domingo, julho 15, 2012

A vida ganhou - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 15/07

Cada UPP carioca salva, em média, seis vidas por ano. A conclusão é de pesquisa do Laboratório de Análise da Violência da Uerj e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O pesquisador é Ignacio Cano, que vasculhou as mortes violentas ocorridas antes e depois da criação das 13 primeiras UPPs.

Aliás...
O xerife Beltrame assiste amanhã no MoMA, em Nova York, ao filme “5x Pacificação”, produzido por Cacá Diegues.
Depois, participa de debate no “New York Times”, mediado por Larry Rohter, ex-correspondente do jornalão no Rio.

Bolsa Navio
Um ex-diretor da Petrobras diz que os US$ 360 milhões gastos com a P-59, na Bahia, dariam para comprar duas plataformas no exterior.
O “Bolsa Navio” já tem dez anos. Ou seja, o tempo passa, o tempo voa, e a nossa indústria naval nunca fica competitiva.

Calma, gente
O Movimento Carlito Rocha, do Botafogo, vai propor ao Conselho Deliberativo do clube a troca de nome do Enge-nhão de Estádio João Havelange para Estádio Nilton Santos.

Hei de torcer, torcer...
A sede do querido América, na Tijuca, vai a leilão, terça, a mando da 3+ Vara Federal do Rio.
É para pagar dívida de R$ 900 mil com a Fazenda Nacional.

Vip, vop

Depois de esgotar na Europa, o inédito “Vip vop”, do nosso músico Leo Gandelman, lançado lá fora em maio pelo selo inglês Far Out
É o primeiro disco autoral do artista desde 2004.

O DOMINGO E de Sheron Menezzes, 28 anos, a linda atriz que vai viver a primeira vilã de sua carreira na novela "Lado a lado", de João Ximenes Braga e Cláudia Lage, que a TV Globo deve estrear em setembro.
Será Berenice, jovem que mora num cortiço e morre de inveja de Isabel (Camila Pitanga). Neste flagrante, repare, a formosa aproveita um intervalo das gravações para chupar a cana do cenário. Um doce para outro doce

Em nome da lei

O juiz Odilon de Oliveira, que ficou conhecido por sua atuação na fronteira Brasil-Para-guai, onde condenou 120 traficantes e confiscou mais de R$ 2 bi do crime organizado, inspirou o próximo filme de Sérgio Rezende, “Em nome da lei”.
O longa, de ficção, será rodado ano que vem.

Na vida real...
Por sua atuação, Odilon vive há dez anos com escolta permanente de policiais federais.

Magoou
É dura a vida do jornalista. A prefeitura da cidade mineira de Iguatama abre inscrições dia 27 agora para novas contratações.
Um coveiro terá salários de R$ 806,90. Já um jornalista vai ganhar... R$ 622,73.

Os safadinhos
A argentina Movistar, do grupo espanhol Telefonica, publicou anúncio na revista das Aeroline-as Argentinas destinado, acho, ao público gay do país de Maradona.
O texto, ilustrado com a foto dos, digamos, “bofes” acima, diz: “O que acontece no Brasil permanece no Brasil.” Ou seja, vem para cá que ninguém vai saber.

Ciência sem fronteira
Di 22 agora desembarca no Rio o suíço Kurt Wüthrich, No-bel de Química em 2002.
Vem a convite do ministro Mercadante participar do programa Ciência Sem Fronteiras, na UFRJ, por três anos.

Rubem Braga 2013
Do coleguinha e escritor Sérgio Augusto, depois de uma temporada na Flip: “Que tal criarmos naquelas ruas de pedras de Paraty uma Corrida de São Silvestre só com políticos.”
Sérgio integra o lobby para que Rubem Braga e a crônica sejam temas da próxima Flip.

Não sou eu
Um levantamento no site do TSE revela que, dos 1.653 candidatos a vereador no Rio, há nomes, digamos, curiosos.
Alguns: Caroço Moto Táxi, Totti Alceudispor, Renata do Bole-Bole, Lula do PSDB, Moisés da Dengue e Anselmo da Farmácia (leia mais no site).

O encurtamento das durações - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 15/07


Quanto tempo leva para superar a dor da perda? Quanto tempo para digerir uma rejeição? Absorver que um sonho terminou? Esquecer uma frustração? Uma mágoa de infância? Um trauma? Uma demissão? Os psicanalistas provavelmente responderão que é preciso respeitar o ritmo de cada um. Há quem seja rápido na retomada da vida, e há os mais lentos, que necessitam de um acompanhamento mais intensivo. Não há como decretar: dois dias, dois meses, dois anos.

Só que a maioria da população não procura psicanalistas. Não têm dinheiro pra isso, e muito menos disponibilidade. As pessoas não podem parar no meio do dia para se consultar, pois trabalham insanamente, e tampouco possuem tempo para, segundo elas, desperdiçar. Sabe-se que análises são demoradas, que buscam e rebuscam nossa intimidade, que não é num estalar de dedos que se atenuam as dores internas. E qualquer coisa que demore, hoje em dia: não, obrigada.

Que inquietação.

O passado e o futuro são dois períodos que já não interessam: cultua-se o presente como nunca antes. O que vale é este momento, agora, o instante vivido. Tudo digitalizado, virtual, instantâneo. Quem ainda espera dias por uma resposta? Meses por uma solução?

Na vida burocrática, governamental, a demora ainda é praxe e se vale da morosidade para arrecadar mais e mais dinheiro, mas no plano pessoal, encurtaram-se as durações. Vive-se tudo de forma mais compacta, o começo e o fim mais próximos do que jamais foram. E acabamos impregnados dessa urgência, dessa vontade de resolver todas as tranqueiras com a maior agilidade possível.

Porém, há tranqueiras e tranqueiras.

Você consegue resolver pendências profissionais de imediato, consegue tomar decisões práticas sem se alongar: parabéns. Salve a produtividade. Mas não foram essas as questões levantadas no início desse texto. Falávamos de tristezas, de cicatrizar feridas, de aceitar o destino que nos coube, de assimilar mudanças.

Sentimentos não são regidos por megabytes por segundo, não se vinculam a relógios, não obedecem a leis objetivas – é o curso da natureza que manda. E a natureza é surda e cega para o desatino. Exige a introspecção devida, sem a qual nada se resolve, só se mascara.

Diante da dor emocional, só há uma ordem a respeitar: paciência. De nada adianta inventar alegrias fajutas e se oferecer para a cobiça do mundo sem antes estar com a alma serenada e forte. É preciso saber esperar, do contrário a gente se atrapalha e só reforça a miséria existencial que preenche as madrugadas.

Basta de tanta gente evitando pensar, evitando chorar, evitando olhar para dentro de si mesmo, sorrindo de um jeito tão triste que só faz demorar ainda mais o reencontro com o sorriso verdadeiro – aquele aguardando a hora certa de voltar.

Garimpando amores - HUMBERTO WERNECK


O Estado de S.Paulo - 15/07


Mas quer saber? - disse ele de repente, saltando fora da tristeza em que estava chafurdado. - No mês que vem vou à província de Oriente e trago um pepillo.

Quase caí, não das nuvens, mas da amurada onde estávamos sentados, frente ao mar do Caribe, naquele fim de tarde em Havana, enquanto ondas musculosas esmurravam pedras lá embaixo, saltando às vezes para esparramar-se entre os carros no Malecón. Pepillo quer dizer garoto, e o que Reinaldo estava me contando é que ia pegar 1.000 km de estrada até Santiago de Cuba, no outro extremo da ilha, e de lá trazer algum do seu agrado. Como quem vai ao Vale do Jequitinhonha atrás daquelas noivas de barro. Seria a província de Oriente um criatório de pepillos, um pesque-pague, um delivery de corpos juvenis?

Estávamos na década de 80 e o domingo, já irremediável, caminhava para aquele momento em que, no Brasil de então, a musiquinha do programa dos Trapalhões antecipava em nossas almas a sombra da segunda-feira. E Reinaldo era todo segunda-feira. Estava de luto. Dois dias antes, Carlito, seu jovem companheiro (su compromiso, se diz em Cuba, para não macular o sacrossanto significado que a Revolução deu à palavra compañero), tinha sido convocado para a guerra em Angola. Na melhor das hipóteses, dois anos em armas do outro lado do Atlântico, em nome da solidariedade internacional dos povos.

Dava para entender o que sentia o cinquentão Reinaldo. Uns 15 anos antes, a estrepitosa exposição de sua vida íntima, patrocinada por mexericos cívicos de um vizinho, lhe custara o emprego na burocracia estatal, e precipitara o outrora poderoso economista numa rampa ensaboada rumo a infortúnios que pareciam não ter fim. Escândalo, processo, ano e meio de confinamento num campo de reeducação.

Finalmente devolvido à, digamos, liberdade, deu trabalho conseguir trabalho. Tudo o que o Estado concedeu ao decaído foi uma sucessão de empregos de importância cada vez mais pífia - o mais recente deles, não isento de ironia, numa fábrica de espelhos. Das antigas mordomias, só não lhe confiscaram o idoso carro espanhol que no auge do prestígio recebera zero km, e que na altura daquele nosso papo se achava convertido numa lata velha que era preciso empurrar a cada nova partida.

Ao cabo de tanto solavanco, Reinaldo ultimamente se dizia feliz, acreditando-se ancorado numa zona de calmaria, quem sabe vitalícia. Seus infortúnios tinham agora como contrapeso o amor e os hormônios em brasa de Carlito - pepillo, pepita que a carência de Reinaldo tinha ido faiscar nas lavras da província de Oriente.

Foi o que ele me contou naquela tarde. Contou também que estava longe de ser um garimpeiro solitário - e me abriu os meandros desse tráfico subterrâneo, expediente nada raro entre os que precisam viabilizar uma sexualidade não majoritária sob um regime já rotulado por alguém de machista-leninista.

Recurso de sobrevivência, disse Reinaldo, e senti que não dramatizava. Eu próprio, numa reportagem anos mais tarde, falei de estratagemas que o cubano inventa para seguir vivendo - da maionese sem ovo à criação de porco em apartamento. Por que a criatividade dos ilhéus haveria de apagar-se no incontornável território do amor e do sexo?

Em qualquer parte do mundo, o jovem da província que sonha com vida menos acanhada pode, para transplantar-se, recorrer à pensão da Dona Maria, a um canto sobrante em casa de amigo generoso. Ocorre que em Cuba não tem pensão da Dona Maria, e o amigo, por generoso que seja, em geral mora espremido na sua cajita de fósforos.

É onde entra o maricón maduro que tenha seu cafofo, no qual de bom grado pode instalar um pepillo interiorano maior de idade disposto a encarar vivências que serão transitórias ou não. Ninguém explora ninguém, me garantiu Reinaldo, o arranjo convém às duas partes. O déficit de moradias, quem diria, conspira em favor de comportamentos menos ortodoxos. À fome se junta... - bem, melhor ficar por aqui.

(Ah, o Reinaldo? Sua incursão ao Oriente foi bem sucedida. O carro acabou, mas não o novo amor. Quanto a Carlito, soube que voltou de Angola, casou, é pai e trabalha de garçom.)

Querer demais da vida - DANUZA LEÃO

FOLHA DE SP - 15/07


Ser apenas feliz, para certas mulheres, é pouco. Dizem que não têm vocação para a vida normal e vão embora


Costuma ser assim: as pessoas se conhecem, se encantam umas pelas outras, procuram conhecer os amigos, a família, os gostos pessoais, e assim descobrir se foram feitos um para o outro, para se unirem e serem felizes, até que a morte os separe. Aí namoram e casam.

Bem, para começar, é raro que duas pessoas se unam e sejam felizes até que a morte as separe, e quando chegam a se descobrir, todo aquele enorme encantamento que sentiram no primeiro encontro começa a complicar.

Ela não gosta da mulher do melhor amigo dele -e já começa a implicar-, ele não vai com a cara da irmã dela -e já começa a implicar-, um gosta de churrascaria, o outro, de um japonês, e por aí vai.

Começa então a tentativa de adaptação, cada um abrindo mão de certas coisas para que a relação dê certo. As adaptações que eram feitas nos primeiros dias de namoro com enorme prazer, um ano depois podem virar motivo de mau humor, e a verdade verdadeira é que ninguém gosta de fazer concessões, cada um só quer fazer o que quer e o que gosta.

É da natureza humana, e natural, pois se duas pessoas gostam exatamente das mesmas coisas, das mesmas pessoas, sentem fome e sono sempre na mesma hora, e por aí vai, vira uma monotonia sem fim. Então que tal por uma vez fazer tudo diferente e tentar que tudo dê certo, pelo menos por um tempo?

Seria assim: uma mulher e um homem se conhecem, se olham, e sentem um total arrebatamento um pelo outro. Nesse momento eles sairiam de onde estivessem -da praia, do bar, da festa- e passariam a viver só desse amor, só para esse amor. Nesse mesmo dia iriam morar juntos, sem saber dos defeitos um do outro, se esconderiam do mundo, dos amigos, das famílias, e abririam mão de seus desejos mais intensos para agradar ao outro. Não é assim, quando se ama?

E como é assim, não brigariam por nada, não discutiriam por nada, não implicariam com coisa alguma, e a vida seria uma total felicidade -por um tempo, é claro. Mas chegaria o momento em que eles começariam a se conhecer melhor, e a vida real invadiria um mundo que até aquele momento era só deles; com isso viriam as complicações, as de sempre.

Teriam que conhecer os amigos e as famílias, chegaria o dia inevitável em que um deles -ela- diria que tem horror a futebol, e ele daria o troco dizendo que odeia os filmes de Woody Allen que foi obrigado a ver, para lhe fazer a vontade. E chegaria o dia cruel em que falariam pela primeira vez sobre política, e que não iriam votar no mesmo candidato. A partir daí, viraram um casal feliz, desses que se vê por aí.

Só que ser apenas feliz, para certas mulheres, é pouco. Algumas dizem ao marido que não têm vocação para a chamada vida normal, que vão embora. E ficam espantadas -quase decepcionadas- quando eles dizem estar de acordo.

Porque quem viveu momentos tão delirantes não pode se conformar com menos. Querem da vida muito, tudo, tanto, que não aceitam vivê-la como ela é.

E vão, cada um para o seu lado, na procura eterna de outros encontros apaixonantes, mesmo que curtos, sabendo que para encontrá-los -talvez- vão passar longas temporadas inteiramente sós.

Tensão no coração da América - MAC MARGOLIS


O Estado de S.Paulo - 15/07



Na semana passada, os paraguaios estavam em pé de guerra com um vizinho e pouco tinha a ver com o impeachment ruidoso de Fernando Lugo. O motivo foi uma encrenca antiga: quem controla as águas do Rio Pilcomayo? E tal como a briga com os parceiros do Mercosul, essa é igualmente polêmica e sem solução evidente. Mas se nada for feito para solucioná-lo, pode ter consequências continentais.

Há anos os vizinhos duelam sobre as águas do rio compartilhado, que traçam parte da fronteira interiorana entre Bolívia, Paraguai e Argentina. O Pilcomayo é um portento. Nasce nos córregos dos Andes bolivianos, atravessa a baixada tropical boliviana, esbarra na planície do Chaco paraguaio e margeia vagaroso pela província argentina de Formosa. O gigante fluvial sul-americano esvazia-se no Rio Paraná e este, no Prata.

Suas águas são vitais para a agricultura e a pesca tradicional que sustentam centenas de milhares de ribeirinhos. Com o descobrimento de gás natural e petróleo nas suas margens, hoje o interesse nesta bacia está redobrado. A tensão, também. Por natureza, o Pilcomayo é traiçoeiro. Desce dos Andes, carregado de sedimentos e os deposita caoticamente pelo Chaco meridional, criando zonas férteis e calamidades crônicas. O assoreamento intenso distorce seu traçado e entope seu leito, ora encharcando gente e lavouras, ora roubando água.

O homem bem que tentou mexer. Desde 1991, governos argentinos e paraguaios lançaram obras heroicas, cavando canais de escape e irrigação na tentativa de ordenar o fluxo dágua. Mas a intervenção hidráulica nem sempre obedece à diplomacia e à natureza, ou a nenhuma das duas.

Assim, há poucas semanas, os paraguaios flagraram a maquinaria argentina empenhada em mais uma obra de engenharia heroica - na surdina. Trata-se de um novo grande canal (já tem 800 metros) que mais uma vez ameaça mudar o fluxo do Pilcomayo e patrocinar um desastre ecológico, segundo o governo de Assunção. "Desvio escandaloso", berrou o influente jornal ABC Color, que denunciou o plano argentino de "esgotar" a água paraguaia, reduzindo a poeira vasto trecho do Chaco.

A polêmica invade a pantanosa diplomacia regional. "Agora os imprevisíveis vizinhos engendram novo foco de conflito", declarou a delegação paraguaia ao Parlasur, o órgão legislativo do Mercosur. O ministro paraguaio de Obras Públicas, Enrique Salyn Buzarquis, denunciou a obra como atentado contra a soberania nacional e ameaça revidar, cavando um canal paraguaio.

Há ecos do passado nessa querela. Em estudo recente, Davig Zhang, pesquisador da americana Academia Nacional de Ciências, descobriu que mais de 8 mil guerras foram deflagradas por disputas sobre recursos naturais, incluindo a água. Egito e Sudão disputaram o controle do Nilo, em 1958, enquanto Israel brigou com meio mundo árabe pelo acesso ao Rio Jordão em 1967.

Riquíssima em recursos hídricos, a América Latina não é exceção. A organização World Water, que mapeia os conflitos hídricos, relaciona nove disputas pelas Américas Central, do Sul e Caribe, desde a década de 60. No ano passado, com o pretexto de desentupir o Rio San Juan, a Nicarágua mandou seus soldados invadir a Costa Rica para ganhar um naco do território.

Mas há também nas ondas do Pilcomayo um prenúncio do futuro. Em tempos de aquecimento global e extremos climáticos, a água pode ser o novo petróleo, estopim de desastres e guerras. Hoje, são 276 vias fluviais que atravessam fronteiras nacionais em 145 países. Suas bacias abrigam 40% da população mundial. Para abastecê-las, o mundo precisará 40% mais água doce até o ano 2030, segundo a ONU.

A próxima guerra mundial será pela água? Há controvérsias. Uma pesquisa da Universidade de Oregon mostra que nos últimos 50 anos, disputas pela água irromperam em violência em apenas 37 conflitos. No período, houve cinco vezes mais tratados do que guerras envolvendo águas internacionais.

Se alguém viu essa pesquisa na bacia do Pilcomayo, é outra história. Vilificado pelos vizinhos pela derrubada do presidente Lugo, o Paraguai foi suspenso dos dois grandes compactos latino-americanos, Mercosul e Unasul. Em consequência, Cristina Kirchner se recusa a reconhecer o novo governo de Assunção. Pelo jeito, a fossa diplomática abriu espaço para o novo canal.

A ilusão do saber - MARCELO GLEISER


FOLHA DE S. PAULO - 15/07 

Tanto Newton quanto Maxwell estavam certos: a luz é tanto uma partícula quanto uma onda

Muitas vezes o familiar oculta os maiores mistérios. Esse é o caso da luz, um fenômeno tão comum que quase ninguém dá muita bola para ele. Acordamos com ela todos os dias, ligamos e desligamos lâmpadas com descaso, raramente refletindo sobre a sua natureza, sobre o que está por trás dessa intensidade visível, porém impalpável, etérea, porém concreta, discreta, porém essencial.
No seu tratado sobre a luz intitulado "Óptica", publicado em 1704, Isaac Newton defende sua crença de que a luz é constituída de pequenas "partes": "Não são os raios de luz corpúsculos diminutos emitidos por corpos brilhantes?", pergunta. Sugere, além disso, que a luz viaja com velocidade finita, fazendo referência aos resultados de Ole Roemer, o qual, em 1676, mediu a velocidade da luz usando o eclipse de Io, uma das luas de Júpiter.
Em 1865, James Clerk Maxwell publicou o tratado "Teoria Dinâmica do Campo Eletromagnético", no qual descreve a luz como ondulações do campo eletromagnético.
A teoria explica conjuntamente a eletricidade e o magnetismo como manifestações do campo eletromagnético: uma carga elétrica produz um campo elétrico à sua volta, como cabelos rodeando uma cabeça. Tal como a gravidade, seu efeito cai com o quadrado da distância. Campos magnéticos são gerados quando cargas elétricas são aceleradas.
Uma rolha oscilando numa piscina cria ondas circulares. Imagine que a rolha é uma carga elétrica; ao oscilar, ondas eletromagnéticas são irradiadas concentricamente. (A carga as emite em três direções, e não duas.) Se a rolha subir e descer rápido, as ondas estarão próximas, terão frequência alta; se lentamente, a frequência será baixa.
Algo assim ocorre com as ondas eletromagnéticas, que podem ter altas e baixas frequências: o que chamamos de luz visível é um tipo de onda com frequências entre 400 e 790 Terahertz (1 Terahertz=1.012 ciclos/segundo). Já os raios X e gama têm frequências bem mais altas, enquanto o infravermelho e as micro-ondas têm frequências mais baixas.
Maxwell imaginou que, tal como ondas na água ou de som, a luz precisasse de um meio para se propagar. Esse era o estranho éter: transparente, imponderável e muito rígido, uma quase impossibilidade. Mas todos acreditavam nele, mesmo após os experimentos de Michelson e Morley não o terem encontrado.
Só em 1905 o jovem Einstein descartou o éter com a sua teoria da relatividade: ao contrário de todas as outras, as ondas eletromagnéticas podem se propagar no vazio. (É possível que ondas gravitacionais também o façam, assunto que fica para outra semana.)
Para complicar, a luz não tem massa. "Como algo que não tem massa pode existir?", perguntaria o leitor. Em física, energia é mais útil que massa. E a luz tem energia, podendo ser descrita como onda ou partícula: Newton e Maxwell estavam corretos. As partículas de luz, os fótons, têm energia proporcional à frequência. (Vê-se logo a estranheza: uma partícula com frequência, que é propriedade de onda!)
Lembro-me das palavras de Daniel Boorstin: "O maior obstáculo à novas descobertas não é a ignorância; é a ilusão do saber". Mesmo que saibamos tanto sobre o mundo, sabemos ainda tão pouco.

Transtornos e desordens - JOÂO UBALDO RIBEIRO


O Estado de S.Paulo - 15/07


De uns tempos para cá, é cada vez mais forte a tendência a não se ver o indivíduo como responsável pelos próprios atos. No terreno da ciência social esquerdoide, o sujeito é assaltante porque lhe faltaram oportunidades, não teve educação, vive numa sociedade consumista, foi vítima de bullying e mais quantos indicadores se concebam, em pesquisas cujos resultados são definidos pela própria formulação e, muitas vezes, não passam de manipulações pseudoestatísticas, destituídas de base sólida. Enxergam-se relações de causa e efeito inexistentes, que resistem até mesmo à óbvia verdade de que a ampla maioria dos que enfrentaram e enfrentam essas situações não é de delinquentes.

No terreno da psicanálise de boteco, o sujeito surra mulher e filhos porque foi também surrado, principalmente pela mãe. Ou - pois a psicanálise de boteco tem o condão de adaptar suas explicações e a causa que, num exemplo, surte determinado efeito em outro surte efeito contrário - porque não foi surrado e nem sequer advertido e, assim negligenciado pela mãe, nutre amor e ódio pela figura materna, na qual desconta seus recalques baixando a porrada na santa mãe de seus filhos, os quais também apanham porque dividem as atenções da dita figura materna. Ou qualquer outra especulação asnática, das muitas que volta e meia ainda ouvimos.

Agora, por meio da entusiástica colaboração de cientistas, psiquiatras e, principalmente, fabricantes de drogas psicoativas, vamos ingressar definitivamente na era em que qualquer comportamento ou qualquer emoção serão vistos como uma doença mental, no sentido mais lato do termo. Aliás, pouco se tem usado a expressão "doença mental". O chique agora, que repetimos como papagaios bem ensinados, é "transtorno", "desordem" ou "distúrbio". Sabemos que certamente a maioria dos psiquiatros e das psiquiatras, bem como a maioria dos cientistos e cientistas, embora talvez não a maioria dos fabricantes e fabricantas de drogas, não é constituída de enganadores venais e inescrupulosos, que tomam dinheiro dos fabricantes para promover a vendagem bilionária de remédios. Mas muitos e muitas são (está certo, vou parar com este negócio de flexionar os gêneros de tudo, sei que é chato; mas é só porque quero mostrar como certas coisas enfeiam e aleijam nossa já tão perseguida língua portuguesa) e a bandidagem deles combinada vai de vento em popa.

O número de transtornos e desordens aumenta exponencialmente e já se observou que, anunciado um novo mal, de que antes não havia relato, logo surgem novos "pacientes", gente que agora padece de síndromes também antes nunca descritas. E os males do espírito, digamos, muitas vezes não geram sintomas físicos, ou, se geram, são de difícil definição etiológica, de forma que o diagnóstico vira conceitual e subjetivo: eu acho que você está deprimido porque acho que seu quadro configura o que eu acho que é depressão.

Não há mais preguiça, há transtornos ou desordens de atenção, de motivação, de interação social, de tudo o que se possa imaginar. Não há mais agressividade, rudeza no trato, timidez, temperamento calado, nada disso, só há transtornos e desordens. Quando expira a patente de uma droga, seu fabricante se apressa a criar, novamente com a ardorosa colaboração de cientistas e psiquiatras contratados ou subvencionados generosamente, uma nova doença, a que a mesma droga se aplique, mudando apenas de nome. Emoções antes normais em qualquer ser humano podem facilmente revelar-se transtornos ou desordens, conforme o freguês e a moda psiquiátrica corrente. Não se fica mais triste, fica-se deprimido. Não se fica mais ansioso pela antecipação de alguma coisa, fica-se com distúrbios de ansiedade. E para tudo há uma pílula.

Claro, chegaremos, se já não chegamos e ainda não nos demos conta, ao ponto em que todo indivíduo, se confrontado com um hipotético "padrão normal", será portador de vários transtornos, distúrbios e desordens. Qualquer acontecimento que afete suas emoções, seu estado de ânimo ou mesmo seu bem-estar físico deverá ser objeto de controle medicamentoso. Posso até imaginar que talvez já exista, e no futuro poderá prosperar, a figura do PP, o Personal Psychiatrist, não para receitar ou atender no consultório seu cliente milionário, mas para acompanhá-lo ao longo de todo o dia, ministrando-lhe a droga apropriada para a manifestação de qualquer de seus inúmeros distúrbios.

A infância, com a falsa descoberta de um número alarmante de bebês portadores de transtorno bipolar, passou a ser uma doença. Assim como, com toda a certeza, a puberdade, a adolescência, a jovem maturidade, a meia-idade e a velhice. Tudo doença, é claro, bola nisso tudo, bola em toda a existência, você é que pensa que é sadio, é porque não procurou direito sua doença. E, aliás, sugere a prudência que escolhamos logo nossos transtornos, desordens e distúrbios, porque do contrário poderemos estar sujeitos a que escolham por nós. E ninguém escapará, porque o objetivo é englobar toda a Humanidade.

O problema não é a ciência decretar que, de uma forma ou de outra, somos todos malucos. Isso todo mundo às vezes pensa. O problema é quando decidem qual é a nossa maluquice e nos forçam a uma "normalidade" que não queremos e não temos por que aceitar. A chancela da ciência pode ser adulterada. E não é impossível que, em determinadas situações, divergências com o Estado, ou com grupos de poder, acarretem muito mais que censura às artes e à imprensa. Podemos ser forçados a agir "normalmente" e considerados insanos, se discordarmos da normalidade oficial. Na União Soviética, houve tempo em que quem divergia do Estado era carimbado como doido varrido e encafuado num hospício. Tenho medo de não me encaixar na portaria da Anvisa que defina a normalidade e ser obrigado a tomar um Abestalhol por dia.

Simples e velha honestidade - JOSÉ DE SOUZA MARTINS

O Estado de S.Paulo - 15/07


Alijados da sociedade, catadores que devolveram dinheiro achado retiveram como bem imaterial um antimoderno sentido da honra



Quando a honestidade surpreende e dela se desconfia é porque alguma coisa essencial está mudando na sociedade. É o que incita à compreensão sociológica dessa reação, suas ocultações e seus significados no recente caso da devolução, ao dono de um restaurante, dos R$ 20 mil que lhe foram roubados. O dinheiro fora achado por um casal de moradores de rua de São Paulo, o maranhense Rejaniel e a paranaense Sandra.

Já há um debate em relação ao suposto sentido do gesto dos dois moradores dos baixos de um viaduto do Tatuapé. Uns veem nele vontade de aparecer. Outros consideram trouxa o casal, pois "o achado não é roubado". Não poucos no gesto reconhecem a simples e velha honestidade, um valor de referência. Aliás, é por meio dela que a sociedade se reproduz e se preserva, regula e organiza a vida de todos, dos bem-intencionados e dos mal-intencionados, dos íntegros e também daqueles para os quais a honestidade já não é senão uma anomalia.

Vontade de aparecer é pouco provável, pois essa vontade é circunscrita a determinadas categorias sociais e depende de socialização específica. É própria da classe média, cuja cultura valoriza o parecer muito mais do que o propriamente ser. Quem procura parecer o que não é e mais do que é quase sempre se denuncia nos gestos impróprios e na inabilidade para manipular apropriadamente o código gestual que corresponde à aparência que pretende ostentar. Pessoas pobres sabem disso, mesmo quando imitam aquilo que não são. Os ricos também o sabem porque com facilidade identificam quem não pertence à categoria social dos que podem ostentar. As pessoas se traem nos desajustes da conduta.

Parecer traz identidade visual e o prestígio superficial da aparência, o que é característico da sociedade de consumo. Os dois moradores de rua, que são catadores de lixo reciclável, estão muito longe das fantasias consumistas da maioria e suas possibilidades de ostentação. São culturalmente incapazes de manipular os significados da aparência porque não têm como dela beneficiar-se.

Quanto a ser trouxas porque deixaram de apoderar-se do que não era seu, e do que claramente careciam, é algo improvável. Alguém que se apodere de uma quantia de dinheiro muito superior à sua capacidade de utilizá-la, mesmo dinheiro achado na rua ou no lixo, dificilmente poderá utilizar esse dinheiro na escala de suas carências acumuladas sem ser denunciado. A teia de regras e cautelas do mundo do consumo é vigilante e repressiva para que um pobre não se meta a ser o que não é. Não é improvável que o casal tenha levado isso em conta.

Mesmo que fosse a um restaurante para uma lauta refeição e matar a fome de uma vida, correria o risco de não ser servido e de despertar suspeitas. E, se pretensioso, mas prudente, pedisse uma garrafa de modesto vinho da terra, maior seria a suspeita. Pobre que é pobre toma água ou suco, dizem os vigilantes da conduta alheia. O que bem indica o que são as suspeitas que regulam as relações sociais. Todos somos devidamente observados todo o tempo por todos. O político que foi visto com amigos num restaurante com dois Romanée Conti, um vinho de US$ 6 mil a garrafa, já despertou suspeitas. Imagine-se o morador de rua servindo-se de modestíssimo vinho local. Para entrar no restaurante, teria antes que comprar os trajes apropriados à transitória escala de ascensão social que R$ 20 mil permitem. Em condições assim, dinheiro achado é inútil.

O gesto do casal repercutiu no Brasil e foi, no geral, bem-vindo como indício de que nem tudo está perdido, no mesmo momento em que na própria estrutura de poder a anomalia da corrupção compromete o sentido democrático da vida política. O gesto, aliás, não é novo nem raro. São frequentes casos semelhantes de dinheiro alheio achado e devolvido ao dono desconhecido de quem o acha, geralmente por meio da polícia.

O homem que achou o dinheiro declarou que gostaria que sua mãe o visse agora, pois ela se orgulharia dele. Eis a questão. Lançado para a margem da sociedade, reteve, como um bem pessoal e imaterial que é, o antimoderno sentido da honra. Por incrível que pareça, a maioria das pessoas é honrada e faz parte dessa imensa massa invisível dos não notados. Um trabalhador dedicado ao seu trabalho, ou um professor devotado ao ensino e à formação de seus alunos, terá pouquíssima chance de ser aplaudido, mesmo por quem de seu trabalho se beneficia. No entanto, eles têm o que lhes basta como nutrição moral: o sentido da honra e a honestidade. Já não se fala disso, mas os sociólogos sabem que uma das carências humanas destes tempos de liquefação dos valores é a da honradez e da honestidade, o alimento que sacia os que não foram vencidos, os que se mantiveram antiquadamente honestos.

JAPA GOSTOSA


Democratas de ocasião - FERREIRA GULLAR

FOLHA DE SP - 15/07


Só um presidente já politicamente inviável é impedido com o apoio unânime do Congresso


Deixei a poeira assentar para dar meu palpite sobre a polêmica surgida com o impeachment do presidente Fernando Lugo, do Paraguai. Ao saber da notícia, logo previ a reação que teriam os presidentes de alguns países sul-americanos, inclusive o Brasil.

E não deu outra. Hugo Chávez e Cristina Kirchner, como era de se esperar, reagiram de pronto e com a irreflexão que os caracteriza. Logo em seguida, manifestou-se Rafael Correa, do Equador, que, com a arrogância de sempre, rompeu relações com o novo governo paraguaio. Chávez decidiu cortar o fornecimento de petróleo àquele país. E o Brasil? Fiquei na expectativa.

Como observou certa vez García Márquez, o Brasil é um país sensato e, acrescento eu, talvez por nossa ascendência portuguesa, pé no chão. E assim foi que Dilma primeiro mandou seu ministro das Relações Exteriores qualificar o impeachment de "rito sumário". Ou seja, não teria sido dado a Lugo tempo para se defender.

Sucede que o próprio Lugo, presente à sessão do Congresso quando se votou seu impedimento, declarou: "Aceito a decisão do Congresso e estou disposto a responder por meus atos como presidente".

Não disse que o Congresso agira fora da lei nem que tinha sido impedido de se defender. De acordo com as normas constitucionais paraguaias, recorreu à Suprema Corte e ao Tribunal Superior de Justiça, que não atenderam a seus recursos por considerarem constitucional a deposição e legítima a entrega do governo ao vice-presidente.

Só depois que os vizinhos tomaram a inusitada atitude de repelir a decisão do Congresso paraguaio foi que Lugo mudou de opinião e decidiu formar um governo paralelo, este, sim, destituído de qualquer base legal.

Fala-se em golpe, mas só um presidente já politicamente inviável é impedido com o apoio praticamente unânime do Congresso: 76 votos a 1 na Câmara de Deputados e 39 a 5 no Senado. Fora isso, nem os militares nem o povo paraguaios se opuseram. Pelo contrário, o impeachment de Lugo parece fruto de uma concordância nacional. Nessa decisão pesou, sem dúvida, o Partido Liberal, de centro-direita. Mas foi com o apoio deste que ele se elegera presidente da República.

O que houve então? Um complô de que participaram todos os partidos e quase a totalidade dos deputados e senadores? Se fosse isso, o povo paraguaio teria saído às ruas para protestar e denunciá-los. Só uns poucos o fizeram. As Forças Armadas, os intelectuais, os sindicatos protestaram? Ninguém.

O inconformismo com o impeachment de Lugo veio de fora do país: de Hugo Chávez, Cristina Kirchner, Evo Morales, Dilma Rousseff, que se apresentam como defensores da democracia. Serão mesmo?

Vejamos. Hugo Chávez suspendeu o funcionamento de 60 emissoras de rádio e televisão que se opunham a seu governo, criou uma espécie de juventude nazista para atacar seus opositores e fez o Congresso mudar a Constituição para permitir que ele se reeleja indefinidamente. Cristina Kirchner apropriou-se da única empresa que fornece papel à imprensa argentina, de modo que, agora, jornal que a criticar pode parar de circular.

Já Rafael Correa processa um jornal de oposição por dia, exigindo indenizações bilionárias. Democratas como esses há poucos. Dilma mandou seu chanceler a Assunção para pressionar o Congresso paraguaio e evitar o impedimento de Lugo, como o faziam antigamente os norte-americanos conosco.

Como se vê, há um tipo de democrata que só defende a democracia quando lhe convém. Mas, mesmo que Chávez, Cristina, Morales, Correa e Dilma fossem exemplos de líderes democráticos, teriam ainda assim o direito de se sobrepor às instituições paraguaias e à opinião pública daquele país?

Como o impeachment de Lugo consumou-se de acordo com a Constituição paraguaia e pela quase unanimidade dos parlamentares, o único argumento do nosso chanceler foi o de ter sido feito em "rito sumário".

No entanto, que chance deram eles ao Paraguai para se defender das sanções que lhe foram impostas? Nenhuma. Essas sanções, além de sumárias, são também ofensivas às instituições do Estado paraguaio e a seu povo.

Eles só pensam em dinheiro - PAULO SILVA PINTO


CORREIO BRAZILIENSE 15/07

Se conseguir votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias, o Congresso Nacional encerra amanhã um profícuo semestre de trabalho. Infelizmente, nem todas as leis aprovadas significam ganhos para o país. Mas o que é mesmo lamentável é perceber que muita gente não se dá conta disso no caso de uma nova regra aprovada pela Câmara dos Deputados. É candidata a se transformar em uma grande falácia se receber a chancela do Senado. Provavelmente não será cumprida, mas vai resultar em muita confusão.

Trata-se da obrigatoriedade para o governo elevar os gastos públicos com educação para 10% do Produto Interno Bruto (PIB), contida no Plano Nacional de Educação 2011-2021. Isso significa quase dobrar o patamar atual, que está em 5,1%. Ninguém que entende minimamente o funcionamento de uma economia e de um governo acha que isso é possível.

O mais importante, porém, é discutirmos se é desejável fixar um piso de gasto para a educação. Responder de forma negativa a essa pergunta é extremamente impopular. Sobretudo porque se fala em algo tão sério. Formar as pessoas deveria ser a maior prioridade do governo, da sociedade, em suma, de todo o país.

A educação merece mais do que há hoje, sem dúvida. E, diante dessa certeza simples, os deputados decidiram dedicar mais dinheiro à tarefa. O que precisamos aumentar na educação, porém, é a qualidade. Quanto mais dinheiro, mais qualidade, não? Não necessariamente.

Esse axioma traz o defeito da inversão, que se torna claro para qualquer microempresário ou mesmo para alguém que cuide bem do orçamento doméstico. Pense na reforma de uma casa. Primeiro a pessoa imagina o que deseja: a ampliação de um cômodo, a renovação da cozinha ou do banheiro. E então parte para o orçamento. Descobre o que é possível e, eventualmente, revê o projeto ou a expectativa de gastos para maximizar a relação custo/benefício. Ninguém em sã consciência começa a conversa com um pedreiro e diz ter

R$ 100 mil para gastar, revelando não ter ainda certeza do que pretende fazer. Quando se pensa em uma pequena obra, é fácil entender que um aumento de, digamos, 50% no orçamento não significa necessariamente igual ganho de qualidade.

Para os parlamentares e para os grupos de pressão que atuam no Congresso Nacional, parece fácil comprometer recursos que nem sequer existem ainda. Deputados de oposição se deleitaram com a derrota que conseguiram impor ao governo, elevando o patamar fixado no projeto de lei de 7% para os 10% aprovados. Esquecem-se de que o mundo vai dar muitas voltas, aliás já deu outras tantas: o PSDB no poder defendeu o oposto.

Quando foi aprovado o plano de educação da década passada, o presidente da República era Fernando Henrique Cardoso. Ele vetou o piso para gastos públicos com educação, que naquela época foi fixado em de 7% do PIB. Isso enseja uma outra pergunta: por que, antes de mais nada, o governo petista apresentou um projeto com os 7% vetados antes? Por uma indesejável coerência. Afinal, o PT defendeu como oposição essa ideia equivocada de pôr o carro na frente dos bois, ou o dinheiro antes das realizações.

Há muitas razões para a insana determinação de fixar, em patamar o mais alto possível, um piso de gastos públicos: voluntarismo bem intencionado, vontade de atrapalhar o governo ou o objetivo de garantir um manancial de abastecimento a emendas ao Orçamento, convênios e obras, a ser usado pelos parlamentares como moeda eleitoral. É notável, porém, a escassez de preocupação real com a melhoria de qualidade nas discussões do Plano Nacional de Educação.

A insistência foi grande em torno dos 10%, que acabaram emplacando na Câmara. Não houve pressão, porém, para mudar os indicadores de qualidade previstos na meta 7 do PNE, que estabelece notas a serem atingidas pelos estudantes do ensino básico. Note-se que essa meta não é tão ousada assim. No ensino médio, deve passar de 3,7 em 2011 para 5,2 em 2021. Em 10 anos, terá de dobrar. Já o gasto público terá de dobrar. E não é daqui a 10 anos, não. Os 10% deverão ser a média anual na década: se não forem cumpridos já, será preciso gastar mais de 10% depois.

Nem tudo está perdido ainda. O PNE deverá ser discutido pelo Senado no início do próximo semestre, e com urgência, pois já deveria estar em vigor. É uma grande oportunidade para que os senadores e a sociedade se debrucem sobre o tema com a vontade de resolver o que realmente importa: como garantir que os brasileiros saiam da escola com conhecimento e criatividade, capazes de ser felizes e promoverem a felicidade de todo o mundo.

Os deputados conseguiram dobrar a meta de gastos públicos com educação, contrariando o governo. Mas não se importaram em aumentar os objetivos de qualidade

Fiat lux - SONIA RACY


O ESTADÃO - 15/07

Em tempos de PIB fraco, Dilma quer derrubar a tarifa de energia elétrica no País – para aumentar a competitividade do setor produtivo.

A presidente se prepara para uma batalha: convencer os governadores a diminuir o peso do ICMS sobre o preço final, hoje em torno de 22%.

Cartão-postal
Para decorar a Casa Brasil, em Londres –point brasileiro nos Jogos Olímpicos –, a carioca Kakau Höfke criou almofadas com gravuras dos mais famosos pontos turísticos do Rio: Cristo e Pão de Açúcar.

Direto de NY
Claudia Abreu, estrelado tecnobrega na novela das 7, prestigiou o maridão, José Henrique Fonseca, que apresentou, sexta, o longa Heleno no MoMA Premiere Brazil!, em NY. Na quinta, ela se emocionou na abertura do festival, que exibiu À Beira do Caminho, de Breno Silveira.

Direto 2
Ilda Santiago e Renata de Almeida também estão por lá. Além de Paula Lavigne, que ciceroneia o rapper Criolo. Ele faz show no Central Park dia 21, ao lado de Bebel Gilberto e Renegado.

Rasante
Marta, nossa futebolista galáctica,veio da Suécia para filmar campanha da Coca-Cola em Paraisópolis. Depois, juntou-se à seleção, que treina na Suíça para as Olimpíadas.

Mosqueteiros
Tony Blair, Bill Clinton e FHC se reúnem em agosto na Casa Fasano, em SP. Vão falar a CEOs da América Latina sobre possíveis cenários econômicos para os próximos anos.

Responsabilidade social

•A produtora Sala12 e o Peixe Urbano estão unidos em prol de jovens da Brasilândia. Realizam, desde o mês passado, oficinas de arte de rua para adolescentes da região. A iniciativa tem apoio da ONG Mensageiros da Esperança e patrocínio de Deutsche Bank e Phooto.

•A marca de acessórios femininos Be Forever criou bolsas com estampas de garrafas PET para ajudar o Instituto Íris, que treina cães-guia para deficientes visuais.

•A CNS está vendendo toalhas assinadas por Gustavo Rosa em prol da Fundação Ação Criança. O garoto-propaganda da campanha beneficente é o ator Julio Rocha.

•Colegas, filme dirigido por Marcelo Galvão, que mostra a vida pela ótica de três personagens com Síndrome de Down, foi selecionado para concorrer no Festival de Cinema de Gramado, em agosto.

•A Avon Foundation for Women avisa: estão abertas, no site, inscrições para o Concurso Mundial para Criação de Aplicativos Pela Não Violência Doméstica. Vão até 31 de julho.

•Vêm aí as capas de tablet da Fom, feitas de pelo ecológico. Chegam às lojas ainda esta semana.

•A Miami/ESPM e a AACD fecharam parceria para criar ações de marketing que estimulem novas doações. Com apoio do varejo, a meta é captar em torno de R$14 milhões em contribuições para a entidade.

Dom Eugenio - CARLOS HEITOR CONY

FOLHA DE SP - 15/09


RIO DE JANEIRO - Se fosse muçulmano, umbandista, técnico de futebol, comunista ou lixeiro, dom Eugenio Sales seria o que sempre foi: um homem reto, sincero, fiel a seus princípios e, sobretudo, humano. Acontece que foi sacerdote, bispo e cardeal. Sua trajetória tinha um ponto de referência lá em cima -no caso dele, o Deus no qual acreditava e a igreja à qual servia em tempo integral e em modo total.

Conservador, sim, e mais do que isso: coerente e sincero com sua forma de pensar e agir no mundo.

O pessoal de certa esquerda o criticava porque não bajulava causas e doutrinas que entravam em moda. Ele fizera sua opção básica por uma religião estruturada, multissecular, que passara por um "aggiornamento" no Concílio Vaticano 2º. Não trocaria esse corpo de pensamento social e ação por um marxismo superado, um socialismo terceiro-mundista e badalativo.

Além da doutrina tradicional da igreja à qual serviu, atualizou-se com as encíclicas que foram até citadas por João Goulart no famoso comício de 13 de março de 1964: a "Mater et Magistra", a "Populorum Progressio" e a "Pacem in Terris". Pessoalmente, creio que nem Jango nem a turma que o cercava tivessem lido (ou entendido) os documentos que gostavam de brandir para amenizar resistências numa sociedade que, afinal, se rotula de cristã ocidental.

Protegeu perseguidos políticos daqui e de fora, com uma firmeza que desarmava os militares. Eu próprio, em certa época, fui rastreado por ele e por dois de seus auxiliares, dom Eduardo e dom Rafael.

Em alguns momentos de perigo que atravessei, ia dormir na casa de dom Eugenio, no Sumaré, quando fumávamos nossos charutos.

Detalhe importante: ele nunca me chamou pelo meu nome usual, mas de Heitor. Como meu pai e minha mãe.

Tremor na base - DORA KRAMER


O Estado de S.Paulo - 15/07

Sentindo que Lula poderá não voltar a se candidatar - mesmo se a saúde permitir, por razões políticas - e querendo assegurar o papel de protagonista no projeto de continuidade no poder, o PT estaria fomentando atritos entre os outros dois principais partidos de sustentação ao governo para, assim, enfraquecê-los junto à presidente Dilma Rousseff.

Pode ser fato ou só impressão, mas é essa a versão preponderante nas conversas entre lideranças do PSB e do PMDB a respeito do que entendem como um plano para criar um cenário de dificuldades a fim de "vender" - é o termo utilizado - proteção à presidente, apresentando-se a ela como fiel esteio a fim de assumir o papel de maior destaque que os petistas esperavam ter no governo sem Lula à frente da Presidência.

Apontam como o arquiteto da obra o deputado cassado e réu do mensalão José Dirceu, lembrando o discurso dele em reunião de sindicalistas no ano passado dizendo que no governo Dilma o PT teria espaço para fazer e acontecer, o que por enquanto não se confirmou.

Ao contrário: os petistas se sentem alijados e desconfortáveis com a maneira mais cerimoniosa da presidente de tratar dos interesses do partido, enquanto a veem mais próxima de valores que vinham sendo reclamados pela sociedade e deixados de lado pelo partido durante a gestão Lula, conduta que lhe confere uma autonomia além do esperado no programa original.

Nesse quadro, a possível volta do ex-presidente era um trunfo e, quando essa hipótese se distancia, o PT começa a se inquietar com o futuro e a trabalhar para se fortalecer.

Como faz isso, na visão dos aliados? Enfraquecendo as outras correntes de sustentação ao governo a fim de tornar a presidente cada vez mais caudatária do PT. A meta seria afastar esses partidos da convivência presidencial e dos ministérios para ceder maior espaço ao partido à medida que se aproximar a campanha presidencial de 2014.

Com essa análise na cabeça, PSB e PMDB decidiram que o melhor a fazer é não cair na armadilha, não brigarem entre si, não disputarem quem é o mais próximo da presidente, mantendo sempre ativa uma linha direta de diálogo com Dilma e reafirmando apoio à reeleição dela.

Em suma e com outros detalhes sobre o risco de as artimanhas do PT acabarem levando os aliados a procurar outros caminhos, foi o que disse a Dilma o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, no jantar que teve com ela há uma semana.

Risca de giz. O senador Aécio Neves vetou a coligação na chapa de vereadores em Belo Horizonte sabendo que os petistas não aceitariam, para forçar a ruptura da aliança e assim demarcar terreno como pré-candidato de oposição à Presidência.

No momento em que o PSDB dá duro para combater o PT em diversas praças, principalmente em São Paulo com José Serra à frente, Aécio precisava dar uma demonstração ao partido de que sabe falar grosso com o adversário.

Ainda que entenda as razões, Dilma Rousseff está contrariada com o prefeito de BH, Marcio Lacerda, que 15 dias antes da ruptura havia lhe garantido a continuidade da aliança.

Trem fantasma. Demóstenes Torres não poderia ter substituto mais "representativo" que Wilder Morais. Biônico como todo suplente de senador, indicado para a chapa por Carlos Cachoeira, acusado de omitir patrimônio da Justiça Eleitoral, tomou posse na calada de uma manhã de sexta-feira.

De surpresa, rapidamente para não dar tempo a questionamentos e, fazendo jus ao pequeno, mas já notório histórico, sem dar explicação alguma sobre as suspeitas que o cercam prestou juramento da tribuna do Senado prometendo honrar o mandato "que o povo de Goiás" lhe conferiu.

Parece brincadeira, seria bom que fosse, mas lamentavelmente não é.

Cabe a suas excelências, se autoridade moral lhes restar, decidir se deixam por isso mesmo.

Maré vermelha - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 15/07

Pilares da base de Dilma Rousseff, PT e PMDB reforçaram presença nas disputas municipais em São Paulo, principal reduto do PSDB. Petistas disputarão 258 prefeituras, contra 213 em 2008. Peemedebistas encabeçam 226 chapas -12 a mais. No governo há 17 anos, tucanos terão candidatos em 394 municípios -queda de 31. Os dados, extraoficiais, justificam o temor de Geraldo Alckmin com o avanço do consórcio encabeçado pela presidente e o vice, Michel Temer, para 2014.

War A redução do contingente de candidatos a prefeito do PSDB reflete a opção por alianças competitivas e por cidades com maior densidade populacional. "Vamos aumentar a votação em cidades hoje administradas pelo PT", prevê o secretário-geral tucano, César Gontijo.

Anorexia Alvo da dissidência que resultou na criação do PSD, o DEM foi a legenda que mais definhou em relação a 2008: caiu de 190 para 120 candidatos próprios a prefeito no Estado.

Inimigo íntimo PSDB e PT coabitam em 53 coligações majoritárias em São Paulo. Em 10 cidades, os petistas apoiam cabeças de chapa tucanos. Em outras três localidades, a situação se inverte. Resolução do PT só permite esse tipo de aliança em cidades onde já tenha sido selada nas eleições anteriores.

Prozac O PSDB nacional faz prognóstico para lá de positivo sobre suas chances nas capitais. Levantamento feito pelo partido contabiliza nada menos que 10 dessas cidades em que seus candidatos supostamente disputam com chance de vitória, além de outras 5 em que conta com chance de vitória de aliados.

Lexotan O líder do PSD na Câmara, Guilherme Campos, fiel escudeiro de Gilberto Kassab, passou a semana chamando um a um os deputados do partido para tranquilizá-los de que a intervenção decretada em Belo Horizonte não se repetirá em outras cidades país afora.

PIB verde Em paralelo à disputa de Fernando Haddad (PT) e Soninha Francine (PPS) pelos votos dos marineiros, José Serra reuniu empresários adeptos da agenda sustentável. O QG do tucano chamou 40 deles para um "brainstorm" ambiental.

Lição de casa Vencida no Código Florestal, Marina Silva adverte aliados de Dilma sobre a próxima briga dos "sonháticos": a ex-ministra promete engrossar a pressão pela aplicação de 10% do PIB em Educação, aprovada pelo Congresso e rejeitada por Guido Mantega (Fazenda).

Triangulação A quebra de sigilo da construtora Delta, entregue à CPI do Cachoeira, revela que a construtora fez pagamentos a empresas que também foram fornecedoras de campanhas políticas em 2004 e 2010.

Combustível Cruzamento entre a movimentação de uma conta da Delta no Banco do Brasil e dados do Tribunal Superior Eleitoral mostra que postos de gasolina receberam dinheiro da construtora exatamente um ano após prestar serviços para campanhas de parlamentares do Rio de Janeiro, Pará, Mato Grosso do Sul e Rondônia.

Santinho Em 2004, uma conta da empreiteira pivô do Cachoeiragate no Banco Rural foi usada para repassar R$ 61 mil para uma papelaria que foi fornecedora de campanhas no Rio para candidatos do PV, PC do B e PMDB.

Companheiro Centrais sindicais lideradas pela UGT de Ricardo Patah pediram audiência com Gilberto Carvalho nesta semana. Vão dizer ao secretário-geral da Presidência que não concordam com a proposta de mudança na CLT advogada pela CUT.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

Tiroteio
"Para a Dilma o importante é ter mais Bolsa Família para parecer que o governo cuida da área social. O resto é irrelevante."
DO PRESIDENTE DO PSDB, DEPUTADO SÉRGIO GUERRA (PE), sobre o fato de a presidente ter minimizado o PIB como indicador do crescimento do país.

Contraponto
Piquete
Irritado com a demora do ministro Aloizio Mercadante (Educação), que participaria de audiência pública na Comissão de Educação do Senado, o presidente do colegiado, Roberto Requião (PMDB-PR), reclamou ironicamente com assessores do petista:
-Assim vou ser obrigado a colocá-lo na mesa com três professores em greve!
Mercadante chegou com atraso de pouco mais de 40 minutos ao evento. O motivo: estava reunido no Palácio do Planalto com a presidente Dilma Rousseff exatamente em discussão sobre as reivindicações da categoria.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 15/07

Ministério da Saúde lista referência de preços
O Ministério da Saúde vai preparar uma ata de preços que servirá como base para orientar os Estados nas compras púbicas de equipamentos do setor.

Com a medida, o órgão afirma que pretende fazer com que os valores dos produtos comprados pelos governos sejam padronizados para evitar oscilações nos processos licitatórios.

"O registro de preço garantirá que os valores não sejam exorbitantes em um lugar. Hoje, os Estados compram a preços muito variados. Será uma referência", diz Zich Moyses Júnior, do ministério.

A iniciativa ocorre após a publicação do decreto, no final do mês passado, que cria uma margem de preferência para a compra de produtos médicos nacionais realizada pelo governo.

Pela medida, abrangida pelo PAC, o governo poderá pagar até 25% a mais por itens como cateter, marcapasso, máquina de hemodiálise e outros, desde que tenham sido fabricados no país. Foram definidos cerca de 80 equipamentos de produção doméstica que terão preferência em relação aos importados nas compras públicas.

A elaboração de uma lista de preço é tema delicado, segundo Carlos Goulart, presidente-executivo da Abimed, entidade que reúne o setor.

"Temos que ver como isso vai ser feito. É preciso cuidar para que não haja comparações indevidas", diz Goulart.

DOCE ASIÁTICO
A Arcor, multinacional argentina fabricante de balas, chocolates e biscoitos, acaba de abrir seu primeiro escritório na Ásia, na cidade chinesa de Xangai.

O objetivo da empresa é aumentar as vendas de seus produtos no continente.

"A unidade será uma base para facilitar as exportações principalmente para China, Índia e Filipinas", diz Oswaldo Nardinelli, diretor-geral e principal executivo da companhia no Brasil.

Até o final deste ano, a empresa concluirá o investimento de R$ 60 milhões para expansão de suas fábricas no Brasil.

"Vamos dobrar a produção de chocolates em Bragança Paulista (SP) e a de balas em Rio das Pedras (SP)", afirma Nardinelli.

O Brasil é o principal mercado da companhia fora da Argentina e representa 16% do faturamento do grupo.

R$ 1 BILHÃO
é o faturamento da companhia no Brasil

5

fábricas no país

4.000

funcionários no Brasil

LENTE DE AUMENTO
A rede de óticas Fototica mapeou pontos no país para iniciar o plano de expansão com foco no crescimento da classe média. O projeto piloto de 25 unidades definido para este ano já começou a ser aberto. Para 2013, estão previstas outras 60, todas próprias. Além disso, mais de cem unidades que a empresa já possui serão reformadas para um modelo que facilite a venda de combos, com pacotes que incluem armações e lentes.

"O foco não é o grande shopping center. São ruas e centros comerciais onde há potencial, como a zona Leste de São Paulo", diz Marcelo Ferreira, presidente da empresa. A expansão inicial ocorre em São Paulo, Pernambuco e Bahia.

O QUE ESTOU LENDO
Graça Foster, presidente da Petrobras

Mesmo após assumir a presidência da companhia de petróleo, em fevereiro, Graça Foster mantém o hábito de ter entre as mesas de casa e do escritório ao menos três livros. A principal leitura atual é "My Early Life", de Winston Churchill.

"A arte de escrever sobre si mesmo de forma delicada, e nos fazer entender mais não só sobre ele, mas sobre a forma de ser dos demais, é demonstrada com muita sensibilidade", diz Foster.

As memórias do chefe de Estado britânico sobre sua infância e juventude foram presente de uma amiga dela em Londres.

Outro livro que tem dedicatória, só que do autor Daniel Yergin, é "The Quest Energy, Security, and the Remarking of the Modern World". "A reflexão sobre 'how much oil' também é parte desse ótimo livro."

Além das questões de energia e liderança, Foster se debruça sobre a vida de um dos Beatles. "Um dia chego ao final, faltam umas 400 páginas de 'John Lennon -The Life', de Philip Norma."

Também tinha dedicatória, mas que ela não declara de quem, em "The First 90 Days: Critical Success Strategies for New Leaders at All Levels", livro que Foster recebeu e leu no início de sua gestão na estatal.

CRÉDITO ÀS pequenas
O Banco do Brasil desembolsou R$ 15 bilhões de capital de giro para micro e pequenas empresas de São Paulo nos seis primeiros meses deste ano -alta de 13,6% ante mesmo período de 2011.

A redução das taxas de juros e a ampliação dos limites de crédito influenciaram o crescimento.

O Bradesco não fechou os números do primeiro semestre. Em março, sua carteira nacional de crédito a micro, pequenas e médias somava R$ 106,7 bilhões, alta de 20,6% ante o mesmo mês de 2011.

INOVADORES EM ALTA
Poucas empresas no país têm hoje um setor destinado à inovação, segundo estudo da R.Hannun encomendado pela consultoria Symnetics.

Enquanto 38% dos executivos ouvidos afirmaram que a companhia onde trabalham tem uma área específica, 70% acham necessária a existência do setor.

"Essa demanda mostra que as empresas sentem falta de se organizar para viabilizar a inovação. Não é tanto uma estrutura física separada que fará a diferença", afirma Fanny Schwarz, sócia da Symnetics.

LANCHE FRESCO
Com unidades apenas em Brasília e Goiânia, a rede de lanchonetes Quiznos entrará nas regiões Sul e Sudeste.

Serão seis lojas até o fim do ano, todas em Curitiba. No início de 2013, a rede chegará a São Paulo. As primeiras unidades serão próprias e servirão de modelo para franquias.

A empresa espera abrir anualmente cerca de 30 lanchonetes no país nos próximos dez anos.

A expansão faz parte da estratégia da marca, que também entrará no Paraguai, na China e na Índia.

GOSTOSA


Palmeiras! O Porco tava raquítico! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 15/07


E diz que o Debóchenes vai voltar em 2027. E vai dar de cara com o Sarney. O Sarney é cenário do Senado! Rarará!

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Que semana! Corinthians Libertadores e Palmeiras Campeão. Onde é que aperta o botão do fim do mundo? Uma onda gigante vai invadir tudo! Semana bombada: Debóchenes cassado e Palmeiras Campeão. E sabe por que o Maluf tá apoiando o Haddad? Porque o Haddad não é bom de provas! E o Maluf detesta provas.
E qual o destino do Debóchenes? Diz que o Debóchenes vai voltar em 2027. E vai dar de cara com o Sarney. Sentado na mesma cadeira. Firme e Fortão! O Sarney é cenário do Senado! Ou então o Debóchenes volta pra Goiânia e cria um dupla sertaneja: Cascatinha e Cachoeira. Ou, como disse o Helio de La Peña do "Casseta & Planeta": "Vai assumir um ponto de bicho no centro de Goiânia!".
E os senadores? Eu gosto dos senadores porque eles falam "peremptório". E "egrégia". Gosto muito de "egrégia". "Egrégia" é tudo! E teve um senador que citou até Sêneca e depois disse: "Nós não podemos SE conformar". Rarará! O Sêneca não era muito bom de concordância!
E sabe quem vai ocupar a vaga do Debóchenes? O ex-marido da mulher do Cachoeira! Isso se chama: EFEITO CASCATA! Rarará! Vai dar merda! Tudo que é ex dá confusão: ex-mulher, ex-amante, ex-marido!
E o Palmeiras campeão? Depois de séculos. A cidade ainda tá com cheiro de mofo! Estouram rojão mofado. Com cheiro de mofo, mas pelo menos estouraram. Não é como o meu São Paulo, que só estoura pipoca.
A única coisa que são-paulino estoura é pipoca! Agora só resta pros são-paulinos torcer pro Léo Áquila ganhar "A Fazenda"! E a Gretchen? Saiu de "A Fazenda". Num guentou. Abstinência matrimonial! A Gretchen saiu da fazenda e ficou num mato sem cachorro. Ops, sem marido. A bunda da Gretchen não é uma fazenda, é um latifúndio!
E os corintianos? Não precisam cavar túnel pro Japão. Já tem agência com promoção: "Japão em 48 vezes: Passagem pro Japão, passaporte falsificado, vale-refeição internacional e barraca de camping". E dicionário com tradução de expressões úteis direto pro japonês: "Perdeu, mano". "Vai levar pipoco." "Não fui eu." "Sou trabalhador." "Quero minha mãe." Adorei o "quero a minha mãe"!
E ainda bem que acabou o campeonato. Não aguentava mais gritar "Chupa!"; "Chupa, Boca!" "Chupa, Coxa!" "Chupa, Porco!" E Chupacabra! Tamos na fase da fixação oral!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

O gerúndio na política - PERCIVAL PUGGINA


ZERO HORA - 15/07


Formas gerundiais devem ser usadas com cautela. Não são caldo de galinha do bom estilo. Por isso, chama a atenção a invasão dos gerúndios na comunicação nacional. Você liga para um 0800 da vida com o intuito cívico de reclamar sobre algo. Quer providência e solução. Não obstante, inevitavelmente, a resposta vem assim: Vamos estar encaminhando sua solicitação... Vamos estar entrando em contato. Vamos estar agendando. E por aí “vão indo” os encaminhamentos.

Poderíamos dizer que é apenas um dos muitos erros acolhidos no nosso modo de falar. No entanto, se prestarmos atenção aos motivos dessa construção verbal, perceberemos que a linguagem frauda a mensagem. O gerúndio, empregado assim, dissimula uma negação do que expressa. Cria uma ilusão, ao sugerir que a ação ocorrerá no tempo presente, de modo continuado – encaminhando, entrando em contato, agendando. Mas faz o inverso disso ao remeter tudo para as imprecisões do futuro e da impessoalidade, através do “vamos estar”. Quem diz vamos estar, não está. Omite a informação sobre quando estará. E não atribui a alguém o dever de estar. Para que a frase merecesse credibilidade seria necessário usar o verbo no tempo futuro, estabelecer quando a ação seria cumprida e indicar seu sujeito: encaminharei neste momento, entrarei em contato hoje, o diretor agendará imediatamente, e assim por diante. Imagine, leitor, o que aconteceria se na empresa do tal 0800, um gerente, interpelado por seu chefe sobre determinado problema, respondesse com um “vamos estar verificando e estaremos encaminhando”...

Mas isto aqui não é lição de Língua Portuguesa. Nem eu a saberia ministrar. Pretendo mostrar que essa formulação marota, à qual nossos ouvidos “vão estar se habituando” cada vez mais, ganha crescente espaço no discurso político. Aliás, é a cara da nossa política perante as carências nacionais. Reflete a falta de projetos, a fatuidade dos programas de governo e os solavancos administrativos causados pelas manchetes. As decisões de governo, no Brasil, “estão sendo” tomadas ao sabor das emoções.

Indagado sobre problemas específicos de sua atividade, o gestor público nunca mostra surpresa e raramente fornece resposta com começo meio e fim. A nova técnica consiste em dizer que “temos estado estudando” e “estaremos acompanhando, planejando, promovendo” ou coisas que o valham. Assim, há mais de uma década, temos estado tentando sair do RS para o norte do país por uma rodovia digna, e há mais de trinta anos temos estado programando soluções para o problema da BR-116 entre Porto Alegre e Novo Hamburgo, por exemplo. Eminentes pedagogos têm estado estudando a queda dos nossos indicadores educacionais, mas são sucessivas gerações de alunos que vêm sendo, mesmo, prejudicadas.

Avizinha-se um pleito municipal. Fique atento ao que dirão os candidatos. Firmou-se entre nós um hábito segundo o qual o que é prometido para os primeiros dias seguintes à posse, o pacote de bondades do discurso eleitoral, fica postergado para o último mês de dezembro do quadriênio em disputa. E o que acaba posto em prática é um pacote de maldades cautelosamente omitido durante a campanha. Os candidatos deveriam detalhar e comprometer-se com seus programas de governo. Os eleitores deveriam esmiuçá-los, ponderá-los, confrontá-los. E cobrá-los. No Brasil, ganha-se a eleição com um programa e governa-se com outro. A partir da posse, as bondades vão para o gerúndio. E o presente do indicativo serve para outras coisas.

Tirar o pé do freio para crescer - AMIR KHAIR


O ESTADÃO - 15/07

O governo desistiu da sua meta de crescimento de 4,5% para este ano. A série de pacotes de estímulos não surtiu o efeito desejado, o Banco Central reduziu a previsão de 3,5% para 2,5%, a indústria recua, o varejo fraqueja e a arrecadação federal cresce abaixo da previsão oficial. Algumas análises culpam a insuficiência dos investimentos, que no primeiro trimestre foi de 18,7% do PIB, quando deveria ser de 25% (!). Mas reconhecem que, para atingir isso, vai levar tempo e o que se deseja é uma recuperação mais rápida da letargia econômica.

Há consenso ao reconhecer que a crise internacional vem derrubando o crescimento em todos os países, e, nesse ambiente, investir é arriscado para as empresas.

Há os que apostam que na insuficiência do investimento privado a solução é o governo federal investir mais, mas é apostar numa eficiência de gestão com sérias dificuldades para conseguir tirar as obras do papel.

Há também consenso de que o crescimento não virá pela via das exportações, pois o mercado externo está saturado e fortemente vendedor. A não ser em algumas commodities, na agricultura e pecuária é possível algum resultado, mas, mesmo assim, sem expansão significativa sobre o ano anterior. O consumo das famílias, segundo essas análises, atingiu seu limite devido ao que consideram ser excessivo o endividamento, com um quarto do orçamento doméstico comprometido com o pagamento de prestações.

Interessante notar que, sobre os juros embutidos nessas prestações, há omissão. Segundo a Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), os juros médios em abril (antes da ação do governo) foram de 107% ao ano, em maio recuaram para 105% (!) e em junho subiram para 106% (!). Bela redução. Metade das prestações são juros. Eis a razão da inadimplência e o principal freio ao crescimento.

O que fazer? A primeira coisa a reconhecer é que a economia está emperrada devido ao potente conjunto de freios que o governo ainda não removeu por medo do fantasma da inflação. São eles: Selic, juros bancários e carga tributária sobre o consumo, dos mais altos do mundo, e liquidez das mais baixas do mundo. Para remover esses freios, são necessárias medidas de curto e longo prazo.

Curto prazo. A redução dos juros (básico e bancário) e da carga tributária vai aliviar a o orçamento doméstico, bem como o custo de produção e o capital de giro da empresa. Mas isso é factível? Sim, e rápido. Se o governo decidir reduzir a Selic para 5% (não se justificam 8%) vai economizar os recursos necessários à desoneração sensível na carga tributária. Além disso, a queda da Selic reduz os ganhos de tesouraria dos bancos e, se tabelar, reduzindo as tarifas bancárias (não sei porque ainda não foi feito), vai empurrar os bancos privados na ampliação da oferta dos empréstimos, gerando a necessária concorrência bancária com, aí sim, a redução dos juros.

Não basta o Banco do Brasil e a Caixa reduzirem seus juros. É necessário seguir o conselho do economista- chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban): "Você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água". Sem querer, ensinou o caminho das pedras: aperte o lucro dos bancos. Isso é que vai levar o cavalo ao rio. É bom o governo ouvir quem é do ramo.

Para ativar exportações, a medida de maior eficácia é a desvalorização cambial que pode ser alcançada sem ônus via ampliação da liquidez, à semelhança do que vêm fazendo os países desenvolvidos, que desvalorizaram suas moedas para elevar suas exportações. O câmbio, para isso, deve ser ligeiramente acima de R$ 3,00, que é o nível necessário para permitir o equilíbrio nas contas externas. Para isso, é necessário elevar a liquidez (6% do PIB) no País, que é metade da praticada na Argentina e México.

Longo prazo. Emplacar a reforma tributária, mas não nos moldes de mera simplificação do ICMS- como tem sido até hoje, e que pouco efeito teria sobre a carga tributária -, mas sim desonerar o consumo, que é super tributado, reduzindo o poder aquisitivo da população.

Isso é que faz com que quem ganha até dois salários mínimos (SM) pague 49% do que ganha em tributos e quem ganha cima de 30SM,26%. Essa é a trava mais difícil de ser removida, pois é secular. Isso ocorre, principalmente, devido ao ICMS, que onera cerca da metade da tributação sobre o consumo. O ICMS é um imposto estadual e o que mais pesa na carga tributária. Para reduzi-lo, é necessário estabelecer alíquotas inferiores às atuais, especialmente para as que gravam os bens e serviços de consumo popular.Éaquique entra, especialmente, a redução nas elevadas alíquotas que incidem sobre as contas de energia elétrica e telefone.

Os Estados sempre barraram a aprovação da reforma tributária temendo perder arrecadação do ICMS, que seria alterado para ser cobrado no destino onde a mercadoria é consumida ou usada. O governo federal já informou que garantirá a compensação integral e de forma automática aos oito Estados que poderão perder com a alteração no ICMS. O governo federal deu, assim, o sinal verde. É preciso mudar o sinal vermelho dos Estados. Não há outra saída senão forte e persistente pressão da mídia sobre os governadores e o Congresso, para o processo de aprovação dessa reforma ter chance de ocorrer.

Para as empresas retomarem o poder competitivo, além da desoneração tributária e da queda dos juros (medidas de curto prazo), é fundamental a redução dos custos externos à sua porta: logística, infraestrutura e burocracia. Os dois primeiros podem melhorar em função do lento crescimento do PAC e da ação das empresas, que investem por não poder esperar pela ação governamental.

Quanto à burocracia, é possível descomplicar exigências de controle inerentes ao preenchimento e apresentação de documentação se o princípio a ser adotado na desburocratização for o de que as empresas procuram agir corretamente segundo as normas em vigor. A verificação desse cumprimento deve ser feita a posteriori, via fiscalização seletiva,que pode ser suficiente para coibir os que querem delinquir. A própria simplificação dessas normas irá facilitar seu cumprimento.

Mas se o governo continuar acreditando nos pacotes de estímulo e não remover os freios que ele próprio impôs ao desenvolvimento, dificilmente irá conseguir ultrapassar o crescimento de 2,7% registrado no ano passado. É hora, pois, de tirar o pé no freio (juros e carga tributária elevada e liquidez baixa) e deixar o País crescer. A bola está só com o governo.

Menos café, mais leite - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 15/07


BRASÍLIA - São Paulo, Estado, e São Paulo, capital, acostumaram-se a ser tratados no Brasil como centros do universo -e não apenas por paulistas e paulistanos. Maior economia, polo irradiador de cultura, berço do PT e do PSDB, base de FHC e de Lula, tudo parece começar e acabar em São Paulo. Ou parecia.

Nestas eleições, a presidente da República não se mete nas estripulias de Lula em São Paulo e prefere cuidar de Belo Horizonte. São Paulo é de Lula e, de Minas, Dilma cuida.

Ela vem do PDT e não tem a menor paciência com o PT de São Paulo. Na primeira oportunidade, livrou-se de Palocci e o trocou por Gleisi. Em seguida, chamou Ideli. Elas são do PT, mas uma é do Paraná, e a outra, de Santa Catarina. Um trio feminino e não paulista manda no Planalto.

Agora mesmo, Dilma estuda alternativas ao líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia, do PT-SP, que deixou o pau comendo e viajou na última semana antes do recesso. Não é coisa que líder faça.

Assim, Dilma deixa Lula se divertir em São Paulo, mordendo canelas e tentando trucidar o PSDB, enquanto ela cuida da própria reeleição.

Melchiades Filho já escreveu neste espaço que a eleição de São Paulo reflete o passado, com Lula versus Serra, e a de Belo Horizonte aponta para o futuro. Perfeito.

É ali que todos os principais personagens de 2014 testam forças: Aécio Neves, Eduardo Campos, Michel Temer, Gilberto Kassab. É lá, portanto, a prova de fogo de Dilma, não mais como pupila, mas como líder. Se Lula pode se dar ao luxo de ser quase diletante, Dilma tem de se superar e ser pragmática.

Para Lula, o que interessa é ter o gosto de derrotar a oposição no seu último grande reduto. Para Dilma, o fundamental é fortalecer os laços com o PT e manter unida e sob controle sua imensa e ambiciosa base aliada. O laboratório é BH.

É assim que todas as fichas de 2014 já estão sendo jogadas -e em Minas. Façam suas apostas.

O Brasil, sua gente e o Oriente Médio - CELSO LAFER


O Estado de S.Paulo - 15/07


O Itamaraty realizou em 10 de julho mesa-redonda sobre a construção da paz no Oriente Médio, a partir do ângulo dos insumos criativos que a esse processo possam dar expoentes das comunidades de origem árabe e judaica de países do Mercosul.

O chanceler Antonio Patriota teve a gentileza de me convidar para participar do debate, mas a ele não pude comparecer por estar no mesmo dia em Washington com o presidente Fernando Henrique Cardoso, que ali recebeu o prestigioso Prêmio Kluge. Mas gostaria de aqui registrar algumas reflexões sobre o tema, que são basicamente as que tive a oportunidade de transmitir ao chanceler.

A "ideia a realizar" do preâmbulo da nossa Constituição é a dos "valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica de controvérsias". É em obediência a essa diretriz que, nos termos do artigo 3.º, IV, da Constituição, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é o de "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

Esse dispositivo constitucional está em consonância com válidas aspirações nacionais e corresponde, com as naturais discrepâncias entre o ser da realidade e o dever ser dos valores, a uma característica básica da experiência histórica do nosso país. Essa característica propiciou uma unidade numa plural e ajustada convivência das diversidades e levou a uma sociedade que é um amálgama criativo da heterogeneidade das procedências constitutivas do povo brasileiro. Este se corporificou como uma nova liga, de que falou José Bonifácio, o estadista da nossa Independência. Foi no contexto do amálgama dessa nova liga que os brasileiros de origem árabe e judaica encontraram espaço propício para desenvolver-se, enraizar-se, criativamente interagir uns com os outros e com todos os segmentos da população brasileira e integrar-se em todas as dimensões da vida nacional.

A experiência brasileira contrasta favoravelmente com a de outros países. Trata-se, assim, de um válido ativo de soft power num mundo fragmentado e permeado por xenofobias, preconceitos e dificuldades em relação ao diferente dos Outros. Não custa lembrar que as culturas perecem no isolamento e se vivificam na interação recíproca. Daí as virtudes e as virtualidades do nosso amálgama.

Penso, assim, que a cultura política que vem contribuindo para a construção da arquitetura, ainda que imperfeita, do Brasil como país é um ingrediente que oferece um locus standi para levar adiante uma ação diplomática em consonância com os princípios da defesa da paz e da solução pacífica de conflitos, preconizados pelo artigo 4.º da Constituição, que dá a moldura jurídica que rege as relações internacionais do Brasil.

Ninguém ignora as tensões difusas de hegemonia e de equilíbrio que assinalam o contexto regional do Oriente Médio e sua História. Essas tensões impactam o sistema internacional, permeiam e dificultam o processo de paz entre israelenses e palestinos, para o qual os Acordos de Oslo traçaram um válido caminho. Pondero, assim, que a experiência brasileira é fruto tanto de outra realidade histórica quanto dos dados da inserção do Brasil na América do Sul, muito distinta, na sua dinâmica política, da que caracteriza o Oriente Médio. É uma experiência que, por causa de sua especificidade, não pode ser mecanicamente transposta para outros contextos, mas é um exemplo que dá título de legitimidade ao exercício, pelo Brasil, de um esforço em prol da paz.

Concluo, por isso, que um dos objetivos do evento do Itamaraty é o de, valendo-se da experiência brasileira, reforçar o alcance da cultura de paz no Oriente Médio. Isso significa, no plano interno, preservar o Brasil de eventual intromissão dos ódios dos conflitos do Oriente Médio em território nacional, sempre um risco com a globalização, que internaliza o mundo na vida dos países. Penso, lastreado no princípio da prevalência dos direitos humanos contemplados no artigo 4.º da Constituição, que, como diz a Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo XXVI, 2), que tomo no sentido amplo de uma paideia, em sintonia com a experiência brasileira, promover, em consonância com o sentimento constitucional do Brasil, "a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as raças e grupos raciais ou religiosos", coadjuvando, assim, "as atividades das Nações Unidas em prol da paz". Isso se traduz, no plano externo, no exercício, pelo Brasil, do potencial do difícil papel de um terceiro em prol da paz, um tertius juxta partes, que tem como requisito obedecer à sempre atual lição do Barão do Rio Branco: "O dever do estadista, o de todos os homens de verdadeiro senso político, é combater as propagandas de ódio e as rivalidades internacionais".

Estas reflexões estão lastreadas nas observações de um estudioso das relações internacionais e na experiência da chefia, em duas oportunidades, do Itamaraty e que, ademais, tem consciência de suas raízes judaicas e do valor primordial da paz - o bem dos bens - na tradição judaica. O Pirkê Avot - A Ética dos Pais -, que recapitula os ensinamentos dessa tradição, preceitua: "Hilel diz: Sê dos discípulos de Aarão, ama a paz e busca a paz" (I. 12). Esse preceito aponta para a necessidade de se empreender um dedicado e contínuo esforço em prol da paz - sempre esquiva conquista da razão política -, posto que, como também ensina A Ética dos Pais, "o mundo se sustenta em três coisas: a verdade, a justiça e a paz" (I. 18) - ensinamento que igualmente compartilho na condição de professor de Filosofia do Direito.

O monstro - LUIS FERNANDO VERISSIMO


O Estado de S.Paulo - 15/07


Num dos eventos da Festa Literária Internacional de Paraty, cuja décima edição se encerrou no domingo passado, vários autores disseram na Rádio Batuta, do Instituto Moreira Salles, quais eram seus personagens literários inesquecíveis. Eu e o Zuenir Ventura fomos os últimos a depor. O personagem escolhido pelo Zuenir foi a baleia "Moby Dick", o meu foi outro monstro: Humbert Humbert, o narrador do livro Lolita de Vladimir Nabokov.

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Lolita é, para dizer pouco, um livro ambíguo, e a ambiguidade começa no nome duplo do seu narrador. O livro ficou famoso pela razão errada, o fato de ser a história da sedução de uma garota de 12 anos por um homem de mais de 40, mas seus méritos literários ultrapassam o escândalo. É um livro erótico, lido e interpretado como um livro erótico - tanto que durante muito tempo só foi acessível em certos países em edições pirateadas de uma editora francesa especializada em literatura erótica - mas que contém pouco sexo explícito. Seu narrador é ao mesmo tempo uma figura monstruosa e fascinante, um homem obcecado que submete uma menina à sua obsessão e um dos personagens mais divertidos da literatura moderna.

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Humbert Humbert é quase uma autoparódia do intelectual europeu empanturrado de cultura obsoleta, sendo simultaneamente repelido pela vulgaridade da América e perdidamente apaixonado por ela, na figura metafórica de Lolita. Até hoje os críticos discutem quem afinal corrompe quem, no livro. Lolita e a cultura superficial mas irresistível da jovem América corrompem o europeu ou a alta cultura europeia, mesmo priápica e decadente, corrompe a inocente América? Dada a ambiguidade do livro, talvez aconteçam as duas coisas.

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Lolita está para a obra de Nabokov um pouco como o Cântico dos Cânticos está para a Bíblia. Os dois textos exigem alguma ginástica argumentativa dos seus explicadores. Já ouvi o grande poema lúbrico de Salomão ser descrito como uma declaração cifrada de amor a Deus e até fundamentalistas, para quem tudo na Bíblia é verdade literal, fazerem uma exceção e admitirem metáfora, no caso. Lolita também seria uma anomalia na obra de Nabokov, que pouco usou o sexo nos seus outros livros. Há, mesmo, mais sexo no resto da Bíblia do que nos outros livros do Nabokov. Os explicadores de Nabokov, com a mesma intensidade dos fundamentalistas, combatem a ideia de que Lolita seja pornográfico.

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As andanças de Humbert Humbert e Lolita pelas estradas e motéis da América são vistas por alguns críticos como uma viagem do próprio Nabokov pela língua inglesa, ou - melhor - a língua americana. Lolita foi o seu primeiro romance escrito em inglês e ele aproveitou para inventar neologismos e brinca, com óbvio prazer, com termos e peculiaridades da sua língua adotada. Nabokov nunca diria, como Flaubert disse de Madame Bovary, "Humbert Humbert sou eu". Mas não há dúvida que ele também se divertiu com o personagem - esquecido, é claro, o destino da pobre Lolita nas mãos do monstro. O autor teve mais sorte do que Humbert Humbert, que escreve sua história na prisão, esperando a morte. Foram os direitos autorais do livro e a notoriedade que ele conquistou com a obra que permitiram a Nabokov voltar a morar na Europa e viver só da literatura. Metaforicamente, Lolita lhe devolveu a juventude.