ele casada com a dos outros presidenciáveis.

Híbrido 2 Esses aliados defendem Márcio França (PSB) para vice de Alckmin, o que afastaria o PSB do PT e do PSD de Kassab em São Paulo. Sobre a esperada queixa dos aecistas, lembram as chapas Lulécio (Lula e Aécio) e Dilmasia (Dilma e Anastasia), que pipocaram em Minas em 2006 e 2010.

Fuleco 1 O governo do Ceará comprou quatro "tatuzões", escavadeiras que abrem túneis de metrô. Cid Gomes afirma que o gasto de R$ 130 milhões, inusual (geralmente empreiteiras alugam as máquinas), vai permitir que a Linha Leste do Metrô de Fortaleza saia em prazo recorde e a preço menor.

Fuleco 2 O "tatuzão" tem vida útil curta. Uma empresa norte-americana ganhou a licitação para a compra, com preço R$ 50 milhões menor que outra, alemã. As quatro máquinas vão operar ao mesmo tempo nos dois túneis, que terão 13 km e custarão cerca de R$ 3,6 bilhões.

Boleira Dilma Rousseff irá na sexta-feira a Salvador para inaugurar a Fonte Nova. Será o terceiro estádio da Copa do Mundo a ser entregue.

Tiroteio
A propaganda enveredou pelo delírio: até a situação da Petrobras está uma maravilha. Abusam do dinheiro e da nossa paciência.
DO SENADOR ALOYZIO NUNES FERREIRA (PSDB-SP), sobre os gastos do governo com programas de TV que promovem as realizações da presidente Dilma.

Contraponto


Laços de família


A homenagem que o Coronel Paulo Telhada pretende fazer à Rota, enaltecendo a atuação da corporação durante a ditadura militar, dominou os debates na primeira reunião da Comissão da Verdade da Câmara de São Paulo, na terça-feira. Escalado para dissuadir o colega de partido da iniciativa, Mário Covas Neto (PSDB) se aproximou do editor Sérgio Gomes.

-O senhor tem que honrar o seu avô - pediu Gomes.

-Pai - respondeu o tucano.

Para espanto de Covas Neto, o interlocutor perguntou:

-Mas o senhor não é neto do Franco Montoro?

De gregorianos a felicianos - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

O Estado de S.Paulo - 01/04

Tratada como remendo eleitoral, a reforma da política está se encaminhando para, na melhor das hipóteses, acabar num fetiche gregoriano: uma mexida de calendário para valer daqui a 10 anos. No pior cenário, a maior interessada, a sociedade, perderia o direito de saber quem financia quem no jogo político-eleitoral.

Depois de muitas reuniões inconsequentes, os líderes partidários concordaram que são incapazes de chegar a acordo sobre a pretensa reforma política. O impasse vai ser decidido no voto na próxima semana - se os nanicos deixarem. Caso PRs e PSCs da Câmara permitam, os deputados devem votar um par de emendas à Constituição e um ou dois projetos de lei sobre o tema.

Presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) escreveu em seu Twitter que "coincidência de eleições municipais e federais no mesmo ano foi o ponto de maior consenso entre os líderes". Por "maior consenso", entenda-se menor dissenso.

Nem todos acham boa ideia dar seis anos - e não quatro - de mandato aos prefeitos que vierem a ser eleitos em 2016. Mas é o jeito para que todas as eleições passem a coincidir a partir do longínquo ano de 2022 sem que haja prefeitos-tampão ou, ainda pior, prorrogações de mandato sem consulta ao eleitor.

Sempre à frente de seu tempo, nossos representantes também divergem sobre a conveniência de incluir na mesma urna até oito votações diferentes: vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, dois senadores, governador e presidente. Tantas digitações requereriam aulas de piano para o eleitor.

Há quem proponha que a coincidência de eleições se limite ao ano. As votações ocorreriam em datas distintas: para presidente, senadores e deputados federais em - digamos - setembro, e para vereadores, prefeitos, deputados estaduais e governadores um mês depois. Brilhante e econômica solução.

Não importa que os custos sejam dobrados ou que o segundo turno de uma eleição coincida com o primeiro turno da seguinte. Com quatro meses perdidos entre propaganda eleitoral, duas eleições e dois segundos turnos, daria para emendar todo o processo eleitoral com Natal, Copa do Mundo, Semana Santa, carnaval e decretar um ano facultativo. Faria pouca diferença no Congresso.

Outra das emendas é daquelas inutilidades pomposas que os parlamentares se esmeram em aperfeiçoar: para não mais atrapalhar suas viagens de réveillon, querem adiar a posse de prefeitos para 5 de janeiro, de governadores para 5 dias depois, e de presidente para o dia 15. A não coincidência de datas é para poderem ir às cerimônias e festas uns dos outros, é claro.

Depois que essas mudanças constitucionais de primordial importância forem votadas, os deputados finalmente poderão se dedicar ao que mais lhes preocupa: o dinheiro - ou como farão para financiar suas campanhas. O debate é se usarão mais do seu, do meu, do nosso, e se doações de empresas e pessoas continuarão sendo de conhecimento público ou se serão camufladas.

Fundo Perdido. Ironicamente chamada de "financiamento público exclusivo", a proposta petista que deve ir à votação prevê que todas as campanhas eleitorais sejam bancadas por um fundo único. Esse fundo receberia dinheiro do Tesouro Nacional e - a despeito do nome - de empresas e pessoas. O dinheiro seria dividido entre os partidos na proporção dos votos recebidos na eleição anterior. É o chamado fundo perdido.

O brilhantismo da proposta é acertar duas conveniências com uma penada só. Ao privilegiar três de cada quatro reais às campanhas de quem já manda, assegura-se grande vantagem aos incumbentes. Ao misturar tudo em um fundo só, ocultam-se as doações de empreiteiras, bancos e quem quer que seja aos candidatos.

Os partidos que têm as maiores bancadas parlamentares teriam também os maiores repartes financeiros, perpetuando-se no poder. Por mero acaso, o PT tem o maior número de deputados federais. Com as novas prefeituras ganhas em 2012, mais petistas devem eleger-se para a Câmara e Assembleias em 2014, o pleito que serviria de referência para o novo sistema. Muito conveniente.

Se sobrar tempo, os deputados devem votar uma proposta que - essa sim - poderia eliminar boa parte dos vícios que consomem o sistema partidário brasileiro: o fim das coligações nas eleições de deputados e vereadores. Sem esse artifício, partidos nanicos e partidos fisiológicos perderiam sua carona para o poder.

É coligando-se a outras siglas que os nano partidos garantem suas vagas na Câmara. Sem os votos dos coligados, o PSC elegeria 7 em vez de 16 deputados federais - e não teria peso para fazer o pastor Marco Feliciano tornar-se presidente da Comissão de Direitos Humanos. Mas, na lógica dos deputados, isso é menos importante do que dar um tapa no calendário eleitoral.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 01/04

Empresas aguardam regras de mercado livre de gás
Além das 28 empresas já autorizadas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) a comercializarem gás natural, outras companhias estão de olho em novas regras para o setor do gás e a abertura do mercado livre.

Para elas, o desenvolvimento do mercado livre de energia elétrica (para grandes consumidores) vai se repetir no de gás.

A Ecom Energia está abrindo uma outra empresa e também vai pedir à ANP a autorização para atuar na área.

Os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo já têm um marco legal para o mercado livre de gás.

"A lei do gás ainda depende de regulamentações, mas é uma tendência ter o mercado livre no setor, com o qual temos muita sinergia", diz Paulo Toledo, sócio-diretor da Ecom Energia.

As grandes indústrias poderão comprar no mercado livre e não só no regulado da distribuidora -como ocorre atualmente.

"Queremos preparar o consumidor para daqui cinco ou sete anos", afirma Toledo.

Ainda não há nenhuma negócio de gás por falta de regulamentação.

"A ideia é, quando houver comercialização, comprar gás da Petrobras, hoje é praticamente só ela." Há outros entrantes, como a British Gas, que podem ter sobras e vender no mercado livre.

"O país quer ser competitivo. Precisa abrir para trazer novos players. O governo vai ter de tirar um pouco desse monopólio ou essa mão tão pesada da Petrobras", afirma.

Do outro lado do mundo
A BB DTVM, do Banco do Brasil, vendeu US$ 200 milhões em fundo de dividendos no Japão.

A marca foi alcançada no período inicial de oferta de um mês. O fundo, que capta em moeda japonesa, foi oficialmente aberto na quarta-feira pela Shinko Asset Management, do Mizuho, que administra US$ 58 bilhões.

O Credit Suisse International foi responsável pelo hedge cambial.

A gestão da carteira de ações de empresas boas pagadoras de dividendos ficou com a BB DTVM.

"Não são apenas papéis de grandes empresas", diz o presidente da BB DTVM, Carlos Massaru Takahashi.

"Isso mostra que os japoneses querem coisas novas. Agora pedem informações sobre investimentos em infraestrutura", afirma.

"As negociações com eles são longas. Os japoneses querem entender tudo muito bem", diz Takahashi.

Mudança de fábrica
O grupo Taurus, de armamento, vai investir R$ 25 milhões para centralizar parte de sua produção em São Leopoldo (a cerca de 35 quilômetros de Porto Alegre).

Uma planta em Caxias do Sul e uma segunda de São Leopoldo serão transferidas. As mudanças serão feitas porque os prédios dessas unidades são alugados atualmente.

"Também queremos reduzir custos e aumentar a margem de lucro", diz Dennis Gonçalves, presidente da empresa.

A companhia planeja ainda transferir da capital gaúcha para a mesma cidade sua maior instalação, onde atuam 1.800 trabalhadores.

"Só não sei dizer quando isso vai ocorrer. Temos uma dificuldade por causa dos funcionários. Por outro lado, o local está sofrendo pressão imobiliária", diz.

A Taurus teve um faturamento líquido de R$ 701 milhões em 2012 -alta de 15%. Cerca de 70% de suas armas são vendidas nos EUA.

Imã de capital
A vinda dos fundos de "venture capital" (que investem em empresas iniciantes) estrangeiros ao Brasil começou por volta de 2009, mas tem se intensificado com a globalização dessa indústria.

"Os 'venture capital' de outros países estão vindo ao Brasil -e indo para outros mercados emergentes- por causa do alto grau de competição por negócios em centros como os EUA", diz Cláudio Furtado, diretor do centro de estudos em private equity e "venture capital" da FGV.

Grande parte das pequenas empresas que recebem o aporte copiam um negócio já testado no exterior, adaptando-o ao Brasil, diz Furtado.

O fundo americano Flybridge, por exemplo, já investiu em 65 empresas. Dessas, cinco eram brasileiras.

Companhias de diferentes segmentos receberam capital: de vendedora de materiais de construção pela internet a curso de inglês on-line. Agora, o fundo entrou no Clube Pitzi, que conserta celulares.

"Não são só negócios de tecnologia da informação que recebem investimentos, mas costumam ser empresas de tecnologia aplicada, podendo atuar na área de saúde ou agronomia", diz Furtado.

Jon Karlen, sócio do Flybridge -que tem R$ 1,1 bilhão em fundos-, afirma que procura start-ups que utilizem tecnologia para entrar em grandes mercados.

Para o dono do Pitzi, o americano radicado no Brasil Daniel Hatkoff, sua empresa atraiu capital ao oferecer uma ferramenta que resolve entraves atuais (arruma os celulares). "Investidores buscam pessoas atacando problemas importantes."

Luxo rotativo
O Prime Fraction Club, clube de compartilhamento de bens de luxo, vai investir R$ 40 milhões até o final deste ano para aumentar sua frota de veículos.

A previsão é que mais dois automóveis, três aviões, dois iates e três helicópteros façam parte dos seus novos ativos da empresa.

"Esse modelo de negócio [compra compartilhada] tem grande potencial no país. Metade das novas aquisições já estão comercializadas com nossos clientes", afirma Marcus Matta, presidente da companhia.

Do montante que será investido, 70% virão de recursos próprios e 30% de financiamento, segundo Matta.

A empresa conta atualmente com nove bens, cujo valor é de aproximadamente R$ 72 milhões.

"A tendência é que nosso faturamento cresça entre 30% a 40% neste ano."

Atacado no... A Cielo, de pagamentos eletrônicos, vai entrar no setor de atacado especializado. Um projeto piloto deve ser testado em mais de 2.500 estabelecimentos.

...cartão Bares e redes varejistas poderão pagar o abastecimento de seus estoques com cartão. Apenas 5% dos R$ 160 bilhões movimentados pelo setor passam pelo plástico.

Emprego... Profissionais da área de finanças (35%) e vendas (20%) foram os mais requisitados no serviço temporário no ano passado, segundo pesquisa da Page Interim.

...temporário O setor de tecnologia da informação e de telecomunicações, com 15%, foi o terceiro que mais recrutou em 2012, seguido pelos de logística e healthcare (cuidados da saúde), ambos com 10%.

Novo... O diretor-executivo da Fischer Brasil, Ricardo De Benedetto, vai comandar a divisão Americas (México, Estados Unidos e Brasil) da companhia, que atua nos setores químico e automotivo.

...posto As unidades representam 8% do faturamento global de € 500 milhões.

Entre desejos e realidade - MARCELO DE PAIVA ABREU

O ESTADÃO - 01/04

Beira a monotonia insistir em que o Brasil, na presidência de Dilma Rousseff, desistiu de ter política externa própria, inclusive no terreno econômico. O processo de satelitização de Brasília em relação a Buenos Aires é sem precedentes na história da diplomacia brasileira. Resulta, em parte, da reconhecida ojeriza da presidente ao Itamaraty, o que abre mais espaço para o miolomolismo de seus assessores diretos na área externa. Isso a despeito de sucessivos revezes: na pretendida mediação iraniana, na diplomacia hoteleira em Honduras, na trapalhada paraguaia, etc. A ênfase continua a ser em laços estreitos com o bolivarianismo, agora pós-chavista, e o neoperonismo na versão Fernández de Kirchner. Mas não se deve deixar de levar em conta a maleabilidade do Palácio dos Arcos às imposições do Planalto. Em outros tempos, a instituição ofereceu maior resistência às pressões dos donos do poder.

Em meio ao clima de expectativas positivas quanto a um possível acordo comercial entre os EUA e a União Europeia (UE), pode ser detectado algum otimismo, em círculos empresariais nos EUA e no Brasil, em relação a ressuscitar a ideia de um acordo comercial entre o Brasil e os EUA. Tal otimismo está baseado em ilusões, com a intensidade do desejo prevalecendo sobre a realidade dos fatos.

A longa história das fracassadas negociações para alcançar a integração hemisférica é conhecida. A Área de Livre Comércio das Américas (Alca) foi objetivo importante para sucessivos governos dos EUA pelo menos desde o início da década de 1990. De Brasília, o projeto foi encarado com desconfiança por duas razões principais. No plano político, havia relutância quanto ao alinhamento a Washington e às possíveis limitações à diplomacia brasileira em escala global. No plano econômico, foi percebido bem cedo que o governo norte-americano não estava preparado para convencer os "interesses especiais" nos EUA, preponderantemente no setor agrícola, a fazer as concessões que seriam a contrapartida às possíveis concessões brasileiras no que se refere à proteção de bens industriais e às regras associadas a temas como propriedade intelectual, investimento direto, serviços e compras públicas.

Era como se Washington pretendesse generalizar a estratégia de negociação adotada no Nafta, definida com base na maior competitividade da agricultura dos EUA em relação à mexicana. Mas, nas negociações da Alca, o Brasil era demandeur em agricultura e punha a agricultura norte-americana na defensiva.

O outro tema econômico de interesse do Brasil era a limitação do escopo para o uso de medidas discricionárias de defesa comercial, tema que os EUA insistiam em que deveria ser tratado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Essas dificuldades já haviam emergido claramente no governo FHC. Com a posse do governo Lula, houve ênfase redobrada nas limitações políticas à integração hemisférica. A Alca virou anátema num quadro em que foi fortalecida a "política externa de massas". No plano econômico, a insistência dos EUA em retirar da mesa de negociações tanto subsídios agrícolas quanto defesa comercial, para tratamento na OMC, levou à proposta brasileira de fazer o mesmo com os temas não tradicionais. A Alca ficou tão "light" que se dissolveu no ar. Mas o funeral foi protelado até 2005.

A argumentação dos que acreditam que houve mudança significativa nas condições que ditaram o fracasso da Alca em 2005 está calcada em argumentos políticos e econômicos. No terreno político, alega-se que a consolidação do País como potência regional e seu avanço para tornar-se potência mundial teriam eliminado o risco de "cristalização da assimetria de poder entre EUA e Brasil". O diagnóstico deixa de lado a óbvia fragmentação que marca hoje a América Latina, entre o bloco chegado às diversas vertentes do populismo (Argentina, Bolívia, Brasil, Equador e Venezuela) e os países que têm adotado políticas mais consequentes: Chile, Colômbia, México e Peru. Também não parece razoável subestimar as fricções quanto à liderança regional entre Brasil e México. E as pretensões brasileiras em relação à diplomacia global têm sido marcadas por recorrentes decepções.

Por outro lado, e mais importante, não é possível perceber mudança significativa quanto à desconfiança do governo em relação a uma aproximação política aos EUA. Tal desconfiança talvez pudesse ser minorada pela ação de diplomatas profissionais, mas, com o Itamaraty perdendo espaço para o Planalto, isso se tornou bem pouco provável.

No terreno econômico, os argumentos estão centrados na ideia de que a ascensão da China teria tornado menos relevante o problema da concorrência norte-americana. E de que um possível acordo EUA-UE poderia atenuar o protecionismo agrícola nos EUA. Os argumentos não se sustentam. De fato, a concorrência chinesa tende a tornar mais entranhadas as resistências protecionistas da indústria brasileira. E, sendo a Europa notoriamente ineficiente na agricultura, é difícil perceber como um futuro acordo EUA-UE poderá contribuir para abrir o mercado agrícola norte-americano.

Os fatos mostram que o relançamento das negociações da Alca é muito improvável. A despeito dos desejos.

Refém das urnas - CLAUDIO J. D. SALES

O GLOBO - 01/04

Nos últimos meses o setor elétrico tem sido alvo de intenso ataque que vem desestruturando as bases institucional, econômica e regulatória de um setor que é base para o bem-estar social e toda a cadeia de produção.

Tudo começou com a implementação truculenta da Medida Provisória n° 579/2012 (depois convertida na Lei 12.783/2013), que tratou da antecipação do vencimento de várias concessões de geração e transmissão de eletricidade propondo condições que impunham reduções tarifárias aos concessionários.

Da maneira como foi comunicada pelo governo, ficou-se com a impressão que é possível gerar valor por decreto. No entanto, a MP 579 impôs grande perda de valor às empresas do setor elétrico. Não deixa de ser irônico que isso aconteça num momento em que ministros fazem road shows internacionais em busca de investidores para projetos em infraestrutura.

Após a destruição de valor acima outros problemas apareceram. Contando com a hipótese de adesão total dos concessionários à MP 579 (hipótese incorreta, já que algumas concessionárias não aceitaram as condições destruidoras de valor impostas), o governo cancelou o Leilão A-1 de 2012, leilão em que seria comercializada a energia de contratos de energia existente vincendos em 2012.

Esse cancelamento foi desastroso para as distribuidoras, que têm nos leilões regulados pelo governo a única forma de atendimento a seus consumidores. Como a adesão não foi integral, as distribuidoras ficaram expostas e tiveram que comprar energia no mercado de curto prazo a preços elevados devido aos baixos níveis dos reservatórios hidrelétricos.

Desde então, e para minimizar o risco de déficit de eletricidade, o Operador Nacional do Sistema Elétrico tem acionado todas as usinas termelétricas do país.

O custo dessa operação pode atingir R$ 6 bilhões em 2013 e será consolidado no Encargo de Serviços de Sistema, subitem Segurança Energética, pago pelos consumidores. Assim, surgiu no horizonte um cenário aterrorizante para os objetivos políticos do governo: a queda propagada de 20% da conta de luz seria comprometida pelo altíssimo custo conjuntural do despacho termelétrico.

Diante da ameaça a seu discurso de campanha, e numa iniciativa desesperada para socializar os prejuízos dos erros governamentais e regulatórios, o governo publicou no dia 6 de março a Resolução n° 3 do CNPE, que busca expropriar o caixa das geradoras de energia ao impor que passem a arcar com parte do custo do encargo, o que não faz o menor sentido. Afinal, quem deve arcar com os custos de produção de energia são aqueles que a consomem.

Para agravar ainda mais a situação, a liquidação das transações de janeiro de 2013 está suspensa, condição que não pode permanecer porque compromete o caixa de todos os agentes da cadeia de suprimento de energia.

Uma das causas para essa suspensão era a possibilidade de alterar retroativamente a alocação anual da energia (sazonalização) previamente estabelecida. Essa última ameaça, felizmente, acaba de ser bloqueada pela Aneel.

Uso político das empresas estatais, uso eleitoral da tarifa, expropriação de caixa de agentes, ameaças de interferências regulatórias retroativas... Pouco a pouco vão se somando os elementos que configuram um desarranjo institucional completo num setor que deveria ser marcado pela estabilidade legal e regulatória.


Periferias existenciais - RUBENS RICUPERO

FOLHA DE SP - 01/04

Maior fenômeno social da América Latina, as periferias são para nós um mundo desconhecido


É significativo que Hugo Chávez (1954-2013) e o papa Francisco coincidam na prioridade das periferias, geográficas ou existenciais.

A extraordinária carreira do líder venezuelano se deve à intuição de que as periferias eram diferentes. Não se sentiam representadas pelos partidos e políticos tradicionais de classe média e alta.

Os mesmos que, assustados pelo "caracazo", o violento protesto de 1989 contra o pacote do FMI, denunciavam: "Os macacos desceram dos morros"!

As periferias constituem o maior fenômeno urbano e social da América Latina dos últimos 80 anos. Da cidade do México a Buenos Aires, das palafitas de Salvador e Recife à árida desolação de La Paz ou Lima, elas reúnem em condição precárias dezenas de milhões de migrantes e descendentes que jamais contaram com políticas públicas razoáveis de urbanização, transportes, educação e saúde.

Tendo perdido a estrutura de proteção das comunidades rurais de origem, as periferias inventam novas formas de sociabilidade. Geram cultura própria, como se vê nos bailes funk e na música de nossa periferia. Possuem estética original, estilo inconfundível.

Em religião, são pentecostais, evangélicos, preferem as pequenas igrejas de proximidade e acolhimento emotivo. Em política, libertados dos coronéis do interior, se identificam com líderes como Chávez ou Morales, mestiços ou índios como eles, pertencentes ao que os populistas russos do século 19 chamavam de "o povo escuro".

Em 1961, o antropólogo Oscar Lewis escreveu "The Children of Sanchez", onde, a partir da trajetória de uma família miserável da periferia da Cidade do México, afirmava existir uma "subcultura da pobreza" capaz de criar valores e padrões de comportamento originais.

O importante em Lewis não é sua teoria, mas ter chamado a atenção para a irredutível alteridade das periferias, para um fenômeno em que a diferença radical de condições materiais acaba por gerar culturas distintas da envolvente.

Quase ninguém percebeu isso, nem os governos, nem as igrejas, nem os partidos, nem as universidades. Para nós, a periferia é um mundo mais desconhecido que a Amazônia.

Conclamar a igreja a "ir às periferias" foi o discurso que elegeu o cardeal Bergoglio, segundo o cardeal de Havana. Não só as periferias geográficas, mas "as existenciais, do mistério do pecado, da dor, da injustiça, da ignorância e ausência da fé, de toda a miséria".

Se não sai de si mesma, a igreja se torna autocentrada, adoece de mundanismo e narcisismo espiritual. É indispensável deixar de "viver em si, de si, para si" e ir para a periferia.

Para o papa, a periferia é a situação limite, a fronteira do humano, a condição onde os valores se encontram sob ameaça. Francisco a descobriu na sua América Latina, mas ela hoje se expande na Ásia e na África, onde, a cada semana, mais de 1 milhão de pessoas trocam o campo pela cidade.

Se o conselho é bom para as igrejas, para os governos, as universidades, os hospitais, ele é ótimo. A única questão é: será seguido?

Medicina da morte - CARLOS ALBERTO DI FRANCO

O GLOBO - 01/04


Título forte, polêmico? Não, caro leitor. É a expressão concreta do sentimento de milhões de brasileiros diante de recente proposta feita pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para a liberação do aborto até a 12.ª semana de gestação. O presidente do CFM, Roberto D'Ávila, na defesa de uma decisão que está em rota de colisão com a ética médica, esgrime argumentos que não param em pé: "Vivemos em um Estado laico. Seria ótimo que as decisões fossem adotadas de acordo com o que a sociedade quer e não como o que alguns grupos permitem". A estratégia de empurrar os defensores da vida para o córner do fundamentalismo religioso já não cola.

Um embrião e um feto (e querem promover o aborto no terceiro mês da gravidez) são também pessoas, tanto do ponto de vista científico como filosófico. É falsa a afirmação de que o feto faz parte do corpo da mãe e que a mãe pode abortar por ter direito sobre o seu próprio corpo. Na verdade, a mãe é a hospedeira, protetora e nutriz de um novo ser diferente dela, um outro indivíduo. Biologicamente, o ser que está aconchegado no seio da mãe é idêntico ao que estará sentado no seu colo com 3 meses ou à mesa com ela quando tiver 15, 20 ou 50 anos de idade. O embrião é distinto de qualquer célula do pai ou da mãe; em sua estrutura genética, é "humano", não um simples amontoado de células caóticas; e é um organismo completo, ainda que imaturo, que - se for protegido maternalmente de doenças e violência - se desenvolverá até o estágio maduro de um ser humano.

Aprovar a autorização legal para abortar, como bem comentam os filósofos Robert P. George e Christopher Tollefsen em seu livro Embryo: a Defense of Human Life, é dar licença para matar uma certa classe de seres humanos como meio de beneficiar outros. Defender os direitos de um feto é a mesma coisa que defender uma pessoa contra uma injusta discriminação - a discriminação dos que pensam que há alguns seres humanos que devem ser sacrificados por um bem maior. Aí está exatamente o cerne da questão, que nada tem que ver com princípios religiosos nem com a eventual crença na existência da alma.

Hoje o que está sendo questionado não é tanto a realidade biológica, inegável, a que acabo de me referir, é coisa muito mais séria: o próprio conceito de "humano" ou de "pessoa". Trata-se, portanto, de uma pergunta de caráter filosófico e jurídico: quando se pode afirmar de um embrião ou de um feto que é propriamente humano e, portanto, detentor de direitos, a começar pelo direito à vida?

O desencontro das respostas científicas - evidente - acaba deixando a questão sem um inequívoco suporte da ciência. Fala-se de tantos dias, de tantos meses de gravidez... E se chega até a afirmar, como já foi feito entre nós, que só somos seres humanos quando temos autoconsciência. Antes disso, só material descartável ou útil para laboratório. Mas será que um bebê de 2 meses ou de 2 anos tem "autoconsciência"?

Perante essa perplexidade, é lógico que se acabe optando pelo juridicismo. Cada vez mais, cientistas e juristas vêm afirmando que quem deve decidir o momento em que começamos a ser humanos e, em consequência, a ter direito inviolável à vida é a lei de cada país. E é isto que querem fazer: embutir o aborto na reforma do Código Penal. Ora, essas leis, por pouca informação que se tenha, variam de um país para outro e dependem apenas - única e exclusivamente - de acordos, do consenso a que chegarem os legisladores. Em muitos casos, mais que uma questão de princípios, decidir-se-á por uma questão de pressões, ou por complexos comparativos, isto é, pelo argumento de que não podemos ficar atrás dos critérios legais seguidos pelos países desenvolvidos. Mas nem pressões nem complexos parecem valores válidos para decidir sobre vidas humanas.

Quanto ao "consenso por interesse", é útil recordar que fruto dele foi a legislação que durante séculos definiu uma raça ou um povo como legalmente infra-humanos e, portanto, podendo ser espoliados de direitos e tratados como "coisas", também para benéficas experiências científicas: caso do apartheid dos negros na África do Sul e dos judeus aviltados e trucidados pela soberania "democrática" nazista.

O juridicismo, hoje prevalente, equivale a prescindir de qualquer enfoque filosófico e naufragar nas águas sempre mutáveis do relativismo. Nada tem um valor consistente, tudo depende do "consenso" dos detentores do poder, movidos a pressões de interesses. Mas se é para falar de consenso democrático, todas as pesquisas, sem exceção, têm sido uma ducha de água fria na estratégia pró-aborto. O brasileiro é contra o aborto. Não se trata apenas de uma opinião, mas de um fato medido em sucessivas pesquisas de opinião. O CFM, representando uma minoria, está promovendo uma ação nitidamente antidemocrática.

Não obstante a força do marketing emocional que apoia as campanhas pró-aborto, é preocupante o veneno antidemocrático que está no fundo dos slogans abortistas. Não se compreende de que modo obteremos uma sociedade mais justa e digna para seres humanos (os adultos) com a morte de outros (as crianças não nascidas).

Além disso, não sei como o Conselho Federal de Medicina consegue articular sua proposta pró-aborto com o juramento hipocrático. A posição da atual diretoria desse conselho, tal como amplamente veiculada pelos meios de comunicação, não parece condizer com o compromisso sobre o qual todos os médicos, velhos ou novos, algum dia juraram. Não creio que o CFM represente o pensamento daqueles que, um dia, prometeram solenemente empenhar sua profissão, seu saber e sua ciência na defesa da vida.

Com inflação não se brinca - GUSTAVO LOYOLA

VALOR ECONÔMICO - 01/04

Em documentos escritos e em declarações de seu presidente, o Banco Central (BC) vem subindo o tom no que diz respeito aos riscos inflacionários. Na ata da reunião de março do Comitê de Política Monetária (Copom), por exemplo, o BC observou que a inflação está mostrando resistência à queda e chamou a atenção para a possibilidade de a taxa inflacionária estar se acomodando em patamar mais elevado. Em vista disso, a autoridade monetária passou a sinalizar mais claramente a possibilidade de elevar as taxas de juros no curto prazo.

Ocorre que, a despeito dos alertas e da preocupação do Banco Central, o restante do governo, sistematicamente subestimando os riscos inflacionários, vem tratando a questão apenas com ações localizadas de desoneração de preços, como se a inflação não fosse um fenômeno disseminado e explicado por um evidente desequilíbrio entre a oferta e a demanda agregada. Como a distinção entre inflação e uma mera mudança de preços relativos não escapa sequer a um primeiranista de economia, é de se supor que algo mais está por trás da obsessão do governo pela gestão pontual do IPCA, como recentemente mostrado na desoneração da cesta básica.

A questão parece residir na armadilha que o governo construiu para si mesmo ao erigir a queda das taxas de juros ao status de "grande realização da administração Dilma" e alçar a expansão do crédito por meio de operações subsidiadas como objetivo maior a ser perseguido no curtíssimo prazo pelos bancos oficiais. Com isso, criou-se uma situação de constrangimento para o Banco Central, pois uma elevação da taxa básica de juros - que necessariamente teria reflexos sobre as taxas das operações ativas dos bancos no segmento do crédito livre - poria em dúvida a credibilidade do discurso de queda dos juros alardeado por diversas autoridades do governo nos últimos meses.

Além disso, o desencadear prematuro da campanha para as eleições presidenciais de 2014 conduz a uma política econômica míope em que os objetivos de curtíssimo prazo prevalecem sobre considerações de médio e longo prazo. Em vista disso, busca-se evitar a todo custo uma restrição monetária que possa acarretar efeitos negativos sobre o mercado de trabalho e, com isso, prejudicar a popularidade do governo e da presidente junto aos eleitores.

Dessa maneira, resta ao governo insistir na veleidade de controlar a inflação com ações pontuais sobre determinados preços na economia, por meio de desonerações e controle dos preços administrados. Contudo, tal política tem pernas curtas, já que o fôlego das desonerações é limitado, sendo inevitável chegar-se a um momento em que o governo terá que lançar mão de expedientes de eficácia ainda mais duvidosa, como é o caso dos acordos de preços (normalmente turbinados por concessões tributárias ou creditícias); manipulação das alíquotas dos impostos de importação e exportação, etc. Cria-se uma verdadeira marcha da insensatez, com o governo intervindo cada vez mais na economia, utilizando de instrumentos cada vez mais grotescos.

Parece que nada se apreendeu com o desastre inflacionário que atingiu o Brasil por mais de três décadas e que não foi evitado por políticas assemelhadas às hoje adotadas pelo governo Dilma. Nas décadas de 1970 e 1980, fomos pródigos no uso de mecanismos de controle de preços, seja explicitamente por meio de repartições especializadas como os famigerados CIP e SUNAB. O zelo dos burocratas que trabalharam nesses órgãos, obviamente, não foi suficiente para deter a aceleração contínua dos preços, somente contida com o Plano Real, em 1994. Daí, ser difícil extrair racionalidade econômica na predileção do governo atual por uma política de gerenciamento dos índices de preços, ao invés do uso dos tradicionais e mais eficazes instrumentos de controle da demanda agregada.

Nesse contexto, a situação enfrentada no momento pelo Banco Central está longe de ser trivial. É certo que ainda há tempo para se restaurar a racionalidade na política econômica e evitar que a inflação suba de patamar e turbine ainda mais os mecanismos de indexação que nunca deixaram de estar completamente ausentes da economia brasileira. Porém, o Banco Central estará sozinho nessa empreitada, considerando a instância cada vez mais expansionista da política fiscal e a insistência na política de subsídios creditícios por parte do BNDES à custa de abundantes recursos do Tesouro. Por outro lado, a falta de blindagem legal para a diretoria do Banco Central complica ainda mais as coisas, pois a autonomia da instituição fica totalmente dependente da vontade da presidente da República.

Apesar disso, o BC não pode fugir de sua obrigação como autoridade monetária. Cabe a ele, mais do que a qualquer outro órgão da administração federal, chamar a atenção para os riscos da leniência com a inflação e agir com presteza para evitar que o mal se alastre. Há nos próximos meses uma janela de oportunidade para uma correção de rumos que provavelmente estará ausente em 2014. Sendo assim, espera-se que o BC passe das palavras à ação e traga, com isso, algum grau de racionalidade à política macroeconômica. A inflação precisa ser atacada com vigor e com armas adequadas para evitar que ocorram danos ainda maiores ao crescimento econômico. 

Bem-vindos ao passado - PAULO GUEDES

O GLOBO - 01/04
Primeiro, a boa notícia na incessante e democrática busca por maior grau de inclusão social. Os prestadores de serviços domiciliares foram equiparados aos demais profissionais em seus direitos trabalhistas e previdenciários por uma proposta de emenda constitucional. É uma tentativa de retirar da informalidade os serviços de empregados domésticos.

Agora, a má notícia quanto aos impactos econômicos da nova legislação. Os excessivos encargos sociais e trabalhistas que incidem sobre os salários são armas de destruição em massa contra os empregos. Aumentam para as famílias os custos dos serviços de empregadas, cozinheiras, cuidadores de idosos, babás, arrumadeiras, motoristas, caseiros, jardineiros, mordomos e passadeiras. Haverá demissões, acordos para permanência na informalidade, menor ritmo de criação de emprego e salários mais baixos para novas contratações. Deve também aumentar substancialmente o número de ações trabalhistas.

A redução dos salários, o aumento do custo da mão de obra, a queda do nível de emprego e o aumento dos conflitos trabalhistas são efeitos conhecidos de uma obsoleta legislação trabalhista no ambiente das empresas. Efeitos que chegam agora ao ambiente das famílias. Estariam as tentativas de ampliar a inclusão social sempre condenadas a causar desastrosos efeitos econômicos? A extensão dos direitos sociais a alguns sempre resulta na exclusão econômica de outros, geralmente os menos qualificados? A conciliação dos direitos sociais com a manutenção de empregos e salários depende da flexibilidade da legislação trabalhista e da eficiência do regime previdenciário. E o Brasil vai muito mal nas duas dimensões.

Se por um lado festejamos a entrada dos servidores domésticos e das famílias empregadoras na legalidade trabalhista e previdenciária brasileira, lamentamos por outro seu ingresso em um verdadeiro circo dos horrores. Bem-vindos à "Carta del Lavoro" da Itália fascista de Mussolini, ao buraco negro de nossa previdência social e ao inferno dos conflitos trabalhistas que incendeiam nosso ambiente empresarial. Tudo pela inapetência por reformas modernizadoras de uma obsoleta social-democracia que se reveza no poder desde a redemocratização, em vergonhosa aliança política com nefastos conservadores.

Tem boi na linha e no anzol - GIL CASTELLO BRANCO

O ESTADO DE S. PAULO - 01/04

A Bíblia conta sobre a multiplicação dos pães e dos peixes. Na Galileia, Jesus pregava para uma multidão quando anoiteceu e se aproximou o horário do jantar. Diante da preocupação dos seus discípulos, Jesus chamou um menino que tinha à mão um cesto com cinco pães e dois peixes e orientou seus apóstolos a distribuir esses alimentos. O milagre permitiu que mais de 5 mil pessoas fossem alimentadas.

No Brasil, a multiplicação das últimas décadas não foi a dos pães ou a dos peixes, mas, sim, a dos pescadores, por meio do seguro-defeso, existente desde 1991. Para preservar espécies, o governo paga um salário mínimo aos pescadores artesanais por tantos meses quanto dure a reprodução, em áreas definidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Normalmente, o benefício é pago por quatro meses. Aos interessados basta comprovar o exercício profissional da pesca, a inscrição no INSS e que não tenham outro emprego, bem como qualquer outra fonte de renda.

Seja pela consciência ambiental, seja pela renda fixa e fácil, o número de beneficiados cresceu exponencialmente. Em 2002, eram 91.744 os favorecidos. Em 2011 já eram mais de meio milhão. Há dois anos, exatamente 647.670 pessoas já afirmavam viver tão somente da pesca, individual ou em regime de economia familiar, fato que lhes assegurava o direito de receber o valor de um salário mínimo mensal, durante o período de defeso.

Os gastos do governo, obviamente, cresceram na mesma proporção. Em 2002, o Ministério do Trabalho pagou R$ 60,2 milhões a título de seguro-desemprego aos pequenos pescadores. Em 2012, os pagamentos chegaram a R$ 1,9 bilhão. Neste ano, a dotação do Orçamento-Geral da União é de aproximadamente R$ 2 bilhões. O montante corresponde ao triplo dos R$ 630 milhões orçados em 2013 para o Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA). O valor bilionário pago com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador é também quatro vezes maior do que as exportações brasileiras de pescado em 2012, que geraram cerca de R$ 500 milhões. Os números são tão estranhos que parecem "história de pescador".

Nos dois últimos anos, os Estados do Pará, Maranhão e Bahia lideraram os recebimentos do seguro-defeso, tendo São Paulo ficado em 15° lugar, pouco à frente do Rio de Janeiro, na 17ª colocação. Enquanto no Pará os pagamentos atingiram R$ 905 milhões, em São Paulo somaram R$ 63,8 milhões. O município paulista campeão foi Iguape, onde os pescadores receberam R$ 7,3 milhões, mais do que o dobro dos R$ 2,6 milhões desembolsados por cidade em favor dos que vivem da pesca em Panorama e Presidente Epitácio. No Guarujá, o 4° colocado, foram pagos R$ 2,5 milhões. Conforme cadastro da Controladoria-Geral da União (CGU), até em Brasília existem cinco pessoas que receberam juntas R$ 11.784,00 em razão do bolsa-pesca.

Alguns fatos explicam o crescimento vertiginoso das despesas. O benefício estar atrelado ao salário mínimo - com evolução real significativa - é uma delas. Merecem também destaque as disposições legais que reduziram o tempo exigido de registro como pescador artesanal para a obtenção do benefício e dispensaram a obrigatoriedade da inscrição em colônias de pescadores. Paralelamente, o número de inscritos no Registro Geral da Atividade Pesqueira cresceu de forma alucinante. Em 2003, o cadastro tinha pouco mais de 85 mil inscritos e, em 2012, o número superou 1 milhão de inscrições. Em menos de dez anos, a variação da quantidade de registros atingiu 1.125%. É claro que tem boi na linha e no anzol.

As fraudes surgem como um tsunami. Em 2011, a própria CGU já havia constatado 60,7 mil pagamentos irregulares, cuja soma alcançava R$ 91,8 milhões. Em 2012, a Advocacia-Geral da União no Ceará apurou que existiam pescadores cadastrados em colônias que nem sequer residiam nas respectivas cidades e não tinham a pesca como atividade principal. Em Santa Catarina, no município de Tubarão, espertalhões que atuavam em outras atividades e nunca viram um peixe na vida se inscreviam nas associações de classe, pagavam anuidades, contavam tempo de serviço e se aposentavam. O procurador da República Celso Três processou mais de 300 pessoas por fraudes, e ainda assim disse: "É como secar um oceano".

Aliás, o Ministério Público (MP) já abriu ações penais no Amazonas, Maranhão e em vários outros Estados. No mês passado, investigações da Polícia Federal (PF) em Minas Gerais identificaram que fazendeiros, políticos, comerciantes e até um pastor dono de clínica de reabilitação em Belo Horizonte recebiam a bolsa. Os inquéritos devem se transformar em processos por estelionato.

Como o que está ruim sempre pode piorar, há vários projetos de lei no Congresso Nacional que pretendem ampliar o benefício. Dentre eles, por exemplo, os que tratam de estender o seguro-defeso aos pesqueiros impedidos de exercer a atividade por causa das condições climáticas e, ainda, a toda a cadeia da pesca, incluindo os que transportam, comercializam, reparam embarcações e costuram redes. Outras propostas cogitam beneficiar os catadores de mariscos, caranguejos, siris e guaiamuns. A idéia mais curiosa é a que concede a bolsa-pesca mesmo àqueles já contemplados pelo auxílio-doença.

Há cerca de 20 dias, o Tribunal de Contas da União divulgou acórdão analisando os fatores que contribuíram para o incremento das despesas e anunciou auditoria no MPA para avaliar a eficácia dos controles internos referentes à concessão do benefício.

Ao contrário da passagem bíblica, fato que a religiosidade explica, é extremamente necessário que os órgãos de controle, a PF, o MP e a própria Justiça investiguem, de forma sistêmica, as fraudes generalizadas relacionadas à multiplicação dos pescadores, que exalam politicagem e má-fé.