sexta-feira, março 25, 2011

IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO

O mistério do carro cinza
IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO
O Estado de S.Paulo - 25/03/11

Domingo de manhã, saio de casa e dou com o carro Peugeot cinza escuro, estacionado, cheio de tranqueiras, como se fosse uma caçamba. Reapareceu depois de uma ausência. A rua cheia de gente passeando com os cachorros. Cada vez mais cachorros. Por alguma razão, parece que todos decidiram sair ao mesmo tempo, talvez pelo céu nublado, pela temperatura fresca. A padaria, no entanto, estava tranquila, diferente de outros dias, quando fica lotada, quem sabe é o cursinho que foi aberto no meio da quadra. Ali onde já foi a pizzaria Macedo, do Luis Carlos, um dos melhores zagueiros da história do Corinthians; depois Forró do Dominguinhos, ainda que eu jamais tenha visto o Dominguinhos por aqui; em seguida, uma igreja que teve curta duração e escassos fiéis, que deu lugar a uma empresa misteriosa, de janelas lacradas, ninguém via o que se passava lá dentro, diziam que seria um telemarketing. Enfim, agora é cursinho, cheio de jovens que fazem a padaria CPL bombar. Já os estudantes da faculdade de Direito local (não é local? Claro que é) elegeram o bar do Joaquim, ou do Pinguim, certas horas é uma rua de jovens.

O senhor do 512 está junto a árvore torta alertando os que passam para que não batam a cabeça. Há um ar de fraternidade, todos se cumprimentam e comentam a decepção. No sábado, 19, em São Paulo, ninguém tinha visto a super-Lua. Maldito tempo fechado, justamente na noite em que a Lua atingiu seu ponto mais próximo à Terra (o que acontece de 20 em 20 anos) deveria aparecer imensa, trazendo energia positiva. Esperamos que traga, ainda que não a tenhamos visto. No caminho, encontro figuras que fazem o bairro. Viola, o bailarino, professor, com seu corpo de criança, a fazer inveja, e Ciça, sua mulher, caminham, é o andar por andar, fugindo do volante. Comum darmos com o diretor teatral Naum Alves de Souza, o Arnaldo Jabor ou Djalma Bom (lembram-se dele?) Sumido está o editor Fernando Mangarielo. Falta faz o Julio Lerner, que sempre me relatava o fascinante que foi ir em busca da terra natal de Clarice Lispector.

A rua e adjacências mudam no ritmo de São Paulo. Há um novo edifício em conclusão, de 14 andares; há meses uma casa azul-escuro espera a chegada de Alexandre Herchcovitch (virá?); uma loja, a Cinco Décadas, ganhou o apelido de "a janela das seis lâmpadas", por causa das luminárias e abajures expostos; a Casa Casa deu certo, ampliou, enquanto a Argento durou pouco, já fechou. Uma loja, À La Garçonne, traz roupas descoladas, na Varuzza são móveis anos 50 e a Thomaz Saavedra me atrai pelos cartazes de cinemas, geralmente filmes antigos. Os tradicionais continuam em seu lugar, como o Pepe sapateiro, a farmácia de Selma e Vanda, a quitanda do Edson, o supermercadinho dos chineses, a autoelétrica do Pereira, com o chorinho das quartas-feiras, Henrique e Jane que implantaram os vinhos no bairro, a banca do Cid, a clínica de acupuntura da esquina, onde as consultas são impossíveis, filas enormes. Ao lado do restaurante Arturito, Delia e Ana mantêm a videolocadora de clássicos S"Different, agora com um café que funciona a tarde inteira, no qual o sanduíche de carne com berinjela ou abobrinha é enternecedor. No bar Vianna, a margarita é excelente e a lula à doré, perfumada.

Maioria dos conhecidos que encontro esta manhã está a caminho do breakfast no Las Chicas, na Oscar Freire, ao lado da pizzaria Bonde Paulista, esquina da Artur Azevedo. Já correu de boca em boca que Carla Pernambuco e Carolina Brandão chegaram. O lugar virou moda, é point. Ali vejo Ricardo Freire (quem descreve viagens melhor do que ele?) em uma mesa imensa, são as pessoas do seu blog, no café da manhã, comendo o ovo no pão (precisa comer, para saber), enquanto prefiro a coalhada caseira com mel ou granola e o misto-quente no pão de miga.

O Las Chicas tem café da manhã, depois serve almoço, um "quilo" sofisticadíssimo, com a sabedoria de Carla e Carolina, no fim da tarde é happy hour e finalmente lanche ou jantar. Quero dizer que se tornou lugar preferido pelas mulheres. Lindas mulheres juntam-se no Las Chicas para negócios, fofocas, jogar conversa, exibições (o que há de bolsa Vuitton, Hermés!). Sonia Racy, Joyce, Mônica Bergamo, mandem seus fotógrafos.

Caminho, um e outro comenta a volta do Peugeot caçamba, um mistério. Passa semanas estacionado, some, retorna. Um carro lotado de papéis, folhetos, revistas, catálogos. Livre somente o banco do motorista. Dentro vislumbrei um pneu, um caixote, jornais, provas de um livro sobre o Cepal, um volume sobre A História do Pensamento Econômico, outro sobre a Instabilidade e a Criatividade nos Mercados Financeiros Internacionais, um volume dos Arquivos de Celso Furtado, outro com o título Em Busca do Novo, um estudo sobre O Brasil e o Desenvolvimento da Obra de Bresser Pereira, um exemplar da revista Inteligência com a chamada de capa Não Vai Dar Certo. Finalmente o livro de Drauzio Varella, Por Um Triz. E blocos, revistas, sacolas, garrafas de plástico, quadros a óleo. O que significa tudo isso? De quem é esse caro que permanece semanas estacionado?

Ninguém parece saber quem é o dono, o que significa aquele depósito. Na manhã de domingo, olho longamente para o Peugeot, volto para ler os jornais, deixo o dia escorrer e ao dar comida aos gatos vejo que também tenho fome, vou para o Buttina, em cujo jardim posso comer debaixo de jabuticabeiras, posto em sossego e feliz com este pedaço de Pinheiros.

JOAQUÍN MORALES SOLÁ

Aumenta distância entre Argentina e EUA
JOAQUÍN MORALES SOLÁ
O Globo - 25/03/2011

Nem George W. Bush expressou, como acaba de fazer Barack Obama, o grau de tensão entre a Argentina e Washington. Diferentemente do Brasil, país com o qual o governo americano sabe em que coisas coincide e em que coisas diverge, a atitude da Argentina é sempre um mistério. Nada mais expressivo desse enigma que o escândalo recente tendo como centro a carga de uma avião militar americano, que chegou a Buenos Aires no marco de um acordo de cooperação com a Polícia Federal.

As coisas, é verdade, já não vinham bem. Segundo material do WikiLeaks, publicado por "La Nación", Cristina Kirchner deixou de praticar uma obamamania manifesta para cultivar rapidamente uma política de oposição à gestão do presidente americano. Alguns buscam as razões dessa mudança no ressentimento que provocou na presidente argentina a distância que o próprio Obama colocou. Ele recebeu na Casa Branca, com honras, os presidentes de México, Brasil, Colômbia, Chile e Peru. Mas jamais achou uma brecha em sua agenda para atender pessoalmente à presidente argentina.

Os porta-vozes de Washington nunca foram claros sobre as razões para essa frieza; limitaram-se a apontar "problemas de agenda" ou destacavam, quando avançavam um pouco mais, as características "imprevisíveis" do governo dos Kirchner.

Esse afastamento de Obama foi ainda mais inexplicável na última crise econômica internacional, que depositou a condução mundial do problema no G-20. A Argentina é, junto com Brasil e México, um dos três países latino-americanos que integram esse exclusivo clube da política internacional. Ainda assim, Cristina Kirchner só recebeu de Obama um encontro fugaz, de 10 minutos, numa reunião em que se discutia a segurança nuclear. Quase nada.

Esse desagrado argentino se converteu em tormentas de rancor quando se soube que Obama sobrevoaria o território argentino, sem pisá-lo, em seu giro latino-americano dos últimos dias. É realmente estranho para a política externa dos EUA que um presidente americano viaje do Brasil ao Chile sem passar nem um minuto na Argentina.

O governo americano escudou-se no pretexto de que a Argentina está em meio a um processo eleitoral, e que seu presidente dele não quer participar. Faltam sete meses para as eleições presidenciais argentinas. O argumento, a rigor, foi pouco consistente.

Não obstante, o posterior decurso dos acontecimentos pareceu dar razão aos analistas americanos, que aconselharam a seu presidente não aterrissar em Buenos Aires. O que se viu aqui foi um governo decidido a fazer campanha eleitoral contra os Estados Unidos.

"Já que não podemos fazer campanha com Obama, a faremos contra Obama", admitiu há pouco, com uma dose de cinismo, um cristinista. Esse é agora um eixo muito visível da campanha presidencial do governo.

O escândalo do avião caiu no centro dessa estratégia. Algumas armas, cuja numeração não coincidia com o estipulado no inventário, serviram para confiscar parte da carga do avião. A Justiça argentina determinou que "não houve delito" por parte dos americanos, mas o governo argentino retém uma porção da carga.

Funcionários kirchneristas assinalaram que estão averiguando agora se houve intenção do governo americano de vender esse material no mercado negro argentino de armas. A ofensa chegou então ao cúmulo. O conflito é sério, como o classificou Obama, porque o Departamento de Estado continua reclamando esse material, que inclui algumas chaves secretas de comunicação do Departamento de Defesa dos EUA. Para piorar, o próprio chanceler Héctor Timerman (que foi embaixador em Washington a até pouco tempo) participou pessoalmente do confisco das armas e de valises com material militar sensível americano.

O governo argentino não resolveu nada ainda sobre esse conflito, apesar da insistência dos funcionários de Obama. Porta-vozes de Washington disseram que sentiam ter caído "numa armadilha argentina" e a compararam com o que aconteceu a Bush em Mar del Plata na cúpula americana de 2005. Tudo parecia ir bem nos preparativos até que os americanos pisaram no solo argentino; então, o governo dos Kirchner se converteu em beligerante frente a Washington.

As distâncias prévias aumentaram ainda mais quando, nos últimos dias, o chanceler Timerman expôs a única posição argentina que se conhece sobre a ação de tropas ocidentais aliadas para deter a carnificina de Muamar Kadafi contra os rebeldes ao seu regime despótico.

"Não tinham sido esgotados os meios diplomáticos", disse o chanceler, num claro questionamento da decisão dos principais países ocidentais. O governo de Cristina Kirchner foi sempre refratário a criticar o regime de Kadafi desde que começou a revolução em vários países árabes. Kadafismo e peronismo estão unidos por laços imemoriais.

Chamou a atenção, contudo, aquela declaração de Timerman. Quantos civis mortos eram necessários para "esgotar os meios diplomáticos"? Quanta devastação devia perpetrar um dos ditadores mais pitorescos, e mais sanguinário também, do mundo? Como continuar sustentando que os direitos humanos são um eixo fundamental da política externa argentina quando se esquecem dos direitos dos líbios indefesos?

A condição "imprevisível" do governo dos Kirchner é, talvez, o argumento mais sincero do governo americano quando justifica seu afastamento da Argentina. Carece de razão? Um presidente americano só seria bom se tivesse de se moldar à política autorreferencial de Cristina.

Por sua vez, um ditador é bom quando faz parte da melodia do kirchnerismo. Essas contradições entre o discurso e a prática explicam, melhor que qualquer outra coisa, a frase curta e clara que Obama dedicou ao país dos Kirchner: "O conflito é sério."

JOAQUÍN MORALES SOLÁ é jornalista. © La Nación

FELIPE RECONDO E LEANDRO COLON

Mais um obstáculo para o procurador
FELIPE RECONDO  E  LEANDRO COLON
O Estado de S. Paulo - 25/03/2011

Descoberta de encontro secreto pode interferir nos planos de Roberto Gurgel de continuar no comando do Ministério Público

A descoberta do encontro secreto entre o ex-governador José Roberto Arruda e o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pode interferir em seus planos de continuar no comando do Ministério Público por mais dois anos. Seu mandato termina em julho, e Gurgel já está em campanha aberta para ser reconduzido pela presidente Dilma Rousseff.

As explicações que Gurgel terá de dar sobre a conversa reservada que manteve com Arruda, pivô do escândalo de corrupção no DF, podem fragilizar seu nome e esvaziar o apoio que teria dos integrantes do MP. Sem esses votos, Gurgel poderia perder a primeira posição na lista tríplice que é feita pela Associação Nacional dos Procuradores da República e encaminhada à Presidência.

Gurgel já enfrenta um embaraço junto ao governo: parte dos problemas enfrentados no Tribunal Superior Eleitoral por Dilma Rousseff na campanha de 2010 é creditada a ele, que indicou a subprocuradora Sandra Cureau para atuar como fiscal do processo eleitoral no TSE. Sandra entrou com sucessivos processos contra Dilma. Integrantes do governo cobraram pulso forte de Gurgel para ele controlar a atuação da subprocuradora.

Antes mesmo desses fatos novos, assessores de Dilma diziam que ela não perderia a oportunidade de nomear a primeira mulher para comandar o Ministério Público, o que aumenta a cotação da vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat. Se for a mais votada na eleição interna do MP, Duprat deverá ser nomeada por Dilma.

MAC MARGOLIS


O ''modelo Dilma''
MAC MARGOLIS
O Estado de S. Paulo - 25/03/2011

Há apenas três meses, com a troca de guarda no Palácio do Planalto, a especulação corria solta entre dez em dez analistas de política externa. Seria a nova presidente Dilma Rousseff uma versão recauchutada do seu antecessor e mentor político, também afeita a causas arriscadas e a retórica inflamada? Ou romperia com o estilo Lula, trazendo a diplomacia brasileira de volta à serenidade e ao equilíbrio tradicional?

A resposta já começa a ser esboçada. Ontem, em Genebra, quando o Brasil votou com a maioria no Conselho de Direitos Humanos da ONU, ajudando a nomear um relator para avaliar a situação no Irã, o sismo também se registrou. O apoio do Brasil à resolução não só frustrou Teerã, que pressionava aliados e parceiros para derrubar a medida como também marcou a nítida divergência do governo Dilma com a política de seu antecessor.

"Não cabe ao Brasil sair por aí distribuindo certificados de bom ou mau comportamento", dizia com frequência Celso Amorim, chanceler do governo Lula. Antes trabalhar discretamente, puxando a orelha de aliados estratégicos, do que bradar contra o mau do mundo aos holofotes, repetia. Soava simpático, espécie de reedição diplomática do homem cordial: uma política calcada na convicção de que não haja querela entre amigos que não possa ser resolvida. Acabou sendo lembrado como o refrão da indulgência.

Quem apostaria que o governo Dilma fizesse diferente? Afinal, sua candidatura era invenção assumida de Lula, que a ciceroneou mundo afora e nunca deixou de sussurrar no seu ouvido. Ela era braço direito de Lula quando este posou sorridente ao lado de Raúl Castro. Nada comentou quando Lula pronunciou a Venezuela do autoritário Hugo Chávez como um "modelo" de democracia. Tampouco levantou a voz quando Lula se lançou como avalista de Mahmoud Ahmadinejad no barroco acordo nuclear, improvisado de última hora para poupar Teerã de sanções internacionais.

É fato que o primeiro sinal de mudança veio cedo, quando Dilma era ainda presidente eleita. Talvez tenha sido o seu feminismo tardio, que virou marca registrada na campanha presidencial. Ou, mais provável, era a sua própria experiência nas prisões da ditadura brasileira. E por que o Brasil se abstivera em vez de apoiar a decisão da ONU de investigar abusos de direitos humanos no Irã? "Não concordo com a forma que o Brasil votou."

Poderia ter sido um desabafo pontual, destempero de uma estreante na política eleitoral. Mas, ao assumir a presidência, Dilma não só não desmentiu suas declarações da véspera, mas afirmou-as na votação de ontem. "Ao votar a favor da resolução, o Brasil deixou nulo os meses de lobby do governo iraniano", comentou a ONG Campanha Internacional para Direitos Humanos no Irã. O mundo novamente reparou.

É CORRESPONDENTE DA "NEWSWEEK" E COLUNISTA DO "ESTADO"

CLAUDIO J. D. SALES

Políticos, instituições e o passado incerto
CLAUDIO J. D. SALES
O Estado de S. Paulo - 25/03/2011

Um grupo de deputados federais acaba de apresentar o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) n.º 10/2011 para suspender uma decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que encerrou recente polêmica sobre o reajuste de tarifas de eletricidade. Esse projeto, que implicaria custosos litígios sem perspectivas de sucesso, evidencia o interesse de certos políticos por agendas que se distanciam do interesse público.

A iniciativa nasceu por motivações pessoais de poucos parlamentares com objetivos eleitorais. Basta pesquisar os temas explorados em suas campanhas nas últimas eleições para perceber como essa bravata contra empresas locais distribuidoras de energia é essencial para a construção de sua imagem de "defensores do povo".

Há oportunidades mais concretas e maiores em termos econômicos para "defender o povo" e reduzir a conta de luz, mas estas não interessam a esses parlamentares, porque seu envolvimento em tais causas significaria admitir que o inimigo a ser combatido é a carga tributária de 45% que onera a conta de luz. Carga, aliás, que foi sendo aumentada ao longo dos anos por iniciativa ou com o aval do Congresso.

A bravata tomou corpo na Câmara dos Deputados pela falta de tempo dos demais parlamentares para entender um tema complexo. Os deputados que tiverem tempo para examinar o tema perceberão que estão sendo induzidos ao erro.

Tudo começou com um precipitado acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que, posteriormente, foi superado por outro acórdão do mesmo TCU, segundo o qual não houve "descumprimento de dispositivos legais ou de regras inerentes aos contratos de concessão" (Acórdão n.º 1.268/2010). Obviamente, os deputados interessados na controvérsia "se esquecem" de mencionar o acórdão mais recente e continuam divulgando o acórdão superado, confundindo seus colegas parlamentares. A equivocada controvérsia tem que ver com a metodologia de reajuste das tarifas e uma parcela das receitas destinada aos chamados "encargos setoriais", quando se considera o crescimento do mercado.

A Aneel analisou a questão de forma minuciosa e transparente por meio de audiências públicas e propôs um aditivo aos contratos de concessão, acatado por todas as distribuidoras, para modificar, daqui para a frente, a equação de reajuste tarifário. Em seguida, o regulador examinou a legalidade da equação empregada entre 2002 e 2009. O entendimento da Aneel e da Advocacia-Geral da União é de que a equação era coerente com as leis, a regulamentação e os contratos de concessão.

Assim, não faz sentido um acerto de contas retroativo e intempestivo. É por isso que o PDC não terá êxito. Será uma perda de tempo, uma tentativa de atropelo à decisão do regulador e uma ameaça ao papel das instituições. Afinal, o Congresso virou regulador? E, pior ainda, sem nenhum preparo para a função?

Por que esses "defensores do povo" não direcionam sua energia para oportunidades que estão na pauta do Congresso e que podem beneficiar imediata e significativamente o consumidor? A primeira consiste em rejeitar a proposta do governo, encaminhada via MP 517, de prorrogação do encargo Reserva Geral de Reversão (RGR) por 25 anos adicionais. Se o Congresso impedir essa prorrogação, o consumidor economizará R$ 40 bilhões. A segunda oportunidade de desonerar o consumidor ou o contribuinte brasileiro em R$ 5 bilhões é a rejeição pelo Congresso de outra proposta do governo que alteraria o Tratado de Itaipu e aumentaria o generoso pacote de benefícios já oferecido ao Paraguai. Feitas as contas, os deputados que de fato querem defender seus eleitores têm em suas mãos duas oportunidades que somam R$ 45 bilhões. Onde estão esses parlamentares?

O governo e sua base aliada no Congresso precisam agir. Agendas eleitorais de poucos indivíduos são incompatíveis com a necessidade que o País tem de edificar instituições fortes e construir um setor de infraestrutura eficiente e autossustentável.

PRESIDENTE DO INSTITUTO ACENDE BRASIL.

GOSTOSA PARA COMER

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO

A difícil decisão do STF
EDITORIAL
O Estado de S. Paulo - 25/03/2011

Nove meses depois da promulgação da Lei da Ficha Limpa, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu - implicitamente - que ela é constitucional. E - explicitamente - que a sua aplicação nas eleições do ano passado feriu a Constituição. A questão da vigência da lei provocou um legítimo confronto doutrinário nas duas vezes em que a Corte se pronunciou a respeito. A primeira votação, no julgamento do recurso de um candidato a deputado estadual em Minas Gerais, barrado pela Justiça Eleitoral por ter sido condenado por improbidade administrativa, terminou empatada. Cinco ministros concordaram com o argumento de que a aplicação imediata da lei contrariava a Constituição. Cinco outros discordaram.

O julgamento ficou em suspenso, como se sabe, porque não havia sido preenchida a vaga do ministro Eros Grau, que se aposentara, e o presidente do Tribunal, Cezar Peluso, se recusou a dar o voto de Minerva. Nomeado pela presidente Dilma Rousseff o décimo primeiro ministro, Luiz Fux, o caso foi retomado e resolvido anteontem. Visto que nenhum dos 10 mudou seu voto, coube a Fux superar o impasse - e ele desempatou em favor do requerente. Não deixou, porém, de saudar a Ficha Limpa como "a lei do futuro" e "uma aspiração legítima do cidadão brasileiro", pelo seu potencial moralizador da política nacional. A decisão não beneficia apenas o político mineiro que impetrou o recurso. Vale para todos quantos receberam votos suficientes para assumir uma cadeira nas Assembleias Legislativas, Câmara dos Deputados e Senado Federal, mas não puderam assumir por causa de seu prontuário.

Cerca de 30 deles recorreram ao Supremo. O caso mais notório é o do ex-governador do Pará Jader Barbalho, considerado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) depois de já ter sido eleito para o Senado. Ele havia caído na malha da Ficha Limpa por ter renunciado à cadeira na mesma Casa, em 2001, para escapar de um processo de cassação movido por seus pares. Dois outros candidatos impugnados ao Senado - Cássio Lima, na Paraíba, condenado por abuso de poder econômico, e João Capiberibe, no Amapá, por compra de votos - também serão empossados. O número de assentos na Câmara que mudarão de dono depende da revisão do cálculo do quociente eleitoral. A julgar pelos comentários publicados na internet, é geral o repúdio à decisão do STF. Mas, sem jogo de palavras, trata-se de uma injustiça. Embora por maioria de 1 voto, a Corte preferiu uma de duas alternativas perfeitamente sustentáveis.

No plano do direito, tratava-se de dar primazia ou ao artigo 14 ou ao artigo 16 da Carta. O primeiro, em nome da probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato, "considerada a vida pregressa do candidato", prevê a inelegibilidade dos que tiverem, entre outras coisas, atentado contra o patrimônio público. É o princípio que ampara a Lei da Ficha Limpa, invocado, por exemplo, pelo ministro Ayres Brito. O segundo artigo, citado por seu colega Gilmar Mendes, relator do processo, estipula que "a lei que alterar o processo eleitoral" não se aplica à eleição que ocorra até um ano depois da data de sua sanção. São exemplos da detalhista Constituição brasileira, na qual coexistem preceitos conflitantes entre si, quando não paradoxais.

No plano dos fatos, a questão a dirimir era se a Ficha Limpa alterou efetivamente o processo eleitoral. Essa é a convicção do ministro Luiz Fux, para quem a criação de novas regras de elegibilidade às vésperas de um pleito afeta a segurança de candidatos e eleitores. Disso discorda o ministro Ricardo Lewandowski, também presidente do TSE. Ele afirmou que "não se verificou alteração da chamada paridade de armas" entre os candidatos. De toda maneira, fiel ao princípio de não se manifestar sobre algo além do que lhe foi pedido, o STF deixou em aberto o ponto talvez mais polêmico da lei: será que ela pode bloquear candidaturas de políticos condenados por malfeitos antes da sua promulgação? Essa questão entrará em cena se não no pleito municipal do ano que vem - o primeiro sob a égide da Ficha Limpa - com certeza nas eleições nacionais de 2014. E o Supremo será chamado de novo a falar.

NELSON MOTTA

O poder dos sentimentos
NELSON MOTTA
O Globo - 25/03/2011

A relação de amor e ódio entre Lula e Fernando Henrique já foi estudada em um livro de Paulo Markun com o sugestivo título de "O sapo e o príncipe". Mas, além de um estudo psicanalítico, esse caso passional daria um romance.

Sim, os políticos também amam, também sofrem com rejeição e abandono, com ciúmes e traições. Eles têm paixão pelo poder, mas também outros amores, ambições e frustrações, da carne e do espírito. Lula e Fernando não são exceção.

Nem Dilma. Com todo respeito.

Mesmo na solidão do Planalto, ou por isto mesmo, quem sabe o seu coração não bate mais forte por alguém? Por um amor impossível e platônico ? Ou por alguma fantasia, afinal, ela é presidente, mas é mulher. E por que não uma relação amorosa plena? Ela teria todo direito. Martha Suplicy trocou de marido quando era prefeita e, de novo, como senadora. Por que a presidenta seria diferenta? Se Itamar namorava, por que ela não poderia?

Ao contrário de Lula, Dilma tem sido gentil, generosa e simpática com Fernando. Já fez reconhecimentos públicos de méritos de seu governo e cada vez faz menos críticas à sua administração. Conversou animadamente com ele em uma solenidade e o convidou a visitá-la, não só com o seu partido, mas também sozinho. Depois, no banquete de Obama, todo mundo viu o clima que rolou entre eles, brindando entre sorrisos e charmes. O velho professor continua em forma, a nova presidenta parecia encantada. Depois, ele falou maravilhas dela para a imprensa.

Dilma está mais segura, emagrecendo, melhorando o visual, tentando adoçar seu estilo duro e discreto. Mas as duronas também amam. E como ! É um clássico de Hollywood. Dilma é, tem que ser para ter chegado onde chegou, uma mulher forte e intensa, que pode ser muito atraente para senhores maduros apaixonados pelo poder.

Não seria nenhum absurdo se Dilma e Fernando quisessem se conhecer melhor. Ela poderia trocar ideias e afetos com um homem inteligente, culto e charmoso e não ficaria restrita às opiniões do circulo íntimo palaciano. E de Lula, que morreria de ciúmes. Seria uma espécie de Romeu e Julieta maduro - mas com final feliz.

EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO

MÔNICA BERGAMO

CLUBE DA LULUZINHA
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/03/11

As nove ministras do governo Dilma Rousseff (PT) falaram à "Marie Claire" que chega às bancas hoje. Da esq. para a dir., Tereza Campello, Miriam Belchior, Iriny Lopes, Maria do Rosário, Izabella Teixeira, Ideli Salvatti, Ana de Hollanda, Helena Chagas e Luiza Bairros foram fotografadas no Palácio do Planalto. Tereza Campello, do Desenvolvimento Social, falou sobre a descoberta recente de um câncer de mama. "Estou fazendo uma terapia preventiva." Ana de Hollanda, da Cultura, negou o namoro com o compositor Jards Macalé. "Sou muito amiga do Macalé. Não temos nada além disso."

OLHO NA FUMAÇA
O promotor Silvio Oyama, que investiga possíveis irregularidades na inspeção veicular ambiental, quer levar o Instituto de Pesos e Medidas para aferir todos os equipamentos usados em SP. Existem questionamentos sobre a possibilidade de as máquinas interferirem no resultado do teste -e relatos de que um carro reprovado por um aparelho foi aprovado em outro, logo em seguida, depois de o motorista ter reclamado da inspeção.

PROVA
O presidente da Controlar, Harald Zwetkoff, diz ser impossível que um teste tenha sido repetido imediatamente em outro equipamento da Controlar após reclamação. "A prova é feita uma vez só." E que o Inmetro faz aferição periódica dos aparelhos.

PORTA DE ENTRADA
O governo de SP quer fazer um mapeamento da Aids nas prisões. O exame deverá ser feito no momento em que o preso der entrada, permitindo um tratamento imediato.

QUANTO RISO
Jô Soares, grande homenageado do "Risadaria", se apresentou na abertura do festival, anteontem, na Bienal do Ibirapuera. O palhaço americano Avner The Eccentric, uma das atrações do evento, circulou pelo coquetel ao lado do humorista Paulo Bonfá.

MESA REDONDA
A pedido do Palácio do Planalto, deputados e senadores do PT se reuniram em torno de Guido Mantega num jantar, na terça. Dias antes, o ministro da Fazenda fora vítima de fogo amigo que obrigou Dilma Rousseff a reafirmar apoio a ele.

CEGO, SURDO E MUDO

São fortes as suspeitas de parte do governo de que o próprio Roger Agnelli, presidente da Vale, vazou a informação de que Mantega tratou de sua substituição com o Bradesco, tentando gerar rede de solidariedade a ele. Roger, por meio de sua assessoria, dizia que nem sequer sabia que tal reunião ocorrera.

BRASILEIRINHOS

O ator Daniel de Oliveira será um dos protagonistas da minissérie "Brazucas", nova produção da O2, de Fernando Meirelles, com a TV Globo. A série falará da vida de brasileiros no exterior.

REPLAY
O presidente do Cade, Fernando Furlan, diz que, se o Clube dos 13 enviar denúncia contra a Globo por negociar isoladamente o Brasileirão, será aberta investigação preliminar na SDE (Secretaria de Direito Econômico). Se forem encontrados "indícios de violação da concorrência de mercado", o Cade também abrirá processo.

SUSHI DO BEM

O chef Jun Sakamoto está tentando trazer ao Brasil o músico japonês Ryuichi Sakamoto, radicado em Nova York, para um concerto beneficente em prol do Japão, onde moram seus tios e primos. Paula e Jaques Morelenbaum também toparam se apresentar no evento, na Sala São Paulo, ainda sem data marcada. Sakamoto diz que pediu ajuda a Tony Bellotto e Fernanda Takai para juntar Titãs e Pato Fu em outro show beneficente, no ginásio do Ibirapuera.

CURTO-CIRCUITO


Dominguinhos e Ricardo Herz se apresentam de hoje a domingo com a Orquestra Jazz Sinfônica, no Auditório Ibirapuera. Classificação: livre.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, encerra hoje o Congresso de Direito Comercial, na sede da Associação dos Advogados de SP.

O espetáculo "Chico no Feminino" será apresentado de hoje a domingo no Teatro de Dança. Classificação: livre.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

CARLOS HEITOR CONY

O aprendiz de Quasímodo
 CARLOS HEITOR CONY

FOLHA DE SÃO PAULO - 25/03/11

FOI NO início de maio. Eu não me habituara a conviver com aqueles monstros que até então se limitavam às paredes do meu quarto. Eles agora me acompanhavam pelas ruas. Numa terça-feira, fui ao cinema no Boulevard des Capucines, saí no meio do filme que era uma droga -eu não me interessava por mais nada.
Resolvi andar da Opera até o Quartier. Era longe. O dia estava bonito, nem frio nem calor, eu não tinha nada que fazer, procurava retardar a chegada ao hotel. Peguei uma rua deserta e ouvi passos atrás de mim. Olhei. Não vi ninguém. Andei mais um pouco. Os passos me acompanhavam.
Voltei-me. No chão, lá estavam monstros, rastejando. Pareciam caranguejos, cobras absurdas, cheias de garras. Eram escuros, feitos de nada, mas obstinados, meus. Comecei a suar, acendi um cigarro. Nas primeiras tragadas, eles pararam de me acompanhar. Corri. Sem força, caí numa praça que não reconheci. Ninguém me socorreu.
Quando melhorei, reiniciei a caminhada. Os monstros continuavam. Sempre atrás de mim. Entrei num bar iluminado, para tomar água, a boca estava seca, embora entupida de espuma e baba. Meu aspecto assustou as poucas pessoas que bebiam café ou brincavam num fliper. Afastaram-se de mim. Eu devia repugnar-lhes.
Alguns daqueles rapazes, talvez, fumassem os seus cigarros. Mas eu exagerara, perdera o controle. E ali ficaria, preferindo enojar os outros, desde que os monstros permanecessem lá fora, na calçada, me esperando.
Não sei por qual motivo um sujeito me deu um soco, um outro me empurrou para fora. Caí na calçada, no meio dos meus monstros. Embaralhei-me com eles. Foi terrível e macabro. Eu me senti um cadáver rolando no meio dos vermes que me comiam.
Gritei. Um guarda apareceu. O carro da polícia. O xadrez. Acho que me espancaram. Me deram uma injeção, adormeci. Fui solto dois dias depois. Estava imundo. Minhas roupas fediam a urina. Eu perdera minhas defesas. Era um bicho.
Foi com vergonha que cheguei ao hotel. O gerente me olhou severamente, e eu me rejubilei porque ainda era capaz de sentir vergonha. Fecharam minha conta, colocaram minhas malas na portaria. Eu não tinha teto. Ninguém tinha nada a ver com o meu vício, havia muitos viciados no mundo, eu passara da conta, comprometia a todos, viciados ou não.
Tentei me hospedar em outros hotéis. Não me aceitaram. Já era manjado no Quartier. Num deles pedi, como esmola, que guardassem as malas, eu me arranjaria depois. Fui para perto do cais, podia sentar num dos degraus que descem até o rio. Ali não chamaria a atenção de ninguém, nem mesmo a minha.
Pensei no menino limpinho que a mãe beijava, que levou um dia para o banheiro e lhe deu um pêssego aveludado, cheio de sumo, que ela guardara para ele, não queria que o irmão soubesse que aquele pêssego era só para ele, os monstros estavam longe mas esperavam, escondidos na caverna que, tal como o pêssego, era só para ele. O ele que era eu.
""Voilá"..." Vinda de trás, a voz me devolve ao cais do Sena. Não era a voz de um dos monstros que me seguiam, mas de um cara comum, que conseguia dizer alguma coisa sem dizer nada. Me ofereceu outro cigarro. Não sei porque tive vontade de gritar, mas aceitei o baseado. A fumaça empurrou o grito que já estava na garganta. Grito que voltou para dentro, embrulhado nas minhas entranhas.
Naquele instante, um dos sinos da Notre Dame bateu, o som era um pássaro de bronze que tomou conta do espaço. Virei o rosto. "Mamãe, arranjei um bom emprego...", o corcunda mal informado escrevendo para a mãe na província, descolara um bom emprego, sineiro na imensa catedral gótica. Mandava notícias para casa, ficassem tranquilos, mesmo deformado, ele era alguém, não sabia o que esperava, a cigana com sua cabra, a cena final, o povo enfurecido, querendo linchá-lo.
Eu não tinha o povo atrás de mim. Tinha meus monstros. Não adiantava me refugiar na agulha mais alta da catedral. Não precisava amar uma cigana, protegê-la da cólera de todos. Nem mesmo me proteger, a perdição estava dentro de mim, misturada com o gosto de um pêssego impossível e infinito.

JAPA GOSTOSA

LUIZ GARCIA

Limpando as fichas
LUIZ GARCIA 

O GLOBO - 25/03/11 

Nas discussões e julgamentos sobre a Lei da Ficha Limpa vale a pena - principalmente em face da mais recente decisão do Supremo Tribunal Federal - não esquecer um dado fundamental: não há registro de qualquer outro projeto de lei que, sem produzir qualquer benefício direto e concreto para o bem-estar do cidadão, tenha sido respaldado por manifestação tão inequívoca e maciça de apoio da sociedade.
A Lei da Ficha Limpa nasceu de um movimento social absolutamente sem precedentes na história política do Brasil. Principalmente por isso, é decepcionante o resultado da votação do Supremo, esta semana, determinando que a lei não valeu para as eleições do ano passado. Foi uma vitória para 29 candidatos fichas sujas.
Não se pode, ou não se deve, discutir a legitimidade da decisão. O STF pode ter razões que o coração da opinião pública desconhece, mas são - pelo menos, nenhum especialista disse algo em contrário - motivos juridicamente respeitáveis. O principal deles é o de que o artigo 16 da Constituição não permite mudanças na legislação eleitoral no ano anterior ao das eleições. Registre-se que cinco ministros do Supremo tiveram opinião diferente.
E nenhum ministro colocou em dúvida a legitimidade da lei: o que se discutiu foi exclusivamente o início de sua aplicação. Os defensores da validade da lei já nas últimas eleições argumentaram que estavam em confronto dois artigos da Constituição: o que protege a honestidade na vida pública e aquele que determina o momento em que uma lei começa a valer. Deve-se reconhecer que o artigo 16 da Constituição determina que normas eleitorais não podem ser criadas a menos de um ano antes de eleições. Mas cinco dos onze ministros consideraram que essa exigência não seria mais forte do que a necessidade de moralizar o processo eleitoral.
Para o eleitor que não entende dessas coisas o melhor argumento seria bem simples: moralidade, quanto antes, melhor. E a opinião pública pode ir se preparando para uma segunda batalha: a discussão sobre se podem ser punidos pela lei candidatos que se portaram mal antes que ela existisse.
É bem provável que essa questão tenha de ser decidida pelo Supremo. Pelos votos na decisão desta semana, o STF provavelmente ficará contra os fichas sujas - e a interpretação jurídica do processo eleitoral coincidirá com a vontade da opinião pública. 

ANCELMO GÓIS

Calma, gente
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 25/03/11

Roger Agnelli deve permanecer mais tempo no comando da Vale. Sua substituição não se daria este ano. Esta parece ser a posição do Bradesco, incomodado com a maneira com a qual querem enxotar Agnelli, quadro querido no banco.

Clube da Luluzinha

Dilma janta hoje com 30 cineastas mulheres, por causa do mês dedicado a elas. Os marmanjos do cinema estão morrendo de inveja, e um deles, de brincadeira, lamentava não ter nascido fêmea. 

Na toca dos leões
Ana de Hollanda, que ficou sob intenso tiroteio por causa do direito autoral e do Creative Commons, vai se reunir terça com a tribo dos músicos. A ministra abrirá o primeiro de uma série de encontros setoriais da Funarte. O próximo será com a turma do teatro.

Mais liberal

Depois de 18 meses de trabalho, fica pronto hoje o relatório da Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia, formada por 20 notáveis, entre os quais os ministros Carlos Veloso e Ellen Gracie. Defende uma postura mais liberal e menos moralista.

Fala sério, fortão

O ex-governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger, orador oficial do Fórum Mundial de Sustentabilidade, em Manaus, ouviu, atento, o discurso do governador Omar Aziz sem tradução simultânea. Ninguém sabia que o fortão entendia português. Nem ele.

Triângulo rosa
A Mescla/Summus lança em abril uma biografia de Rudolf Brazda, 97 anos, último gay sobrevivente de Buchenwald, campo de concentração alemão. O livro, de Jean-Luc Schwab, chama-se “Triângulo rosa”, símbolo dos gays no nazismo.

Sete jogos no Rio
A Fifa garantiu ontem que haverá pelo menos quatro jogos em cada uma das 12 cidades escolhidas para a Copa de 2014. É uma boa notícia para capitais menores como Natal, Cuiabá e Manaus. Em outros mundiais, houve cidades que sediaram um único jogo.

Já... 
O Rio, palco da final da Copa, terá o maior número de partidas: sete. Maitê, a legítima Maitê Proença, a linda atriz, convivia pacificamente com um perfil falso dela no Twitter, até que, ontem, o impostor criticou Maria Bethânia por causa da história do blog da cantora, autorizado pelo governo federal a captar R$ 1,3 milhão: 
— Maria Bethânia é a nossa rainha, e eu, a sua súdita mais devota. Jamais faria outra coisa que não fosse cobri-la de ouro e glória.

Operação abafa
O Tribunal de Contas do Município do Rio analisa proposta do conselheiro Fernando Bueno para não enviar mais à Câmara de Vereadores os resultados de suas inspeções e auditorias. Parece censura. E é. 

Ritmo de reggae

A banda Cidade Negra vai gravar em inglês “Over the raibow”, do filme “Mágico de Oz”, em ritmo de reggae. 

Meu Deus
José Júnior, do AfroReggae, tem andado com segurança. 

Dedo na tomada
A prefeitura de Caxias, RJ, não paga a Ampla há seis meses. Deve uns R$ 6 milhões. 

Quer pirarucu?
Nem chocolate nem bacalhau. A aposta do grupo Pão de Açúcar para a Páscoa é o pirarucu. A rede comprou 12t do peixe amazônico, que é mais barato. 

Chance perdida 
Pelas contas do Rio Convention & Visitors Bureau, o fluxo de turistas americanos e brasileiros, respectivamente no Brasil e nos EUA, poderia crescer mais de 50%, caso a emissão de vistos fosse facilitada. 

No mais 
Em nome da Constituição, o STF adiou a faxina na política brasileira para 2012. Se é para cumprir a Constituição, que tal começar pelo dispositivo que proíbe a censura à imprensa? O STF tem feito vista grossa aos vários casos. Com todo o respeito.

GOSTOSA

JOSÉ SIMÃO

Dengue! Mosquito picou o Bial! 
JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SÃO PAULO - 25/03/11

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
"Japão reconstrói rodovia destruída por terremoto em seis dias." Ou seja, o Japão vai ficar pronto antes do estádio do Corinthians! O Japão vai ficar pronto pra Copa de 2014. Antes do Brasil!
E mais um pra minha série Os Predestinados. É que no programa da Leda Nagle apareceu um médico epidemiologista pra falar sobre dengue: dr. Roberto MEDRONHO!
O doutor Roberto que me desculpe, mas ele deve matar o mosquito no SUSTO! Socorro! Corre! Lá vem o doutor Medronho! Rarará!
E a manchete do Sensacionalista: "Em vez de arara azul, animação "Rio 2" será estrelada pelo mosquito da dengue". Aedes Azul! O avatar do mosquito! Mas diz que o Eduardo Paes já tem um plano para aniquilar a dengue: O FIM DA PICADA! Rarará! E diz que enquanto o mosquito pica, o Paes picas!
E como me disse uma amiga carioca: "Eu não peguei dengue AINDA!". E o mosquito pica celebridades! Chegou bêbado e a mosquita falou: "Você picou o Zeca Pagodinho de novo?". E aí o mosquito chegou em casa falando coisas sem nexo: "Você picou o Bial?". Rarará!
E a mosquita ameaçando: "Se você chupar a Susana Vieira, você apanha". Rarará! Aí merece!
E esta outra: "Idosa de 92 anos atira no vizinho após ter beijo negado". O cara preferiu um tiro. Será que é por isso que ninguém nega um selinho da Hebe? Rarará!
E sabe aquele jogo do iPad? "Angry Birds." Agora vai ser com o mosquito da dengue. Angry Aedes!
E o Dia Mundial da Água? Esquecemos de comentar. Economizar água para salvar o planeta.
Aí perguntaram praquela modelo: "Como você faz pra economizar água?". "Ah, eu lavo o cabelo no salão. E todo Dia Mundial da Água, eu coopero. Penduro uma placa na porta do box: "Lave só o que for usar HOJE!""
Cena erótica em chuveiro só em filme. Sabe aquela sensação da água batendo no corpo? Esqueça!
Como diz um amigo meu: "Não dá mais nem pra bater uma no chuveiro!". Rarará!
E no ano passado a Ana Maria Braga mandou a gente tomar banho de canequinha. E como ela lava aquele papagaio dela? Ana Maria Braga não lava o papagaio. Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! 

JANIO DE FREITAS

Pelo menos por enquanto
JANIO DE FREITAS

 FOLHA DE SÃO PAULO - 25/03/11

DIANTE DE UMA decisão por seis votos a cinco, dizer que o Supremo Tribunal Federal decidiu em conformidade com a Constituição, como foi dito no próprio tribunal, tem menos sentido do que concluir que os ministros votaram e decidiram em conformidade com suas cabeças, e pronto.
O que se passou no STF foi bem definido pelo ministro Joaquim Barbosa: ocorria ali, a título de julgamento da validade, ou não, da Lei da Ficha Limpa já nas eleições de 2010, o confronto entre duas correntes de opinião. De uma parte, os adeptos do artigo constitucional que exige ao menos um ano entre alteração da Lei Eleitoral e sua aplicação (art. 16); e, de outra parte, os que dão primazia ao artigo constitucional determinante de inelegibilidade "a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato" (art. 14).
O empate de cinco a cinco entre os ministros, vigente até a tarde de anteontem, foi decidido pelo voto de uma só pessoa, o novo ministro Luiz Fux, que não representa mais a Constituição do que qualquer dos demais integrantes do STF. Mas, na prática, ficou como a própria voz da Constituição. O juiz dos juízes.
Se o indicado para a vaga no tribunal fosse outro, e houve mais nomes em consideração, o lado hoje vencido poderia ser o vitorioso. Onde fica, portanto, a "conformidade com a Constituição" nessa vulnerabilidade ao acaso de uma indicação feita, entre outras, à presidente da República?
A voz original da Constituição lhe foi dada pela Constituinte. Nenhum dos 11 ministros se referiu, porém, ao que a Constituinte achou necessário dizer com o intervalo de um ano entre a alteração da Lei Eleitoral e sua aplicação. Como ficou registrado nos anais, a razão do prazo foi a preocupação em proteger as eleições de arranjos de última hora, os casuísmo feitos para prejudicar determinados candidatos, ou correntes de ideias ou partidos em condições legítimas de concorrer.
Nada a ver, portanto, com prevalência do intervalo sobre as necessárias moralidade pessoal e probidade administrativa, e outras exigências. Mais: estávamos, então, apenas três anos e meio distantes do regime autoritário e ainda sob muitos dos seus rescaldos -condição bastante explicativa e que não deveria ser esquecida sempre que se considere o teor da Constituição.
Argumento muito citado pelos contrários à Ficha Limpa já nos resultados eleitorais de 2010, a necessidade de evitar a "insegurança jurídica" foi outro aspecto interessante emitido pelo STF. Uma só pessoa, que acompanhou cinco ministros como poderia ter acompanhado os outros cinco, decidiu os resultados eleitorais das últimas eleições e das futuras.
Pode-se sentir segurança jurídica sob tal realidade? Eleitos que tiveram a posse recusada e agora serão empossados vão, pelos quatro ou oito anos vindouros, exercer seus mandatos no Congresso ou na administração pública. Estão legitimados, para tanto, por nada menos do que o Supremo Tribunal Federal.
Mas, sejam senadores ou deputados, prefeitos ou governadores, não poderão, no entanto, concorrer nas eleições para prefeito e vereador no ano que vem, quando a Ficha Limpa já terá cumprido a quarentena suprema. Segurança jurídica depende também de coerência e lógica, mas não se sabe onde ficaram.
Ao reafirmar seu voto favorável à validade da Ficha Limpa já nas eleições passadas, a ministra Ellen Gracie achou prudente deixar claro que o adiamento vitorioso não a extingue. E o fez com um toque de humor fervente: "A Lei da Ficha Limpa permanece, o STF não derrubou a lei. Pelo menos por enquanto".
Nada seria possível acrescentar-lhe sobre o STF e a (in)segurança jurídica.

TÔ DE OLHO

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Previdência, um deficit esquecido
VINÍCIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SÃO PAULO - 25/03/11

HOUVE UM tempo no debate econômico brasileiro recente que discussões amargas sobre o deficit da Previdência eram frequentes: semana sim, semana não. O tom variava da negligência populista ao catastrofismo liberaloide. A gente parece ter esquecido a Previdência, embora o governo, na surdina, esteja para modificar o sistema de contagem do tempo para a aposentadoria, sob pressão das centrais sindicais.
A gente esqueceu do assunto, mas seria bom observar que o deficit da Previdência -a diferença entre a arrecadação e os pagamentos de benefícios- deve ficar em torno de 1% do PIB ou até menos neste ano. No ano passado, segundo o governo, o deficit ficou em 1,17% do PIB.
Algo em torno de 1% do PIB ainda é uma enormidade. Representaria o equivalente a um terço de todo o deficit do setor público (deficit nominal, que inclui a conta de juros, de União, de Estados e de municípios).
Mas a coisa já foi muito pior. Em 2006, o buraco nas contas da Previdência representava o equivalente a 1,8% do PIB. Durante quase todos os anos Lula, o rombo previdenciário como proporção do deficit total do setor público flutuava entre 60% e 70%, em geral. O último ano em que o buraco do INSS foi inferior a 1% do PIB havia sido o longínquo 2001. Faz uma década.
A notícia parece desmoralizar os alertas a respeito do impacto do aumento do salário mínimo sobre as contas públicas. Como se sabe, o piso dos benefícios previdenciários é o salário mínimo. Todo reajuste do mínimo eleva as despesas do INSS.
Mais que isso, parece referendar os argumentos "de esquerda" a respeito das contas previdenciárias. Isto é, parte importante do deficit previdenciário seria devida a:
1) Baixo crescimento econômico. Uma economia maior reduz, obviamente, o peso relativo do rombo previdenciário em relação ao PIB. Uma economia rodando mais rápido tende a criar mais empregos; os tributos sobre os empregos é que financiam as despesas do INSS;
2) Baixo nível de formalização do trabalho. Uma fiscalização mais eficiente, o crescimento das empresas e outras medidas indutoras da legalização de negócios e de relações trabalhistas levariam mais dinheiro para o caixa do INSS;
3) Baixos salários. Salários maiores, inclusive o salário mínimo, tendem a reforçar a receita do INSS;
4) Falta de fiscalização de fraudes e desperdícios, além de excesso de renúncias fiscais para empresas e outros grupos;
5) Efeito da Previdência dita "rural", os benefícios para trabalhadores do campo e/ou interior, que, no conjunto, praticamente não contribuem para o INSS. As aposentadorias desse grupo seriam, na verdade, uma modalidade de assistência a idosos pobres, um Bolsa Idoso.
Não se pode negar que o crescimento, a formalização do trabalho, a alta dos salários e a melhoria da fiscalização reduziram o deficit.
Mas, ainda assim, o rombo é de 1% do PIB. Mas, é preciso notar, o aumento da despesa do INSS foi coberto com o aumento da carga tributária. Mas, um terceiro de muitos "mas", o país vive um momento demográfico favorável; dentro em breve, tende a aumentar taxa de indivíduos aposentados em relação aos que trabalham. Ou seja, mesmo num momento muito favorável, o deficit ainda é grande. Não é catástrofe. Mas ainda é problema.

DORA KRAMER

Estreita vigilância
DORA KRAMER

O ESTADO DE SÃO PAULO - 25/03/11

Ruim mesmo é ter de aguentar a impertinência de Jader Barbalho jactando-se de ter tido votos (1,8 milhão) em quantidade superior às assinaturas (1,6 milhão) recolhidas em apoio à Lei da Ficha Limpa. Inclusive porque não é verdade: depois da apresentação formal da proposta à Câmara, a iniciativa recebeu mais de 5 milhões de adesões via internet.
Tirando isso e alguma frustração pelo fato de o Supremo Tribunal Federal não ter seguido, no voto de desempate do ministro Luiz Fux, a orientação que adota desde 1989, de que condições de elegibilidade não estão submetidas ao princípio da anterioridade e, portanto, não precisam estar em vigor um ano antes das eleições, está tudo nos conformes.
O Congresso foi obrigado a fazer o que a maioria dos parlamentares não queria, instituindo uma barreira para candidatos com contas em aberto na Justiça, e a lei já foi genericamente considerada constitucional pelo STF.
Há, é verdade, pontos que ainda podem vir a ser contestados isoladamente por candidatos que se sentirem prejudicados. Por exemplo: são válidos julgamentos feitos por conselhos profissionais? Os prazos de punição não seriam exorbitantes? Condenações por improbidade administrativa, como prevê a lei, podem cassar uma candidatura? E atos cometidos antes da aprovação da lei podem ser levados em conta?
São questões que suscitam polêmica. O ministro Marco Aurélio Mello já se manifestou contra a aplicação da inelegibilidade retroativa. Mas o senador Demóstenes Torres, procurador de Justiça, lembra que o Supremo aceitou o princípio de que a lei pode "retroagir para prejudicar" quando declarou constitucional a cobrança de contribuição para os inativos da Previdência Social.
Que a lei vale é fato, mas é fato também que o STF será instado a voltar a se pronunciar por provocação dos candidatos que se enquadrem na categoria "ficha-suja" e, portanto, caberá ao tribunal zelar pela aplicabilidade da lei.
A julgar pela posição da maioria do tribunal e das saudações feitas ao seu objetivo - exceção feita a dois ou três ministros que não nutrem simpatia pela quebra da presunção de inocência até que os processos transitem em julgado -, há relativa segurança de que a Justiça não vai torná-la letra morta na prática.
De qualquer modo, conviria à sociedade manter-se mobilizada em torno da validade do preceito geral: o de que, como disse o ministro Ayres Britto, "o político que desfila pelo Código Penal com sua biografia não pode ter a ousadia de se candidatar". Ou seja, quem pretende exercer mandato representativo não pode carregar consigo folhas corridas.
Tal exigência não tem nada a ver com agressão aos direitos das minorias nem fere princípios democráticos. De novo, o exemplo já batido, mas incontestável: se é vedado o acesso de processados aos concursos públicos, por que autorizar o ingresso de condenados por órgão colegiado ao Congresso?
Isso não significa dizer que devam ser alimentadas as manifestações de ira ou menosprezo ao Supremo. Tampouco são aceitáveis como resultado de frustração popular conclusões segundo as quais a indiferença à vida política seja o melhor remédio, dado que "nada muda mesmo".
Cumpre lembrar que ministros do Supremo não tomam decisões baseados em vontades pessoais. Interpretam a Constituição. O Congresso, se quisesse, poderia ter votado uma lei semelhante há mais tempo - propostas em tramitação no Legislativo não faltavam para isso - e de forma juridicamente mais perfeita.
Bem como poderia, mediante reforma do sistema eleitoral, dar ao eleitor instrumentos efetivos de punição pelo voto.
Da parte da sociedade, a existência do debate em torno de uma questão até a aprovação da lei da Ficha Limpa relegada a um segundo plano, sem sombra de dúvida ajudará o eleitorado a fazer a sua parte na hora de escolher o candidato.
Ademais, não seria a simples aprovação de uma lei que de uma hora para outra modificaria uma dinâmica malsã arraigada desde os primórdios da República.
Democracia é assim mesmo: dá um trabalho danado, requer paciência, mas vale o esforço.

GOSTOSA

CELSO MING

Continua aquecido
CELSO MING

O ESTADO DE SÃO PAULO - 25/03/11

Quem olha de relance para a curva do desemprego que vai no gráfico ao lado pode ficar com a impressão de que a atividade econômica está em retração no Brasil. Mas é o contrário que está acontecendo.
A economia continua em franco crescimento. O que mudou foi apenas a velocidade. No ano passado o PIB avançou 7,5% e, neste ano, terá mais alguma coisa entre 4,0% e 4,5%.
O desemprego chegou ao seu ponto mínimo em dezembro, com 5,3%. Subiu para 6,1%, em janeiro, e aumentou mais em fevereiro, para 6,4%. Mas está longe de indicar uma piora das condições do mercado de trabalho.
A população ocupada no último mês, aponta o IBGE, estava em 22,2 milhões, a mesma de janeiro. No período de 12 meses terminado em fevereiro, a economia brasileira teve um aumento de 515 mil ocupados (mais 4,1%).
Salvaguardadas as diferenças regionais, as condições hoje são muito próximas do pleno emprego. O mercado de trabalho continua pressionado. Faltam engenheiros, pedreiros, pintores, soldadores, eletricistas - a lista é enorme. O setor com maior redução de ocupação foi o de serviços domésticos. Provavelmente, graças a migração de mão de obra para a indústria ou para o setor de serviços, cujas proporções dentro do PIB crescem ano a ano.
Na Carta Ibre, a ser divulgada nesta segunda-feira, a revista Conjuntura Econômica, da Fundação Getúlio Vargas, avalia que a oferta de trabalho vai se expandindo 1,8% ao ano, acima do crescimento da população economicamente ativa, de 1,5% ao ano. E que esse é um fator limitador do crescimento econômico futuro no Brasil (crescimento potencial).
Não é o único. A poupança doméstica continua baixa demais, o investimento está insuficiente, em torno de 19% do PIB, quando teria de ser de alguma coisa em torno de 24%. Isso exige mais importação de poupança e investimentos.
E tem essa cavalgada dos preços que, medida como custo de vida (IPCA), ameaça ultrapassar os 6% em 12 meses. A inflação elevada demais que ataca a economia é tanto o resultado do crescimento acima da capacidade das pernas quanto fator limitador do crescimento do período seguinte, pois exigirá, como já ocorre, uma política monetária (de juros) mais apertada, combinada com ajustes fiscais (cortes de despesas públicas), cujo resultado será a esperada desaceleração da atividade.
Este início de governo enfrenta um conjunto impressionante de surpresas. Ninguém imaginava na virada do ano que se espraiaria uma revolução na comunidade islâmica, com forte impacto sobre os preços do petróleo. Também não estava no radar de nenhum observador a disparada dos preços das commodities quando a economia dos países ricos ainda está se convalescendo da crise financeira. Ninguém poderia prever as turbulências que agora estão flagelando a economia do Japão e os mercados de câmbio.
O avanço da inflação no País - esse, sim - estava mais previsível. Mas tanto o governo como o Banco Central preferiram fingir que não a viam, porque priorizaram a eleição da candidata oficial. Por isso, a conta a pagar ficou mais alta. E há dúvidas de que o governo Dilma tenha feito até agora o suficiente para virar esse jogo.

CONFIRA
Não doeu

O euro não ficou nem um pouco abalado com a rejeição do pacote de austeridade pelo Parlamento de Portugal. Por muito menos houve no ano passado enorme turbulência quando, primeiramente, a Grécia e, depois, a Irlanda passaram por problemas semelhantes.
Qual o recado?
Ainda não está claro o sentido dessa tranquilidade. Pode ser a certeza de que virá uma solução. Ou, então, pode ser o sinal de que a crise será tomada como oportunidade para deixar um país quebrar e servir de exemplo para os demais. 

MÍRIAM LEITÃO

Empresas do Madeira 
MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 25/03/11

Conversei ontem com Benedicto Barbosa da Silva Júnior, presidente da Odebrecht Infraestrutura, da Usina de Santo Antônio, e com Victor Paranhos, diretor-presidente da Energia Sustentável, da Usina de Jirau.
Cada um tem uma explicação, e nenhum dos dois culpa os trabalhadores em si, mas descrevem condições de trabalho que destoam do clima de conflito que levou o governo a convocar a Força Nacional para conter problemas trabalhistas de empresas privadas.
Benedicto Júnior conta que a Usina de Santo Antônio tem a vantagem de ficar bem perto de Porto Velho, a apenas três quilômetros da cidade, e por isso eles mudaram o plano original:
- Tínhamos intenção de trazer de fora pelo menos 70% dos trabalhadores e depois mudamos e contratamos 70% de trabalhadores locais. Isso resolve o problema de moradia. Fizemos o programa Acreditar, que já qualificou 10 mil pessoas, muitos deles do Bolsa Família. E são todos funcionários da empresa.
Já a obra de Jirau fica a 120 quilômetros de Porto Velho, é um canteiro de obra com gente trazida de fora. O que Victor Paranhos conta é que os funcionários também são contratados diretamente. A terceirização existe em serviços bem especializados, como o de proteção do vertedouro:
- Os alojamentos são para seis funcionários em cada quarto, com banheiro e ar-refrigerado. Somos fiscalizados por auditoria internacional independente, e por financiadores. A Energia Sustentável construiu uma cidade, a Nova Mutum, onde moram 800 trabalhadores, e 300 que foram desalojados pela obra, em casas de 85 m e 800 metros de terreno. O restaurante serve refeições de alta qualidade, que tem tido um nível alto de aprovação. E quando eles reclamam de hora extra, é porque querem mais horas extras, como por exemplo trabalhar domingo, quando ganham mais.
Na descrição dos executivos, tudo parece realmente bom, falta apenas explicar por que as obras neste momento estão paradas e milhares de trabalhadores estão de braços cruzados.
Paranhos diz que não acredita em envolvimento dos trabalhadores da obra nos atos de queima de alojamentos ou até assalto:
- Houve um incêndio, e em 20 minutos, com maçarico, arrombaram o banco 24 horas. O estranho é que quando acontecia o incêndio não sumiu um lápis nos alojamentos. Mas houve esse roubo.
Quis saber como ele explicava o fato. Ele disse o seguinte:
- É bom lembrar que a BR-364 é rota do tráfico de drogas; estamos a 150 quilômetros da Bolívia, há um aumento muito grande por aqui de tráfico, tanto de crack como de outras drogas.
É um realidade a proliferação de rotas de tráfico na região amazônica, mas isso, de novo, não explica por que trabalhadores permanecem em greve, dado que as condições são assim tão boas. Paranhos disse que estão ocorrendo negociações entre o Sindicato da Construção Civil de Rondônia e os dois canteiros de obras.
O fato é que jornalistas que foram lá no início da confusão relataram entrevistas com trabalhadores se queixando das condições de trabalho, de terem sido contratados com ofertas que não foram cumpridas, e tudo explodiu após um conflito entre um motorista de uma empresa terceirizada e alguns trabalhadores. É difícil acreditar que tanta insatisfação tenha surgido do nada, ou que um grupo de traficantes tenha desembarcado no canteiro de obras sob olhos de milhares de trabalhadores, encarregados, engenheiros.
Em todos os empreendimentos o setor público está presente de várias formas. Estatais são parte dos consórcios; o governo é o contratante; o BNDES é o maior financiador. No caso do Energia Sustentável, por exemplo, que constrói Jirau, Suez tem 51%; Chesf, 20%, Eletrosul, 20%, e Camargo Corrêa, 9,9%. Portanto, se houve tratamento inadequado em relação aos trabalhadores, é absurdo. E que eles não estão satisfeitos, dá para inferir pelos fatos.
O governo precisa esclarecer melhor e prestar contas à sociedade sobre o que está acontecendo no Rio Madeira. Afinal, além de serem obras feitas com dinheiro público, quando houve conflito, foi chamada a Força Nacional, e um ministro palaciano, no caso, Gilberto Carvalho, foi escalado para resolver o problema em conversas com as centrais sindicais.
Na verdade, as centrais convocadas por Gilberto Carvalho estão caindo de pára-quedas. Os antigos líderes trabalhistas foram para o governo; nas centrais ficaram lideranças que querem ir para o governo e recebem dinheiro público para cobrir parte dos custos. Nas eleições, mesmo ferindo a lei, fazem campanha para o partido do governo. Os trabalhadores dos canteiros não são ouvidos por essa representação neopelega. E numa conjuntura em que há muita demanda por mão-de-obra da construção, eles têm condições de fazer exigências. Há neste momento uma disputa entre sindicatos e centrais para representar trabalhadores que até ontem estavam esquecidos nos canteiros de obras do PAC.
As empresas responsáveis pela construção das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau afirmam que os trabalhadores não são terceirizados, principalmente os peões das obras. Dizem que as condições de trabalho são as melhores possíveis e auditadas por empresas independentes. Mesmo assim, as obras estão paradas e os trabalhadores estão de braços cruzados.

TÔ CAGANDO

ILIMAR FRANCO

Kátia aderiu
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 25/03/11
 
Uma das mais ferrenhas opositoras do governo Lula, a senadora Katia Abreu (DEM-TO), que também é presidente da Confederação Nacional da Agricultura, decidiu entrar no PSD de Gilberto Kassab. Para a direção do DEM explicou: “Prefiro a Dilma (Rousseff) do que o Aécio (Neves)”. Alegou ainda que ficou sem time, com a saída de Jorge Bornhausen e Kassab, e que perdeu espaço num partido em que os deputados são maioria.

Vem aí mais uma canetada do TSE?

Os grandes partidos estão se articulando para aprovar na reforma política, pelo menos, lei que proíba as coligações nas eleições
proporcionais. Seus caciques acreditam que com apenas essa mudança vão conseguir se livrar de meia dúzia de pequenos partidos. Eles têm votos para aprovar essa mudança, mas reconhecem que será difícil, porque vários desses pequenos partidos apoiam o governo Dilma. Por isso, preferem que o próprio TSE, com base na lei da fidelidade, e na recente interpretação de que o suplente é do partido e não da coligação, adote resolução acabando com as coligações nas proporcionais.

"O povo não está esperando por um tucano para votar nele em 2014, ele quer uma proposta e uma atitude nova” — Sérgio Guerra, presidente do PSDB

DESENCANTO. O presidente da Firjan, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, depois de ter comemorado a escolha do ministro Luiz Fux,
para o STF, agora está frustrado. O motivo: o voto sobre a Lei da Ficha Limpa. Fux deu maioria para sua não aplicação em 2010.
“Eu não esperava. Eu não imaginava. Acho que todos nós que somos sensíveis à ética na política... Ele deveria ter declarado
qual seria o seu voto antes de assumir”, desabafa. 

Ancine
Há uma forte articulação para que o diretor da Ancine Mário Diamante, cujo mandato vence em agosto, seja reconduzido por mais
um mandato. Para a vaga de Paulo Alcoforado, que saiu no final do ano passado, vai Vera Zaverucha.

Cara a cara

O senador e ex-procurador da República Pedro Taques (PDT-MT) foi quem coordenou as investigações que resultaram na prisão
do ex-senador Jader Barbalho (PMDB-PA). Com a decisão do STF, eles agora vão conviver no Senado.

Petistas à beira de um ataque de nervos
O PT está em polvorosa com a exoneração de Clarice Coppetti e Carlos Borges da direção da CEF. Torcem o nariz para a ida do peemedebista Geddel Vieira Lima para a vice de Pessoa Jurídica e arrancam os cabelos com a escolha de José Urbano Duarte para a vice de Governo. Eles se referem a Urbano como “aquele tucano”, pois ele, funcionário de carreira, ocupou cargos de direção da Caixa no governo Fernando Henrique.

Perdas
Os tucanos avaliam que a oposição perderá poder de fogo com a criação do PSD de Gilberto Kassab. Consideram que o DEM e o PPS estão perdendo substância. Mas o que mais os preocupa é a falta e a divisão interna do próprio PSDB.

Antídoto
A presidente Dilma aproveitou a reunião do Conselho Político, ontem, para defender a política econômica e elogiou o ministro Guido Mantega (Fazenda), dando sequência à tentativa de conter a fritura por que ele passa.

 EUA. Na reunião do Conselho Político, a presidente Dilma disse que a visita do presidente Barack Obama foi importante porque o Brasil tratou “de igual para igual” com os EUA.
 O DEPUTADO Romário (PSB-RJ), ao sair de audiência com o ministro Orlando Silva (Esporte): “Existem problemas nas obras de infraestrutura (Copa de 2014). Mas tudo vai entrar no seu devido caminho daqui a dois ou três meses”.
 O INCA informa que é a fonte do relatório que embasou o discurso da presidente Dilma Rousseff com críticas ao trabalho de prevenção do câncer.