segunda-feira, agosto 22, 2011

CIÚME DA FAXINEIRA

CIÚME DA FAXINEIRA


GUILHERME FIUZA - A faxina da Dilma parece piada de português


A faxina da Dilma parece piada de português
GUILHERME FIUZA
REVISTA ÉPOCA

A faxina de Dilma se parece com a história da queda do avião no cemitério português. Trata-se de humor negro e preconceituoso, mas ilustra bem a atual cena política brasileira. Segundo a anedota, as equipes de resgate lusitanas fizeram a operação mais longa da história dos acidentes aéreos: após uma semana de buscas por corpos na área do cemitério onde o avião caíra, as autoridades portuguesas concluíram que havia mais de 1.000 passageiros a bordo. E anunciavam que as escavações continuariam até que a última vítima fosse localizada.

A piada é pura implicância com nossos colonizadores, mas expressa com exatidão a suposta cruzada de Dilma contra a corrupção em seu próprio governo. Quem transformou o Estado em moeda de troca política foi o partido da presidente. Seria cômica, se não fosse trágica, a imagem de Dilma desenterrando aqui e ali as ossadas do fisiologismo que estão por toda parte – como se ela não tivesse nada com isso. É a vez dos portugueses de contar a anedota dos brasileiros que vibram com a faxina de quem fez a lambança.

Wagner Rossi, da Agricultura, é mais um ministro que cai coberto de elogios da presidente. Assim como Palocci e Alfredo Nascimento, Rossi mereceu todos os votos de confiança de Dilma até o último momento. É como se sua cabeça tivesse rolado por um acidente natural, um capricho do destino. O próprio ministro demitido, em nota oficial, declarou que nada foi provado contra ele, que as denúncias são mera intriga da oposição, que se orgulha do seu trabalho etc. Só mesmo um fenômeno da natureza pode explicar que um ministro tão orgulhoso e seguro de si resolva pedir o boné.

Pelo menos essa turma é transparente. Respondendo à imprensa – sempre ela, importunando a privacidade dos homens de bem –, Wagner Rossi declarou que viajou, de fato, no avião de uma empresa cliente do seu ministério. A empresa em questão conseguiu, depois que Rossi entrou no governo, um aumento de 3.000% no valor dos financiamentos públicos para seus projetos de agronegócios. O então ministro da Agricultura não viu nenhum problema em embarcar no jatinho dessa próspera empresa.

Os termos usados por Rossi em sua explicação denotam toda a inocência e a doçura de sua relação com a tal empresa: “Informo que, em raras ocasiões, utilizei como carona o avião citado na reportagem”. Que fique, portanto, esclarecido aos maliciosos de plantão: não houve nada demais, só um empresário dando carona a um ministro. Uma questão de solidariedade.

A imagem de Dilma desenterrando as ossadas do fisiologismo, como se não tivesse nada com isso, é trágica

Se todos os ministros demitidos do governo popular tivessem essa clareza e espontaneidade, talvez Dilma pudesse ter economizado detergente e água sanitária. Antonio Palocci, por exemplo, poderia ter dito que “utilizou como carona” seu status de coordenador da campanha presidencial e de ex-ministro da Fazenda para prestar consultoria privada. Ninguém duvidaria da sua inocência. Alfredo Nascimento poderia ter declarado que “utilizou como carona” o Ministério dos Transportes para que o pessoal do PR montasse a farra orçamentária do Dnit. E assim por diante, calando essa mídia golpista que vê maldade em tudo.

Vejam o caso do senador maranhense José Sarney, que utilizou como carona o Estado do Amapá para se perpetuar em Brasília. Apesar do escândalo no Ministério do Turismo (da cota pessoal de Sarney), envolvendo uma ONG de fachada que drenou milhões de reais para projetos fantasmas no Amapá, o senador permanece imune em sua cadeira na presidência do Congresso. O secretário executivo do ministério – aquele flagrado ensinando um empresário a montar convênio pirata com o governo – é afilhado político de Sarney. Por que a faxina não chega a ele?

Porque Sarney é dono de uma das capitanias hereditárias do fisiologismo, dessas que Lula e Dilma utilizaram como carona para se agarrar ao poder. Faxina contra a corrupção? Melhor contar piada de português.

ENTREVISTA - SILAS MALAFAIA



ENTREVISTA 
SILAS MALAFAIA
Revista Época 

"Governante vai ter de dizer em que acredita"

Eliseu Barreira Junior

O pastor evangélico afirma que os temas religiosos – como aborto ou homossexualidade – entraram e não sairão mais da política brasileira

No ano passado, quando a campanha política pela Presidência da República enveredou para uma discussão sobre fé e aborto, o pastor evangélico Silas Malafaia virou uma espécie de pivô da disputa eleitoral. Líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, no Rio de Janeiro, Malafaia apoiou a candidatura da também evangélica Marina Silva até a véspera do primeiro turno. Quando Marina estava em seu melhor momento, Malafaia abandonou-a e passou a pedir votos para o tucano José Serra, segundo ele mais firme que Marina na oposição ao aborto. Serra perdeu a eleição, mas Malafaia não perdeu os holofotes. Poucos meses após a posse da presidente Dilma Rousseff, ele passou a liderar uma cruzada contra o projeto de lei que pretende criminalizar a homofobia. Loquaz e provocador, usa seus programas de rádio e TV para combater a proposta quase que diariamente. Nesta entrevista, ele critica a Igreja Universal, diz que os políticos não poderão mais esconder suas crenças e tenta explicar sua posição sobre a homossexualidade.

ENTREVISTA - SILAS MALAFAIA

QUEM É
Carioca de 52 anos, é o pastor líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Formado em psicologia pela Universidade Gama Filho, é casado e tem três filhos

O QUE FAZ
Há 29 anos apresenta programas na TV, exibidos em rede nacional e no exterior

O QUE FEZ
Publicou mais de 100 livros e diz ser o pastor que mais vende DVDs de mensagem no Brasil, cerca de 1 milhão de cópias por ano

ÉPOCA – O senhor é pastor da Assembleia de Deus, mas, diferentemente de outros líderes evangélicos, é muito ouvido por fiéis de outras denominações. Qual é a diferença?
Silas Malafaia – Estou na TV há 29 anos ininterruptos e nunca fiz programas para a Assembleia de Deus. Então, o pessoal me codifica como um pregador. Faço um programa interdenominacional. Sempre trabalhei como uma voz apologética em defesa da fé. Por causa disso, acabei conquistando espaço entre outros segmentos. Hoje, existem quatro pastores em rede nacional: Edir Macedo, da Universal, R.R. Soares, da Internacional da Graça, Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus, e eu. Sou o único que sempre fiz programa para todo mundo. Não porque sou bom. É porque não tem espaço, amigo.

ÉPOCA – As igrejas evangélicas ainda têm uma imagem muito estigmatizada entre os não evangélicos. Por que, em sua opinião?
Malafaia – Isso mudou muito, irmão. Hoje, essa história de imagem estigmatizada é cafezinho. Antigamente, nego só botava coisa ruim sobre os evangélicos na televisão, nos jornais. Era só cacete em cima de pastor. Agora tem jogador de futebol evangélico, artista...

"Antigamente, nego só botava coisa ruim sobre os evangélicos na
televisão, nos jornais. Agora tem jogador de futebol evangélico, artista..."

ÉPOCA – O senhor acha que alguns líderes evangélicos ajudaram a criar essa imagem estigmatizada?
Malafaia – É aquela história de perdas e ganhos que todo segmento social sofre. Algumas atitudes fizeram a gente perder, outras fizeram ganhar. Tome o exemplo da Universal e do Edir Macedo. Ele ajudou em algumas coisas e prejudicou em outras. Ele é um cara que fez a igreja evangélica despertar para um evangelismo ousado, igreja aberta o tempo todo. Antes, as igrejas evangélicas abriam duas vezes por semana à noite. O Macedo é que arrebentou com isso, entende? O lado ruim da coisa é o sincretismo.

ÉPOCA – Qual é sua relação com o bispo Edir Macedo?
Malafaia – A Bíblia tem um texto que diz assim: "Poderão andar dois juntos se não estiverem de acordo?". Eu já ajudei o Macedo quando ele foi preso, mas eles são separatistas, só veem o lado deles. Então, não me presto a andar com uma pessoa que só quer andar com mão única para ela. Sou a favor de mão dupla: para lá e para cá, entende? O Macedo está isolado, todo mundo sabe. Eles só são evangélicos para os outros quando estão com dor de barriga, quando o pau está quebrando em cima deles ou então por interesse político. A comunidade evangélica está madura e não se presta mais a isso.

ÉPOCA – Nos bastidores, circulou a notícia de que o senhor estaria apoiando o PSD, o partido que o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, quer construir. Procede?
Malafaia – Amigo, não apoio partido nenhum. Apoio pessoas. Meu irmão (o deputado estadual Samuel Malafaia, do PR-RJ) está querendo ir para lá (o PSD), mas isso é problema dele.

ÉPOCA – Qual é sua opinião sobre Kassab?
Malafaia – Nada a falar contra ele.

ÉPOCA – Mas, no passado, o senhor já se desentendeu com ele...
Malafaia – Eu o critiquei quando ele fechou uma igreja evangélica do apóstolo Valdemiro Santiago. Ser amigo ou respeitar alguém não significa ser capacho ou concordar com tudo o que essa pessoa faça.

ÉPOCA – Na eleição presidencial do ano passado, o senhor apoiou Marina Silva no início. Ainda no primeiro turno, passou a pedir voto para o José Serra. Por que mudou de lado?
Malafaia – Pior do que um ímpio é um cristão que dissimula. A Marina, membro da Assembleia de Deus, sabe que, como uma pessoa de fé, não pode negociar sobre questões de aborto nem de homossexualismo. Ela era contra o aborto, mas por que dizia que faria um plebiscito? Ela quis dar de bacana, jogar para a galera, e eu falei não. Qualquer um podia fazer aquilo, menos ela, por suas convicções de fé.

ÉPOCA – Por que o José Serra?
Malafaia – Acredito que tinha de me posicionar. Naquele momento, o Serra era o mais adequado para isso. Ele mantinha uma posição firme sobre aborto, que foi o grande debate da campanha desde lá atrás. A Dilma dissimulou a história. Ela se posicionou a favor do aborto para a revista Marie Claire, depois mudou o discurso. O único que se coadunava com meus valores e crenças era o Serra.

ÉPOCA – Em sua opinião, o debate de questões religiosas deverá se repetir nas próximas disputas eleitorais?
Malafaia – É lógico. Amigo, hoje em dia governante vai ter de dizer em que princípios acredita. Vai ter de botar a cara, porque a comunidade evangélica está bem esperta, madura. Não vai dar para ficar em cima do muro. Não queremos que nenhum político tenha a ideia de que lutamos por uma República evangélica e que, por isso, ele tem de abraçar nossos princípios e mandar todo o mundo às favas. Não estou dizendo também que o cara, para ter apoio dos evangélicos, tem de odiar os homossexuais. Não é radicalismo imbecil e idiota. Se um governante apoiar leis que privilegiam homossexuais em detrimento da sociedade, vamos cair em cima. Hoje, sou a maior barreira que existe para aprovarem a lei que criminaliza a homofobia. E, se abrir a boca para dizer que apoia o aborto, vai ficar feio também.

ÉPOCA – O que é, em sua opinião, a homossexualidade?
Malafaia – O homossexualismo é comportamental. Uma pessoa é homem ou mulher por determinação genética, e homossexual por preferência apreendida ou imposta. É um comportamento. Ninguém nasce homossexual. Não existe ordem cromossômica homossexual, não existem genes homossexuais. O cromossomo de um homem hétero e de um homem homossexual é a mesma coisa. O resto é falácia, é blá-blá-blá. Só existe macho e fêmea, meu amigo.

ÉPOCA – Por que o comportamento homossexual se desenvolve?
Malafaia – A Bíblia diz que, aos homens que não se importaram em ter conhecimento de Deus, Ele os entregou um sentimento perverso para fazerem coisas que não convêm. Do ponto de vista comportamental, é promiscuidade mesmo, meu amigo. O ser humano quer quebrar todos os limites. Quanto mais ele quebra limites, mais insaciável se torna. Ninguém nasce homossexual. É a promiscuidade do ser humano.

ÉPOCA – É possível alguém deixar de ser homossexual?
Malafaia – Nossa igreja está cheia de gente que era homossexual. O cara não nasceu (homossexual). Se não nasceu, amigo... Ninguém nasce homossexual. É uma opção, por uma série de elementos: ou porque foi violentado, ou porque escolheu por modelo de imitação. O ser humano vive por modelo de imitação.

ÉPOCA – E como se dá essa reversão?
Malafaia – Meu filho, essa reversão é o cara voltar a ser macho e a mulher voltar a ser fêmea. Dar forças para o cara vencer isso. Acredito no poder do Evangelho para transformar qualquer pessoa, inclusive homossexuais.

ÉPOCA – Qual é sua opinião sobre os casos de violência contra homossexuais?
Malafaia – Vou te dar alguns numerozinhos para a gente poder desfazer essa conversinha fiada para boi dormir. Os números é que vão dizer: no ano passado, 50 mil pessoas foram assassinadas no Brasil, e 260 eram homossexuais. Que índice é esse para dizer que o Brasil é um país homofóbico? Outro número: mais de 300 mulheres foram assassinadas por violência doméstica em 2010, mas ninguém fala nada. Mais de 100 crianças são assassinadas ou violentamente espancadas por dia, e ninguém fala nada. Sabe por quê? É porque por trás das editorias dos jornais, da televisão existe uma bicharada desgramada que dá toda essa ênfase para eles. Não quero que ninguém morra, amigo, mas o índice (de mortes de homossexuais) é insignificante para a violência que acontece no Brasil. Então, esse é um apelo de propaganda para eles (gays) poderem ter benefícios em detrimento do conjunto da coletividade social. Essa daí é velha, e eu não sou otário. Sei pesquisar os números, e a imprensa não dá os números. Tem mais heterossexual que homossexual sendo assassinado. Você sabe o que é homofobia para os homossexuais? Olhar com cara feia para um gay é homofobia. Não concordar com a prática deles é homofobia. Uma coisa é criticar a conduta, outra é discriminar pessoas. Tudo para eles é homofobia. Essa é a malandragem deles, e eu não caio nessa.

"No ano passado, 50 mil pessoas foram assassinadas no
Brasil – e 260 eram homossexuais. É um índice insignificante
para dizer que o Brasil é um país homofóbico"

ÉPOCA – Os ativistas homossexuais são heterofóbicos?
Malafaia – Acho que eles são uns malandros que ganham verba dos governos federal, estadual e municipal para fazer esse papel. São uns malandros oportunistas faturando em cima da grana que as ONGs deles recebem. Essa é a verdade nua e crua. Não é pouca grana, não. E ninguém fala disso. Os ativistas homossexuais são pagos para esse serviço podre que fazem de chamar todo mundo de homofóbico.

ÉPOCA – O que fazer com o comportamento homossexual?
Malafaia – O comportamento homossexual é um direito que a pessoa tem. O direito de ser é guardado pela Constituição, pelo livre-arbítrio. Não quero que ninguém seja eliminado. Critica-se presidente da República, critica-se pastor, padre, deputado, mas não pode criticar uma prática? Em hipótese alguma. Querer eliminar homossexual é homofobia. Não quero isso. Quero discutir com um homossexual e poder dizer que sou contra a prática dele, assim como os gays podem me dizer que são contra a prática dos evangélicos. Isso é democracia.

ÉPOCA – O que o senhor acha das críticas feitas ao deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) (político contrário às leis que criminalizam a homofobia)?
Malafaia – Você vai ver o Jair Bolsonaro nas póximas eleições. Ele vai ter três ou quatro vezes mais votos que recebeu na eleição passada. A sociedade brasileira é conservadora, 90% da população é cristã. Desses 90%, os evangélicos e católicos praticantes são 70%. Nós somos maioria absoluta neste país, amigo. Pergunto: qual é o deputado gay que teve uma votação expressiva? Esse Jean Wyllys (deputado federal do PSOL-RJ) entrou na sobra de legenda, com 13 mil votos, pendurado num cara (o deputado Chico Alencar, do PSOL, segundo mais votado do Estado). É o mais famoso dos gays e não tem voto, não tem porcaria nenhuma.

ÉPOCA – Como o senhor reagiria se um de seus filhos ou netos dissesse que é gay?
Malafaia – Vou melhorar tua pergunta, aprofundá-la. Se algum filho meu fosse assassino, se algum neto meu fosse traficante, se algum filho meu fosse um serial killer e tivesse esquartejado 50, continuaria o amando da mesma forma, mas reprovando sua conduta. Meu amor por uma pessoa não significa que apoio o que ela faz. Daria o Evangelho para ele, diria que Jesus transforma, que ele não nasceu assim, que é uma opção dele.

O fantoche do Turismo - REVISTA ÉPOCA


O fantoche do Turismo
REVISTA ÉPOCA

Em oito meses como ministro, Pedro Novais cumpriu ordens da liderança do PMDB e delegou poderes ao enrolado Frederico Costa, preso pela PF

Murilo Ramos

Aos 81 anos e dono de um patrimônio declarado de R$ 6,3 milhões, o ministro do Turismo, Pedro Novais, poderia estar distante dos delitos da política nacional, usufruindo uma aposentadoria pacata, daquelas exibidas em comerciais de televisão. Apesar da situação confortável num momento da vida em que quase todo mundo quer descanso, ele assumiu o cargo no primeiro escalão da equipe empossada no início do ano pela presidente Dilma Rousseff. Ganhou o posto por indicação da cúpula do PMDB, partido pelo qual se elegeu no ano passado para o sétimo mandato de deputado federal. Do ponto de vista técnico, a nomeação para o Turismo nunca fez muito sentido. Sem experiência na área, Novais parecia ter pouco a contribuir num setor que exige dinamismo e sintonia com as crescentes demandas dos turistas nacionais e estrangeiros.

Antes mesmo de tomar posse descobriu-se que o octogenário deputado usara R$ 2 mil da verba indenizatória da Câmara para pagar o pernoite em um motel de São Luís. O caso ainda rende comentários jocosos sobre a vida sexual do ministro. Em oito meses de governo, Novais confirmou as previsões e nada apresentou de significativo para o desenvolvimento do turismo no Brasil. Os últimos acontecimentos, porém, demonstraram que o ministro cumpre na Esplanada o importante papel de fantoche de uma turma complicada que ocupa o Ministério do Turismo desde o governo passado e atua sob a proteção do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).

Oito subordinados de Pedro Novais foram presos durante a Operação Voucher, executada há duas semanas pela Polícia Federal (PF) para desbaratar uma rede de 36 pessoas acusadas de desviar cerca de R$ 4 milhões de dinheiro do Turismo. Entre os presos estava Frederico Silva da Costa, secretário executivo do ministério. Em qualquer ministério, o secretário executivo é o segundo cargo mais importante. Os fatos revelados a partir da operação policial mostraram que, no Turismo, Frederico Costa atuava, porém, como o verdadeiro ministro. Pedro Novais funciona apenas como a fachada política do grupo acusado de irregularidades.

A prisão de mais de três dezenas de pessoas obrigou o pequenino Novais, que tem cerca de 1 metro e meio de altura, a comparecer à Câmara na quarta-feira para dar explicações. Cercado de seguranças e tendo o deputado Henrique Eduardo Alves como líder na defesa, Novais reforçou a imagem de que é apenas uma marionete na Esplanada. No depoimento de quase quatro horas, ele se comportou como um aguerrido defensor dos suspeitos. “Frederico é um dos funcionários mais conceituados do ministério”, afirmou Novais para justificar a nomeação do executivo. “Ninguém entende mais que ele do relacionamento com o Ministério do Planejamento, que é quem disponibiliza os recursos.” Com essas declarações, Novais tentou passar a impressão de que partira dele a ideia de promover Frederico da Secretaria Nacional do Desenvolvimento do Turismo, que ele ocupava até dezembro, para o segundo cargo mais importante da pasta. Na verdade, Frederico foi escolhido pela cúpula do PMDB antes mesmo da indicação de Novais. Ele apenas foi empossado com a missão de chancelar a nomeação do secretário executivo.

Logo na primeira semana de janeiro, Novais teve um motivo concreto para concluir que o auxiliar Frederico não deveria ocupar o cargo. Na ocasião, ÉPOCA revelou que Frederico estava com os bens bloqueados por supostos desvios de recursos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Novais jogou a responsabilidade da nomeação para o Palácio do Planalto. “Vi a reportagem de ÉPOCA, mas não cabia me posicionar sobre isso. Na varredura da Casa Civil, ele passou. Não o nomeei. Quem o nomeou foi a presidente Dilma, por indicação minha”, disse.

Frederico pediu demissão na semana passada, depois de deixar a cadeia. Por meio de advogados, ele nega as acusações de envolvimento em irregularidades no Ministério do Turismo. A força que ele acumulou nos últimos meses ficou evidente no depoimento de Novais na Câmara. O ministro disse que, em abril, assinou uma portaria que delegou poderes maiúsculos a Frederico Costa. O secretário executivo ficou autorizado a lidar com a gestão orçamentária, financeira, administrativa e patrimonial do Turismo. Nos últimos meses, os principais acordos firmados pelo ministério com os governadores foram costurados por Frederico. Além disso, Frederico tinha poderes para nomear, exonerar e promover servidores. Com essa medida, Novais se apequenou um pouco mais e fez ressaltar seu papel de ministro títere.

“Frederico Costa é um dos funcionários mais conceituados do ministério”
PEDRO NOVAIS, em defesa do ex-subordinado preso

Na semana passada, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou o bloqueio de bens de 28 suspeitos de ter surrupiado dinheiro público num desdobramento da Operação Voucher. A medida reforçou a impressão de que Novais fazia vista grossa para o que acontecia a seu redor. Provocado por parlamentares, Novais afirmou que não faz “papel de bobo” nem foi traído pelos subordinados.

Para que se entenda seu papel desempenhado dentro e fora do governo, Novais ainda precisa detalhar por que favoreceu com parte de suas emendas parlamentares o município de Barra do Corda, no Maranhão, que tem como prefeito Manoel Mariano de Sousa, o Nenzim. Aliado de Novais, o prefeito escapou da prisão durante uma operação da PF no começo do ano. Ele é suspeito de ser chefe de uma quadrilha que desviou cerca de R$ 50 milhões de verbas federais entre 2005 e 2010. Novais disse à reportagem que tem relações políticas com o prefeito e justificou o investimento como oportunidade de “melhorar a qualidade de vida das pessoas”.

Eficiente no envio de dinheiro para amigos sob suspeita, o ministro do Turismo tem pouca relevância no poder central. A maior prova disso é o tratamento dispensado a ele pela chefe, a presidente Dilma. Nos oito meses de governo, Dilma o recebeu apenas uma vez no Palácio do Planalto, no final do mês passado.

CARTA AO LEITOR - REVISTA VEJA - O loteamento é a raiz da corrupção


O loteamento é a raiz da corrupção
CARTA AO LEITOR
REVISTA VEJA

Na semana passada, caiu mais um ministro que integrava o governo de Dilma Rousseff - Wagner Rossi, da Agricultura, abatido em meio a uma colheita de malfeitorias revelada pela sucursal de VEJA em Brasília. Antes dele, foi a vez de o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, ser abalroado por denúncias desta revista. Há o caso, ainda, do ministro do Turismo, Pedro Novais, que pode ganhar um bilhete para a porta da rua, por causa de esquemas de corrupção em sua pasta. Neste número, VEJA também mostra como as coisas andam malparadas no Ministério das Cidades. Honestidade é um atributo individual que pode ou não ser cuidado, de acordo com a biografia de cada um, mas a bandalheira nas diferentes esferas governamentais no Brasil tem sua causa principal no sistema de loteamento político que guia as escolhas para cargos-chave da administração publica. Só no governo federal, são 21635 funcionários que, em maior ou menor grau, foram escolhidos por critérios exclusivamente partidários. Destes, 1226 pertencem ao primeiro escalão. Só que, no final das contas, ficam encarregados de gerir o Orçamento da União, que em 2010 ultrapassou 1 trilhão de reais.

A verdade é que ministros e funcionários escolhidos apenas por critérios políticos estão mais interessados em tirar uma lasca dos fundos públicos para beneficiar seu partido - ou desviar dinheiro para os próprios bolsos - do que em empregar os recursos para atender a demandas da população - que sustenta o governo por meio de impostos diretos ou indiretos. Não se trata, contudo, só de falta de honestidade. Falta também competência. Dos mais de 20000 comissionados, pouquíssimos exibem perfil técnico exigido para as funções que desempenham. 0 resultado desse quadro é a má gestão que continua a emperrar a máquina estatal brasileira. A solução para esse problema é simples, fossem os políticos brasileiros menos fisiológicos e mais racionais. 0 primeiro passo é diminuir dramaticamente o número de funcionários públicos indicados por políticos. Nos Estados Unidos, eles são 2000. No Reino Unido, somente uma centena, aí incluídos os ministros. 0 segundo passo é recrutar, dentro dessa estrutura enxuta, gente com currículo impecável - tanto no que diz respeito à ética quanto à habilitação profissional. 0 terceiro passo estabelecer critérios de meritocracia que para aqueles que cumprem as metas exigidas, entre os comissionados como entre os concordados. Isso já é feito em estados como Minas Gerais e Pernambuco. É exterminando dessa forma a praga do loteamento que se reduz ao mínimo possível o flagelo da corrupção.

PAULO BROSSARD - O que houve?


O que houve? 
PAULO BROSSARD
ZERO HORA - 22/08/11

Tenho a impressão de que ninguém se queixaria da semana passada por falta de surpresas. Aliás, quando caiu o quarto ministro, da Agricultura, jornais e televisões divulgaram a ocorrência com relevo incomum. Em verdade, salvo quando se trate de governo que se instale ou de ampla reforma ministerial, não se vira coisa parecida; em verdade, tem sido ou vem sendo uma sucessão de mudanças ou de substituições, tanto mais estranhável quando o ministério ainda não contava oito meses de funcionamento.

Lembro que o presidente Vargas, ao assumir a presidência em 1950, declarou que o ministério anunciado era "de experiência"; não causou boa impressão; afinal, sobrava-lhe experiência a respeito, conhecimento de homens experientes; em verdade, o "ministério de homens experientes" não durou muito; e o que me parece particularmente foi que ao renová-lo recorreu a alguns brasileiros ilustres que haviam sido seus ministros dos primeiros e longos anos de governo. Osvaldo Aranha, José Américo, Vicente Rao, Apolônio Salles, o que não impediu que chegasse a crise de 54. Agora, em tudo, a situação era diferente.

Não faltam motivos de surpresa. De resto, com exceção do ministro da Defesa, todos os outros saíram baleados, baleados no pé, baleados na asa, mas baleados, o que não deixa de ser estranho se tratando de ministros de Estado, presumidamente expressões superiores da sociedade sob todos os aspectos; e, ainda mais, tudo foi se desdobrando ou na casa do governo ou à sua sombra. De qualquer sorte, os ferimentos foram notórios. E, como não houve boletins médicos, não sei se houve lesões graves. Graves ou não, pouco importa, ninguém questionou sua objetiva ocorrência, nem dúvidas a respeito. O fato é que ministros empossados em janeiro e desempossados a partir de junho, alguns deles vindos do governo anterior, findo em 31 de dezembro de 2010, estranhamente, deixaram de ser sem terem sido. Enfim, cada tempo tem um estilo.

No entanto, não houve nenhuma crise como as de 1954 e 1964 e já caíram quatro ministros, e é possível que mais um ou de um venha a cair. Ora, isto é grave em si mesmo. A propósito, faço uma observação breve. Em tempos idos, quando nomeado um ministro de Estado, não era necessário publicar seu curriculum vitae; de modo geral, o país sabia quem ele era, donde vinha e o que fizera. Em tempos mais recentes, não é raro que ao nome do nomeado tenha de ser aditado o respectivo currículo. Não me perguntem por quê.

Tradicionalmente era exigido, como ainda se exige, que o brasileiro esteja no exercício dos seus direitos políticos e contar mais de 21 anos para vir a ser deputado. Assim, Rodolfo Dantas, ministro aos 26 anos, continua a ser o mais jovem parlamentar brasileiro. Ocorre que, em todas as Constituições há cláusulas não escritas, formuladas pelo uso e intocáveis. Assim, não se pede aos ministros sejam sábios ou santos, mas que, na velha expressão, sejam "homens bons". Agora o mais delicado. O que vem ocorrendo a respeito são referências extremamente desairosas; imputação de corrupção, tráfico de influência, desvio e aproveitamento de verba pública, expedientes ilícitos, ou seja, a prática de atos manifestadamente incompatíveis com o denominado decoro parlamentar. E mais não precisa dizer.

Obviamente não possuo elementos para sentenciar a respeito do mérito das duras imputações ocorrentes cá e lá. Mas o que posso dizer é que, se procedentes, a sanção mais grave seria leve, em face da sua gravidade. Da mesma forma quando sem fundamento, seus autores deveriam igualmente ser despojados de função pública. Enquanto isso, a nação fica à mercê da lama. O que aconteceu no Brasil?

DENISE ROTHENBURG - A fonte secou


A fonte secou
DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 22/08/11

Para quem acha que o cenário político está ruim, é melhor ir se preparando para um pior. O Orçamento de 2012 mostrará que não há recursos para incrementar o ano eleitoral.

Há poucos dias, a presidente Dilma Rousseff deixou escapar a um interlocutor: "Lula deixou obras demais. Não temos como tocar tudo ao mesmo tempo e liberar tudo o que pedem". Tentava assim justificar a impossibilidade de atender os R$ 7,5 bilhões em emendas ao Orçamento de 2011 pedidas por deputados e senadores. A frase circulou entre os petistas como se Dilma tivesse feito uma reclamação e não uma constatação de que o antecessor gastou por conta do futuro. E isso serviu de base para que, ao longo dos últimos dias, alguns saíssem levantando o "volta Lula".

Muito se escreveu e se comentou sobre esse possível retorno do ex-presidente à ribalta como candidato em 2014. Foram consumidas horas de debate para se tentar entender como essa faxina anticorrupção pode terminar respingando na imagem de Lula. Afinal, muitos dos ministros com validade de um iogurte saíram de seu governo, assim como as liberações de recursos agora investigadas. No meio político, entretanto, pouco se disse sobre as contas públicas e o rico dinheirinho do contribuinte que, não raras vezes, vai parar em obras turísticas onde não há turismo, como mostraram reportagens do fim de semana.

Dilma é técnica. Acompanha diariamente as receitas e despesas do governo. Leu cada linha da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2012 que sancionou na semana passada. Sabe que não tem margem para gastar a rodo como desejam os políticos. Está ciente ainda que, diante da balbúrdia no cenário internacional, terá que manter o superavit primário — ou seja, aquilo que o governo economiza — na faixa dos R$ 139,8 bilhões previstos, 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2010, esse superavit ficou abaixo da meta. Foi de R$ 101,7 bilhões (2,77% do PIB).

Daí, conclui-se que Lula gastou mais do devia. Os lulistas dirão que os gastos e lançamentos de obras por parte do ex-presidente foram feitos porque eram necessários, senão ao povo, para alavancar a eleição de Dilma — naquela época uma desconhecida que precisava mostrar serviço para cair no gosto do eleitor. A turma de Dilma, entretanto, diz que a candidatura dela foi escolha de Lula e, se a conta de elegê-la ficou cara, não resta à atual presidente outra saída, senão varrer o descontrole — e os descontrolados — para que os recursos sejam bem aplicados. E aí, deu-se o choque com a base aliada.

Noves fora...

Para quem acha que o cenário político está ruim, é melhor ir se preparando para um estica e puxa maior ainda. Quem estudou a LDO de 2012, como fez Dilma, sabe que não há recursos para aumentos salariais no que vem. Da margem de R$ 17,6 bilhões que o governo teria para ampliar as chamadas despesas obrigatórias, R$ 15,6 bilhões já saíram dessa conta com os incentivos setoriais previstos no programa Brasil Maior e no Supersimples. Sobraram R$ 2 bilhões. Tampouco haverá recursos em caixa para fazer todas as obras em andamento, muito menos para começar novas que ainda não estejam projetadas. O Orçamento de 2012, que sairá do forno da ministra Miriam Belchior em 10 dias, indica que não há margens para inventar mais despesas.

Você aí deve estar pensando: como não terá dinheiro se a arrecadação só aumenta? É sempre bom lembrar que há juros da dívida, pagamento de pessoal, ativo e inativo, e ainda toda a legião de obras dos PACs 1 e 2, da Copa do Mundo, do Minha Casa,Minha Vida, e o Bolsa Família. Só os gastos sociais vão crescer R$ 10,5 bilhões em 2012. Em suma, o mesmo governo que arrecada, já tem claro onde será aplicado esse dinheiro extra.

...ou entende ou dança

Foi ciente de tudo isso que a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, pediu aos líderes que cada parlamentar listasse suas prioridades entre as emendas apresentadas ao Orçamento deste ano. E faltando quatro meses para acabar o ano, muitos acreditam que o dinheiro dessas emendas só chegará às bases no ano que vem, e se chegar. Ou seja, o mau humor no plenário vai continuar e as votações vão prosseguir a conta-gotas. Os aliados do governo, acostumados à gastança do passado e aos convites para jantares no Palácio da Alvorada, se sentirão "desprestigiados" em pleno ano eleitoral. E Dilma que durma comum barulho desses!

A presidente não parece tão preocupada assim. Afinal, ela se dedica mais a fazer o que pode com os recursos disponíveis do que ficar atendendo os choramingos dos políticos. Mas não pode viver sem eles. O difícil daqui para frente será fazer com que eles entendam que a fonte secou. Os tucanos, que vinham alertando há tempos sobre esse cenário, já entenderam Dilma e lhe estenderam a mão em suaves gestos de carinho. Querem assistir de dentro do campo, a briga entre ela e os aliados do governo. E, assim, lá na frente, se der para pegar essa bola, dar um chega para lá no PT e conquistar o Planalto, eles não vão titubear em fazê-lo.

ALDO PEREIRA - Casamento e casamentos


Casamento e casamentos
ALDO PEREIRA
Folha de S. Paulo - 22/08/2011

Por que não legalizar uniões homossexuais? Afinal, se as caducas prescrições do Levítico valessem, ainda hoje seria legal praticar o comércio de escravos
Bello Maasaba, curandeiro nigeriano de 87 anos, já casou em rito muçulmano com 107 mulheres.
Descontadas nove que já morreram e 12 que repudiou em divórcio, ele coabita com 86, de idades que vão de 19 a 64 anos.
Dos 185 filhos, sobrevivem 133; o caçula nasceu em abril último.
Embora excepcional, a família Maasaba é exemplo válido de uma instituição universal, o casamento fértil, processo natural de regeneração biológica e estabilidade social humana; sem tal casamento, não teríamos evoluído até aqui.
Igualmente próprio de toda sociedade humana é o status superior da mãe casada em relação às mulheres que, tenham filhos ou não, sejam descasadas, solteiras ou mesmo viúvas. À parte méritos ou deméritos, justiça ou injustiça, fato é que, considerada apenas em si, a maternidade dignifica a mulher.
Alfred Korzybski (1879-1950) recomendava que certos termos fossem distinguidos por "índices"; isto é, qualificativos numéricos ou de data, para evidenciar nuances de significado. Por exemplo, casamento1950 e casamento2011.
O uso dos "índices" não vingou, faltou-lhes necessária validade prática. Mas, sem extrapolar o julgamento da "semântica geral" inventada por Korzybski, há evidente procedência na distinção.
Isoladamente, o termo casamento evoca modelo algo idílico: jovem casal que pactua colaborar na formação de uma família, sabedor dos sacrifícios concomitantes e animado por pouco mais que o prestígio inerente a tal responsabilidade.
Korzybski talvez categorizasse tal instituição como casamento1.
Genericamente, casamentox é um contrato que, em sociedades monógamas, confere a duas pessoas status legal distinto, decorrente de certos direitos e deveres mútuos livremente assumidos por elas. Cabe ao Estado, em seu papel de garantidor de contratos, formalizar a validade diversificada dessa realidade civil.
Isto é, reconhecer não apenas casamento1, mas também casamento2, casamento3 e casamentoetc. (Korzybski recomendava o etc. para tais indeterminações.)
Afinal, nestes novos tempos, de novos costumes e de recursos contraceptivos, muito mais gente casa sem ser jovem nem ter propósitos de procriação.
Por que não admitir, afora casamentoxy, também categorias de casamentoxx ou casamentoyy para legalizar uniões hoje interditas à perseguida minoria homossexual? A relutância legislativa em codificar "de jure" tal situação "de facto" configura mais uma das contumazes prevaricações do Congresso.
Intimidado, no caso, por vociferações da direita bíblica. (Embora a reprovação do lesbianismo pareça ambígua em Romanos 1-26, a sanção de Levítico 20:13 é explícita: morte aos homens homossexuais.)
Mas se caducas prescrições do Levítico valessem hoje, seria legal comerciar escravos (e escravas, tabeladas a preços de 40% a 50% inferiores). Seria ilegal consumir frutos do mar, camarão e presunto. E seria proibido -atenção, moçada- adornar o corpo com tatuagem.

GEORGE VIDOR - Alucinações


Alucinações
GEORGE VIDOR
O GLOBO - 22/08/11

Motivos não faltam para preocupações reais com os rumos das economias no chamado mundo desenvolvido, mas os mercados, que vivem de expectativas, estão sofrendo alucinações e passaram a ver chifres em cabeça de cavalo o tempo todo. Sequer se sensibilizam com os lucros fantásticos registrados pelas empresas que puxam as bolsas de valores americanas e a Bovespa.

Na lista das companhias com maiores lucros nos Estados Unidos encontram-se quatro bancos (JP Morgan, Citi, Wells Fargo e Bank of America), uma seguradora (Berkshire Hathaway, do grupo do bilionário Warren Buffett), cinco companhias de tecnologia da informação (Apple, Microsoft, IBM, Oracle e Google), três petrolíferas (ExxonMobil, Chevron e Conoco), uma fabricante de equipamentos (General Electric) e uma empresa de varejo (Walmart). Sinal de que nem tudo vai tão mal assim. No Brasil, Petrobras e Vale tiveram os maiores lucros de sua história no primeiro semestre.

Ou seja, os acionistas ganharam dinheiro como nunca nos negócios das próprias empresas, e nas bolsas perderam uma barbaridade por causa das alucinações com o fantasma da recessão que anda assombrando o mundo.

É inútil tentar encontrar alguma lógica ou racionalidade quando os mercados mergulham nessa fase. É comum alternarem euforia e profundo pessimismo. Nos indivíduos, diz-se que é um comportamento maníaco-depressivo.

A Alemanha cresceu a um ritmo de quase 5% no primeiro trimestre. A França cresceu em ritmo considerável no período (cerca de 3,5%). Os especialistas sabiam que esse ritmo não seria mantido diante das dificuldades enfrentadas pela União Europeia e pelos Estados Unidos. Mas quando os números do segundo trimestre foram revelados, confirmando a queda no ritmo de crescimento, os mercados reagiram muito mal, como se fosse uma surpresa. Como foi dito, os mercados são ciclotímicos. Têm fases que andam à cata de boas notícias. Agora, só reagem às más.

A associação das empresas concessionárias de terminais de contêineres (Abratec) espera, para este ano, um crescimento de 10% a 11% no movimento do setor. Os portos brasileiros movimentam anualmente cerca de oito milhões de contêineres. Até minério de ferro (de alta qualidade, relativamente em pequenas quantidades, para fins especiais da indústria) e açúcar já têm sido transportados nesses cofres de carga.

Sérgio Salomão, que preside a Abratec, diz que, mesmo com toda a ameaça de crise lá fora, as empresas que administram os terminais não podem postergar investimentos, pois precisam estar preparadas, com razoável antecipação, para qualquer aumento de demanda não previsto. O maior desafio é a busca pela produtividade: a média brasileira de carga e descarga de contêineres está em 50 unidades por hora. Mas já se chega a atingir números bem maiores, como é o caso do Santos Brasil, que recentemente bateu na casa de 110 contêineres movimentados por hora. No passado, quem chegasse a 40 contêineres por hora era merecedor de palmas...

Na avaliação de quem entende do ramo, o álcool hidratado tem pouca possibilidade de voltar a ser competitivo na maior parte do país enquanto a gasolina permanecer nos patamares atuais (R$1,70 por litro, na refinaria, sem adição de etanol). As usinas produtoras de etanol não esperavam que os preços da gasolina ficassem inalterados por tanto tempo.

No caso do álcool anidro, que é misturado à gasolina, na proporção de 25%, o preço do derivado do petróleo não causa o mesmo impacto sofrido pelo álcool hidratado, pois não é um combustível concorrente.

Enquanto as vendas de álcool anidro crescem no mesmo ritmo do consumo de gasolina, as de álcool hidratado tendem a minguar, até que esse combustível volte a ser competitivo no Brasil.

O restaurante pousada Locanda della Mimosa, no Vale Florido, em Petrópolis, um dos poucos do país a figurar em renomados guias gastronômicos internacionais, esteve para fechar. Depois que o casal proprietário se separou, ficou difícil tocar o negócio, pois havia necessidade de renovação até mesmo de conceitos do restaurante e tudo ficou meio parado. Mas apareceu um comprador, no caso o escritor Aguinaldo Silva (autor da novela "Fina Estampa", da TV Globo, que estreia hoje). Ele adquiriu 100% da propriedade e 70% do negócio, mantendo somente Lilian Seldin como sócia - Danio Braga vendeu toda a parte que detinha, deixando, no entanto, vários bons vinhos na adega do restaurante.

Lilian permanece à frente do Locanda e de imediato está levando adiante algumas mudanças combinadas com Aguinaldo. A pousada terá mais dois quartos, além dos seis já existentes, e haverá uma área reservada para festas e recepções. O cardápio, mais enxuto, ainda é de de tirar o chapéu; está mais para a cozinha brasileira, porém sem abandonar o vínculo original com a italiana (massas e risotos). E os preços estão adequados para um restaurante estrelado na serra. Como novidade, no jantar de uma sexta-feira por mês o Locanda voltará a servir apenas pizza. E também mensalmente haverá um brunch aos domingos. O Locanda, que não recebia crianças, agora tem até um menu especial para as que não desejarem se aventurar em pratos menos infantis.

Especialistas em propriedade intelectual se reúnem de sexta a domingo no seu XXXI Congresso Internacional, em um hotel na Barra da Tijuca. O tema central do evento é a inovação, mas o debate dificilmente fugirá de uma questão do momento que é o direito autoral nesse meio incontrolável que é a internet. A legislação tem sido atropelada pela realidade e o congresso discutirá o que se pode fazer para neutralizar os novos piratas.

GOSTOSA


RUY CASTRO - Agora é cinza

Agora é cinza
RUY CASTRO 
FOLHA DE SP - 2208/11

RIO DE JANEIRO - Outro dia, com a queda de mais um ministro no governo Dilma -o quarto em menos de três meses-, a Folha publicou a tradicional foto do ministério original, batida no começo do ano. Lá estão os 38 titulares, airosos e pimpões em seus ternos azuis, faces rosadas e vestidos vermelhos -exceto os ministros caídos, rebaixados a um tom cinza que os tornou parecidos com Gasparzinho, o "fantasma camarada", antigo herói de desenho animado.
Ou com os réprobos do planeta Krypton, que eram despachados para uma "zona fantasma" e, no processo, perdiam substância e cor. O cinza da foto simboliza que a saída do governo lhes drenou o sangue que permitia enxergá-los em quatro cores. Não que essa súbita monocromia lhes seja inconveniente -ao contrário. Ex-ministros costumam conservar os bons contatos que mantinham quando no governo e, fora dele, levam a vantagem de não ser tão visíveis.
Os 38 ministros juntos, mesmo com os quatro esfarinhados, compõem uma imagem impressionante. É muita gente -nem as superpotências se permitem tantos pingentes de luxo em torno do presidente. E ainda que Dilma aproveitasse para fazer algumas recomposições e extinguisse nove ou dez ministérios, continuaria a ser uma multidão. Mas, naturalmente, os excluídos foram apenas substituídos, e ministério que segue.
A prosseguir a faxina, em breve novos ministros serão evaporados, e a foto terá de ser continuamente retocada para comportar mais gente em cinza. É possível que, para muitos ali, que não têm nada a temer, esse risco seja ínfimo ou nulo. Mas haverá aqueles que, sabendo de si mais do que os outros, ao se verem hoje na foto, já conseguem se enxergar em grisê.
A foto lembra também uma galeria de tiro ao alvo. O leitor é livre para aplicar guache sobre os, a seu ver, próximos candidatos ao abate.

MARIA INÊS DOLCI - Energia a preços justos

Energia a preços justos
MARIA INÊS DOLCI 
FOLHA DE SP - 22/08/11

Temos de frear a drenagem de dinheiro para as arcas do erário para programas de aceleração do desperdício


AGORA VAI. Pensei isso em relação à campanha da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) "Energia a preço justo".
Espero que a sociedade toda se mobilize em torno dessa máxima. Já pagamos várias vezes a conta bilionária da construção de usinas hidrelétricas. Mas, como cobrar dos outros é uma delícia para os governos e para as corporações, eles nem sonham em paralisar essa derrama.
O que a Fiesp adverte, em publicidade publicada em jornais como a Folha, é que teremos nova oportunidade, a partir de 2015, de baratear essa conta.
Daqui a quatro anos, vencerão as concessões. Haverá novos leilões, que podem e devem ser feitos pelo critério de menor tarifa.
Isso não ocorrerá, contudo, se ficarmos quietos, preocupados com crimes em novelas, como se a tarifa de energia não pesasse tanto para toda a sociedade.
Ela impacta os custos das mensalidades de condomínios residenciais e empresariais, é parte dos preços de produtos e de serviços e encarece as exportações.
Governos estaduais se aproveitem dessas faturas obrigatórias para encobrir sua incompetência gerencial, cobrando pesadas alíquotas do ICMS.
Além disso, governo e agência reguladora (Aneel) se negaram a repor o que foi pago a mais nas contas nos últimos anos -no mínimo, R$ 7 bilhões.
Depois da criação do Impostômetro, pela Associação Comercial de São Paulo e pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, essa iniciativa talvez seja a mais forte exposição do quanto somos espoliados por uma carga tributária absurdamente elevada.
Temos acompanhado para onde vai parcela expressiva da arrecadação, nos ministérios dos Transportes, da Agricultura e do Turismo.
Sustentam as chamadas "bases políticas" dos governos no Congresso e nas assembleias estaduais.
Pagamos caro para os governos se endividarem mais, em vez de pouparem para um desenvolvimento sustentável.
Enquanto isso, as quedas de energia se multiplicam, em claro sinal de investimento equivocado ou insuficiente. Mesmo com uma montanha de dinheiro, as empresas não entregam o que deveriam -energia elétrica para todos, sem interrupções frequentes.
Recentemente, passageiros ficaram retidos em vagões do metrô de São Paulo por força (ironia?) de um miniapagão. Mais um, daqueles que os atuais governantes diziam que jamais ocorreriam.
Temos de frear a drenagem de dinheiro produtivo, conquistado após décadas de estudo e trabalho, que cai nas arcas do erário para programas de aceleração do desperdício.
A economia estimada com leilões orientados para o preço mínimo da tarifa de energia poderá atingir R$ 30 bilhões ao ano. Esse dinheiro teria destino mais nobre, ao compor a poupança familiar, financiar saúde, estudos e lazer. Ou seja, voltaria ao consumo, gerando mais empregos e mais impostos. Mas do gênero produtivo, não especulativo.
Não podemos continuar exportando quase que somente commodities, como soja e minério de ferro, porque nossos produtos mais sofisticados não têm competitividade, em razão da alta carga tributária, da "burrocracia" estatal e da moeda nacional sobrevalorizada.
É um modelo que não se sustentará por muito tempo.
Países têm de se garantir com o mercado interno, especialmente os com grande população, que precisa se alimentar, morar, estudar, cuidar da saúde e se divertir.
O brasileiro não deve mais sustentar a incompetência pública e privada. Chega!
Deveríamos cobrar padrões internacionais de eficiência e de respeito ao consumidor de quem quisesse atuar em nossos mercados, principalmente em telefonia fixa e móvel, em acesso à banda larga, em energia elétrica, em saneamento público e em transporte.
É hora, também, de os governos pararem de agir como vampiros de nossa vitalidade econômica, arrecadando quase 40% de nossas riquezas para prover Conabs e Dnits da vida.
O desenvolvimento de um país só ocorre quando a sociedade aprende a dizer não. Não!

RICARDO FERRAÇO - Coalizão suspeita


Coalizão suspeita
RICARDO FERRAÇO
O Globo - 22/08/2011

Vamos ter que viver quantas crises mais para concluir que o modelo de presidencialismo de coalizão brasileiro está esgotado? Porque se é o presidencialismo de coalizão que tem garantido a ampliação da base parlamentar e a governabilidade, é esse mesmo modelo que vem comprometendo a gestão pública, ao abrir brechas para a corrupção e para a ineficiência.

Em nome da governabilidade, optamos por um pragmatismo político que tem esbarrado no limite da irresponsabilidade. A regra geral hoje é o patrimonialismo e o aparelhamento partidário dos cargos de confiança.

É certo que o conflito aberto entre Executivo e Legislativo tem como resultado a paralisia política, com enormes prejuízos para a sociedade. Também não dá para negar a lentidão do processo legislativo - e a governabilidade exige respostas mais rápidas. Mas nada justifica as negociações nem sempre republicanas que vêm assegurando apoio parlamentar ao governo.

Se podemos tirar uma lição da atual crise, é que a coalização partidária que sustenta um governo precisa ser formada a partir de compromissos claros em torno de um programa comum, um projeto nacional baseado no interesse público - o que nem sempre acontece.

Não temos outro caminho senão a profissionalização da gestão pública. O que está longe de significar um governo formado só por burocratas. Até porque um nome técnico não é, necessariamente, garantia de honestidade e correção. E seria um erro grosseiro associar automaticamente denúncias de corrupção a indicações puramente políticas. A indicação partidária é perfeitamente legítima, desde que feita de modo transparente, atendendo a critérios éticos e de competência técnica.

A atual crise nos leva também a questionar, mais uma vez, o número excessivo de cargos comissionados no setor público. Só o governo federal dispõe de mais de 20 mil cargos de confiança, que dispensam o filtro do concurso público e fazem a festa de muitos apadrinhados por aí. Na França e na Alemanha, por exemplo, esses cargos não passam de 500.

Reduzir o inchaço da máquina pública não é apenas cortar gastos desnecessários, mas colocar um freio no aparelhamento desmedido do Estado. É permitir um controle mais eficiente da gestão pública.

Mais: apesar do avanço inquestionável na fiscalização e transparência dos gastos públicos, a fragilidade dos mecanismos de controle internos e externos ainda é um problema grave. Os últimos acontecimentos comprovam a inexistência - ou, pelo menos, a ineficiência - de mecanismos preventivos de controle, capazes de evitar desvios, fraudes e desperdícios.

Desvios e fraudes só têm sido identificados e investigados depois que rios de dinheiro público já foram perdidos. Na verdade, só depois de virarem notícia e crise política.

Quantas crises mais serão necessárias? Quantas crises mais para nos darmos conta do óbvio?

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA - Cuidado, cada caso é um caso


Cuidado, cada caso é um caso
ANTONIO PENTEADO MENDONÇA
O ESTADÃO - 22/08/11
Regras da ANS permitem aos consumidores de planos de saúde antigos migrarem para outros mais novos, mas é preciso analisar se isso vale mesmo a pena

Recentemente, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) baixou regras para permitir aos titulares de planos de saúde anteriores a janeiro de 1999 mudarem para planos de acordo com a Lei 9656/98.

A mudança do plano antigo para outro plano não é obrigatória e as regras permitem duas alternativas: a adaptação do plano antigo às regras da Lei dos Planos de Saúde Privados, com a inclusão de procedimentos originalmente excluídos, ou a migração para um plano completamente novo, pelo preço de mercado na data da migração.

As mudanças só podem ser feitas dentro de planos administrados pela operadora do plano anterior. Ou seja, não se trata da aplicação das regras da portabilidade, também recentemente introduzidas pela ANS. E elas só podem ser feitas uma vez, não sendo permitido o retorno para a situação anterior, em função de arrependimento com as novas regras pactuadas.

Como cada caso é um caso, as alternativas oferecidas podem ser interessantes ou não. Vai depender de cada plano e das necessidades de cada titular.

Os planos de saúde anteriores a janeiro de 1999 apresentam enormes diferenças de cobertura e elas precisam ser consideradas. Em primeiro lugar, eles não são necessariamente ruins, nem sangram seus titulares, não dando atendimento quando necessário. Alguns destes planos estão entre os melhores e mais abrangentes oferecidos pelo mercado. Outros, não. Num universo onde o diferencial era um atendimento melhor do que o oferecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde), tem de tudo. Planos para o chamado "chão de fábrica", planos caros, planos com grande hotelaria, mas com poucas coberturas, planos abrangentes, com livre escolha, com rede própria ou com rede credenciada, etc.

No fim dos anos 1970 os planos de saúde privados eram o sonho de consumo da classe média. E eram oferecidos pelas assistências médicas, Unimeds e seguradoras. Naquela época, as diferenças entre eles eram nítidas. As assistências médicas operavam com redes próprias, as Unimeds por meio dos médicos cooperados e as seguradoras, em sistema de reembolso.

Plano universal. Como os planos de saúde privados até 1998 não tinham uma regulamentação específica, a Susep (Superintendência de Seguros Privados) desenvolveu um plano de seguro saúde obrigatório para as seguradoras. Chamado de "Plano Universal", com cobertura praticamente igual à do SUS, as seguradoras eram obrigadas a apresentá-lo aos clientes, pelo preço que achasse conveniente, dando como alternativa, caso o desejasse, planos menos completos e, consequentemente, com preços menores.

Na década de 1990, por conta da concorrência no setor, o Plano Universal da Susep, ainda que, na prática, tenha sido muito pouco comercializado, foi um instrumento importante para formatar a maioria dos planos de saúde privados, levando em conta as necessidades e a capacidade de pagamento da sociedade brasileira, das pessoas física e jurídica.

Todavia, após um longo sono nas gavetas do Congresso Nacional, quando a Lei dos Planos de Saúde foi desengavetada, a ideia foi deixada de lado.

Se o Plano Universal da Susep tivesse servido de base para desenvolver os conceitos de cobertura e atendimento, com certeza a realidade atual seria muito mais favorável ao consumidor, que teria planos compatíveis com seus riscos e sua capacidade de pagar, além do que as operadoras não correriam o risco de se transformarem em bombas relógio, como ainda pode acontecer.

Mal entrou em vigor, a Lei dos Planos de Saúde Privados foi modificada em mais de 90% de seu texto por uma Medida Provisória baixada no dia seguinte à sua aprovação e por várias outras ao longo dos meses. O resultado da lei mal elaborada é uma série de boas intenções que engessam os planos, que por isso nem sempre levam em conta a realidade nacional.

Como existem planos anteriores a 1999 que são muito bons, a decisão de sair de um plano antigo deve ser tomada com cautela, levando em conta o contrato original e as vantagens e desvantagens de mudar dele para um outro tipo de plano.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA


Operação resgate
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SP - 22/08/11

Prestes a assumir a Prefeitura de Campinas, o PT sinaliza aos aliados disposição de abrir mão da cabeça de chapa em 2012 para garantir a governabilidade do vice, Demétrio Vilagra, que amanhã substituirá o cassado Dr. Hélio (PDT). Com aval da cúpula nacional, petistas traçam coalizão eleitoral com PSB e PMDB, encabeçada pelo deputado Jonas Donizete (PSB), vice-líder de Dilma e hoje à frente nas pesquisas.
Tudo para manter em sua órbita a administração da maior cidade do interior paulista, objeto do desejo do PSDB, que enxerga na crise política a chance de recuperar o cargo depois de 16 anos. O estímulo aos tucanos parte de Geraldo Alckmin, que contratou a Unicamp para delinear as prioridades da região.

Faxinando 1 No governo, há quem considere a situação de Mário Negromonte potencialmente mais explosiva que a de Pedro Novais. Para começar, o ministro das Cidades é protagonista do conflito na bancada do PP na Câmara, enquanto o titular do Turismo é figurante que pode, no máximo, ser atingido por uma bala perdida no motim do PMDB.

Faxinando 2 Ainda que Novais se enfraqueça com o acúmulo de denúncias a pairar sobre o Turismo, boa parte delas não diz respeito à sua gestão. Já Negromonte, temem auxiliares da presidente, precisaria apenas de um pouco mais de holofotes para se complicar bastante.

Coração leve Demorou mais de um mês, desde a queda de Alfredo Nascimento do Ministério dos Transportes, para o PR declarar sua "independência" do Planalto. E menos de uma semana para o partido reconsiderar a decisão. Afinal, "mágoa dá câncer", diz o líder na Câmara, Lincoln Portela (MG).

Divã O presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), e o secretário-geral, Rodrigo de Castro (MG), reúnem hoje à noite líderes do partido em Brasília para ajustar a retórica tucana diante da "faxina". A ideia é refutar a hipótese de recuo após relatos de que FHC teria sugerido o desembarque da CPI da Corrupção.

Microfone Dilma reservou cinco horas do domingo para gravar especial de seu programa semanal de rádio, que vai ao ar hoje. Pela primeira vez o "Café com a Presidenta" será veiculado em 27 versões, uma para cada Estado. O tema é educação.

Patrocínio 1 Geraldo Alckmin regulamentará, via decreto, a MIP (Manifestação de Interesse Privado). O instrumento permitirá ao governo paulista incorporar ao seu portfólio projetos desenvolvidos por empresas nacionais e estrangeiras interessadas em participar de PPPs.

Patrocínio 2 Chefiada pelo vice, Guilherme Afif, a ofensiva nasce com teto de R$ 25 bilhões em verbas orçamentárias e prevê concessões que abrangem metrô, prisões, escolas e hospitais. O modelo será apresentado ao mercado em setembro.

Para já Um primeiro lote de PPPs para erguer fóruns já está no forno. Compreende sete unidades no Estado.

Para depois Entre elas está a de Itaquera, em área contígua ao estádio do Corinthians. O início da construção está prejudicado: o canteiro da Odebrecht, responsável pela arena, fica no terreno destinado aoJudiciário.

DNA Parceria de Alckmin e Dilma, o monotrilho de São Bernardo precipita a disputa entre três postulantes à prefeitura. Enquanto Luiz Marinho (PT) evoca a conquista de verba federal para o projeto, o deputado Orlando Morando (PSDB) assume, em outdoors, a paternidade da obra. Alex Manente (PPS) abraça a causa na TV.
com LETÍCIA SANDER e FÁBIO ZAMBELI

TIROTEIO

"Sérgio Cabral está reeditando o franciscanismo do PMDB na Presidência, 20 anos depois: é dando que se recebe".
DO EX-GOVERNADOR DO RIO CESAR MAIA (DEM), sobre os contratos recém-celebrados pelo governo do Rio com a construtora Delta, do empresário Fernando Cavendish, dono do jatinho usado pelo governador fluminense.

CONTRAPONTO

Questão de ordem


Durante audiência do ministro Paulo Sérgio Passos (Transportes) na Câmara, Pauderney Avelino (DEM-AM) criticava os famosos aditivos a orçamentos de obras da pasta, batendo na tecla de que determinada empresa, considerada inidônea por seu Estado, não poderia ter sido contratada pelo Dnit.
Diante de mais de 40 inscritos para falar, Edson Ezequiel (PMDB-RJ), que comandava a sessão, não atendeu aos apelos para uma nova pergunta sobre o tema e seguiu em frente. Um colega da oposição reclamou:
-Presidente, concede um aditivo ao Pauderney?

"PLUS"


SANDRA POLÓNIA RIOS - Falta estratégia no ''Brasil Maior''


Falta estratégia no ''Brasil Maior''
SANDRA POLÓNIA RIOS
O Estado de S.Paulo - 22/08/11

O Plano Brasil Maior, divulgado no dia 2 de agosto de 2011, pretende dotar o País de uma nova política industrial, tecnológica, de serviços e de comércio exterior para o período de 2011 a 2014. De acordo com o documento de divulgação, o plano foca "no estímulo à inovação e à produção nacional para alavancar a competitividade da indústria nos mercados interno e externo".

Ainda segundo o documento, "o Plano Brasil Maior organiza-se em ações transversais e setoriais. As transversais são voltadas para o aumento da eficiência produtiva da economia como um todo. As ações setoriais, definidas a partir de características, desafios e oportunidades dos principais setores produtivos, estão organizadas em cinco blocos que ordenam a formulação e implementação de programas e projetos".

Apesar da roupagem metodológica que precede a apresentação das medidas, sugerindo rigor e visão estratégica, é exatamente esse tipo de visão que falta à nova política industrial.

A leitura das 35 medidas anunciadas leva à percepção de que foram reunidas, sob um único guarda-chuva, diversas iniciativas que vinham sendo discutidas em diferentes áreas do governo e que respondem a demandas e preocupações diversas.

O Plano não aponta para a indústria que se pretende ter no futuro. O horizonte temporal é curto para transformações relevantes e os instrumentos têm efeitos potenciais contraditórios entre si.

Os mecanismos anunciados indicam que o governo parte de um diagnóstico geral correto - o de que a indústria brasileira sofre com a deterioração das condições de competitividade e de que é preciso desonerar a produção industrial, as exportações e os investimentos, além de incentivar a inovação e a participação das pequenas e das médias empresas no comércio exterior. Entretanto, particularmente no que se refere ao comércio exterior, os instrumentos incorporados ao programa são tímidos e contraditórios: enquanto alguns buscam aumentar a competitividade das manufaturas brasileiras no mercado internacional, outros, voltados à proteção da indústria doméstica, tendem a resultar em perda de eficiência e aumento de custos no processo produtivo.

Diante da dificuldade de enfrentar a conhecida agenda de competitividade - desoneração tributária das exportações e dos investimentos; desoneração da folha de pagamentos; melhoria das condições de infraestrutura e logística; e redução da burocracia e dos custos acessórios no processo exportador -, o governo adota medidas parciais e pontuais. Diante da incapacidade de lidar com os problemas sistêmicos, as autoridades optam por mecanismos pontuais, alguns voltados para o aumento da proteção. Mas, ao fazê-lo, vão de encontro com os objetivos de aumento de competitividade.

Alguns traços vão se consolidando na política industrial e de comércio exterior brasileira a partir de 2008:

recuperação do corte setorial dos instrumentos de política industrial;

intensificação do uso de mecanismos direcionados ao aumento do conteúdo nacional dos produtos industriais;

e reforço do viés discricionário na aplicação dos instrumentos, mesmo daqueles que podem ser considerados como transversais.

No que se refere à recuperação do corte setorial, chama a atenção o fato de que, também nesse caso não se apresentam escolhas definidas. Há instrumentos específicos para diferentes setores, dando a impressão de que as diversas demandas foram atendidas: redução dos custos tributários para bens de capital, novo regime especial para o setor automotivo, desoneração da folha para setores intensivos em trabalho, preferências nas compras governamentais para setores e atividades elegíveis e novos programas de financiamento para um conjunto variado de atividades industriais.

Além dos traços mais gerais, dois aspectos chamam a atenção na condução da política de comércio exterior recente no Brasil e que tendem a se perpetuar com a nova política: déficit de implementação e transitoriedade dos mecanismos.

Os agentes econômicos que atuam no comércio exterior brasileiro sofrem com as dificuldades de operacionalização de instrumentos que são anunciados, mas não são implementados. Muitas vezes é difícil, inclusive, identificar se os instrumentos estão ou não em vigência. Dentre as medidas incluídas no anúncio do Plano Brasil Maior, algumas já foram divulgadas anteriormente - é o caso da preferência para produtos e serviços nacionais nas compras do setor público, incluída no "Pacote de Competitividade" de maio de 2010 e que continua em processo de regulamentação.

Além disso, muitos dos mecanismos têm caráter transitório. No plano divulgado, diversos benefícios têm prazo de vigência previsto para terminar em dezembro de 2012. Essa transitoriedade gera incertezas e desestimula a adoção pelas empresas de estratégias exportadoras mais duradouras.

Diante das dificuldades para promover reformas de caráter horizontal que eliminem as distorções do regime tributário brasileiro, reduzam os custos assessórios com a burocracia e enfrentem as graves deficiências de transporte e logística, vai-se costurando uma colcha de retalhos com medidas muitas vezes incoerentes entre si.

MARCIA PELTIER - Pó valioso


Pó valioso
MARCIA PELTIER
JORNAL DO COMMÉRCIO - 22/08/11 

O Brasil está alavancando os negócios do grupo Kraft Foods no país. A Tang acaba de se tornar a 12ª marca global do grupo a fazer parte do hall das que valem mais de US$ 1 bilhão. O resultado é, em grande parte, fruto do desempenho da marca em mercados emergentes. Pelo segundo ano consecutivo, Tang ocupa a liderança do mercado brasileiro no setor de refrescos em pó: em maio de 2011, obteve 35,7% de share.

Tititi

O livro História da Moda no Brasil, de Luís André do Prado e João Braga, está provocando a ira dos admiradores e amigos da estilista Maria Cândida Sarmento, falecida em 2002. É que José Augusto Bicalho, estilista que fez parte do Moda Rio, grupo de grande importância para a afirmação da moda carioca, não foi lá muito gentil ao dar seu depoimento sobre a criadora da grife Maria Bonita. “Tinha uma roupinha rococó, à moda Elba Ramalho”, disparou Bicalho.

Do avesso

Deixou marcas na Academia Brasileira de Filosofia, localizada no centro do Rio, o forte esquema de segurança do vice-presidente Michel Temer, que recebeu da casa o título de doutor honoris causa, na quinta-feira. Na falta de outro lugar no prédio tombado, um banheiro químico foi instalado na sala de reuniões. E um sofá teve o encosto descolado pela ação de vasculhamento do Esquadrão Anti-Bombas. Somente de oficiais da Polícia do Exército havia 40 no interior da Academia.

Força bruta

Oficial dos marines americanos, atualmente no comando do batalhão anti-terrorismo da reserva ativa, o brasileiro Eduardo Jany está no Rio. Como palestrante da International Association of Chiefs of Police, vai falar, hoje, no Riocentro, sobre a preparação de unidades operacionais para grandes eventos. Com mais de 20 prêmios e condecorações, inclusive a medalha de Estrela de Bronze do Departamento de Defesa dos EUA, Jany é duro na queda. Tri-campeão de karatê (faixa-preta) e natação nos jogos Internacionais de Policiais e Bombeiros, ele também treina para triatlons, além de fazer salto livre e mergulho.

Dalai Lama em SP
Esgotadas as inscrições gratuitas para a palestra do Dalai Lama, na manhã do dia 17 de setembro, no Anhembi, e totalmente vendidos os ingressos a R$ 50 para a preleção da tarde do mesmo dia, no WTC, quem quiser ainda ver de perto o mestre budista nessa sua quarta visita ao país terá que correr. Restam apenas 400 ingressos dos 2,5 mil postos à venda, a R$ 240, do simpósio científico que acontece dia 16, também no WTC. Nessa data, o líder religioso reunirá especialistas brasileiros e estrangeiros em torno de debates sobre os estados de consciência e as práticas contemplativas.

Respostas mentais

Uma das estrelas será o neurocientista inglês Adrian Owen, da Universidade de Cambridge, em 50º lugar no ranking de 2010 dos 100 mais importantes cientistas do Reino Unido do jornal The Times. Ele desenvolve pesquisas no sentido de provar que é possível se comunicar com pessoas em estado minimamente consciente, que pareciam estar em condição vegetativa.

Faixa preta

Também virá a doutora Tamara Russel, criadora do Body in Mind Training, programa implementado para populações com distúrbios psiquiátricos severos. Tamara, curiosamente, é também uma premiada instrutora de artes marciais e Tai chi.

Palavras doces

A editora Lua de Papel lançará, em setembro, o livro A promessa, do best-seller Richard Paul Evans. O autor já vendeu mais de 14 milhões de livros nos EUA e seus romances foram traduzidos para mais de 25 idiomas. O livro narra o encontro de uma mulher com um homem misterioso e encantador. Evans já teve três obras de sua autoria adaptadas para o cinema, a última delas, A Perfect Day, com Rob Love e Chistopher Lloyd.

Raridades

De amanhã a sexta-feira, das 15h às 22h, acontece o leilão em comemoração aos 105 anos da família Ernani, de três gerações de leiloeiros. Entre as cerca de 900 peças que irão a pregão estão desde uma talha de igreja de Mestre Valentim, do século 18, e esculturas em terracota, representando as quatro estações, a uma aquarela de Marc Chagall. Não faltam achados de valor histórico como rádios a válvula, com lance inicial de R$ 100, e antigos modelos de aparelhos de TV. A exposição do acervo termina hoje, na rua São Clemente 385, em Botafogo.

Livre Acesso

O programa Marcia Peltier Entrevista, desta terça-feira, recebe o médico e pesquisador Eduardo de Rose. Gaúcho, de Rose é uma das maiores autoridades mundiais sobre combate ao doping nos esportes. Presidente honorário da Confederação Pan-Americana de Medicina do Esporte, ele integra também o Conselho da Agência Mundial Anti-doping. A entrevista vai ao ar às 23h, pela Rede CNT.

Raquel Davidowicz, estilista da marca Uma, apresenta a coleção verão para clientes durante coquetel na loja da Dias Ferreira, amanhã, às 17h.

A cantora e compositora Daniela Colla, filha de Carlos Colla, faz uma homenagem ao Rei Roberto Carlos e lança o CD Canzone Per Te, pela gravadora Arlequim. O CD é todo em italiano e com músicas inéditas.

O professor Carlos Wizard está apostando no potencial esportivo do Brasil. Ele criou um programa de idiomas voltado para empresas, governos estaduais e municipais, e órgãos públicos em todo o Brasil que têm especial interesse nos eventos que começam com a Copa das Confederações, em 2013. A meta é aumentar em 30% o número de cariocas bilíngues até 2014.

Começa na quarta e vai até sábado o festival de pâtisserie francesa no Le Pré Catelan, comandado pelo jovem chef Julien Alvarez, de 27 anos, campeão do mundo de pâtisserie este ano no concurso Coupe du Monde de la Pâtisserie, realizado em Lyon.

Elizabeth Garber, da Beth Chocolates, abriu a primeira loja de brigadeiros gourmet no Rio Design Barra.

Adriano Miolo, diretor enólogo do Miolo Wine Group, comanda, hoje, uma degustação vertical com cinco safras do lote 43. Serão degustadas as safras de 1999, 2002, 2004 e 2008, na Casa do Filé. É a maior vertical desse vinho já realizada no Rio.

Com Marcia Bahia, Cristiane Rodrigues, Marcia Arbache e Gabriela Brito

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - O dilema de Dilma


O dilema de Dilma
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 22/08/11

Pressionada para gastar, mas ainda repetindo o discurso da seriedade, a presidente Dilma Rousseff parece indecisa entre seguir o exemplo de seu antecessor e adotar uma política de prudência e responsabilidade ante o recrudescimento da crise da economia global. O primeiro caminho é o da gastança com objetivo principalmente eleitoral. A ordem, nesse caso, é atender os aliados e investir o dinheiro público na caça ao voto. A outra escolha é politicamente mais complicada, porque requer firmeza na ação e compromisso com objetivos nacionais de longo prazo. A piora do quadro internacional, com o risco muito próximo de uma nova recessão na Europa e nos Estados Unidos, torna a decisão especialmente dramática.

O discurso da seriedade foi adotado antes da posse e repetido nos primeiros meses de governo. A presidente Dilma Rousseff começou o mandato anunciando um corte de R$ 50 bilhões nas despesas orçamentárias. O corte seria em parte uma ficção contábil, como ficou logo claro, mas, de toda forma, certos gastos foram contidos por algum tempo.

As promessas de seriedade foram repetidas. Há poucos dias a presidente vetou vários dispositivos do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias. Eliminou, por exemplo, o compromisso de aumento real das aposentadorias superiores a um salário mínimo. Além disso, o Executivo tenta conseguir a prorrogação, mais uma vez, da Desvinculação de Receitas Orçamentárias (DRU).

Mas a presidente Dilma Rousseff tem cedido a certas pressões e tem ouvido conselhos para seguir a política da gastança eleitoreira. A resistência da base aliada à faxina ministerial parece tê-la convencido a dar mais atenção àqueles conselhos.

O governo havia anunciado, no primeiro semestre, a intenção de anular boa parte do estoque de restos a pagar. Seria um passo para livrar as contas de um monte de entulhos. Também havia indicado a intenção de ir muito devagar na liberação de verbas para as emendas parlamentares. Mas a presidente parece haver recuado.

A curtíssimo prazo devem sair R$ 1 bilhão para emendas, com verbas deste ano, e R$ 450 milhões de restos acumulados. Faltam detalhes sobre os passos seguintes, mas é razoável prever novas liberações até o fim do ano. Na hipótese mais otimista, a presidente Dilma Rousseff está simplesmente agindo de acordo com circunstâncias políticas difíceis. Ela tenta reagrupar as forças para os próximos embates no Congresso. Mas há motivos para se pensar numa hipótese pior - a de uma adesão mais ampla aos padrões seguidos nos oito anos anteriores.

O governo se dispõe a realizar em 2012 um esforço fiscal menor que o deste ano, segundo fonte ministerial citada, sem identificação, no jornal Valor. Mas o esforço realizado neste ano foi mínimo. Até agora, o superávit primário, dinheiro posto de lado para pagamento de juros, foi produzido muito mais pela arrecadação crescente do que pela contenção de gastos. De janeiro a julho, o governo central arrecadou 14% mais que no mesmo período de 2010, descontada a inflação. O aumento nominal foi de 21,3%.

O crescimento da receita poderá ser menor no próximo ano, se a economia perder impulso, mas o valor ainda será maior que o deste ano. Despesas obrigatórias, no entanto, crescerão sensivelmente. Já está previsto um aumento ao funcionalismo concedido no governo anterior. Esse reajuste é escalonado. Também crescerão de forma considerável as despesas da Previdência, especialmente se o aumento do salário mínimo ficar na faixa de 13% a 14%, como admitiu há meses o ministro da Fazenda.

Segundo a fonte citada pelo jornal, o governo deverá no próximo ano descontar da meta de superávit primário o total investido no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O compromisso com a meta cheia, portanto, será mais uma vez abandonado. Se esse for o roteiro, pode-se prever para 2012 uma programação financeira ainda menos flexível que a deste ano, inflada e fortemente contaminada pela campanha das eleições municipais. Gastança irresponsável e improdutiva é muito diferente de política anticíclica. Diante do risco de uma recessão internacional, o quadro brasileiro é preocupante, especialmente se houver um afrouxamento prematuro da política monetária.

NICOLAU DA ROCHA CAVALCANTI - Divórcio e liberdade


Divórcio e liberdade
NICOLAU DA ROCHA CAVALCANTI
O Estado de S.Paulo - 22/08/11

Recentemente, a revista do New York Times publicou um artigo intitulado The Divorce Delusion, em que se dizia que a tendência contemporânea de apresentar o divórcio como algo indolor não corresponde à realidade. Heather Havrilesky, autora do artigo, entende que o divórcio na vida real está mais próximo do drama do filme Kramer vs. Kramer do que poderíamos imaginar. É uma tese ousada. Será que o esforço por desdramatizar a ruptura do casamento está sendo ineficaz?

Logo em seguida saiu no Wall Street Journal um texto de Susan Gregory Thomas sobre o mesmo tema (The Divorce Generation, 9/7), no qual retrata a diferença de atitude com relação ao casamento entre a geração X e a dos seus pais. Os mais jovens estariam mais determinados a manter a união, ainda que nem sempre o consigam. Desde o ano de 1980, a proporção de divórcios nos EUA vem caindo.

É um tema complexo. No Brasil o divórcio é recente, tem pouco mais de 30 anos. Mas já se incorporou à nossa mentalidade. É difícil encontrar quem não considere positiva a possibilidade do divórcio no regime jurídico do casamento.

O que isso significa? Que abraçamos o conceito moderno de liberdade. Liberdade como escolha, arbítrio, choice. E estamos felizes com essa liberdade, já que sempre é possível revisar, reescolher, adaptar, romper, mudar. Não nos sentimos presos: o amanhã pode ser diferente do hoje.

Num primeiro momento, essa percepção da liberdade deslumbra. Mas tem um preço: exclui a dimensão temporal das nossas escolhas. Elas ficam presas ao presente, sem transcendência vinculante para o futuro.

Ficamos limitados ao hoje, ao agora. E nos esquecemos de que somos seres temporais, cuja vida não se realiza só no hoje, mas ao longo do tempo. Não nos basta o agora: o presente - quando limitado ao presente - não nos define. Também somos história e também somos futuro.

A perspectiva do tempo é parte do fenômeno humano, ou seja, é parte da liberdade. Promessas, juras, compromissos sem a dimensão temporal são apenas palavras, são apenas presente. Sem essa transcendência vinculante para o futuro o conteúdo intencional desses atos humanos é raso e muitas vezes se assemelha a uma mentira, já que acaba por negar aquilo que em princípio deveria expressar.

Será tudo isso uma teoria? Infelizmente, não. Estreitar o horizonte da liberdade tem consequências. Um exemplo é a insegurança. Sem compromissos que ajudem a dar um sentido ao futuro o medo nos sequestra. Ficamos sem armas para lutar contra a incerteza do amanhã. Quantas vezes já não foi dito que a ansiedade é um dos grandes males da nossa época?

Mas não basta falar em escolhas, já que muitas vezes não é essa a percepção subjetiva de quem está envolvido num processo de divórcio. Este não é visto tanto como uma decisão, mas como a única saída. O drama do divórcio não pode ser separado do drama do casamento infeliz. Tratá-los isoladamente parece-me intelectualmente desonesto, existencialmente falso e ideologicamente moralista, pois é fácil criticar o divórcio sem ver o dia a dia de um casamento em apuros.

E aqui entramos num segundo aspecto importante da concepção moderna de liberdade. Encara-se que suas únicas limitações são externas e se pressupõe que internamente todos os seres humanos sejam igualmente livres. Ignora-se a necessidade de um aprendizado da liberdade (Aristóteles). Ela - em certo sentido - não é um dado, é preciso conquistá-la.

E o que isso tem que ver com o fracasso de tantos casamentos?

É preciso aprender a conviver com uma pessoa. Não basta uma vontade inicial ou uma paixão. E quando se ignora esse fato acontece o contrário do inicialmente pretendido: acabamos reféns das circunstâncias, na percepção de que o divórcio é a única solução. É interessante notar que a visão moderna de liberdade, que em princípio parece privilegiar a autonomia individual, nos devolve a uma situação pré-socrática: reféns do destino, reféns dos deuses. Já não somos donos do nosso futuro, são as circunstâncias que parecem determinar a nossa vida.

Dessa forma, o extraordinário, o heroico não é o divórcio, e sim a fidelidade. Talvez seja essa razão por que a cultura ocidental tenha buscado durante tantos séculos proteger o casamento, facilitando sua permanência no tempo, pois o mais fácil é que se rompa no meio do caminho.

E quem são os culpados pela situação atual? Penso que somos nós mesmos, ao excluirmos o conteúdo humano da fidelidade. Ficamos apenas com a forma, com as regras externas, e - na ótica contemporânea - essas são as grandes vilãs da liberdade. Por isso o divórcio foi visto como uma libertação, já que flexibilizava tais regras.

Mas será que os limites da nossa liberdade não decorrem muito mais de nós próprios, dos nossos hábitos, da nossa visão de mundo? Não é uma pergunta simples, pois incide no núcleo da nossa identidade. Afinal, somos nós ou são os outros e as circunstâncias que determinam a nossa vida? Talvez seja irreal pôr uma disjuntiva tão radical, mas o viés da nossa resposta é um interessante indicador.

Encarar o divórcio como uma alternativa possível dentro do projeto pessoal de vida significa desistir de um sonho por medo de que se torne um pesadelo. Mas será essa a única opção razoável? A desesperança merece ser uma alternativa?

Não há uma equação matemática para resolver essa questão, não existe uma resposta única. Toda opção tem o seu preço e me parece que saber o custo de cada alternativa nos ajuda a sermos mais livres. Afinal, se há um consenso no mundo de hoje, é o de que a liberdade é fundamental. Sejamos conscientes, portanto, de em qual liberdade estamos apostando.

ADVOGADO, É PRESIDENTE DO CENTRO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA (CEU), ENTIDADE MANTENEDORA DO INSTITUTO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS SOCIAIS (IICS).

GOSTOSA


JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO - Rivais ao acaso



Rivais ao acaso
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S.Paulo - 22/08/11

Fernando Henrique Cardoso e Geraldo Alckmin demonstraram mais apoio a Dilma Rousseff na semana passada do que boa parte do PT. Não foram só os elogios, verbas e afagos da presidente que seduziram os dois tucanos. O cálculo político explica melhor o oposicionismo "light" da dupla, cada vez mais contrastante com o de José Serra. Tudo passa por 2014.

Nas internas, FHC disse a correligionários que o PSDB deveria apoiar a dita "faxina" promovida por Dilma no governo, em vez de propor uma investigação pelo Congresso. Na sua avaliação, uma CPI da Corrupção agora só favoreceria o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva daqui a três anos. O subtexto: em 2014, é mais fácil um candidato tucano bater a atual presidente do que o seu patrono político.

É improvável que o ex-presidente defendesse Dilma se ela não o tivesse elogiado publicamente mais de uma vez, se não o fizesse convidado de honra no encontro com Barack Obama, em Brasília. O ego sempre foi o ponto fraco do tucano. Mas tampouco FHC se arriscaria nessa defesa da petista sem uma razão partidária. O cálculo do ex-presidente pode até não fechar, mas é defensável.

Com Alckmin, o flerte de Dilma passou por outros cantos. Presidentes e governadores sempre têm interesses comuns: programas em parceria, controle fiscal e o bom andamento da economia - o principal lubrificante para suas reeleições. Mas nada é mais importante do que o objetivo político de cada um. E o do governador paulista parece combinar com o da presidente.

Em cerimônia na quinta-feira no mais alto ninho tucano, o Palácio dos Bandeirantes, Dilma tateou: "O pacto republicano e pluripartidário que estamos firmando hoje é capaz de transformar a realidade social que vivemos". Pela reação de Alckmin, a petista tocou a nota certa. "Ultrapassamos o período de disputas para unir esforços em prol daqueles que precisam. Isso se deve em grande parte ao seu patriotismo", respondeu o governador, referindo-se à visitante. Rapapé inédito entre tucanos e petistas.

Tanta eloquência se explica se Alckmin estiver preocupado em garantir a sua reeleição em 2014, e fazer dela trampolim para a candidatura presidencial em 2018. Ele teria 66 anos. Para o governador ter chances daqui a sete anos, Dilma - e não Lula - precisaria disputar 2014 pelo PT. Nisso, ele e FHC concordam, ainda que por motivos opostos (para Alckmin, seria melhor que outro tucano não se elegesse presidente em 2014, pois seria candidato "natural" à reeleição quatro anos depois).

Nesse cenário, em 2018 Lula, aos 73 anos e há oito longe do poder, seria um adversário improvável. Dilma seria inelegível. E o PT enfrentaria o desgaste de eventuais 16 anos de governo. 2014 é uma eleição mais arriscada para Alckmin do que 2018. Se disputar o próximo pleito presidencial, ele abrirá o mesmo flanco que abriu em 2006, quando perdeu para presidente e viu Serra se eleger governador em São Paulo.

Isso limita o próximo rol de presidenciáveis tucanos a Aécio Neves e a Serra. Não por acaso, o mineiro se apressou a reforçar o tom oposicionista. Disse que a "faxina" é mero "slogan de campanha" e que o governo só demite em reação ao noticiário. Não nomeou Dilma nem falou em CPI. Ou seja, manteve-se um tom abaixo de Serra, o mais sistemático crítico do governo federal. O PSDB é campeão olímpico de "fogo amigo", mas não disputa o título sozinho.

"Se fosse unido, não seria partido." A piada é velha, mas ainda vale. A disputa pelo poder começa dentro das siglas partidárias, sempre. O PMDB está dividido em São Paulo (Michel Temer versus quercistas). O PP rachou entre o atual e o antigo ministro das Cidades. O PT já nasceu com tantas diferenças que as institucionalizou, sob a forma de tendências partidárias. No Brasil, bastou começar com "P" para tender à divisão. Até a Polícia Federal tem facções.

Não poucas vezes há mais identidade entre políticos de agremiações antagônicas do que entre seus pares. Por contingência, histórica ou geográfica, um está em uma sigla e outro, na rival. Daí que as alianças e coalizões são quase aleatórias, com poucas combinações fora do jogo. Tudo depende da circunstância, que muda feito nuvem.

Conscientemente ou não, Dilma adotou o estilo de um antecessor na troca do ministro da Agricultura. Avisou primeiro seu vice e pediu a indicação de um substituto. Deixou claro que a vaga é do PMDB de Temer. Preveniu especulações. É como FHC fazia.