sexta-feira, março 23, 2012

PROGRAMAÇÃO ESPORTIVA NA TV


17h45 - Olhanense x Benfica, Campeonato Português, Bandsports, Esporte Interativo e Sportv 2

18h45 - São Bernardo x Cruzeiro, Superliga masc. de vôlei, Sportv

19h45 - Santo André x Americana, Nacional fem. de basquete (semifinal), Sportv 2

21h - Minas x Florianópolis, Superliga masc. de vôlei, Sportv

23h30 - LA Lakers x Portland Trail Blazers, NBA, ESPN

23h30 - Peñarol x Bauru, Torneio Interligas de basquete, Sportv 2

2h - Treino do GP da Malásia, F-1, Sportv 2 e Sportv HD

5h - Treino de classificação do GP da Malásia, F-1, Globo

Imposto de fachada - EDITORIAL FOLHA DE SP

Folha de S. Paulo - 23/03/12


A CUT (Central Única dos Trabalhadores) prepara uma campanha em que voltará a defender o fim do imposto sindical, contribuição compulsória no valor de um dia de salário cobrada anualmente de todos os trabalhadores com registro em carteira profissional. Mas não é o que parece.

O tributo irriga sindicatos, federações, confederações e centrais com R$ 1,6 bilhão por ano. Sistema compulsório similar alimenta os sindicatos patronais.

Advogar pela redução dos descontos no contracheque do trabalhador é uma bandeira popular. Poderia ser também uma forma de modernizar o encarquilhado sindicalismo brasileiro, promovendo maior liberdade e autonomia.

O atual sistema, pelo qual o Estado atua como um repassador de verbas e ainda limita a concorrência -pelo princípio da unicidade sindical, não pode haver mais de uma associação por categoria na mesma base territorial-, acabou produzindo centenas de sindicatos de fachada. Eles só sobrevivem por obra da tutela oficial e representam muito mais suas próprias diretorias do que trabalhadores.

O problema é que a CUT não está propondo a extinção real do imposto, mas sua substituição por uma "taxa negocial", cobrada a título de serviços prestados na negociação dos acordos coletivos. Seu valor seria decidido em assembleia da categoria e pago por todo trabalhador, sindicalizado ou não.

Se a proposta vingar, o funcionário poderá até ver seu desconto em folha majorado. As assembleias tendem a ser controladas por sindicalistas, e não é impossível que um valor mais elevado do que um dia de salário termine aprovado.

A receita para promover uma reforma sindical que crie instituições fortes e representativas é conhecida pelo menos desde 1948, quando surgiu a Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ligada à ONU.

O documento, que era defendido pela CUT antes de ela ter se aconchegado ao poder, após a ascensão do PT, preconiza a eliminação das contribuições compulsórias e da unicidade sindical. Só quando a organização precisa batalhar para obter filiados ela se torna de fato independente.

Pode-se argumentar que a extinção do imposto da noite para o dia destruiria centenas de sindicatos, o que não é desejável. Nesse caso, melhor seria defender um cronograma de mudança gradual, para que possam adaptar-se. O que não parece correto é trocar seis por meia dúzia -ou dúzia e meia.

Molestar cetáceos, sequestrar e a reforma penal - FERNANDO GRELLA VIEIRA e ALEXANDRE ROCHA ALMEIDA DE MORAES

FOLHA DE SP - 23/03/12


Desde 1988, formataram-se 700 crimes. Precisamos criminalizar tanto? E há distorções: molestar cetáceos e soltar balões têm altas penas, mas o cárcere privado não



O editorial da Folha de 18 de março apresenta com lucidez e correção a necessidade de se restabelecer a proporcionalidade entre penas, crimes e valores mais caros à sociedade. O direito, como fenômeno histórico e social, jamais pode ser divorciado dos anseios da sociedade.

No contexto da política criminal do país, várias questões preocupam.

Uma é o elevado número de subnotificações -somente um quarto dos crimes são formalmente registrados. Existe ainda uma crise das demais formas de controle social, colocando o direito penal como única instância para solução dos conflitos sociais.

Há ainda incapacidade do Estado em executar políticas públicas suficientes e a necessidade de tutela de novos bens difusos trazidos com a Constituição de 1988 -como o meio ambiente, a ordem tributária, a segurança viária e a saúde pública.

O Estado é incapaz de fiscalizar e executar adequadamente o sistema penitenciário e a política legislativa de adoção de penas restritivas de direitos seja para crimes médios, seja para crimes de alta periculosidade.

Isso ocorre, entre outros fatores, porque crimes de pequeno e médio potencial ofensivos são assim classificados pelas penas abstratamente contempladas e não pelo valor do bem que protegem.

Desde 1988, foram formatados quase 700 novos crimes, sendo certo que somente um quarto destas infrações se sujeita, na prática, à pena privativa de liberdade.

Será que precisávamos criminalizar tanto? Não seria o caso de uma adequada ponderação de interesses para garantir às infrações mais graves a aplicação efetiva da pena privativa de liberdade?

A Folha ressalta com propriedade essas distorções: enquanto crimes como molestar cetáceos, soltar balões e falsificar medicamentos possuem elevada proteção penal, crimes graves como o cárcere privado, o homicídio, o abuso de autoridade, a prevaricação e a corrupção não possuem penas compatíveis com os bens tutelados.

É evidente que o sistema de penas deve ser construído de modo a obedecer ao escalonamento de valores historicamente construídos pela sociedade, visando a proporcionalidade entre o crime e a pena.

Mas é imperioso constatar que o direito penal cumpre uma função ética e social, protegendo valores fundamentais para a subsistência da vida em sociedade.

Na medida em que o Estado se torna omisso ou mesmo injusto, dando tratamento díspar a situações assemelhadas, acaba por incutir na consciência coletiva a pouca importância que dedica aos valores que pretende tutelar.

Em vez de se legitimar socialmente, o direito penal como hoje é concebido afeta a crença na justiça penal. Ele propicia que a sociedade deixe de respeitar tais valores, gerando um círculo vicioso. Em pouco tempo, a desilusão com a incerteza de um direito justo gera clamores por uma nova lei penal.

É preciso coerência e congruência normativa -além do domínio da dogmática e da técnica legislativa em geral, a lei deve ser funcional, fragmentária, mas eficiente no que se propõe a tutelar.

Para tanto, é preciso é preciso denunciar a falácia de que o criminoso é vítima da sociedade e reconhecer que as propostas de mudanças legislativas em matéria criminal não podem se distanciar dos interesses de um direito penal da sociedade.

Somente assim cumprimos o papel e objetivo fundamental de nossa República: “construir uma sociedade livre, justa e solidária”.

Estamos trabalhando com esse intuito e precisamos levantar uma bandeira: a recodificação da legislação penal. Somente com a sistematização da legislação penal será possível expor as incongruências das penas, a desnecessidade de vários crimes e proteger suficientemente a sociedade.

FERNANDO GRELLA VIEIRA, 55, é procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo
ALEXANDRE ROCHA ALMEIDA DE MORAES, 38, é promotor de Justiça

Quem pisca primeiro - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 23/03/12


Se o eleitor da crescente classe C, hoje apoiador de Dilma, perceber que alguém pode ter diálogo com o Congresso e, ao mesmo tempo, assegurar o desenvolvimento do Brasil sem escândalos ou brigas, adeus PT e Dilma

Os políticos mais observadores e discretos estão atônitos com o impasse criado entre a presidente Dilma Rousseff e os congressistas da sua base aliada, uma novela que, ao que tudo indica está longe do capítulo final. Ontem, depois das derrotas sofridas em várias instâncias do Congresso Nacional, a presidente não moveu um músculo em direção à bandeira branca. Ao contrário.

Do Planalto, têm-se notícias de que a liberação de emendas individuais ao orçamento continua suspensa e, por tabela, nomeações de segundo escalão. Aqueles encontros que ela prometeu aos integrantes da base aliada também foram adiados. E, para completar, Dilma agora descobriu um mecanismo para deixar as agências reguladoras funcionarem sem que os personagens detentores de poder decisório passem pelo crivo dos políticos e deflagrou demissões para todo o lado nessa seara. E, de quebra, em várias dessas agências, técnicos indicados por partidos são chamados a entregar os cargos.

Da parte dos políticos, o ânimo não é diferente. Enquanto não sair um calendário para votação do Código Florestal antes da Rio+20, não tem conversa. Greve geral em relação a projetos de interesse do Poder Executivo. E, diante disso, Dilma — que não considera nada tão relevante para votar a toque de caixa e se refere à grande parte da crise como “espuma” — paga para ver se os parlamentares cumprem as ameaças. Ou seja: estão todos com a faca na boca e ninguém se move em direção ao diálogo.

Por falar em diálogo…
A esperança de muitos é a de que nesta sexta-feira a presidente dê algum sinal de armistício antes de viajar para a Índia. Está prevista uma reunião de ministros com a presidente para discutir a crise sem fim e tentar buscar soluções em curto prazo. Ontem, já houve um almoço nesse sentido e é possível que ela anuncie Brizola Neto como novo ministro do Trabalho.

O problema é que, do jeito que a carruagem se move, nem cargos nem emendas serão suficientes para “domar” a base no assunto que mais interessa à presidente no momento: o Código Florestal. Os parlamentares tratam do tema como uma disputa entre ambientalistas e ruralistas e não um assunto de governo. Foi esse o clima da primeira votação do texto na Câmara e é o sentimento que predomina no momento. De mais a mais, os ruralistas querem o texto votado antes do vencimento do decreto que concedeu anistia aos desmatadores, em abril. Portanto, se nenhum dos dois ceder no Código, o impasse não será resolvido e os reflexos virão logo ali.

Por falar em reflexos…
Impasses políticos podem ser bem recebidos num primeiro momento pela opinião pública farta do toma lá, dá cá, mas, no fundo, não são positivos para ninguém. Nem para o PT. No caso dos petistas, o primeiro sintoma dessa briga já respingou não só no candidato a prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, sem perspectiva hoje de montar uma grande aliança em torno de sua candidatura, conforme colocamos aqui ontem. O segundo reflexo, pouco explorado, foi a aceitação pela Câmara da proposta que obriga a demarcação de terras indígenas a passar pelo parlamento. Se o texto for aprovado, sabe quando os índios vão conseguir demarcar um hectare? Nunca! Basta ver o tamanho da bancada ruralista.

Afora questões como as demarcações de terras, que têm reflexo direto na vida das pessoas, outras eleições virão. E se o eleitor da crescente classe C, hoje apoiador de Dilma, perceber que alguém pode ter diálogo com o Congresso e, ao mesmo tempo, assegurar o desenvolvimento do Brasil, adeus PT e Dilma.

Nos bastidores, existe quem diga com todas as letras que a classe política seguirá em 2014 na direção a qualquer outro nome que surja como interessado no diálogo e no respeito ao Congresso Nacional. E, hoje, os congressistas não sentem esse respeito do governo. Tudo bem que ela queira mudar a forma de relação com os congressistas, mas não será com a faca na boca que ganhará aliados para seus planos. No Brasil, aqueles que desprezaram a harmonia entre os Poderes não vingaram. Por isso, para a felicidade geral, espera-se que a meditação e os mantras ajudem a presidente a se abrir ao diálogo republicano com a própria base. Por enquanto, nem nesse sentido eles sentem que ela topa conversar. Aí, fica difícil. 

Show de realidade - NELSON MOTTA


O Estado de S.Paulo - 23/03/12


Seguindo a atual preferência popular na televisão, foi um show de realidade, muito melhor do que qualquer Big Brother. O repórter do Fantástico se passa por gestor de saúde e detona quatro quadrilhas disfarçadas de empresas fornecedoras de hospitais públicos que subornavam funcionários, fraudavam licitações e inflavam preços para roubar o contribuinte.

A mise-en-scène é moderna, mas os métodos são antigos e se espalham como um câncer nas administrações, só mudam os nomes dos malfeitores e dos partidos no poder, que não por acaso são sempre beneficiários de generosas contribuições das quadrilhas. Vai ser assim enquanto pessoas jurídicas - que não votam - puderem participar de campanhas eleitorais.

Os ramos de atividade são clássicos da gatunagem: coleta de lixo (esse pessoal ama o lixo, como negócio e metáfora), quentinhas de presídios (são os melhores clientes, não reclamam nunca), aluguel e manutenção de carros (em um ano recuperam o preço do veículo).

Roubar de hospitais, de crianças doentes, é repugnante, mas nada mais surpreende num País que já viu desbaratadas quadrilhas de funcionários, políticos e empresários que roubavam sangue, remédios para câncer e merenda escolar. Roubam de crianças, presos e doentes, e, num eufemismo delubiano, chamam de "ética do mercado". No Brasil maravilha da propaganda oficial, é um show de realidade: com o País mais rico, rouba-se mais.

Mas este não é só mais um dos incontáveis episódios de suborno de gestores e roubo de dinheiro público, é um arquétipo documentado, um padrão que deveria ser estudado como um modelo, porque se reproduz de forma sistêmica em todo o Brasil, com a administração pública dominada - como nunca na história desse País - pelos interesses dos políticos e dos partidos.

Como é incontestável que a maior parte dos nossos representantes federais, estaduais e municipais é de baixo nível ético, como esperar que os ruins façam boas indicações? Você confiaria em alguém indicado por Sarney, Renan ou Jucá?

O castigo extra para os quadrilheiros cariocas vai ser comer a gororoba de preso que eles superfaturavam.

Dilma quer atiçar 'espírito animal' de empresários - VINICIUS MOTA

FOLHA DE SP - 23/03/12

Keynes sustentava que a decisão de investir depende em larga medida da confiança dos empreendedores no país

A presidente Dilma Rousseff reuniu-se com os maiores empresários do país a fim de atiçar-lhes o "espírito animal". A sentença, que estimularia em certos humoristas um punhado de associações, ancora-se na história das ideias econômicas.

O economista britânico John Maynard Keynes (1883-1946) celebrizou o termo "animal spirits" em sua principal obra, "A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda", de 1936. Ele surge no mais enigmático capítulo do livro, o 12º, que trata das expectativas de longo prazo.

Keynes indaga o que leva alguém a imobilizar uma soma cavalar de capital em empreendimentos cujo sucesso ou fracasso só será conhecido muitos anos depois. Por que construir uma fábrica de chocolates em vez de emprestar o dinheiro ao governo?

Se o retorno (lucro) que se espera do capital empregado na fábrica for maior do que os juros prometidos pelo governo no mesmo período, então a chance de esse investimento vingar é grande. Do contrário, nada feito.

O problema, lembra Keynes, é que não há como saber com suficiente precisão no presente quanto vai render um investimento produtivo ao fim de um prazo longo, "pois a base para fazer esse tipo de cálculo não existe". A lista hipotética do que pode dar errado não tem fim.

A decisão de investir, argumenta Keynes, depende em larga medida da confiança do empresário -uma questão de psicologia, e não de prospecção matemática. A condição ideal para o investimento ocorre, escreve, quando o "cálculo racional se complementa e se sustenta pelo espírito animal, de modo que o pensamento sobre o fracasso é posto de lado, como um homem saudável coloca de lado a expectativa da morte".

O espírito animal, para Keynes, associa-se a um instinto de "otimismo espontâneo", uma propensão natural "para a ação, em vez da inação". Essa tendência "inata para a atividade" é que faz a "engrenagem [da economia e dos empregos] girar".

Dois séculos antes de Keynes, o filósofo escocês David Hume (1711-1776) empregou o termo "animal spirits", o que leva alguns comentaristas a fazer a conexão entre os dois. Mas Hume, em sua proposta de adaptar o método experimental de Isaac Newton às humanidades, parece usar a expressão num sentido mais específico e menos metafórico que Keynes.

O espírito animal, em obras como "Tratado da Natureza Humana", é quase um impulso neuromotor, na protociência da cognição e do conhecimento defendida pelo filósofo no século 18.

De volta ao século 20 e à obra de Keynes, eis o ponto para a iniciativa da presidente brasileira: "A prosperidade econômica depende em demasia de uma atmosfera política e social favorável ao homem de negócios".

Cenário externo se desanuviou - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 23/03/12


A cena externa melhorou muito, os juros dos títulos americanos estão mais atrativos e o risco de que o "tsunami monetário" inunde o Brasil com moeda estrangeira, forçando a valorização da moeda, é, hoje, menor do que se supunha há algumas semanas. Uma boa parte dos € 529,5 bilhões que o Banco Central Europeu despejou nos bancos, na segunda operação de financiamento de longo prazo, voltou para o BCE e deve ficar no próprio continente.

Há um processo de desinflação no Brasil desde maio do ano passado. O IPCA, hoje na casa dos 5,5%, vai perder alguns pontos em abril e maio. A queda, no entanto, pode ser interrompida em junho e julho - meses em que o IPCA foi de apenas 0,15% e 0,16% no ano passado - mas será compensada por taxas menores que as de 2011 no último trimestre do ano. Se não houver aumento de preço da gasolina, a inflação do quarto trimestre deve ficar um pouco abaixo de 0,50% ao mês.

Há, sim, chances de a inflação convergir para o cento da meta de 4,5% este ano, asseguram autoridades oficiais. "Vamos fazer o que for preciso para a inflação ficar em 4,5%, disse uma autoridade ao valor. Já 2013 é outro problema. As expectativas do mercado são de 5,5% para a variação do IPCA no próximo ano e as do Banco Central também estão acima do centro da meta. "Temos uma meta multianual. Uma projeção ligeiramente acima da meta num horizonte de 19 a 20 meses não é tão relevante", comentou um economista do governo.

Do lado do nível de atividade, a possibilidade de o PIB crescer neste ano acima de 3,5% é remota. As melhores projeções da área econômica do governo indicam que nos dois primeiros trimestres do ano a economia ainda estará meio morna, aquecendo no segundo semestre e encerrando o ano na casa dos 3%. Uma distribuição razoável da performance do produto seria de expansão em torno de 0,5% a 0,6% no primeiro trimestre, de 1,2% no segundo trimestre e de 1,6% nos dois últimos trimestres do ano. Crescimento de 3,2% para este ano, portanto, seria uma boa aposta.

Foi com base num cenário internacional mais amistoso e no fraco desempenho da atividade doméstica que o Comitê de Política Monetária (Copom) comunicou, na ata da sua última reunião, que deve interromper a trajetória de queda da taxa básica, deixando-a num patamar "ligeiramente acima dos mínimos históricos". Ou seja, a Selic deve cair para 9%, com mais um corte de 0,75 ponto percentual, como entendeu o mercado, e ficar nesse patamar por um tempo indefinido.

Para os economistas do governo, o corte nos juros não está sendo feito à despeito da inflação. O governo Dilma Rousseff recebeu a inflação medida pelo IGP-DI em 11,3%. Em fevereiro, ressaltam, o índice acumulado em 12 meses havia caído para 3,39%. O IPC da Fipe está praticamente no centro da meta na segunda quadrissemana deste mês. O IPCA, que mede a inflação de famílias com renda mensal de até 40 salários mínimos, cai mais lentamente.

Embora os analistas privados vejam o Banco Central de hoje como mais permissivo com a inflação do que o BC do governo anterior, autoridades da área econômica salientam que a taxa, hoje, não está fora dos padrões dos últimos anos.

A média de variação do IPCA nos 13 anos de vigência do regime de metas é de 6,76%. Subtraindo o índice de 12,53% de 2002 - que foi um momento atípico de risco eleitoral - essa média cai para 6,28%, ainda salgada. Nos últimos cinco anos ela caiu para 5,42%. O fato é que a inflação só ficou no centro da meta ou abaixo dele em quatro dos 13 anos (2000, 2006, 2007 e 2009).

A resistência da inflação no Brasil é alimentada pela indexação. Há, também, uma pesada inflação de serviços - movida pelo crescimento da oferta de emprego e por ganhos salariais. Recentemente, o BC fez uma sondagem junto a economistas do setor privado para colher sugestões sobre como descomprimir os preços dos serviços. O retorno foi fraco. A expectativa é de que a queda da inflação dos bens não comercializáveis seja gradual.

Para viabilizar a convergência do IPCA para o centro da meta, será decisiva a política de preços da Petrobras. Se depender unicamente da área econômica, não haverá reajuste da gasolina neste ano, até porque o combustível no Brasil já é caro. Comparado aos Estados Unidos, o galão de gasolina no país custa 50% a mais. Há, entre a Petrobras e a bomba de gasolina uma gama de custos tributários, margem dos distribuidores, entre outros, que precisa ser olhada, dizem as fontes.

As notícias mais recentes da economia mundial, reforçam, já não são tão sombrias. A economia nos Estados Unidos reage e a rentabilidade dos títulos do governo americano tem melhorado. O papel de dez anos, que no dia 7 de março rendia 1,97% ao ano, na sexta-feira passada já havia subido para 2,30% e ontem fechou em 2,27%. Na Europa a situação ainda é complicada, mas as ações recentes do BCE irrigaram o sistema bancário em € 1 trilhão. O temido "tsunami monetário" cunhado pela presidente Dilma Rousseff, porém, pode não chegar ao Brasil.

"Agora temos que parar de falar de crise. É hora de reacender o espírito animal", comentou um ministro ontem. Quanto à taxa de câmbio, ela continua flutuante, mas sob um fluxo de recursos regulado. Não desagradará a ninguém, no governo, se ela ficar na casa de R$ 1,80.

A redução do desemprego - LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

FOLHA DE SP - 23/03/12

Apesar dos níveis baixos do desemprego, país não assiste a um aumento descontrolado de salários 

A TAXA de desocupação no Brasil voltou a cair em fevereiro. Feitas as correções sazonais, ela chegou a 5,6% da população ativa, um novo recorde de baixa na série do IBGE.

Esse número surpreendeu o economista Fabio Ramos, da Quest, que acompanha em detalhe o mercado de trabalho no Brasil. Nas suas palavras, "veio um novo piso. Ceder de 10% para 8% não foi difícil. E foi rápido, cerca de 1% a 2% de queda por ano. Mas esperávamos que a desocupação ficasse estável quando chegasse a 6% da população ativa. Mas continua cedendo, agora na velocidade de 0,5% ao ano".

Ele refaz agora suas previsões: "Ainda em 2012, o crescimento do emprego pelo Caged vai igualar o número de brasileiros que chegam ao mercado de trabalho e, nesse momento, o desemprego vai se estabilizar". Apesar dos riscos, termina seu comentário dizendo que "não cederá dos 5,5%!".

Vida de analista de economia -no Brasil e no mundo- é assim mesmo: surpresas constantes e coragem para recalibrar suas previsões. Mas vou continuar a trazer as observações do Fabio. No relatório que elaborou a partir dos dados do IBGE divulgados ontem, ele destaca ainda os seguintes pontos.

A redução do desemprego veio quase que exclusivamente pelo lado dos serviços. A indústria patina e, se não for revertido o quadro, vai começar a desempregar. Mas, apesar dos níveis baixos do desemprego, não estamos assistindo a um aumento descontrolado de salários. Eles crescem a uma taxa anual real da ordem de 3,5%, que é alta, se não houver ganhos de produtividade da mesma magnitude.

No caso da indústria, as importações de produtos intermediários têm minimizado esse aumento de custos do trabalho. Por isso a taxa de câmbio é uma âncora fundamental para manter a inflação dentro da banda do Banco Central.

Já no setor de serviços, em que os aumentos salariais são superiores à média, o aumento de preços tem sido o caminho escolhido pelas empresas para manter suas margens de lucros. Não por outra razão a inflação para esses produtos tem corrido próxima a 9% ao ano.

Como a geração de novos empregos está crescendo 2,5% ao ano nos últimos meses, a massa total de salários na economia cresce acima de 6% ao ano. Com o crédito bancário ainda em expansão -embora a taxas bem mais reduzidas- e a voracidade do brasileiro pelas compras, o consumo das famílias vai sustentar expansão de pelo menos 3,5% para o PIB.

Mas volto a lembrar que, para chegarmos a um crescimento médio da ordem de 3,5% neste ano, será preciso que, no fim do ano, a economia se expanda a taxas superiores a 5,5% ao ano.

Por isso seria de muito bom-senso o governo moderar seus estímulos à economia, como escrevi na minha coluna anterior.

Para ter uma visão sobre a velocidade de retomada da atividade via consumo, listo abaixo as taxas anuais de aumento do salário real nos meses a partir de setembro do ano passado: -0,4%, -0,7%, -0,4%, +0,8%, +0,7%, +0,9%.

Essa brusca variação no salário real nesse período está associada à inflação de 2011 acima de 6,5% ao ano e à deste início de 2012, próxima a 4% ao ano.

Mas, ao longo dos próximos meses, uma inflação mais elevada vai reduzir os ganhos reais dos salários, com a média do ano convergindo para os 3,5% citados acima.

Finalmente, gostaria de comentar os riscos e os efeitos positivos associados a uma taxa de desemprego tão baixa e à baixa qualificação profissional dos brasileiros que estão no grupo dos "sem ocupação".

Os riscos são claramente ligados a aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade das empresas e a pressões de custo que se seguem. Do lado positivo, gosto

de mencionar o fato de que -pela primeira vez em muito tempo- as empresas estão sendo obrigadas a oferecer a seus funcionários e a terceiros cursos de especialização profissional.

Essa mudança de comportamento pode acelerar a melhoria da qualificação profissional do brasileiro sem depender do governo, que sempre se mostrou lento e ineficiente nesse campo.

Na guerra dos maus costumes - MARIA CRISTINA FERNANDES


Valor Econômico - 23/03/12



A voz era de profeta do apocalipse e as imagens, de um éden terrestre: "Terras a perder de vista, milhares de cabeças de gado, pistas de pouso, mansão com piscina".

Durante 26 minutos o programa da Record "Domingo Espetacular", que compete em audiência com o "Fantástico", da Globo, expôs os indícios de enriquecimento vertiginoso do bispo que comanda a Igreja Mundial do Poder de Deus.

A denominação compete com a Igreja Universal, dona da Record, pelos evangélicos pentecostais. Para isso, também conta com um canal de TV, a Rede 21, arrendada do grupo Bandeirantes.

A Universal deu ao rival o mesmo tratamento que seus bispos receberam no noticiário quando a Igreja entrou no ramo das comunicações.

Nascida da costela da Universal, a Igreja Mundial do Poder de Deus ainda não tem a mesma penetração política de sua congênere cujo PRB chegou ao ministério. Mas a guerra aberta entre as duas igrejas, cujo campo de batalha são concessões públicas de um Estado laico, indica o flanco político que lhes foi aberto.

Não foi o PT que inventou o pentecostalismo mas foi sob a era petista que suas denominações, que falam a linguagem da prosperidade, mais avançaram nos negócios da fé.

Tampouco foi o PT que proibiu o aborto ou inventou o preconceito contra os homossexuais, mas a força política adquirida por essas denominações no Congresso e fora dele tem sido um obstáculo crescente à secularização da pauta dos direitos humanos.

Confronto de pentecostais é de corar congressistas

Também foi na era petista que as pastorais sociais perderam rebanho para os programas sociais do governo e viram o equilíbrio de forças na Igreja Católica pender para a pauta moralista, mais competitiva com o avanço pentecostal.

Em comum, evangélicos e católicos ganharam terreno sobre a política partidária no poder de mobilização social como mostrou a campanha eleitoral de 2010. Esta semana os católicos que protestam contra petistas-que-matam-criancinhas voltaram ao centro de São Paulo com cartazes de fetos sendo espetados pela estrela do partido e alusões ao homossexualismo na esfera eleitoral.

O governo Dilma Rousseff ora age afirmativamente frente a essa pauta, como na escolha de Eleonora Menicucci para Secretaria de Políticas para as Mulheres, ora na defensiva, como no episódio em que o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, desculpou-se por ter colocado o dedo na ferida do conservadorismo pentecostal.

Esse avanço se reflete no peso que as bancadas religiosas ganharam na pauta do Congresso. Atuam pelo poder de veto. Da mesma forma que, nos Estados Unidos, o direito ao aborto acabou sendo decidido pela Suprema Corte, no Brasil a união civil de homossexuais, barrada no Congresso, só seria reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.

Na discussão da Lei da Geral da Copa, que somou uma Casa Civil sem autonomia a uma liderança que pegou o trem andando, foi o veto dos evangélicos à bebida nos estádios, e não a prevalência do Estatuto do Torcedor que moveu o pano de fundo da trapalhada.

Essas pautas suprapartidárias, encabeçadas por duas das bancadas mais fortes do Congresso - evangélicos e ruralistas -, têm servido ao jogo de barganha dos partidos no confronto com o governo do qual se dizem aliados.

A aposta de que grupos minoritários dentro dos partidos aliados podem tomar as rédeas no Congresso ainda está por se mostrar devidamente conectada com a realidade das eleições municipais.

Não são apenas os partidos que ficam mais dependentes do governo federal para eleger seus prefeitos. Agraciados com o tempo de televisão no horário eleitoral gratuito, os aliados têm uma moeda de troca importante para o partido majoritário do governo que tem a pretensão de também ser o maior nas prefeituras.

É disso que tratam as alianças, mas o petista atento a esse jogo continua sendo aquele que recupera sua saúde em São Bernardo.

Dilma parece mais concentrada na estratégia de colher apoio na sociedade a sua cruzada contra os maus costumes nas relações com o Congresso. Pela primeira vez em discurso público, a presidente expôs a estratégia de cativar a opinião pública para enfrentar o bloqueio de seus aliados.

Ao escolher o jeitinho brasileiro como alvo - "a maioria dos brasileiros cansou de conviver com práticas marcadas pela lassidão e com nossa fama de país do jeitinho" -, a presidente, marca uma diferença de apelos feitos pelo antecessor Luiz Inácio Lula da Silva em momentos de crise política.

Lula dirigia-se ao brasileiro que, como ele, tinha saído de baixo e vencido na vida enfrentando ricos e poderosos - "Eles vão ter que me aguentar".

Com a crítica ao jeitinho, Dilma mira uma base social difusa que tanto pode estar na classe média estabelecida quanto naqueles que prosperam na cultura do esforço pessoal com a ajuda do Prouni e do crédito consignado.

Ao contrário de Lula, Dilma não conta com o entusiasmo dos movimentos sociais. Colheu ontem manifestações mais concretas de apoio dos empresários com quem se reuniu do que dos sindicalistas que recebeu na semana passada, embora ambos sejam igualmente sensíveis às medidas que o governo vier a tomar contra a desindustrialização.

Ao escolher o apelo difuso contra os maus costumes, Dilma parece apostar num apoio que se difunde para além dos meios tradicionais de mobilização social. É uma aposta da era virtual, mas com uma base que ainda está por ser testada.

São as igrejas pentecostais que, nos últimos anos, têm demonstrado capacidade de mobilizar e convencer. Não apenas pelas marchas e cultos gigantescos, mas pela capilaridade de seus pastores - cujos templos ficam abertos de madrugada - e pela penetração de seus programas de televisão.

Se a guerra é de costumes, o confronto deflagrado no último fim de semana entre os pentecostais faz as raposas que emparedam Dilma no Congresso parecerem anjos.

GOSTOSA


Calibragem - REGINA ALVAREZ

O GLOBO - 23/03/12


O IBGE divulgou ontem dois indicadores importantes para medir a temperatura da economia. O IPCA-15, que é prévia da inflação oficial, ficou em 0,25% em março, bem abaixo das previsões do mercado, que apostava em 0,40%. O desemprego ficou em 5,7% em fevereiro, a menor taxa para o mês desde 2003. Isso não seria uma contradição, já que a inflação está caindo puxada pelos serviços e o mercado aquecido pressiona esses preços?

De fato, o que chamou mais a atenção dos analistas na composição do IPCA-15 foi o recuo de alguns preços de serviços que estavam rodando em um patamar muito elevado. Os grandes itens que puxaram o índice para baixo estão na categoria de gastos pessoais: manicure, cabeleireiro, aluguel, consertos e manutenção, por exemplo. Se o mercado está forte, a classe C demandando por serviços, o mercado de trabalho aquecido e a renda continua crescendo, agora puxada pelo aumento do salário mínimo, como os preços dos serviços podem estar recuando? Uma hipótese, na opinião do economista Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, é que esteja havendo uma acomodação desses preços, porque cresceram muito e bateram no teto.

Ele lembra que, pelo efeito estatístico, haveria uma desaceleração do IPCA em 12 meses, já que a base era mais alta no começo de 2011. Mas destaca que o recuo da taxa está mais rápido do que as projeções do próprio Banco Central em dezembro.

O economista Carlos Thadeu de Freitas, da CNC, destaca um outro aspecto: tanto o IPCA-15 como a taxa de desemprego divulgados ontem refletem o passado e não o que vai acontecer com a economia daqui para frente. O crescimento ainda está tímido, mas vai acelerar a partir do segundo semestre. E os incentivos ao consumo oferecidos pelo governo podem gerar pressões inflacionárias.

Freitas defende a calibragem dos incentivos, de forma que estimulem menos o consumo - pois a taxa de juros em queda já é um importante impulso nesse sentido - e mais os investimentos.

- Para crescer, sem pressionar a inflação, o governo deveria moderar os incentivos ao consumo e desonerar mais os investimentos - recomenda. E lembra o risco de o governo errar a mão no estímulo ao consumo neste momento como errou no ano passado ao contrair demais os investimentos.

Ganho real
Junto com o câmbio, um dos problemas que mais afeta a indústria é o crescimento do custo do trabalho sem aumento correspondente da produtividade. O gráfico abaixo mostra como o rendimento médio real nas seis principais regiões metropolitanas do país continua crescendo. Houve alta de 1,2% em fevereiro, sobre janeiro, e crescimento de 4,4% em relação ao mesmo mês de 2011. Acima, portanto, da variação do PIB. A principal fonte de pressão neste início de ano para as empresas é o reajuste de 14% do salário mínimo.

Balanço I
O balanço das empresas no quatro trimestre do ano passado confirma o que o IBGE antecipou. As companhias voltadas para o mercado interno estão se saindo bem, enquanto as que dependem do mercado externo vêm decepcionando. Empresas dos setores de serviço, como telecomunicações, financeiro, varejo e consumo, trouxeram números fortes, enquanto siderurgia, mineração, petróleo e gás ficaram abaixo do esperado.

Balanço II
A expectativa agora é em relação ao resultado das construtoras. A previsão do mercado é de que a rentabilidade dessas empresas será afetada pelo aumento de custos e pela desaceleração nas vendas. "Temos dados preliminares de vendas que mostram desaceleração do setor. Combinada com o aumento de custos da mão de obra, deve produzir resultados fracos na construção civil", prevê a analista-chefe da Ativa Corretora, Luciana Leocádio.

Olho na indústria
Depois da queda de 2,1% em janeiro, a indústria segue com maus indicadores em fevereiro. A produção de veículos caiu 0,5%, depois de recuar 10,1%; o fluxo de veículos pesados nas estradas ficou menor em 0,8%, seguindo queda de 0,4%; e a produção de papelão ondulado ficou 0,9% menor, depois do recuo de 0,8%. "Os indicadores que antecipam a produção não vieram bons, mas ainda prevemos alta de 0,7% na indústria em fevereiro. Este é um período de forte recomposição de estoques, e isso pode garantir um PIB de 1,1% no primeiro trimestre", disse o economista Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria. 

Uma reportagem mobiliza o país - PEDRO SIMON


O Globo - 23/03/12


A reportagem do "Fantástico", na TV Globo, no último domingo, estarreceu o país. Revelou que ainda falta muito para chegarmos a mínimos padrões de civilização, quando se trata de combater a corrupção e a impunidade.

Avançamos, é fato, e um grande passo foi a Lei da Ficha Limpa, que impede registro de candidaturas de quem foi condenado em tribunal ou órgão colegiado.

Ajuda a moralizar a eleição, mas é pouco. Ainda não fizemos completamente a lição de casa.

A propina, de tão óbvia, já integra o cálculo de custos das empresas, é parte do chamado Custo Brasil, juntamente com a burocracia asfixiante e a péssima infraestrutura física do país, aí incluídos portos, estradas, aeroportos, energia, etc.

A TV Globo mostrou aos brasileiros o odioso método de ação de verdadeiras quadrilhas. Estão ali, frente a frente, o corrupto e o corruptor. No papel de "corrupto", o jornalista, que, temo, possa ser responsabilizado juntamente com o diretor do hospital, um homem digno, cuja coragem permitiu levantar o véu da corrupção. Todas as exigências formais do bom jornalismo estão presentes ali. A matéria atende às perguntas básicas: o que, quem, quando, onde e por que. Na suíte, ou seja, a matéria do dia seguinte, o administrador do hospital reforçou: "Sei quem roubou e quanto foi roubado, quem pagou e quem recebeu, conheço os endereços deles; só não posso ir buscar o dinheiro de volta." Fazer com que o dinheiro desviado retorne aos cofres públicos é outro problema. Muitos defendem a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para analisar a situação da Saúde. As CPIs, historicamente, tiveram grande prestígio. Apoiadas no jornalismo investigativo, contabilizaram o impeachment de um presidente da República e a cassação de parlamentares envolvidos em falcatruas no Orçamento da União. Atualmente, perderam o foco e o sentido. Investigam, sim, mas transformadas em instrumentos de barganha política.

Não se sabe, exatamente, o quanto é desviado de dinheiro público, no Brasil. Comumente se estima o total de desvios em um montante que beira absurdos R$ 100 bilhões por ano.

Um valor que supera, em muito, os R$ 92 bilhões previstos no Orçamento de 2012 para a pasta da Saúde. Em contrapartida, o gasto mensal com medicamentos pelo hospital pediátrico do Rio, de acordo com a reportagem, é de apenas R$ 120 mil! Caso fosse concretizada, a fraude desviaria cerca de R$ 1 milhão. É muito, comparado com o salário de um operário, ou mesmo considerando o gasto mensal com remédios naquele hospital. Porém, o que pensar quando nos deparamos com o montante envolvido em privatizações como a da Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores mineradoras do mundo, doada por tostões? Ou em grandes obras de infraestrutura que mobilizam bilhões de reais? A indignação nacional causada pelos fatos demonstrados no "Fantástico" é capaz de mudar a história.

A imprensa assume, no combate à corrupção e à impunidade, papel equivalente ao exercido na luta pela democracia, denunciando os "malfeitos", tão perversos hoje como antes.

Vai que depois eu vou - ELIANE CANTANHÊDE


FOLHA DE SP - 23/03/12

BRASÍLIA - Enquanto Dilma enfrenta as feras aliadas, aumenta a perplexidade diante de Lula, que estimula o confronto da pupila e sucessora com o Congresso.
Ao novo líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB), Lula teria dito que "a luta é boa" e que é chegado o momento de "novos métodos e práticas políticas".
Soou assim: vai firme, Dilma! Faça, no seu segundo ano de mandato, o que eu não tive coragem nem tentei fazer em oito anos!
Lula tinha biografia, esperteza política e alta popularidade, mas não arriscou um tico de energia para melhorar os métodos, as práticas e os líderes do Congresso.
Refestelou-se confortavelmente na companhia de Romero Jucá, de Renan Calheiros e de José Sarney -seu último ato de governo foi convidar Sarney para o voo de volta para São Paulo. Pois é essa a turma que Dilma tenta agora enfrentar ao nomear Eduardo Braga como seu líder.
Lula também absolveu Fernando Collor para a história, depois de o PT ter sido decisivo para trucidá-lo, defendeu governador que usou dinheiro público para levar até a sogra no Carnaval a Paris, disse que gravações não são prova de nada, reduziu o "mensalão" a caixa dois de campanha e foi quase paternal ao criticar os "aloprados" que carregavam uma mala de dinheiro para pagar dossiês contra adversários.
Além disso, não concluiu a escolha dos caças da Aeronáutica, não iniciou a Comissão da Verdade, adiou a decisão do caso Battisti para as últimas horas de seu governo, promoveu uma gastança na reta final do seu mandato para eleger a sucessora. Deixou, assim, várias bombas para explodir no colo de Dilma.
Com esse "vai firme!", Lula estimula Dilma a ser valente, confrontar o Congresso e mergulhar no escuro -risco que ele, espertamente, se recusou a correr. Se der certo, parte da vitória será dele. Se der errado, ela que se vire. Assim é fácil.

Faltou fé aos coreanos? - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 23/03/12


O mercado se surpreendeu com a notícia de que o estaleiro coreano Samsung vendeu a participação de 6% que detinha no Estaleiro Atlântico Sul (EAS), instalado no complexo portuário de Suape (PE), para os sócios Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, que passam a ficar com 50% cada um do empreendimento. O fim da parceria da Samsung desmente informações que vinham sendo divulgadas em Brasília, dando conta de que o estaleiro coreano, que possui comprovado know-how na construção de navios, plataformas e sondas de exploração de petróleo, aumentaria a sua participação no EAS ou mesmo poderia adquirir seu controle acionário. O governo teria interesse no negócio, que implicaria maior transferência de tecnologia, permitindo o cumprimento de prazos acertados com a Petrobrás para a entrega de embarcações de que a estatal necessita urgentemente para aumentar a produção nacional de petróleo.

A presidente da Petrobrás esteve no Recife no fim de fevereiro, para um encontro reservado com os sócios do EAS. Depois do encontro, Graça Fortes lembrou que o contrato da Petrobrás é com a empresa de investimento Sete Brasil, que encomendou as construções ao Atlântico Sul. Graça Foster, antiga funcionária da estatal e ex-diretora de sua área de Energia e Gás, é conhecida por seu rigor com o cumprimento de prazos e, como ela própria afirmou, em entrevista ao Estado, está empenhada em acompanhar "que nem mosca de boi" as encomendas feitas pela companhia. É claro que ela não desconhece a ineficiência dos trabalhos do EAS, que registra o notório caso do navio João Cândido, que, apesar de ter sido lançado ao mar em maio de 2010, com grande fanfarra, continua no estaleiro para reparos.

Há atraso também na produção de sondas. A sonda P-55, construída pelo EAS, começou a ser transportada para o Rio no início deste ano e só estará em condições de poder entrar em operação no Campo de Roncador, na Bacia de Campos, nos últimos meses deste ano ou - o mais provável - em 2013. Como informou O Globo, a produção de petróleo pela Petrobrás em território nacional, que ficou 3,7% abaixo da meta em 2011, deveria aumentar 335 mil barris/dia em 2012, mas para isso precisaria contar com a P-55, com expectativa de produzir 120 mil barris/dia, e com o poço piloto de Guará, no pré-sal na Bacia de Santos, que produziria outros 180 mil barris/dia.

O aumento da produção no volume previsto não passa, portanto, de "uma possibilidade". Essa situação diz respeito não só aos interesses da Petrobrás e de seus acionistas, mas aos interesses nacionais, já que, com maior produção, o País poderia aumentar a exportação de petróleo, em uma fase de altas cotações. Não se deve deixar de observar que as vendas de petróleo em bruto constituem hoje um dos principais itens da pauta de exportações brasileiras.

Tudo parece indicar também que os estaleiros brasileiros, de modo geral, ainda não adquiriram todo o know-how necessário para atender às exigências de conteúdo nacional feitas pela Petrobrás por exigência do governo petista. O EAS anunciou, no início deste mês, que receberia o reforço de uma equipe de 120 técnicos coreanos, mas agora, com a saída do estaleiro Samsung, não se sabe se isso ocorrerá ou não. A transferência de tecnologia é muito facilitada quando há um sócio estrangeiro com reconhecida competência. Uma alternativa poderia ser um contrato de assistência técnica entre os controladores e a multinacional, mas isso, por enquanto, permanece no terreno da especulação.

Na realidade, o País continua aferrado à questão de conteúdo nacional dos equipamentos para a produção de petróleo, mesmo quando isso se mostra irrealista. Em seu discurso de posse na estatal, Graça Foster reiterou o compromisso com "a uniformização dos critérios de medição e cobrança de conteúdo local nas contratações para toda a companhia, pois, afinal, temos investimentos de US$ 224,7 bilhões e uma estimativa de produção de 6 milhões de barris por dia até 2020".

A presidente da Petrobrás não viu contradição alguma entre os meios disponíveis e os objetivos a atingir.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 23/03/12

Fundo de ações do Brasil chega à Colômbia

A BB Gestão de Recursos DTVM lançou o que considera o primeiro fundo de ações do Brasil na Colômbia, com gestão de uma administradora brasileira.

A administração e a distribuição ficarão sob a responsabilidade da Interbolsa, uma das maiores corretoras da Colômbia.

O fundo leva o nome de Carioka, grafado com "k" em vez de "c". "O nome foi escolhido pela Interbolsa", diz Carlos Massaru Takahashi, presidente da BBDTVM.

O "fondo" vai aplicar 80% em empresas tidas como pagadoras de bons dividendos e alocar 20% de empresas de "middle caps" [capitalização média], de setores avaliados pela gestora como de bom potencial de crescimento.

"O fundo é em pesos colombianos, o que também é inédito para um fundo com exposição em ações brasileiras", afirma Takahashi.

Para participar do fundo, o investidor tem de possuir o equivalente a R$ 5.000.

As movimentações serão de pelo menos R$ 1.000.

"É um fundo para pessoas físicas que começa com R$ 3 milhões de patrimônio líquido e a meta é chegar a R$ 100 milhões neste ano."

"Essa iniciativa faz parte das estratégias de internacionalização e de intensificar a distribuição de fundos da BB DTVM no exterior, através de parcerias locais", afirma Takahashi.

A BB Gestão de Recursos DTVM é a maior asset (gestora de recursos) do Brasil, com cerca de R$ 449 bilhões sob gestão.

sem trocas

A presidente da Petrobras, Graça Foster, negou ontem o rumor de que esteja para demitir o diretor financeiro da companhia, Almir Barbassa.

O executivo estava à frente da área na gestão do ex-presidente José Sérgio Gabrielli, a quem é muito ligado. "Ninguém mais vai sair", disse ela. "Em princípio, segue como está [a diretoria]."

fora da tomada

Aproximadamente 48% das empresas do setor de eletroeletrônicos registraram redução nas vendas em fevereiro, em comparação com o mesmo período do ano passado, de acordo com levantamento da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica).

Em janeiro, apenas 31% das companhias indicavam queda na mesma base de comparação.

A parcela das empresas que citavam estabilidade caiu de 22% na sondagem de janeiro para 15% em fevereiro.

A relação das que tiveram aumento nas vendas caiu de 47% para 37%, de acordo com a entidade.

FÉRIAS FRACIONADAS

A construtora Brasil Sol investirá R$ 50 milhões para a construção de um resort na cidade de Nova Viçosa, na Bahia.

O projeto, que ficará pronto no primeiro semestre de 2014, terá 192 casas de 111 metros quadrados cada uma.

Para facilitar a comercialização das unidades, a companhia fechou uma parceria com a RCI (Resort Condominums International) para a venda de frações de 40 casas. A partir de R$ 25 mil, pode-se garantir duas semanas de hospedagem por ano.

"Negociamos essa medida para aproximar o produto do consumidor das classes B e C, que teria dificuldade em arcar com a manutenção de uma casa sozinho", diz Stélio Cristóvão, fundador da construtora.

No negócio acertado pelas companhias, o consumidor pode ser proprietário de parte de uma casa na Bahia, mas viajar para outros hotéis da rede RCI, que atua em mais de cem países.

O VGV (Valor Geral de Vendas) estimado do projeto é de cerca de R$ 200 milhões.

imigrante empregado

O nível de emprego entre hispânicos e asiáticos nos EUA voltou ao nível pré-crise.

Estudo do Pew Research Center, organização independente de pesquisas, mostra que o número de hispânicos empregados passou dos 19,5 milhões no quarto trimestre de 2009 para 20,7 milhões no mesmo período de 2011 -incremento de 6,5%.

Entre 2007 e 2009, a queda havia sido de 2,4% (perda de 473 mil postos). A principal fonte de trabalho para os hispânicos nos últimos anos foi o setor hoteleiro.

O instituto aponta, no entanto, que a geração de empregos foi suficiente apenas para acompanhar o ritmo de crescimento da população em idade de trabalho, que se expandiu em 6% entre 2009 e 2010.

SERVIÇO TIPO EXPORTAÇÃO

As exportações mundiais de serviços comerciais aumentaram 3% no último trimestre do ano passado, ante mesmo período de 2010.

Os dados são da Unctad (Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento) e da OMC (Organização Mundial do Comércio).

O número é bastante inferior aos 13% registrados no trimestre anterior.

De acordo com dados preliminares dos órgãos, a expansão das exportações de serviços brasileiros foi de

21% no ano. No mesmo período, o crescimento médio mundial ficou em 11%.

ESCRITÓRIO NA BARRA

A taxa de vacância dos escritórios de luxo na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, passou de 1,8% para 12,4% no período de um ano, segundo estudo da Binswanger.

O aumento aconteceu entre o último trimestre de 2010 e o final de 2011.

Mesmo com a alta na quantidade de imóveis vagos, os preços dos aluguéis também subiram na região.

O valor mínimo registrado para locação passou de R$ 70 para R$ 80, por metro quadrado. O preço máximo registrado, por sua vez, que estava em R$ 115, chegou a R$ 130 por metro quadrado.

O mercado geral de escritórios de luxo no Rio fechou o ano passado com vacância de 3%, segundo o estudo. 

Perigo no volante - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 23/03/12

O ciclista na Rodovia BR- 040 não foi a primeira pessoa que Thor Batista atropelou. No dia 27 de maio de 2011, o filho de Eike e Luma, a bordo do Audi placa EBX 0001, atropelou um senhorzinho de 86 anos, também numa bicicleta, na Av. Sernambetiba, na Barra. Uma ambulância do Samu levou o idoso para o Hospital Lourenço Jorge, ali perto. Depois, foi transferido para o Copa D’Or.

Segue...

Thor prestou socorro ao senhorzinho e pagou todas as despesas médicas. Segundo um filho da vítima, que prefere não aparecer, a família não registrou queixa e não pediu indenização: — Estávamos preocupados em salvar nosso pai, que também não queria confusão.

Aliás...

O senhorzinho, hoje recuperado, fraturou o acetábulo (parte da bacia onde a cabeça do fêmur se encaixa). Pôs duas placas e cinco parafusos, fez fisioterapia, hidroterapia e teve sessões com psicólogo para se livrar do trauma.

Fator Odebrecht

Na reunião de Dilma com os 28 maiores empresários do país, Marcelo Odebrecht propôs que a classe ajude o governo a aprovar no Congresso mudanças tributárias. Logo depois, seu colega Josué Alencar brincou: — Presidente, agora que a senhora conseguiu um novo líder no Congresso, o Marcelo Odebrecht...

Sapo barbudo

A barba de Lula voltou a crescer.

A fama do padre
“Ágape”, livro do padre Marcelo Rossi, chegou a Portugal só há duas semanas e já é o mais vendido na terrinha. Editado pela Globo Livros, a obra já vendeu 7,6 milhões de exemplares no Brasil. Em Portugal, saiu pela Porto Editora.

JIBOIAS COMO esta têm zanzado pelos 37 terrenos do empresário alemão Rolf Glaser na Rua Benedito Calixto, no Morro do Vidigal, há umas três semanas. Quem primeiro viu foi uma vizinha. Assustado e sem saber o que fazer, Rolf recorreu ao caseiro e até a seu advogado. Mas, até agora, ninguém conseguiu pegar as cobras. Como já saiu aqui, o calorão, além de trazer o mosquito da dengue, tira as serpentes das tocas, segundo o Instituto Vital Brazil.

O mistério da taça
A Receita apurou nota publicada aqui sobre a retenção da Taça Fair Play, que a seleção de Parreira ganhou em 2006. Segundo o Leão, em junho de 2007, um ano após a Copa da Alemanha, a tal taça chegou ao Galeão como carga comum, despachada da Suíça e identificada como material promocional de valor não comercial.

Abandonado...

Ainda segundo a Receita, a CBF não foi buscar o troféu, que acabou indo a leilão e comprado por um particular.

Refinaria do Ceará

Este mês, o governador Cid Gomes deve formalizar a entrega à Petrobras do terreno onde a estatal pretende construir uma refinaria para 300 mil barris/dia. A Refinaria do Ceará é um projeto de quase 60 anos. Mas parece que agora vai.

Gangue dos quatro
Ministério Público encaminhou à Justiça outro inquérito aberto pela Delegacia Fazendária da Polícia Civil do Rio, há seis meses, contra diretores da Ruffolo. A empresa é uma das quatro flagradas pelo “Fantástico”, da TV Globo, tentando assaltar os cofres públicos.

A favor do bullying

A Câmara do Rio aprovou ontem lei do vereador Carlos Bolsonaro que proíbe matérias contra homofobia e bullying nas escolas municipais.

Bença, Papa

Sérgio Cabral, Eduardo Paes e o xerife do Rio, José Beltrame, serão recebidos pelo Papa Bento XVI, dia 1o- de abril. Os três vão a Roma se reunir com os organizadores da Jornada Mundial da Juventude, que será realizada no Rio ano que vem.

Moda verão

O Fashion Rio edição verão deste ano deve ser no Jockey Club, na Gávea.

Retratos da vida

Quarta, por volta de 21h, dois casais num Fiat Uno entravam no motel Love Land, no Cachambi, no Rio, quando um táxi os fechou, e dele saiu uma moça. Era a mulher de um dos salientes, que já desceu aos gritos (“Vou matar!”). Pela janela do Fiat, ela agarrou os cabelos de uma das ocupantes, e só soltou com a ajuda da turma do deixa disso. Juntou gente, que começou a chamá-la de “Pedrita”, porque ela agarrava os cabelos da amante do marido com força.

PONTO FINALJuca Ferreira pode até ter razão. Mas não custa lembrar que o ex-ministro é, com todo o respeito, meio viúvo do cargo. Com dor de cotovelo, fez tudo para não largar o osso. 

A passividade diante da crise institucional - WASHINGTON NOVAES


O Estado de S. Paulo - 23/03/12


São inquietadores, preocupantes, muitos sinais que vêm da área institucional brasileira, aí compreendidos Legislativo, Executivo e Judiciário. Que mostram a fragilidade do quadro legal em que estamos inseridos - e que pode, a qualquer momento, levar a rupturas indesejáveis, por cansaço, inconformidade, revolta da sociedade.

Pode-se começar pelo mais recente, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de convalidar medida provisória do Executivo, de 2007, que condenara na véspera, por não haver passado, antes do plenário no Congresso, por comissão mista de deputados e senadores, como exige a legislação. Advertido no dia seguinte pela Advocacia-Geral da União, o STF voltou atrás e disse que a obediência somente será obrigatória daqui por diante - pois corria o risco de invalidar 460 medidas provisórias, 16 mudanças na Constituição, 12 projetos de lei complementar, 198 projetos de lei e 252 decretos legislativos em vigor e que contrariam aquela exigência (Estado, 11/3).

Imagine-se a confusão! Para remendar a ferida decidiu-se que a exigência legal só será cobrada daqui para a frente - se ninguém contestar o arranjo. Mas será que ninguém no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário tinha visto isso antes?

Panorama semelhante já fora exposto na votação, no mesmo tribunal, do projeto de Lei da Ficha Limpa. Discutiu-se muito a partir de quando valeria, quem atingiria. Só não se discutiu a validade da aprovação no Congresso, já que um conluio ali, entre o relator e senadores, permitira trocar a expressão "os que tenham sido condenados" por "os que forem condenados". Isso exigiria a volta à Câmara dos Deputados para nova apreciação, uma vez que o texto fora modificado - o que não foi feito, sem que ninguém protestasse, no Legislativo ou no Judiciário, ou acusasse a irregularidade. E o Executivo, tranquilamente, sancionou a lei. E se alguém agora exigir uma revisão, à véspera das eleições deste ano?

Não foi o pulo único do gato. Pouco antes, o mesmo Senado, com o mesmo relator, aprovou outro arreglo que suprimiu do projeto da Política Nacional de Resíduos Sólidos o dispositivo, que já passara pela Câmara, após 19 anos de discussão, que só admitiria a incineração de lixo (processo caro e com riscos) depois de esgotadas as possibilidades que enumerava - não geração de lixo, reutilização, reciclagem, tratamento com disposição final ambiental (aterro). Para alegria das grandes empreiteiras - que têm, quase todas, incineradoras -, o projeto enviado pelo Senado foi sancionado na Presidência da República - sem nenhum protesto das áreas institucionais.

Talvez, entretanto, a situação mais indecorosa tenha sido a entrevista concedida há uns cinco anos pelo então ministro Nelson Jobim, na qual, de livre e espontânea vontade, confessou ao jornal Folha de S.Paulo haver participado de uma "articulação" para incluir na Constituição de 1988 - da qual ele fora sub-relator - dois artigos que não haviam sido examinados e aprovados pelo plenário. Ilegalidade que ele só revelará quais são "em livro". Que artigos serão esses que a sociedade brasileira vem acatando, cumprindo? Por que nenhum membro do Legislativo ou do Judiciário interpelou, contestou, tomou providências? Que consequências isso terá provocado, prejudicando a quem?

E assim fomos, e vamos, reduzindo por medida provisória áreas de preservação permanente na Floresta Amazônica, estabelecendo metas de redução (quase 40% para 2020) de emissões de poluentes que contribuem para mudanças climáticas (sem saber de quanto serão as emissões no final desta década e agora emitindo mais, com menos álcool e mais gasolina) e tantas outras coisas. E ainda com um enorme abacaxi a descascar pela frente: o julgamento do "mensalão" no STF, que não se sabe se será realizado antes das próximas eleições (e com que consequências) ou se vai ser empurrado para a frente até prescrever. E também sem entrar no terreno dos dramas levantados no Poder Judiciário pela ministra corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ou no das irregularidades cometidas por pessoas nomeadas para altos postos da República (com a sucessão de escândalos e demissões). Ou na situação constrangedora de membros do Legislativo, no exercício das suas funções, acusados de tantas barbaridades - não há espaço que chegue nos jornais.

Na verdade, tudo ou quase tudo acaba sendo "empurrado com a barriga", como diz o povão. Mas os riscos são muito altos e não podem ser admitidos. Ninguém sabe como nem quando começa exatamente uma crise institucional. Mas todo mundo sabe hoje do descrédito que permeia a área política. Talvez seja essa a questão principal a ser enfrentada pelos partidos e seus candidatos na campanha que se avizinha, em quase todos os lugares. Como confiar neste ou naquele candidato? Que pensam eles de todas essas questões?

Não bastasse isso, são raríssimas as informações sobre o que pretendem também no terreno concreto das políticas públicas. Nossas grandes cidades estão mergulhadas - e cada vez mais - em problemas gigantescos, mas sem políticas adequadas para enfrentá-las, só com medidas pontuais prometidas.

Não estranha, assim, que proliferem candidaturas tendentes a ridicularizar a corporação política, o mundo da administração. Nem que ganhem corpo as atitudes de protesto contra uma carga tributária que se considera excessiva e desperdiçada.

Todo o cuidado é pouco. O sentimento de inermidade, de desproteção, da maior parte da sociedade cresce aos olhos de quem quer ver. Trata-se de um terreno e de um momento perigosos, pois não há como prever o desfecho de uma crise em que a sociedade se limite a sacudir os ombros. É indispensável, por isso, que as instituições responsáveis descruzem os braços e se lancem à tarefa de criar alternativas em que os cidadãos possam confiar. E resta muito pouco tempo até outubro.

GOSTOSA


As rachaduras nos Brics - BRAHMA CHELLANEY


Valor Econômico - 23/03/12


Ao preparar-se para realizar sua última reunião de cúpula anual em Nova Déli, quarta e quinta-feiras da próxima semana, o grupo dos países do Brics- Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - continua sendo um conceito em busca de uma identidade comum e de uma cooperação institucionalizada. Isso dificilmente surpreenderia, tendo em vista que esses países têm sistemas políticos, economias e objetivos nacionais muito distintos, e estão localizados em diferentes regiões do mundo. Apesar disso, as cinco economias emergentes orgulham-se de constituir a primeira importante iniciativa mundial não ocidental.

A ausência de consenso entre os países do Brics levou os céticos a qualificarem o agrupamento de sigla sem qualquer substância. Para seus protagonistas, porém, trata-se do produto das atuais mudanças de poder no mundo e poderão evoluir de modo a constituir um importante instrumento na definição da arquitetura de governança mundial - parteira de uma nova ordem internacional.

Afinal de contas, as economias do Brics são, provavelmente, a mais importante fonte de crescimento mundial futuro. Elas representam mais de um quarto das massas terrestres no planeta, mais de 41% de sua população, quase 25% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e quase metade de todas as reservas em divisas e ouro. O Brics, na realidade, também pode ser chamado de R-5, derivado das moedas de seus membros (real, rublo, rupia, renminbi e rand).

Países estão alavancando a recuperação global e devem liderar a criação de uma nova ordem mais plural. Mas precisam entrar em acordo em torno do que acreditam ser objetivos políticos e econômicos comuns que possam serem atingidos

Na cúpula de Nova Deli, os líderes do Brics discutirão a criação de instituições comuns, em particular, de um banco de desenvolvimento comum capaz de mobilizar a poupança desses países. Atualmente, os países do Brics constituem um bloco frouxamente articulado e informal. Se os líderes do grupo não fizerem progressos na criação de uma estrutura institucional, darão credibilidade à afirmação de que não passam de um fórum de discussões reunindo países tão diversos que seus interesses comuns, se é que existem, não podem ser traduzidos num plano de ação compartilhado.

Foi apenas no ano passado que o Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) converteu-se no Brics, com a inclusão da África do Sul. O conceito do grupo, concebido em 2001 por Jim O"Neill, do Goldman Sachs, e abraçado pelos quatro países originais apenas em 2008, quando seus ministros de Relações Exteriores reuniram-se informalmente durante uma reunião trilateral envolvendo a Rússia, a Índia e a China. A inclusão do Brasil abriu caminho para a primeira cúpula do Bric, em 2009, que, curiosamente, pegou carona na reunião da Organização de Cooperação de Xangai, em Ecaterimburgo, na Rússia, naquele ano.

Essa associação ajudou a SCO - ainda em grande parte uma iniciativa sino-russa - a ganhar mais evidência, mas deixou os países do Bric com pouco espaço para começar a formular um plano de ação unificado. A subsequente inclusão da África do Sul transformou o Brics num agrupamento de cunho mais mundial, que ameaça tornar irrelevante ainda outra iniciativa: o Ibas (Índia, Brasil e África do Sul).

Para o Brasil, Rússia, Índia e África do Sul, o grupo Brics serve de fórum para enfatizar sua crescente influência econômica e exibir sua ascensão ao palco mundial. Mas para a China, que não necessita reconhecimento como potência mundial emergente, o Brics proporciona vantagens tangíveis - e não apenas simbólicas. Em consequência, a China projetou, efetivamente, uma longa sombra sobre o grupo, buscando abertamente, por exemplo, controlar o proposto banco de desenvolvimento comum - algo que a Índia e a Rússia, em particular, recusam-se a aceitar.

Num momento em que a China está sob pressão para manipular o valor do yuan para manter a competitividade de suas exportações, o Brics lhe oferece uma plataforma para expandir o papel internacional de sua moeda. Como parte de seu anseio em dispor de uma moeda internacionalmente aceita capaz de rivalizar com o dólar ou o euro, a endinheirada China planeja oferecer empréstimos em yuans aos outros membros do Brics.

Conceder empréstimos e praticar o comércio em yuans provavelmente ampliaria a reputação e a influência internacional da China. Mas sua moeda subvalorizada e subsídios ocultos às exportações vêm minando sistematicamente a indústria de transformação em outros países do Brics, especialmente a Índia e o Brasil.

Apesar disso, os defensores do conceito Brics continuam esperançosos em que o grupo possa servir como um catalisador para reforma institucional mundial. Os arranjos internacionais existentes permanecem praticamente estáveis desde meados do Século XX (apesar do surgimento de potências econômicas não ocidentais e de dificuldades não tradicionais), e por isso o mundo necessita mais do que os passos titubeantes e desconexos dados até agora. A formação do G-20, por exemplo, foi uma improvisação concebida para adiar uma genuína reforma financeira.

Na verdade, as modestas medidas implementadas em resposta às mudanças na distribuição de poder mundial limitaram-se à esfera econômica, e ao pilar fundamental das relações internacionais - paz e segurança - de competência exclusiva de pequeno número de países.

A agenda chinesa não é a mesma das dos outros países do Brics, quando se trata de reforma institucional mundial. Trata-se de uma potência revisionista no que diz respeito à arquitetura financeira mundial, empenhada numa revisão do sistema de Bretton Woods. Mas é uma defensora do status quo, no que diz respeito ao sistema das Nações Unidas, e opõe-se firmemente à ampliação do quadro de membros permanentes do Conselho de Segurança. A China quer continuar sendo o único país na Ásia com um assento permanente no CS - uma posição que a coloca em oposição à Índia.

Para que os países do Brics se consolidem como grupo de pressão nas relações internacionais, precisam acordar em torno do que acreditam ser objetivos políticos e econômicos capazes de serem atingidos. Por exemplo, eles mostram-se geralmente unidos em sua frustração com - mas não em sua reação ao - status do dólar como moeda de reserva mundial. Com efeito, a relação bilateral mais importante de cada país do Brics é com os EUA.

O conceito de Brics representa, acima de tudo, o desejo de seus membros de criar uma ordem mundial mais plural. Mas é incerto se os membros do grupo algum dia evoluirão de modo a formar um agrupamento coerente com objetivos definidos e mecanismos institucionais. Nos próximos dias, poderemos descobrir se o Brics será, algum dia, mais que uma sigla simpática associada a uma reunião anual inútil. (Tradução de Sergio Blum)

Conversa é pouco - CELSO MING


O Estado de S.Paulo - 23/03/12


O governo Dilma corre o risco de copiar o governo da Argentina que, em vez de criar condições que garantam competitividade ao setor produtivo, se limita a fazer apelos para que os empresários parem de importar, invistam em fábricas e criem empregos.

Foi o que fez ontem a presidente Dilma Rousseff, no encontro em Brasília com 28 líderes do setor produtivo.

O governo Dilma não se empenha o suficiente para derrubar o custo Brasil, assiste passivamente ao esvaziamento da indústria e, depois, tenta compensar com improvisação e alguma conversa - e não com reformas profundas, que reverteriam o jogo desigual.

Um governo que apresenta condições estáveis (e não predatórias, como este) para os negócios e para a criação de empregos não precisaria inventar políticas industriais, reservas de mercado, obrigatoriedade de conteúdo local, isenções tributárias temporárias nem tampouco empréstimos a juros favorecidos do BNDES.

Ontem o jornal Valor Econômico publicou informação alarmante. Nada menos que 55% de toda a arrecadação de ICMS pelos Estados provém das cobranças sobre apenas três insumos: energia elétrica, telecomunicações e combustíveis. Ou seja, acontece no Brasil o contrário do que se verifica em outros países, onde a política procura desonerar matérias-primas e insumos com o objetivo de assegurar competitividade ao setor produtivo.

Até agora, o governo federal e os demais governos dos Estados e dos municípios se dedicaram a arrancar mais impostos do setor privado e a inviabilizar a produção ou permitir que Estados e municípios façam a mesma coisa. Depois, quando veem que a indústria não dá conta do consumo, tentam resolver tudo com conversa e certos favorecimentos.

A indústria brasileira importa cada vez mais matérias-primas, peças, componentes e conjuntos, porque são fabricados lá fora a custos substancialmente mais baixos - e, por isso, ficam mais baratos, mesmo com a carga alfandegária à qual são submetidos depois de desembarcados.

Mesmo sendo produzida com matérias-primas caras (petróleo, gás ou carvão) a energia elétrica é mais barata lá fora do que no Brasil, onde a fonte cai do céu. E os custos muito mais altos valem também para telecomunicações, combustíveis, infraestrutura, logística, capital de giro. E começam a valer também para o custo da mão de obra, cada vez mais cara por aqui.

A falta de prontas soluções para reverter o custo excessivo de produção que tira competitividade do setor produtivo brasileiro acentua deformações e cria "direitos adquiridos" - como se direitos fossem e adquiridos fossem. Os Estados e os municípios, por exemplo, entendem que qualquer mudança lhes tiraria arrecadação e, por isso, também trabalham para bloquear quaisquer tentativas de reforma. É o que também se vê no projeto da Resolução 72 do Senado, cujo objetivo e acabar com a guerra dos portos.

Intervenções no câmbio, destinadas a garantir maior desvalorização do real e juros alguma coisa mais baixos, e novas reuniões para acompanhar os "desafios à produção nacional", como ontem voltou a ser prometido para os empresários, são pouco para devolver competitividade ao setor produtivo nacional.

Na ponta da faca - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 23/03/12

Candidato favorito nas prévias do PSDB de São Paulo, neste domingo, o ex-governador José Serra recebeu um ultimato do DEM. Se os tucanos não apoiarem a candidatura do deputado ACM Neto à Prefeitura de Salvador, o que lhe garantiria dois minutos a mais de propaganda na TV, o Democratas apoiará o candidato do PMDB em São Paulo, o deputado Gabriel Chalita, dando a ele um minuto e quarenta segundos de publicidade na televisão.

Royalties: propostas da bancada do Rio

A bancada de parlamentares do Rio no Congresso reuniu- se, na noite de anteontem, para definir propostas ao relatório do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) no projeto de redistribuição dos royalties do petróleo. São três as propostas em debate: 1) Antecipar para os 27 estados R$ 12 bilhões relativos ao petróleo do campo de Libra (Otavio Leite e Leonardo Picciani); 2)
Securitizar os royalties de todosos estados viabilizando a emissão de títulos (Anthony Garotinho); e 3) Criar um fundo para compensar os estados não produtores, antecipando R$ 12 bi da receita de royalties de futuros campos (Alessandro Molon).

O governo não vai votar com a corda no pescoço” — Jilmar Tatto, líder do PT na Câmara (SP), sobre o adiamento da votação do Código Florestal.

BATENDO PÉ.
 A presidente Dilma está uma arara com o líder do PMDB, Henrique Alves (RN), na foto, e com o relator do Código Florestal, Paulo Piau (PMDB-MG), porque eles participaram do processo de negociações no Senado. A irritação da presidente é porque o governo flexibilizou exigências ambientais para fechar um acordo, e agora a bancada ruralista, com o apoio do PMDB, quer arrancar novas concessões para votar o código.

Xadrez
Se o deputado Sérgio Carneiro (PT-BA), que é suplente, ficar mesmo sem mandato, o PT vai escalar o ex-líder da bancada, Paulo Teixeira (SP), para assumir a relatoria do processo de elaboração de um novo Código de Processo Civil.

Reviravolta?
Diante da perspectiva de o TSE decidir que o PSD, do prefeito Gilberto Kassab, não terá tempo de televisão nem fundo partidário até as eleições de 2014, o DEM já aposta na volta de, pelo menos, oito deputados federais para o partido.

Aposta nos Brics
O ministro Gastão Vieira (Turismo) aproveitará a viagem à Índia, com a presidente Dilma, para se reunir com seu equivalente naquele país. O Brasil quer intensificar o fluxo de turistas dos Brics para cá. Em 2010, 18.829 indianos visitaram o Brasil. Com esse número, a Índia não está nem entre os 20 primeiros do ranking. A Argentina é a origem da maioria dos turistas que visita o Brasil, com 1,4 milhão em 2010, seguido dos EUA, com 641 mil, e a Itália, com 245 mil.

Afinaram
Atendendo a um apelo do presidente do DEM, José Agripino (RN), os senadores Pedro Taques (PMDB-MT) e Randolfe Rodrigues (PSOLAP) não acionaram o Conselho de Ética no caso do líder do DEM no Senado, Demóstenes Torres (GO).

Compadres

O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), no auge do caso Carlinhos Cachoeira, ligou para o ministro Aldo Rebelo (Esporte) e pediu sua intervenção para que os senadores do PCdoB não atacassem o líder do DEM, Demóstenes Torres (GO).

EMBOLADA. 
Sem acordo entre o prefeito de Recife, João da Costa, e o deputado João Paulo para as eleições municipais, o PT tem agora um terceiro candidato: Maurício Rands. A direção nacional não quer prévias.

A COMISSÃO
 de Desenvolvimento Regional do Senado aprovou, ontem, projeto que aumenta de 20% para 40% a cota de produtos produzidos nas ZPEs que podem ser vendidos no mercado interno.

A MINISTRA
 Ideli Salvatti (Relações Institucionais) tem agenda especial hoje em Florianópolis. Vai conhecer a neta, Helena, que nasceu ontem. 

Limites na coalizão - MERVAL PEREIRA


O Globo - 23/03/12


Embora pareça uma ação extemporânea, sem base em um projeto de longo prazo, as atitudes da presidente Dilma em relação à sua base partidária estão pelo menos suscitando uma discussão que há muito não se via por parte do governo: quais são os limites éticos das negociações partidárias?

O presidente da Câmarados Deputados , o petista gaúcho Marco Maia, disse ontem que a base aliada tem "legitimidade" para cobrar cargos e liberação de recursos, mas garantiu que isso não significa institucionalizar a prática do "toma lá dá cá".

A questão é que, no Brasil, uma interpretação distorcida do que seja o papel dos partidos políticos no apoio a um governo levou a que a corrupção e o fisiologismo se tornassem elementos fundamentais da chamada "governabilidade".

Essa distorção aparece no comentário do senador Fernando Collor (PTB-AL) de que seu impeachment deveu-se ao pouco caso que ele fazia das relações políticas entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, passando por cima de todos os problemas éticos que seu governo enfrentou.

Da mesma maneira, no governo Lula, montou-se um grande esquema de corrupção para comprar apoio parlamentar na certeza de que os "300 picaretas" que Lula identificou no plenário da Câmara, quando foi constituinte, seriam facilmente manipuláveis.

Nesse período, o presidente Lula ainda demonstrava alguns pruridos no relacionamento público com políticos que não tinham a imagem condizente com a percepção que a opinião pública ainda tinha do Partido dos Trabalhadores naquela ocasião.

Tanto que recusou se unir ao PMDB mesmo com seu braço-direito político, José Dirceu, já tendo costurado um acordo.

Luiz Inácio Lula da Silva alegava que não tinha confiança em políticos que depois viriam a ser seus grandes correligionários, como o ex-ministro Eunício Oliveira, para pegar apenas um exemplo de político rejeitado que se transformou em aliado útil.

No início de seu governo, quando ainda pretendia aprovar reformas como a da Previdência, o ex-presidente Lula teve que contar com o apoio da oposição para avançar nesse campo, que os sindicatos e o próprio PT rejeitavam.

Depois do susto do mensalão, cujo objetivo era conseguir apoios sem necessidade de expor essas relações promíscuas do PT defensor da ética na política com o baixo clero do Legislativo, Lula mudou de estratégia radicalmente.

Passou a se empenhar para formar a maior base aliada possível, exacerbando a troca de favores a tal ponto que conseguiu pela primeira vez na História unir todas as alas do PMDB no seu Ministério.

Montou então uma base aliada "defensiva", isto é, formada não para aprovar as reformas estruturais necessárias ao desenvolvimento do país, mas para defender o presidente de qualquer nova tentativa de impeachment político.

Essa sua atitude, na prática, evidencia que ele agia seguindo o mesmo pensamento que mais tarde o ex-presidente Collor exprimiria na tribuna do Senado e que tanto desagradou tanto a Dilma quanto ao próprio Lula.

Para eleger na sua sucessão a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, uma mágica tirada do bolso do colete, Lula passou a exigir do PT um espaço maior para os aliados e foi atrás de partidos que não faziam parte da base aliada, mas poderiam ser cooptados à base do fisiologismo.

Com isso, garantiu a maior aliança partidária já montada no país, mas tão heterogênea que apenas a eleição de Dilma os unia como objetivo, sendo impossível armar-se um programa de governo que comportasse tantos interesses distintos.

A negociação dos espaços para cada um dos dez partidos aliados passou a ser a única maneira de mantê-los sob a mesma bandeira política, e com isso o fisiologismo e a corrupção ganharam um espaço que jamais tiveram em governos anteriores, mesmo que os personagens sejam basicamente os mesmos.

Nunca tiveram tanto poder quanto até recentemente, mesmo o senador Renan Calheiros, que foi ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, um cargo de aparente pompa, mas esvaziado de poder político.

A tese de que todos esses tipos de corrupção com que nos defrontamos na nossa política, como o corporativismo, o clientelismo e o fisiologismo, fazem parte da estrutura de governabilidade de democracias pouco desenvolvidas como a brasileira preocupa pensadores como o ex-ministro Marcílio Marques Moreira, há muito envolvido na luta pela ética na política.

Para ele, a falta de compromissos éticos corrompe o sistema "assim como a ferrugem corrói o ferro, metáfora que Políbio já usava e que Maquiavel de certa maneira retoma na primeira década de Tito Lívio".

Marcílio ressalta que pesquisas recentemente divulgadas mostram que a presença de um líder, ou de um decálogo, que, inspirando confiança, legitime comportamentos tem enorme influência sobre eles.

Tanto no sentido de estimular atitudes corretas e éticas no trato da coisa pública quanto, como ocorre hoje no país, de estimular comportamentos pouco éticos quando os interesses pessoais estão acima do interesse público.

Nesse sentido, embora o sistema sob o qual sua presidência está montada seja baseado nessa promiscuidade de interesses, a presidente Dilma Rousseff está dando sinais de que pretende mudar o paradigma.

Por enquanto, no entanto, não há clareza sobre que novos caminhos pretende trilhar e com o apoio de que forças políticas. Nem há evidências da viabilidade de tal projeto, se é que ele existe mesmo.