sexta-feira, outubro 21, 2011

CAPA DA REVISTA VEJA 22/10


ALBERTO CARLOS ALMEIDA - Não basta sair ás ruas e protestar



Não basta sair ás ruas e protestar 
ALBERTO CARLOS ALMEIDA
VALOR ECONÔMICO - 21/10/11

Segundo o Barão de Itararé, uma negociata é um bom negócio para o qual você não foi convidado. Ou seja, todo mundo é contra a corrupção, somente seu beneficiário direto não é. Isso significa que todas as marchas contra a corrupção que vêm ocorrendo no Brasil têm o apoio de, pelo menos, 99% da população. O que temos visto é a manifestação direta e organizada de um desejo sempre captado pelas pesquisas de opinião. A corrupção é inaceitável porque é roubo, roubo de recursos retirados do bolso de cada brasileiro que paga impostos. Mais do que isso, esse recurso não é aplicado em serviços públicos importantes e que salvam vidas. Cada real que sai de nossos bolsos e vai para o bolso de um corrupto deixa de ser utilizado para atender pessoas em hospitais públicos, em emergências, em postos de saúde, medicamentos deixam de ser comprados para serem distribuídos à população, crianças não têm acesso a um ensino de qualidade, e um sem número de serviços que deixam de ser providos pelo governo, com impacto muito negativo na vida de todos nós. A corrupção é inaceitável e revoltante.

A grande questão é como combater e reduzir um fenômeno dessa natureza. É preciso ter em mente que corrupção é como crime violento: é possível combater e reduzir, mas jamais viveremos em um mundo sem crime ou sem corrupção. Mesmo os países menos corruptos acabam convivendo com algum grau de desvio de dinheiro público. O problema brasileiro é nossa percepção de que a corrupção nunca foi tão grande, ou mesmo de que é muito maior no Brasil do que em qualquer outro lugar do mundo.

A perspectiva histórica, mais do que documentada em centenas de estudos, revela que países atualmente tidos como pouco corruptos já passaram pelo mesmo drama que vivemos hoje. A corrupção política na Inglaterra do século XIX era avassaladora. O mesmo pode ser dito de Nova York há poucas décadas, quando o prefeito estava envolvido com a máfia local. Essa perspectiva nos permite concluir, de maneira realista, que a corrupção será reduzida no Brasil porque, como outros países e suas respectivas populações, nossa sociedade se opõe a ela.

As denúncias da mídia e as atuais marchas contra a corrupção são instrumentos da maior importância no combate ao roubo do dinheiro público. A mídia fornece transparência ao malfeito (para utilizar um termo de que a presidente Dilma Rousseff gosta muito) e as manifestações públicas tornam audível a voz rouca das ruas (termo de que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso gostava muito). A articulação entre a opinião publicada dos jornais e a opinião pública das ruas é fundamental para que os políticos fiquem com medo de serem pegos em casos de corrupção. Isso ajuda no seu combate.

A maior arma contra a corrupção, porém, é a existência de instituições que a combatam efetivamente. Mídia e opinião pública são instituições, mas não é a elas que me refiro, e sim ao Ministério Público, Justiça, Tribunais de Contas, Tribunais Regionais Eleitorais, agências reguladoras, leis, departamentos de ensino e pesquisa em nossas universidades que estudem fraudes, Conselho Nacional de Justiça, procuradorias, corregedorias etc. O processo de combate é longo e penoso, e seus resultados são lentos e, muitas vezes, frustrantes.

A importância da ação dessas instituições está comprovada cientificamente em artigo de Lee Alston, Marcus Melo, Bernardo Mueller e Carlos Pereira intitulado "The Predatory or Virtuous Choices Governors Make: The Roles of Checks and Balances and Political Competition". Utilizando dados para cada Estado do Brasil, eles mostram que, quanto mais ativas são essas instituições, menos os políticos do respectivo Estado enriquecem, menor é o gasto com pessoal como proporção da receita do Estado e menor é o déficit primário daquela unidade da federação. Os autores provam cientificamente que a interação entre Poder Judiciário ativo, tribunais de conta atuantes, procuradores públicos militantes, com auxilio da mídia local e da opinião pública, são imbatíveis quando se trata de limitar a margem de manobra dos políticos no uso do dinheiro público. A lição é clara: quem quer combater a corrupção precisa apoiar o fortalecimento das instituições que controlam o poder dos políticos.

Os cinco Estados que têm as instituições de controle mais fortes são Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e São Paulo. O lanterninha é o Maranhão de Sarney, antecedido por Roraima, Rio Grande do Norte, Piauí e Alagoas. Isso mostra que a família Sarney e Collor não são fenômenos isolados, que pairam sobre o mundo sem ligação alguma com suas instituições. Pelo contrário, os Sarneys só existem porque em seu Estado não foram desenvolvidas as instituições que os combateriam. Não existe algo equivalente para os cinco Estados que lideram a lista das regiões brasileiras com maior controle de poder sobre os políticos.

Outro artigo científico, "Creative Accounting and the Quality of Audit Institutions: The Achilles" Heel of the Fiscal Responsibility Law in Brazil", de autoria de Marcus Mello, Carlos Pereira e Saulo Souza, demonstra de maneira precisa que, quanto mais ativo é o Tribunal de Contas estadual, menores são os "restos a pagar" no orçamento local. Os "restos a pagar" são despesas orçamentárias transferidas para o ano seguinte. Ao fazer isso, o governo estadual adia um eventual impacto negativo de despesas no seu desempenho fiscal. Ou seja, na prática, "restos a pagar" mais elevados significam, em geral, mais gastos e menos responsabilidade fiscal. Os autores chegaram a uma conclusão tão previsível quanto surpreendente: quanto mais ativo é um Tribunal de Contas estadual, menores são os "restos a pagar". Isso é o mesmo que afirmar que no Brasil de hoje o maior guardião da responsabilidade fiscal dos Estados são seus Tribunais de Contas.

Eis minha sugestão para os organizadores das marchas contra a corrupção: passar a defender o fortalecimento das instituições judiciárias, dos Tribunais de Contas e procuradorias, promover abaixo-assinados, para serem enviado a todos os juízes, defendendo a condenação à prisão de políticos considerados corruptos, e também negociar com faculdades públicas e particulares a criação de departamentos de ensino e pesquisa exclusivamente dedicados ao estudo de fraudes e corrupção. O movimento contra a corrupção deve não só criticar, mas também passar a apoiar explicitamente as instituições responsáveis pela cassação do mandato de 296 prefeitos entre 2005 e 2008 e de outros 274 que já foram cassados depois de 2008. A grande maioria deles perdeu o mandato por improbidade administrativa ou por infração à legislação eleitoral.

É importante que as manifestações públicas contra a corrupção, assim como a cobertura da mídia sobre escândalos, não nos impeçam de reconhecer quanto já avançamos e quanto tem sido feito para impedir o roubo do dinheiro público. Para avançar, é preciso reconhecer os méritos do que já foi realizado, é preciso apoiar-se no que já foi feito. A legislação que dificulta a corrupção é toda ela melhorada de maneira incremental. Por exemplo, primeiro se estabelecem licitações, depois de algum tempo as licitações de menor preço, em seguida os pregões eletrônicos com lances, e para aperfeiçoar mais ainda, se define que não haja restrições às empresas que participarão do pregão de tal maneira que o número de empresas na concorrência seja o maior possível. Cada melhoria depende do aprendizado de acertos e erros da legislação anterior.

Qualquer administrador público eleito no Brasil atual sabe que muitas coisas que eram feitas há dez anos não podem mais ser feitas hoje, sob pena de tornar o político inelegível. Foi preciso tempo para que as leis fossem melhoradas. Foi preciso mais tempo para que as instituições passassem a agir de forma mais vigorosa e para que seus operadores percebessem que o cumprimento de seu papel seria benéfico para suas respectivas carreiras. Isso precisa ser reconhecido.

Por outro lado, a intolerância da sociedade à corrupção depende do aumento da escolaridade da população. Pessoas menos escolarizadas são mais complacentes com a corrupção do que pessoas de escolaridade mais elevada. Aliás, isto está devidamente provado no meu livro "A Cabeça do Brasileiro". Ou seja, não é da noite para o dia que uma sociedade passa a rejeitar de maneira cabal a corrupção. Pelo contrário, esse é um processo de extrema lentidão, porque depende do igualmente vagaroso aumento da escolaridade média de toda a população. Vamos às ruas, sim, mas tenhamos paciência e passemos a demandar o fortalecimento das instituições de controle.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo".

IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO - Dividindo o quarto com García Márquez



Dividindo o quarto com García Márquez 
 IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO
O ESTADÃO - 21/03/11

PARIS

Somente no terceiro dia percebi a pequena placa, à direita da porta de entrada do Hotel Trois Collèges. Na minha chegada, após 12 horas de voo e o táxi cortando a cidade em meio a congestionamentos provocados por blitz da policia, por acidentes e pelo acúmulo de carros (pensam que é só em São Paulo?), chegamos esbodegados ao hotel, às 6 da tarde. Banho, jantar e cama. No segundo dia, a saída foi acelerada, era o último dia de uma exposição muito comentada, Espadas, histórias e mitos, no Museu Cluny, que sabe tudo da Idade Média. Na volta, fim da tarde, estávamos chapados por um calor que fazia os parisienses se indagarem: será o fim do mundo? O outono começara, as folhas estavam caindo sobre as calçadas e parques e o sol esturricava num céu sem uma nuvem. Não verás Paris nenhum, pensei.

Na manhã do terceiro dia, esperávamos Camila, amiga de minha filha, que tinha ido buscar um vestido de noiva. Feito de encomenda, lindo, de bom gosto, custou 1.300, cerca de R$ 3 mil. "Por esse preço, em São Paulo, eu nem alugava um vestido. Para mandar fazer, pediam por volta de R$ 12 mil. E acham barato. Volto feliz", ela confessou.

Então, vi a plaquinha de bronze:

Neste hotel, em 1957, Gabriel García Márquez, prêmio Nobel, escreveu seu romance Ninguém Escreve ao Coronel.

Foi o terceiro livro escrito pelo colombiano e o primeiro em que ele acertou, começou a ter público. Corri a perguntar ao concierge se ele sabia em que apartamento García Márquez tinha escrito e ele me disse que foi no 63, o mesmo que eu estava ocupando. Mas que na época era menor, tinha apenas uma cama. Passei a olhar diferente aquele cubículo em que eu estava com Marcia e Maria Rita, o único que conseguimos na alta estação, por ter feito planejamento de ultimíssima hora. Um duas estrelas muito simples, simpático, limpo, pessoal afável, café da manhã servido por uma cabo-verdiana alta, a Alice. No segundo dia, ouvi-a falando português e me admirei:

- Então, você fala português?

- Pois desde ontem estou a falar português contigo e você me respondia em francês.

Na sua autobiografia, Márquez conta que estava na cidade como correspondente de um jornal, mas que o jornal fechou e ele ficou lá com um restinho de dinheiro. Passou a enviar cartas aos amigos, pedindo socorro. "Morava no sexto andar de um hotel sem elevador, e todos os dias descia para ver se havia uma carta, e nunca havia. Foi quando a história de meu avô começou a se desenhar na minha cabeça, porque este avô passou a vida esperando a carta que confirmaria o seu direito a uma pensão do governo, por ter lutado na guerra civil. Todos os dias até morrer foi ao porto esperar a carta que nunca chegou. Meu avô ia ao porto, eu descia à portaria, e nada de cartas; assim a história se escreveu."

Foi quando descobri uma segunda placa comemorativa. Andando por Paris, olhem para as paredes e as portas. São milhares de placas contando que um escritor, um cantor, uma celebridade morou ali. Ou indica o ponto em que alguém da Resistência morreu. Você vai refazendo a história. A outra placa nos conta que o escritor húngaro Miklós Radnoti, um dos mais queridos pelos seus compatriotas, morou no Trois Collèges no fim dos anos 1930. Durante a guerra, foi feito prisioneiro na Iugoslávia e enviado a Auschwitz, onde morreu aos 35 anos.

Também fiquei sabendo que o poeta Raoul Ponchon morou no hotel entre 1911 e 1937, quando morreu. Um poeta que o Zé Celso, cultor de Baco, adoraria. Segundo Apollinaire, Raoul ao cantar o vinho, as mulheres e as flores, com bom humor, foi o último dos poetas báquicos. Verlaine o amava. Bela companhia a minha. Passei a respeitar mais o Trois Collèges em sua humildade. Também, das janelas dos quartos você dá com o maciço da Sorbonne. Imagino que o nome seja em homenagem à Sorbonne, ao Collège de France, bastante próximo, e à Faculdade de Medicina.

No avião, um dos filmes foi À Meia-Noite em Paris. Na madrugada, na TV de minha poltrona acabei vendo dublado, sabe Deus por quê. E me diverti. A certa altura, o tradutor traduziu Left Bank (a velhíssima Rive Gauche) como "o banco da esquerda". De certo, o banco onde o Zé Dirceu e o Lula põem o dinheirinho. Desliguei, dormi. Ao menos, me ficaram do filme, entre outras, as imagens de restaurantes como o Le Polidor, onde acabamos indo comer, e a galinha de angola é ótima; do Balsar, na Rua Des Écoles, onde a Noix de Saint Jacques é delicada e o risoto de lagosta e lasgotins estupendo, e demos uma olhada no Le Grand Velfour, dos mais sofisticados da cidade. O menu mais barato custa 96, ali pelos R$ 250. Por pessoa!!! Mas existe o Menu Plaisir pela "módica" quantia de 282 (vinho à parte), perto de R$ 800. Preciso levar um personal gourmet que me ensine a comer cada prato, sozinho não dou conta. Ah! Agora o Trois Collèges tem elevador. Meu modesto sonho, delírio de posteridade: será que um dia colocarão uma placa dizendo que ali reescrevi a terceira versão de minha novela Os Olhos Cegos dos Cavalos Loucos?

PS: Anotem, por favor, nas agendas. No dia 31 deste mês, nos jardins da Editora Global, na Rua Pirapitingui, 111, lanço meu novo livro, Acordei em Woodstock. Viagem, memórias, imaginação, perplexidades. Delírios

GILLES LAPOUGE - Sarkozy, senhor da guerra



Sarkozy, senhor da guerra
GILLES LAPOUGE
O Estado de S.Paulo - 21/10/11


Duas notícias felizes para Nicolas Sarkozy: Carla Bruni deu à luz uma menina e o coronel Muamar Kadafi foi morto, o que simboliza o triunfo da guerra empreendida pela comunidade ocidental e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) contra o tirano líbio, graças, em parte, à energia inesgotável do presidente francês.

Sarkozy, que há alguns meses vem colecionando apenas escorregões, deve dar mais brilho a essa vitória. Ele adora se apresentar como senhor da guerra. O engajamento do presidente francês na primeira fila da coalizão formada contra Kadafi é ainda mais maravilhoso porque ocorreu após longos anos de deslumbramento da França com o ex-ditador da Líbia.

Mesmo antes de assumir a presidência, Sarkozy mantinha relações afetuosas com Kadafi, que começaram em 2005, quando ele era ministro do Interior. Claro que Kadafi era um personagem nauseabundo. Já havia entrado em guerra contra a França no Chade.

Protetor do terrorismo internacional, ele explodiu um DC-10 da UTA sob o Níger, em 1989, matando 170 pessoas. No entanto, há alguns anos, um novo Kadafi havia surgido, mais gentil, humanista, tolerante. E o líbio não se contentava apenas em dizer belas palavras. Ele agia.

Em 2003, renunciou às armas nucleares. Rompeu com os terroristas. E chegou até a apoiar a guerra de George W. Bush contra o Iraque depois dos atentados de 11 de setembro de 2001. Portanto, foi esse Kadafi, completamente mudado, branco como um lírio do campo, que Sarkozy, então ministro do Interior, procurou atrair em 2005.

O braço direito de Sarkozy, Claude Guéant (que depois tornou-se ministro do Interior), entrou em negociações com o ditador e estabeleceu vínculos estreitos com a polícia da Líbia para lutar contra um inimigo comum: a Al-Qaeda.

A França teve um papel fundamental na formação das "forças especiais líbias", que prenderam e torturaram os opositores de Kadafi, incluindo um grupo de enfermeiras búlgaras acusadas por Trípoli de contaminar as crianças líbias com o vírus da aids.

Em 2007, Sarkozy assumiu a presidência e sonhou em criar uma "União Mediterrânea", da qual a Líbia seria um dos pilares. Ele quis vender tecnologia a Trípoli, tanto as centrais nucleares da Areva e como os aviões Rafale.

Kadafi estava radiante e deu "de presente" as enfermeiras búlgaras, entregues à então mulher de Sarkozy, Cecília, e a Claude Guéant. O ditador cobrou pela gentileza, exigindo uma visita de Estado a Paris. Sarkozy não via malícia nisso.

Kadafi desembarcou na capital francesa com seu séquito de esplêndidas mulheres negras com adornos carnavalescos. Exigiu ficar em sua tenda das "mil e uma noites" instalada no gramado do Hotel Marigny, no centro da cidade. Sarkozy ficou "à beira de uma crise de nervos". Mesmo assim, o presidente cedeu aos caprichos do amigo Kadafi. A humilhação foi terrível, tanto que Kadafi renegou as promessas feitas e assinou contratos de algumas centenas de milhões de euros, não de 10 ou 15 bilhões como previsto.

Reviravolta. Alguns anos mais tarde, em 2011, irrompe a primavera árabe. As populações da Tunísia e Egito se libertam de seus tiranos. A França não entende nada. Balbucia. É importante dizer que os franceses eram amigos dos dois ditadores. Em 2010, a chanceler Michèle Alliot-Marie foi convidada pelo tunisiano Ben Ali para passar o Natal em Túnis. No momento das revoltas, ela propôs o envio de tropas da França para reprimir "os agitadores".

Em seguida, o primeiro-ministro francês, François Fillon, voltou do Egito, onde foi hóspede de Hosni Mubarak. Tudo indicava que Paris não se envolveria na primavera árabe, mas a providência às vezes é sábia e uma nova revolta explodiu na Líbia.

Foi um francês, um filósofo de esquerda, Bernard-Henri Lévy, quem telefonou de Benghazi para seu amigo Sarkozy, que percebeu uma oportunidade de se recompor e assumir dois papéis ao mesmo tempo: o de libertador e o de senhor da guerra.

Ele se animou. Correu para Londres para convencer David Cameron. Juntos, conseguiram uma resolução do Conselho de Segurança da ONU. Uma semana depois, Sarkozy e o amigo Lévy estavam na escadaria do Palácio do Eliseu. O presidente reconhecia oficialmente o Conselho Nacional de Transição (CNT), de Benghazi. A chancelaria nem mesmo tinha sido avisada.

Para Sarkozy, o ganho seria duplo. A Líbia apagaria todas as baixezas de duas relações com Kadafi. Ele se transformaria no amigo dos "povos oprimidos". E lá estava ele, liderando a coalizão internacional contra o mesmo Kadafi que ele, há muito tempo, tentava loucamente seduzir.

No início de setembro, foi realizada em Paris uma conferência de 60 países para debater o futuro de uma Líbia sem Kadafi. No mesmo Hotel Marigny. Através das vidraças, os participantes puderam ver o histórico gramado onde, três anos antes, acompanhado de seus vizires, mordomos, guardas, oficiais, espiões, policiais e amazonas, Kadafi instalou sua bela tenda. Um sucesso para Sarkozy. Depois de vários saltos perigosos no vazio, ele se recompõe. Salve o artista! Salve o acrobata! / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

DAVID COIMBRA - Gre-Nal da vergonha



Gre-Nal da vergonha
DAVID COIMBRA
ZERO HORA - 21/10/11

O pior lado da rivalidade Gre-Nal causou, ontem, um prejuízo incalculável a Porto Alegre e ao Rio Grande do Sul. A perda da Copa das Confederações e a diminuição da importância da participação da cidade na Copa do Mundo situam-se muito além das meras e mesquinhas questões esportivas.

A não participação na Copa das Confederações talvez seja ainda mais grave do que a tímida participação na Copa do Mundo. A seleção uruguaia provavelmente jogaria em Porto Alegre, trazendo junto 40 ou 50 mil turistas uruguaios. Imagine-se um jogo entre Uruguai e Espanha, por exemplo. Imagine-se a Alemanha ou a Itália jogando no Estado. Imagine-se o lucro da rede hoteleira, dos taxistas, dos bares e restaurantes, da cidade inteira com recursos diretos e indiretos e também com a projeção internacional.

Porto Alegre não abocanhará esse quinhão.

Por quê?

Por causa da nefanda grenalização de tudo o que ocorre no Rio Grande do Sul. Assim como a rivalidade Gre-Nal já fez Grêmio e Inter conquistarem o mundo, faz, também, às vezes, com que gremistas e colorados sabotem-se mutuamente quando têm de se unir. No caso específico, gremistas e colorados deveriam ter se unido lá atrás, quando começaram as tratativas para a cidade ser uma das sedes da Copa do Mundo e da Copa das Confederações.

As lideranças do Estado, o governador, o prefeito, o presidente da Federação, os presidentes dos clubes, deputados, Senadores e vereadores, as lideranças todas deveriam ter conversado com responsabilidade, seriedade e ponderação sobre o que Porto Alegre deveria e poderia fazer para ser uma boa sede para as competições.

Mas isso não foi feito. Ao contrário, houve uma rala disputa Gre-Nal para sediar a Copa, e essa disputa ainda não acabou. Colorados se apressaram em apresentar sua candidatura, gremistas trabalharam nos bastidores contra a candidatura colorada, jamais houve uma união em torno de um objetivo, jamais houve uma discussão desapaixonada e adulta do tema. É a grenalização tosca, superficial e, o pior de tudo, pouco inteligente.

Não há mais tempo de salvar o que se perdeu. Mas ainda há tempo para que não se perca ainda mais. Desde que haja um pouco, só um pouco, de bom senso.

GOSTOSAS


MARIA CRISTINA FERNANDES - Os comunistas e a Copa



Os comunistas e a Copa
MARIA CRISTINA FERNANDES
VALOR ECONÔMICO - 21/10/11

Com 15 deputados federais, a 11ª bancada da Câmara, os comunistas do Brasil só ganham do PV (14), do PPS (12) e da penca de legendas de um dígito.

Nela reúnem-se o delegado mais barulhento do país, Protógenes Queiroz (SP), alguns sindicalistas e sete deputados egressos do movimento estudantil.

Também fizeram carreira na União Nacional dos Estudantes os três ministros que a legenda já emplacou (Aldo Rebelo, Agnelo Queiroz e Orlando Silva).

O orçamento fixo da UNE vem do monopólio da emissão das carteiras de estudante, aprovado pelo Congresso no segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, mas a entidade, a partir do lulismo, também passou a receber repasses federais para os eventos que organiza.

No governo Lula, a bancada do PCdoB votou com o governo 66% dos projetos. Só não foi mais fiel do que o partido do presidente da República que aderiu ao Executivo em 77% das votações.

No governo Dilma Rousseff, Aldo Rebelo foi um dos comandantes da pior derrota legislativa da presidente, a votação do código florestal.

Quem tem ambições majoritárias acaba saindo do partido. Foi o caso do senador Lindbergh Farias (RJ), outro ex-presidente da UNE, e do governador Agnelo Queiroz (DF), ambos hoje no PT.

O PCdoB custou a eleger seu primeiro prefeito. Luciana Santos, outra egressa do movimento estudantil, governou Olinda entre 2001 e 2008. Hoje são 42, mas um único de capital, Edvaldo Nogueira (Aracaju), que chegou à prefeitura como vice do petista Marcelo Déda, assumiu o cargo com a eleição deste ao governo e foi reeleito.

Nos legislativos estaduais e municipais o PCdoB é chamariz de músicos. Em São Paulo, quase elege Netinho de Paula senador. O atual vereador paulistano com seus 7,7 milhões de votos é hoje o recordista em número absoluto de votos do partido.

Sua roda de samba junta ainda Leci Brandão, eleita deputada estadual em São Paulo, Martinho da Vila e Jorge Mautner.

A ala dos esportistas é a mais recente do partido. É nela que desembarcam muitas das antigas lideranças da UNE que, ao cederem seus postos para as novas gerações do movimento estudantil, têm que procurar novas freguesias. Foi o caso de ambos os ministros dos Esportes que o partido já teve.

Antes de chegar ao ministério, o primeiro cargo executivo relevante ocupado pelo PCdoB na área foi a Secretaria de Esportes de São Paulo que a gestão Marta Suplicy confiou em 2001 a Nádia Campeão, outra egressa do movimento estudantil que hoje preside o partido no Estado. A experiência se repetiu em Campinas onde o prefeito cassado dr.Hélio (PDT) entregou a um outro ex-presidente da UNE, Gustavo Petta, cunhado de Orlando Silva, a secretaria municipal de esportes.

O reconhecimento de que o PCdoB havia se tornado uma grife na política esportiva, sob quaisquer colorações ideológicas, veio com o convite do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), a um dirigente local do PCdoB, sem experiência prévia na área, para a secretaria municipal da Copa de 2014.

Com a ocupação crescente dos cargos públicos de esportes, proliferaram convênios com ONGs ligadas ao partido. É por meio deles que o PCdoB mantém parte de suas bases eleitorais da mesma maneira que convênios firmados pelo Ministério do Trabalho favorece entidades ligadas a sindicatos que funcionam à sombra de PT, PDT e de outros partidos. O esquema se prolifera por toda a Esplanada a despeito das recomendações do TCU de que muitas das entidades contratadas não entregam o combinado - e pago.

Os holofotes se voltam para o PCdoB porque o partido assumiu predominância nos Esportes nos anos estratégicos que antecedem a Copa do Mundo e a Olimpíada. O comodato comunista dos grandes eventos soma a Embratur, em mãos do deputado federal Flávio Dino (PCdoB-MA), e a UNE, por onde passa a discussão da meia-entrada para os jogos.

Com todo esse poder, seria de esperar que o partido viesse a ter uma posição mais clara sobre a relação entre esses grandes eventos esportivos e o desenvolvimento do país. Há cinco anos no cargo, o ministro Orlando Silva só recentemente começou a comprar brigas numa seara em que a cartolagem acostumou-se a levar todas.

No programa que foi ao ar ontem em cadeia nacional o PCdoB ocupou-se mais em defender Orlando Silva e propagandear futuros candidatos. Nada disse do regime especial que vai reger as licitações das obras de 2014 e da Lei Geral da Copa que está em tramitação no Congresso para regular a meia entrada, a bebida alcóolica nos estádios e os contratos de publicidade.

A experiência na África do Sul já está devidamente sedimentada para que dela se tirem lições. Em entrevista para a Deutsche Welle, Eddie Cottle, da federação internacional que reune trabalhadores na construção civil, adiantou dados de seu livro sobre aquela Copa.

A África do Sul, diz, recebeu 373 mil turistas em 2008, menos que no ano anterior quando lá aportaram 483 mil visitantes. A Fifa insistiu na construção da milionária Arena da Cidade do Cabo desprezando um estádio já existente porque rodeado de favelas. Quatro mil famílias foram desalojadas. Agora o governo quer cobrar impostos para a manutenção deste e de outros elefantes brancos. Nem o impulso à indústria têxtil sobrou de herança porque as camisetas do evento vieram todas da China.

Todos os países usam eventos como a Copa do Mundo para vender uma identidade nacional para consumo interno e externo. A do Brasil deve estar relacionada a esse novo papel que a pujante potência quer desempenhar na governança global. Esse é o tema de insistentes pronunciamentos da presidente Dilma Rousseff em seus recentes périplos internacionais. Resta saber se também pautará a negociação com a Fifa e a CBF sobre as exigências de ambas as entidades ao governo brasileiro.

Em artigo na última edição da revista Interesse Nacional (interessenacional.uol.com.br) o jornalista Juca Kfouri diz quase tudo sobre a Copa no Brasil.

Lembra o jornalista João Saldanha, velho comunista que morreu sem se conformar com os rumos que tomava o futebol. Insurgia-se até contra as placas de publicidade dos estádios por avaliar que colocavam em risco a segurança dos jogadores e poluíam o jogo.

No programa de ontem o PCdoB apropriou-se de célebres comunistas da história como Cândido Portinari, Carlos Drummond de Andrade e Oscar Niemeyer, mas deixou Saldanha de fora.

ANCELMO GOIS - Moça Bonita 2014



Moça Bonita 2014
ANCELMO GOIS
O GLOBO - 21/10/11

Mesmo que o Brasil chegue à final da Copa de 2014, só uns 15,2 mil cariocas (mais ou menos um Estádio de Moça Bonita, do Bangu) vão poder assistir ao único jogo possível da nossa seleção no Maracanã, cuja capacidade será de 76 mil pessoas.
Isto se prevalecer o que ocorreu nas Copas do Japão, da Alemanha e da África do Sul, onde só 20% do público eram moradores das cidades dos estádios.

É ASSIM... 
Segundo a Fifa, nas Copas, em média, de cada 100 pessoas num estádio, 20 são do mundo corporativo (convidados de grandes empresas), 60 são turistas de fora e do país-sede e apenas 20 moram na cidade do jogo. Foi uma derrota do Rio.

TÁ LIBERADO... 
O BNDES liberou ontem, depois de um ano de espera, a primeira parcela do empréstimo de R$ 400 milhões para as obras do Maracanã.
Coisa de R$ 80 milhões.

OUTRA DERROTA DO RIO 
A aprovação do texto do Senado contra o Rio nessa questão dos royalties do petróleo fez subir a temperatura política. Cabral e Lindberg Farias acertaram ontem para 10 de novembro uma passeata na Av. Rio Branco pelos royalties. A ideia é reunir umas 150 mil pessoas.

ALIÁS... 
Hoje, ao meio-dia, moradores da Vila Kennedy e da Baixada Fluminense prometem se acorrentar na porta da Petrobras.
Levarão cartazes com a frase: “Dilma, o Rio lhe deu 70% dos votos e não pode ser traído.”

COMO EU IA DIZENDO 
Da série nomes estranhos nos escândalos do governo petista.
Nesta encrenca no Ministério do Esporte, surgiram uma Ralcilene, ex-funcionária da pasta, e um Waucilon, candidato a deputado pelo PCdoB.

REI NA BARRIGA 
Ontem, por volta de 11h, com o avião já na pista para decolar, o comandante do voo TAM 3920 (Congonhas-Santos Dumont) informou aos passageiros que, por ordem da Polícia Federal, todos deveriam voltar ao embarque.
Feito isto, e em meio a muito suspense, um agente entrou na aeronave para... recolher seu iPad esquecido num assento.

OS CAMARADAS
Já não se faz mais PCdoB como antigamente. O locutor do programa do partido na TV, ontem, pronunciou o nome de Maurício Grabois à francesa, como “Graboá”.
Grabois foi dos fundadores do PCdoB e morreu na Guerrilha do Araguaia, em 1973.

BOLETIM MÉDICO 
Adriano Reys, 77 anos, o ator de tantas novelas da TV (Direito de nascer, Selva de pedra, Vale tudo, Barriga de aluguel...), está internado no Hospital Copa D’Or, no Rio.

SONHO DE POLEGAR 
A polícia do Rio espera a qualquer momento a transferência para o Brasil de Polegar, ex-chefe do tráfico da Mangueira.
Mas teme que a Justiça paraguaia o segure, alegando que ele também cometeu crimes por lá. É tudo que Polegar deseja, claro.

GIRÃO CONDENADO 
A 2ª Vara Criminal de Jacarepaguá, no Rio, condenou o ex-vereador Cristiano Girão Matias a 14 anos, seis meses e seis dias de prisão, além de multa de 480 salários mínimos.
Girão é acusado dos crimes de formação de quadrilha armada e lavagem dinheiro.

CLAUDIA SAFATLE - Risco de baixo crescimento preocupa Dilma Rousseff



Risco de baixo crescimento preocupa Dilma Rousseff
CLAUDIA SAFATLE 
VALOR ECONÔMICO - 21/10/11


Antes de dar sinais mais claros sobre como pretende conduzir a política fiscal em 2012, a presidente da República, Dilma Rousseff, quer limpar a pauta de interesse do governo no Congresso. Isso significa ver aprovados alguns projetos que considera cruciais, como a prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU) - que dá liberdade ao governo para manejar 20% do Orçamento - e a nova regra de divisão dos royalties do petróleo - num arranjo que não represente ônus para a Petrobras.

Quer, também, afastar os riscos de aprovação de dois temas que o Palácio do Planalto considera "dramáticos": a regulamentação da Emenda Constitucional 29 - que define os recursos e cria nova contribuição para financiar a saúde; e a proposta de emenda 300 - que institui piso salarial para policiais civis, militares, bombeiros, ativos e aposentados, pelos padrões do Distrito Federal, a custo estimado em cerca de R$ 30 bilhões.

Somente depois de resolver esses contenciosos é que o governo poderá dar contornos mais nítidos à meta fiscal de 2012, a partir do compromisso já assumido de produzir um superávit primário "cheio" de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Tudo aponta para um forte contingenciamento das despesas públicas, nos moldes dos R$ 50 bilhões feitos este ano, e o Planalto não quer embaralhar o debate no Congresso com a perspectiva de mais um corte nas emendas parlamentares em 2012, tal como também ocorreu este ano.

Política fiscal de 2012 não deve ter caráter eleitoral

A presidente avalia que deu demonstrações cabais de que não brinca com o dinheiro público em duas ocasiões recentes. Primeiro, ao aumentar em R$ 10 bilhões o superávit primário deste ano ao invés de elevar o gasto público com a previsão desse excesso de arrecadação. E, nos últimos dias, ao endurecer com os recorrentes movimentos grevistas do funcionalismo público.

Categorias como auditores da Receita Federal e Polícia Federal, que sempre conseguem arrancar aumentos salariais, não tiveram reajustes este ano mesmo sob a ameaça de greve. Em compensação, Dilma sancionou a lei que eleva para 90 dias o tempo do aviso prévio, num gesto de agrado ao movimento sindical.

A apresentação de um programa fiscal convincente para 2012 seria importante para ajudar na reversão das expectativas de inflação. Hoje, o mercado, segundo a pesquisa Focus, projeta 5,61% de IPCA para o próximo ano, percentual distante da meta de 4,5% que o BC se comprometeu a atingir.

Uma outra preocupação, porém, divide com a inflação as atenções da presidente: a possibilidade de as taxas de crescimento do país em 2012 e 2013 serem baixas. É real o temor do governo de voltar ao padrão de crescimento do período do governo FHC - intercalado por várias crises internacionais -, quando a média de variação do PIB foi de 2,29%, percentual bem inferior à média de 4,01% registrada na gestão Lula - que, de 2003 a meados de 2008, governou embalado pelo crescimento dos países avançados.

Por isso, na visão do Palácio do Planalto, a partir da mudança no mix da política econômica - ao dar maior peso ao controle do gasto público do que ao uso da taxa de juros -, a calibragem entre a austeridade fiscal e a redução do juros básicos deve ser feita com uma certa sintonia fina. O governo busca trilhar o fio da navalha ao optar pelo controle da inflação com as atenções voltadas para a preservação de uma taxa de crescimento não menor do que 3% nos próximos dois anos. O que não está claro é para onde vai pender a opção de Dilma, caso tenha que fazer uma escolha de curto prazo.

A presidente acha que as pessoas, no Brasil, estão subavaliando os efeitos da crise externa sobre o nível de atividade doméstica dos próximos dois anos e, consequentemente, sobre o processo de desinflação no país durante esse período. Segundo seus assessores, ela acredita que as lideranças europeias vão salvar o sistema bancário da zona do euro, mas não tem a mesma certeza sobre o destino dos governos encalacrados em um elevadíssimo endividamento.

Dilma herdou do seu antecessor um processo de aceleração inflacionária e um forte aumento do gasto público. "O ano de 2011 está sendo um freio de arrumação", disse um assessor da presidente. Ela até poderia tentar reproduzir o desempenho de Lula no primeiro mandato - quando no primeiro ano, 2003, o crescimento foi de apenas 1,1%, mas subiu para 5,7% em 2004 -, mas as condições da economia internacional não devem lhe permitir.

Na agenda do governo para 2012 há temas espinhosos, como a mudança nas regras de indexação da caderneta de poupança. O Palácio do Planalto ainda está avaliando se há condições de priorizar, também, a votação do projeto que limita o aumento do gasto com a folha de salários do funcionalismo público, que tramita no Congresso desde 2007.

Poupança e salários dos servidores são temas politicamente muito sensíveis e de difícil aprovação pelo Congresso, sobretudo em ano de eleições municipais.

As relações do Palácio do Planalto com o Congresso tendem a seguir azedas, se, no contingenciamento de 2012, as emendas parlamentares forem novamente varridas do Orçamento. Ao contrário do seu antecessor, Dilma não pensa em mudar o curso da política fiscal por causa das eleições. Quando confrontada com esse tema, segundo um assessor próximo, a presidente responde: "Isso é problema de Luiz Inácio".

MARCIA PELTIER - Apostando na sorte


Apostando na sorte
MARCIA PELTIER
JORNAL DO COMMERCIO - 21/10/11 

Pesquisa realizada pela GfK em nove regiões metropolitanas do país revela que 25% dos consumidores costumam participar de promoções tipo sorteio ou concurso. Desse universo, 34% o fazem pela internet, se cadastrando no site de empresas ou marcas promotoras. A classe A/B é a que tem maior participação, com 43%, contra 26% da classe C/D. Por faixa etária, são os jovens que mais se destacam,com 28% na faixa etária de 18 a 24 anos, e 30%, entre 25 e 34 anos. Foram entrevistadas mil pessoas que apontaram ainda a participação via correio, 29%; via SMS/torpedo, 26%; e via mídias sociais, 16%.

Correndo atrás 

O deputado federal Alessandro Molon vai começar a recolher, na próxima semana, as 171 assinaturas necessárias para apresentar uma PEC que mude o local de cobrança de ICMS da exploração do petróleo do destino para a origem. Segundo o petista, esse prejuízo à economia fluminense foi sacramentado pela Constituinte de 1988 e os royalties teriam a função de ressarcir os estados. Com a ameaça iminente de o Rio perder o repasse dos royalties do petróleo, Molon quer atacar a origem da questão. O Rio perde, no mínimo, cerca de R$ 8 bi anuais com esse tipo de cobrança.

Estômagos fortes 

A autêntica baiana Ciça, que monta seu tabuleiro no Arco do Teles, promove, nesta sexta, o seu III Festival do Acarajé, com regras simples: paga-se R$ 25 antecipadamente ou R$ 40 na hora pelo show de axé no Tico Taco da Lapa, mais o abadá. E come-se todo o acarajé do mundo que seu apetite aguentar. Não há registro, nas outras edições, de baixas em hospitais.

Cidade arrasada 

Antes mesmo do seu lançamento, na próxima segunda-feira às 20h, na Livraria da Cultura do Shopping Fashion Mall, o livro São João Marcos –Patrimônio e Progresso, foi premiado. A obra investiga os motivos do desaparecimento em 1940 da então próspera cidade de São João Marcos, que ficaria hoje próxima a Rio Claro, demolida para a construção de uma barragem que acabou não passando por seu território.

Aberto à visitação 

Em junho, o Instituto Light inaugurou no local um parque arqueológico e ambiental e foi por esse motivo que o arquiteto Mozart Vitor Serra, um dos autores do livro encampado pela empresa, recebeu o prêmio máximo do Iphan na categoria Proteção do Patrimônio Natural e Arqueológico, em nome do parque. Os outros autores são os historiadores Alexei Bueno e Ney Carvalho e a jornalista Karina Howlett-Martin, irmã da apresentadora Cynthia Howlett-Martin.

Super hit 

Em apenas quatro dias de audições, na última semana, os testes de elenco para o espetáculo Galinha Pintadinha teve cerca dois mil inscritos. Na primeira peneira, 270 foram pré-selecionados e 50 ficaram para a seleção final. O resultado brindou 12 escolhidos, dez adultos e duas crianças. O musical será montado a partir do clipe com cantigas infantis postado no YouTube, que teve mais de 260 milhões de acesso. Com direção de Ernesto Piccolo, estreia no Rio, em janeiro. A GEO Eventos assina a produção.

Compromisso 

Aécio Neves prometeu participar de todas as pré-estreias do documentário Tancredo, a travessia, de Sílvio Tendler, em homenagem a seu avô, Tancredo de Almeida Neves. A pré-estreia no Rio acontece terça-feira, um dia depois da de São Paulo, no Unibanco Artplex. O filme entra em circuito comercial dia 28.

Amantes das motos 

Jeff Wright , um dos maiores customizadores de motos vintage do mundo, estará no Two Wheels Brazil, evento inédito no país, domingo, em São Paulo. Criador das motos de Brad Pitt, George Clooney, Keanu Reeves e outras celebridades de Hollywood, ele comporá um júri responsável por escolher o melhor personalizador de motos do Brasil. Vinte candidatos estarão concorrendo ao reconhecimento internacional.

Festa privê 
Uma das surpresas do evento será o pocket show do ex-guitarrista do Guns N’ Roses, Gilby Clarke, para alguns vips. Quem também virá é o renomado artista plástico de Nova York Wes Lang. Com exposições nas mais tradicionais galerias do mundo, o fundador da Brooklin Invitation quer conhecer a Pinacoteca do Estado de São Paulo e bater papo com os irmãos grafiteiros Os Gêmeos, Otávio e Gustavo Pandolfo. Já o diretor de cinema Josh Kurpius passou a semana conhecendo as belezas do Rio. Ficou impressionado com o número de motoqueiros que ganha a vida com entregas. É dele o mais importante filme institucional da Harley Davidson, The Dark Custom.

Doce convivência 
O cantor Will.i.am desembarcou nesta quinta-feira no Rio para gravar o clipe de seu single Great Times. Além de acompanhar as obras finais de sua casa, na Barra, ele pretende passar uns dias passeando por Angra dos Reis com seu novo vizinho, o apresentador Luciano Huck.

Livre Acesso

O grupo O Rappa marca sua volta com show nesta sexta e sábado, na Marina da Glória, com cenário bem carioca. Vai ser reproduzido no palco um dos barracos da favela da Rocinha, que serviu como pano de fundo para a última gravação de CD e DVD do grupo. A banda, que já está com agenda cheia até o fim do ano, percorrerá todo o Brasil em mais de 25 apresentações confirmadas.

O desembargador Luciano Rinaldi, do TJ do Rio, será um dos palestrantes da XI Conferência dos Advogados do Rio de Janeiro nesta sexta-feira, às 16h. O magistrado vai participar do painel sobre processo eletrônico.

A Diageo promove jantar, nesta sexta, na casa de Lenny Niemeyer, que estará toda decorada de azul por Edgard Octavio, para lançar o novo desenho da garrafa de Johnnie Walker Blue Label, em azul claro. A noite terá menu de Claude Troisgros e Paola de Orleans e Bragança como DJ. A proposta é aproximar o blend que simboliza o máximo da House of Walker do público de 35 a 55 anos. Cada garrafa do uísque custa R$ 700.

O MobiRio – Rede Metropolitana de Transporte Público do Rio de Janeiro, projeto da Escola Politécnica da UFRJ, será apresentado ao público, nesta sexta-feira, no Centro de Convenções SulAmérica.

Tatiana Azevedo e Luciana Almeida abrem, nesta sexta, a Flexível XP no Downtown.

O chef Roland Villard preparou um cardápio especial para o Festival de Produtos do restaurante Atlantis, a partir de segunda, às 19h.O menu será todo composto por brochetes, que são os clássicos espetinhos. Dentre as delícias, o brochete de melão e presunto cru, brochete de kafta de cordeiro com legumes e brochete de rocambole de chocolate com sorvete de framboesa.

Com Marcia Bahia, Cristiane Rodrigues, Marcia Arbache e Gabriela Brito

AGARRE A CHANCE


ILIMAR FRANCO - Gasto liberado


Gasto liberado
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 21/10/11

A Câmara vai manter o amplo uso da receita do petróleo que estados e municípios não produtores vão receber. O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), argumenta que o Congresso não pode "manietar" governadores e prefeitos. Diferente da União, que deve destinar a receita do petróleo para um Fundo Soberano e usar apenas o rendimento, estados e prefeituras poderão gastar à vontade. "Quem ganha a eleição sabe o que fazer, cabe ao povo fiscalizar", diz o líder.

Relator fechou números finais na FazendaO relator do projeto de redistribuição dos royalties do petróleo, Senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), fechou os números finais de sua proposta, na terça-feira, numa reunião no Ministério da Fazenda. Participaram o ministro Guido Mantega e o secretário-executivo Nelson Barbosa. O relator chegou ao ministério disposto a reduzir a parcela da União, na participação especial, de 50% para 40% em 2012. Mantega e sua equipe conseguiram convencê-lo de que a União não poderia suportar nenhuma redução que ultrapassasse 42%. Assim foi feito. Anteontem, o relator atendeu a outro pedido de Mantega, retirando dois artigos do texto. Na Câmara, a correlação de forças é pior do que no Senado. Mas vamos trabalhar para evitar perdas para o Rio" - Paulo Teixeira, líder do PT na Câmara (SP)

AgradoÀs vésperas da votação da Desvinculação de Receitas da União, a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) fez ontem uma rodada de conversas com os ministérios para tentar agilizar a liberação de emendas parlamentares.

Os motivos de Aécio NevesO apoio da oposição ao Rio e ao Espírito Santo, comandado pelo Senador Aécio Neves (PSDB-MG), teve como pano de fundo sua pré-candidatura a presidente da República, a preocupação com os royalties do minério, seu discurso municipalista de crítica à centralização de recursos nas mãos da União, sua relação pessoal com o Senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e, claro, a tentativa de desgastar o governo Dilma.

PeitadaO ministro Gastão Vieira (Turismo) vai aproveitar a indicação do PMDB da Bahia para a Secretaria de Turismo da pasta, Fábio Rios Mota, em outra área do ministério. Na secretaria, ele vai manter sua indicada: Suzana Dieckman.

Fim de festa
O Senado acabou com a farra das sessões solenes no plenário. Homenagens agora só depois de 25 anos do fato e uma vez a cada 10 anos. A iniciativa foi dos Senadores Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).

No gritoO PSDB paulista terá inserção de TV no mês que vem e, desta vez, o ex-governador José Serra aparecerá. "Sem dúvida", disse o presidente do diretório regional, deputado estadual Pedro Tobias. No programa anterior, Serra ficou fora.

CABO ELEITORAL. O governador Eduardo Campos (PE), na foto, um dos principais articuladores da nova Lei de Royalties em debate no Congresso, e que tantos prejuízos vai causar aos estados produtores como o Rio, será a principal atração do Congresso Estadual do PSB, no sábado, em Duque de Caxias. O partido fez o convite com a intenção de alavancar seus candidatos nas eleições municipais, como é o caso do secretário estadual Alexandre Cardoso, candidato à prefeitura de Duque de Caxias.

O RELATOR da lei dos royalties no Senado, Vital do Rêgo (PMDB-PB), ao enumerar os ganhos de cada estado com a mudança, usou uma planilha montada pelo deputado Marcelo Castro (PMDB-PI).

A CIDADE do Rio de Janeiro, de acordo com essa planilha, terá uma queda na receita de royalties de R$128 milhões, em 2010, para R$48 milhões em 2012.

O EX-GOVERNADOR Paulo Hartung (ES) esteve com o vice Michel Temer. Ele revelou que é candidatíssimo à prefeitura de Vitória pelo PMDB.

BARBARA GANCIA - Chega de melindre!



Chega de melindre!
BARBARA GANCIA
FOLHA DE SP - 21/10/11 

É ou não fora de esquadro linchar humorista em um país em que cai praticamente um ministro por semana?


Garanto como me chamo Bar­bara Gancia que este é o últi­mo texto sobre Rafinha Bas­tos que você lerá na vida. Tantos lugares para ir e pessoas por conhecer e eu ainda aqui fixada nesse tema. Mas é que ontem, as­sim que ouvi sobre a morte do ditador líbio Khaddaver (por falta de consenso sobre a grafia, escolhi es­sa), corri ao Twitter para saber mais.

E o que encontrei? Estava lá nos "trending topics", os assuntos mais comentados do dia, uma colocação acima do nome do ditador: #feto­dawanessa (feto da Wanessa), uma referência, para quem não sabe, ao filho ainda por nascer da cantora Wanessa Camargo, motivo daquela piada péssima do Rafinha Bastos de que eu nem me lembro mais.

Ocorre que, em vez de deixar o Ra­finha Bastos falando com o monó­xido de carbono que sai do escapa­mento dos ônibus, o experimenta­do Manuel Alceu Affonso Ferreira, um dos melhores advogados do país com grande intimidade em de­fender a liberdade de expressão (advogou ou advoga para o grupo Estado, tendo inclusive defendido a mim, motivo pelo qual lhe serei eternamente grata), resolveu dar um gelada em sua biografia.

Não sei bem se movido por exibicionismo ou se foi o desafio de mos­trar-se capaz de criar um fato novo, mas o doutor Manuel resolveu sair ao encalço do tal comediante em nome de uma idiossincrasia que só faz sentido aos olhos do Código Penal dos anos 1940 ou para aquela gente que se au­toflagela quando lembra da existência do prazer carnal.

Tenho pouca intimidade com a arte de Rafinha Bastos. Como já são quase 50 anos desde que saí da fase anal, custo a me identificar com seu humor fácil, não consigo ver nele o mesmo futuro que percebo em um Marcelo Adnet, numa Tatá Wer­neck ou em um Danilo Gentili. Mas isso sou eu, questão do fundo do âmago do meu ser íntimo, sabe?

Mesmo assim, eu não saio por aí querendo colocar o Rafinha Bastos atrás das grades em nome de uma causa boboca. Que coisa mais ridícula é essa de honra a defender por causa de pia­da? Quem se está pensando em usar como testemunha do feto? Emily Bronte, Victor Hugo, José de Alencar, Jane Austen ou a própria rainha Vitória? No futuro, se o petiz for se ofender com piada besta, me­lhor mandá-lo logo desencanar e lavar tanque atrás de tanque de roupa que passa, não é mesmo, doutor Manuel Alceu?

Tirei o fim de semana passado pa­ra assistir a alguns vídeos de melho­res momentos do "Saturday Night Live", o programa número um de humor da TV americana. Fossem usados os critérios legais e morais imbecilizantes que, do nada, nós agora demos para abraçar, não existira o SNL.

Ou seja, se a gente adotasse a linha de raciocínio de Manuel Alceu, tu­do o que há de mais genial no hu­mor da TV norte-americana não teria sido criado porque há quem confunda besteirol com vida real.

Destaco uma frase do advogado de defesa de Wanessa Camargo que consta do processo movido contra Rafinha Bastos: "A liberdade de ex­pressão artística não abriga no seu âmbito garantidor o humorismo lesivo e afrontante que, sob a capa de pretensos chistes, mascare o atentado ao patrimônio moral de terceiros".

É ou não completamen­te fora de esquadro linchar humo­rista em um país em que cai prati­camente um ministro por semana?

RUY CASTRO - Manhã de sol


Manhã de sol
 RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 21/10/11

Num dia de semana, cedinho, o jovem de cabelo preto e duro de gomalina, vestido de alto a baixo pela última "Vogue" e com a pele conspicuamente branca, posa para fotografias na praia do Leblon, quase deserta àquela hora. Um anúncio ou editorial de moda, talvez. A poucos metros, a estátua do falecido colunista Zózimo Barrozo do Amaral parece se divertir com a cena.
O rapaz é um famoso modelo que não identifico. Deve ser famoso porque uma produtora o abana, outra o protege com um guarda-sol e uma terceira toma sol por ele na pose que ele fará na foto. Há uma maquiadora que lhe enxuga a testa e retoca o nariz. O fotógrafo é cheio de banca, e tem um assistente que arrasta o equipamento pela areia e um iluminador que altera a posição do rebatedor a cada gesto do chefe, o qual olha para o Sol e parece discutir com ele.
No calçadão, dois homens de preto asseguram que as grandes massas não tomem a praia de assalto para disputar pedaços de roupa ou fios de cabelo do rapaz, embora até agora ninguém tenha tomado conhecimento de sua presença.
O fotógrafo, enfim, se decide: sem rebatedor. Faz um sinal para as produtoras, e estas se aproximam do rapaz e lhe atiram copos de água no peito da camisa. Pergunto a um segurança o porquê e ele me explica: é para dar a impressão de que o rapaz acabou de sair do mar. Hmmm. Mas como alguém sai do mar com a camisa molhada e as calças secas?
Não importa. Fico besta com a profissionalização da praia. Na pré-história, só os vendedores de mate e limãozinho trabalhavam nela. Hoje, para a singela operação de fotografar um sujeito molhado, são necessárias nove pessoas. O que significa nove cachês, nove bocas alimentadas, talvez nove louras felizes. Tudo isso serve para movimentar a economia. Ali não tem tsunami, só marola. 

HÉLIO SCHWARTSMAN - Combinação mortal


Combinação mortal
HÉLIO SCHWARTSMAN 
FOLHA DE SP - 21/10/11

SÃO PAULO - Muammar Gaddafi, ditador da Líbia por 42 anos, está morto. Foi feita justiça? A pergunta é capciosa. Não há dúvida de que Gaddafi foi um tirano particularmente selvagem. A lista de malfeitos inclui assassinato, estupro, terrorismo e roubo.
Estima-se que ele e sua família tenham pilhado bilhões.
Irascível, eliminava opositores até por críticas leves ao regime. Conta-se que, numa ocasião, deixou os corpos de adversários que enforcara apodrecendo na praça central de Trípoli. Para garantir que todos captassem a mensagem, desviou o trânsito, forçando motoristas a passar pelo local.
O mundo, porém, não é um lugar tão simples como gostaríamos. O ditador também exibe algumas realizações civilizatórias. Respaldado pelo petróleo, investiu em saúde e educação e até distribuiu alguma renda. A expectativa de vida saltou de 51 anos em 1969 para mais de 74. A Líbia tem os melhores índices de educação da África. O ditador também fez avançar os direitos das mulheres. O maniqueísmo funciona melhor em nossas mentes que na realidade.
Como explica o psicólogo Jonathan Haidt, "puro mal" é uma ilusão da qual nos servimos para distribuir culpa para outros. O que a literatura mostra é que violência e crueldade têm quatro causas principais.
As duas primeiras são ambição e sadismo, mas respondem por poucos casos. É relativamente raro alguém matar só para ter lucro ou prazer. As outras duas são alta autoestima e idealismo moral, que tentamos incutir em nossos filhos desde pequenos.
A razão mais comum de conflito é o excesso de autoestima. Quando alguém ameaça a imagem que fazemos de nós mesmos, vamos para a briga. Gaddafi, que, entre vários epítetos, fazia-se chamar de "rei dos reis", não sofria de baixa autoestima. Mas, para que o "guia da revolução" se tornasse o assassino em massa que virou, foi preciso acrescentar o idealismo, isto é, a convicção de servir a um Deus e a uma ideologia infalíveis. Foi uma combinação mortal.

JOSÉ SIMÃO - Kagadafi! Quero todos os caftans!


Kagadafi! Quero todos os caftans!
 JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 21/10/11

E um cara no Twitter disse que essa foto de celular do Gaddafi tá parecendo o Cauby de porre! Rarará!


Buemba! Buemba! Macaco Simão urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta: "Funcionários da Infraero fazem greve e os voos saem no horário". Então continuem em greve! Rarará! Infraero se chama Infra Zero! Infrazero!
E o Kagadafi? Foi ser ditador no inferno. Acabou o descanso do diabo! Rarará! E quem vai ficar com aquela coleção de caftans exóticos? Eu quero todos. A Alcione também!
E um cara no meu Twitter disse que essa foto de celular do Gaddafi tá parecendo o Cauby de porre! Rarará! Aliás, a Nair Bello do Twitter: "O que o Cauby tá fazendo todo ensanguentado na home do UOL?".
Rarará! E uma leitora me disse que ela queria ver mesmo era a foto do Bin Laden, não do Gaddafi!
E não aguento mais piada do Sarney! Todo mundo que morre acaba em piada com o Sarney! E adorei o Erasmo Carlos no programa da Hebe! O Erasmo Carlos tava parecendo o busto do Erasmo Carlos. Pronto pra colocar na praça!
E a Vanusa passou mal. Deve ter sido o cheiro de laquê da Hebe! Diz que é labirintite. Mas tão dizendo que é la biritite! Rarará! Gente, precisa de um helicóptero do Incor no programa da Hebe. Pela faixa etária, bota um helicóptero do Incor ao lado do sofá!
E adivinha quem também estava? A Martinha! O Queijinho de Minas. Que virou queijo francês. Sabe aquele que eles enterram e desenterram cem anos depois? Queijo fesandê! E esta foi a melhor resposta do Erasmo. "Erasmo, você se lembra...". "Não, não lembro!".
Eu também não lembro de mais nada. Só lembro que cobri o impeachment do Collor e chorei no filme "ET"! É mole? É mole, mas sobe! Ou como disse aquele outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece!
E o Flamengo? Levou de quatro da Universidad de Chile. Foi reprovado no Enem. Rarará! Não consegue chegar ao nível universitário! E com dois gols de Lorenzetti! Levaram lavada de duchas Lorenzetti. Lorenzetti dá um banho de água fria!
E o Pan com Ovo! Ganhamos ouro em tiro! Ou seja, ouro em chumbo! E a atiradora se chama Ana Ferrão. Vai encarar! Só ganhamos duas medalhas em tiro? Só duas? Acho que mandaram os atiradores errados. Subrepresentação! Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

FELIPE RECONDO - Saque reforça testemunho de propina a Agnelo no DF



 Saque reforça testemunho de propina a Agnelo no DF
FELIPE RECONDO
O ESTADÃO - 21/10/11

Investigação policial revela que dinheiro saiu de conta de empresa que emitiria nota fiscal


Investigação da Polícia Civil, incluída no inquérito aberto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), revela que a propina de R$ 256 mil que teria sido entregue a Agnelo Queiroz (PT), governador do Distrito Federal e ex-ministro do Esporte quando era filiado ao PC do B, foi de fato sacada de uma das contas indicadas pelo autor das acusações, Geraldo Nascimento de Andrade.

Os dados e os depoimentos, somados às conversas telefônicas grampeadas com autorização judicial, levaram a polícia a suspeitar do envolvimento direto de Agnelo no desvio de recursos do programa Segundo Tempo.

Ao Ministério Público Federal, o delegado responsável pelas investigações, Giancarlo Zuliani Junior, sugeriu a quebra do sigilo do telefone usado por Agnelo e análise dos dados das antenas da operadora de telefonia celular. Assim, seria possível dizer se Agnelo conversou com integrantes do esquema no dia em que o dinheiro teria sido entregue.

Ao requerer à Justiça Federal o encaminhamento das investigações para o STJ, em razão dos indícios contra Agnelo, que tem foro privilegiado, o procurador da República José Diógenes Teixeira já indicava que as quebras de sigilo podem ser requisitadas.

Os R$ 256 mil que a testemunha disse terem sido pagos a Agnelo foram sacados da conta da empresa Infinita Comércio e Serviços de Móveis Ltda. em 7 e 8 de agosto de 2007. A Infinita é uma das empresas que teria fornecido notas fiscais falsas para encobrir o desvio de verba. Conforme depoimento de Nascimento, o dinheiro foi entregue à noite no estacionamento de uma concessionária em Sobradinho.

Nascimento relatou ter seguido de carro com Eduardo Pereira Tomaz, assessor de João Dias nos projetos do Segundo Tempo, para o estacionamento. Pouco depois do horário marcado, um Honda Civic preto estacionou ao lado do carro em que estava. Eduardo teria entregue a mochila com o dinheiro. Os R$ 256 mil teriam sido desviados de um dos convênios firmados pelo Ministério do Esporte e assinado pelo então secretário executivo e atual ministro Orlando Silva.

Aviso. Em uma das gravações, Ana Paula Oliveira de Faria, mulher de João Dias, policial dono da Federação Brasiliense de Kung Fu (Febrak), liga para Agnelo para avisar que o marido estava sendo preso. Ana Paula relatava a uma secretária de Agnelo que o marido, assim que foi preso, pediu que ela o avisasse.

"O Agnelo...ele...ele tem que saber disso. Eu só queria que você conversasse com o Agnelo, porque assim, o João pediu", disse Ana Paula. "Tá bom, Ana Paula, eu vou passar o número dele e peço para o Agnelo ligar, tá?", respondeu a secretária.

Na quarta-feira, quando divulgada a abertura de inquérito contra Agnelo, a Secretaria de Comunicação do DF divulgou nota afirmando que a existência da investigação não é suficiente para "firmar premissa" de que Agnelo "praticou ato reprovável legal e eticamente". "Há manifesta impropriedade na tentativa de formar juízo de valor aligeirado sobre a idoneidade pessoal ou legal de Agnelo Queiroz, com base em informações incompletas e descontextualizadas, principalmente porque a Justiça, único Poder constitucional para exercer a dicção de culpar ou inculpar os cidadãos, em momento algum o fez."

Suspeita

R$ 256 mil foi o valor que teria sido entregue ao ex-ministro do Esporte e hoje governador do Distrito Federal Agnelo Queiroz

NELSON MOTTA - O fim da guerra ao verde



O fim da guerra ao verde
NELSON MOTTA 
O Estado de S.Paulo - 21/10/11

O Gallup informa: metade dos americanos adultos é favorável à legalização da maconha. Mas 46% continuam contra, a maioria republicanos, conservadores, mulheres e mais velhos. Em 1969, o apoio era de 12%, em 2000 passou a 31%, foi para 40% em 2009 e, dois anos depois, chega a 50%, mostrando que a questão é só de tempo, na marcha inexorável até a legalização final.

Por referendos, a Califórnia e mais 15 Estados já regularizaram o "uso medicinal" com controles e limites, cobrando impostos. Basta uma receita médica de "estresse" para ganhar um cartão de usuário. A polícia sabe quem compra, quanto, e onde. É o eufemismo de uma "legalização branca", verde no caso, uma hipocrisia necessária para ajudar a sociedade a aceitar a inutilidade da guerra perdida. Um golpe mortal no tráfico local e uma preocupação a menos para a polícia e o Judiciário.

Bill Clinton e Fernando Henrique Cardoso têm bons motivos e muita coragem para enfrentar esse tema antigo, polêmico e perigoso, mas urgente. Nos Estados Unidos, o aumento da aprovação popular já atrai o apoio de muitos políticos em busca de votos, mas no Brasil, bem mais conservador, é diferente. Imaginem se nas ultimas eleições Dilma ou Serra assumissem a mesma posição de FHC? Seria um suicídio eleitoral. A direita e a esquerda religiosas os destruiriam entre os católicos, protestantes e evangélicos. Como aqui ninguém quer perder votos, o assunto é evitado. Mas terá de ser discutido depois que os Estados Unidos legalizarem a erva que 7% da sua população maior de 15 anos consome regularmente, segundo a mesma pesquisa.

É um pequeno avanço de uma longa marcha contra o preconceito, a intolerância e a hipocrisia. A guerra jamais conseguiu diminuir o consumo, o tráfico e os crimes a ele relacionados. Mas ao mesmo tempo crescem assustadoramente as vítimas de crack, cocaína, heroína, ecstasy, anfetaminas, barbitúricos e analgésicos, que provocam dependências pavorosas, degradam e matam. Menos tóxica que o tabaco, o álcool e os remédios, a maconha será uma alternativa mais leve e natural, ou uma porta de entrada para drogas pesadas? O tempo dirá.

DORA KRAMER - Conduta uniforme



Conduta uniforme
 DORA KRAMER
O ESTADÃO - 21/10/11

Ideal mesmo seria que a presidente Dilma Rousseff aproveitasse o ensejo de mais um escândalo para dar um jeito no festival de condutas desviantes que assola a Esplanada dos Ministérios.
Ao todo, até agora, aos dez meses incompletos de governo, foram seis: Antonio Palocci e o espetáculo do crescimento patrimonial; Alfredo Nascimento e as obras superfaturadas nos Transportes; Wagner Rossi e o direcionamento de licitações na Agricultura; Pedro Novais e o uso particular de dinheiro público; o Ministério do Turismo e a prisão de 35 servidores acusados de corrupção; Orlando Silva e os convênios fraudulentos no Esporte.
Se somados à lista os episódios temporariamente arquivados de favorecimento partidário na distribuição de verbas públicas no Ministério do Trabalho e da denúncia contra o ministro das Cidades de pagamento de mesada a deputados em troca de apoio, a conclusão é a de que os partidos que compõem a coalizão do governo se equivalem no quesito produção de escândalos.
São dois do PMDB, um do PC do B, um do PR, um do PP, um do PDT e um do PT. Como se vê, há uniformidade de conduta no primeiro escalão. Por enquanto, só ficou de fora o PSB, que ocupa a pasta da Integração Nacional.
E que não se diga que o "dedo podre" pertence ao ex-presidente Lula porque, não obstante a coincidência de os atingidos terem sido todos, direta ou indiretamente, apadrinhados por ele, nesse caso não há hipótese de se transferir responsabilidade: além de ter aceitado nomear cada um deles, Dilma Rousseff era, no dizer do próprio Lula, a "alma" da gestão anterior que, no dizer da propaganda eleitoral, seguiria em ritmo de continuidade.
O problema é a regra que precisa vir de cima. A presidente não impôs uma nova norma pela qual toda transgressão seria castigada. Tanto é que a "base" entrou em estado de prontidão ameaçando revolta quando houve o ensaio de "faxina" e de imediato se avisou aos navegantes que as trocas de ministros ficavam automaticamente adiadas para a reforma de janeiro.
A rigor, as demissões não podem ser consideradas uma punição em regra. Rendem a perda do emprego aos alvos principais, mas a engrenagem continua funcionando como antes de os fatos consumados terem sido postos à porta do gabinete presidencial pela imprensa.
Falou-se ontem o dia inteiro que Orlando Silva estava fora do ministério. Teria uma conversa com a presidente assim que ela chegasse do exterior e tudo se resolveria ali.
A questão é: tudo o quê, a demissão do ministro? Francamente, chega a ser irrelevante. Soa, antes, como o cumprimento de um ritual conhecido, cujo objetivo principal é tirar o foco da denúncia da vez.
Demitido o ministro, o assunto perde o interesse, protestos o sentido, todo mundo se dá mais ou menos por satisfeito e mais cedo ou mais tarde começa tudo outra vez.
A imprensa denuncia, o governo alega presunção de inocência, o acusado se defende, o acusador é desqualificado, os fatos atropelam o palácio, que, por sua vez, os coloca no escaninho do esquecimento com mais uma demissão que renderá à presidente Dilma dividendos públicos pela intransigência em relação a "malfeitorias".
E assim a enganação vira regra geral: o governo finge que toma providências, o País finge que acredita e a farra continua.
Notáveis. A presidente não comenta nem com os próximos os nomes que teria em mente para compor a Comissão da Verdade, cujo relatório de autoria do senador Aloysio Nunes Ferreira foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Pelo projeto, que o governo gostaria de ver votado até dezembro, não podem participar dirigentes partidários. Excetuados, no entanto, os ocupantes de cargos honoríficos.
De onde um ministro aventa a possibilidade de Dilma vir a convidar o ex-presidente Fernando Henrique para integrar o grupo que durante dois anos trabalhará na recuperação da história das agressões aos direitos humanos durante o regime militar de 1964.
A ideia da presidente é escalar um elenco suprapartidário.

GOSTOSA


EDITORIAL O GLOBO - Questão dos royalties virou escárnio


Questão dos royalties virou escárnio
EDITORIAL
O GLOBO - 21/10/2011

O que se temia acabou acontecendo em Brasília, por meio de políticos irresponsáveis, sem espírito federativo. O Senado, em votação simbólica, voltou a desrespeitar, sob o pretexto de agir em nome da maioria, 16 milhões de habitantes do Estado do Rio de Janeiro, 3,5 milhões do Espírito Santo e 40 milhões de São Paulo, ao aprovar, na noite de quarta-feira, um projeto de lei que avança sobre as receitas de royalties e participações especiais decorrentes da produção de petróleo e gás já definidas.

Para se ter ideia do descaso com a população desses três estados, sorrateiramente houve até mesmo uma tentativa de incluir no projeto uma mudança na geografia brasileira.

Não satisfeitos em avançar sobre receitas existentes, um dispositivo no substitutivo do relator do projeto iria redefinir as coordenadas geográficas de modo que parte do litoral fluminense e capixaba se deslocaria no mapa para dois estados do Sul. Com isso o descaso se transformou em afronta aos órgãos técnicos, e passou à categoria de escárnio, pelo excesso de casuísmo.

Sobre a produção de petróleo não incidem impostos estaduais (ICMS) na origem, apenas no destino (nos combustíveis), exceção abusiva que foi estabelecida na Constituição de 1988. Como compensação financeira pelo impacto da exploração e produção de óleo e gás, a legislação prevê o pagamento de royalties e de participações especiais que devem acompanhar a produtividade dos campos. O impacto é bastante negativo, pelos riscos ambientais e pressão sobre a infraestrutura do estado e dos municípios confrontantes à atividade da indústria no mar. Já os pagamentos de royalties e participações são feitos em maior parte à União, que deve se encarregar de redistribuir parte deles aos demais entes federativos.

Com o aumento da produção de petróleo, que não aconteceu da noite para o dia - políticos irresponsáveis, demagogos, fingem desconhecer que, antes de colher os bônus, as localidades confrontantes aos campos produtores tiveram de suportar o ônus -, essas receitas começaram a ganhar relevância.

A descoberta dos reservatórios do pré-sal abriu novas perspectivas de receitas futurais, e sobre as quais foi negociado um acordo com o governo federal que aumentará consideravelmente a fatia dos entes federativos não produtores, em detrimento dos produtores.

Nada disso foi considerado, pois o projeto que o Senado votou prevê um avanço sobre receitas dos campos já licitados e os em produção - uma excrescência jurídica - , congelando a participação atual do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. À resistência quase solitária de fluminenses e capixabas se junta agora o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. O governo federal, a quem caberia promover a pacificação, talvez agora se movimente, até mesmo vetando o projeto, se a Câmara confirmar a decisão do Senado. Caso contrário, caberá ao STF resolver a questão.

A presidente Dilma Rousseff, de forma compreensível, procurou manter alguma distância das negociações no Congresso, embora na sua equipe haja defensores de soluções que não interessam aos estados produtores. Agora, ela terá de agir, para salvar o pacto federativo.

REGINA ALVAREZ - Partilha



Partilha
REGINA ALVAREZ 
O GLOBO - 21/10/11 

Uma discussão relevante quando o tema é a divisão do bolo de recursos do Orçamento federal é a destinação dessas verbas. Quem é beneficiado e quem é preterido no rateio. O deputado Arlindo Chinaglia, relator do Orçamento de 2012, destinou parte do dinheiro reservado às emendas parlamentares a municípios com até 50 mil habitantes para aplicação na saúde, educação e infraestrutura urbana.
Trata-se de uma pequena fatia do bolo, R$2,2 bilhões rateados entre 4.953 municípios, mas que faz diferença no orçamento da maior parte dessas prefeituras. Pela divisão, cada uma receberá entre R$300 mil e R$600 mil, dependendo do tamanho.
O relator chama de emenda de iniciativa popular essa novidade no Orçamento, porque a ideia é que cada uma receberá entre R$300 mil e R$600 mil, dependendo do tamanho.
O relator chama de emenda de iniciativa popular essa novidade no Orçamento, porque a ideia é que cada prefeitura promova audiências públicas para decidir com representantes da sociedade local para onde vai o dinheiro. Se no prazo de um mês não for feita a audiência e encaminhada uma ata à Comissão Mista do Orçamento, o recurso será direcionado à saúde.
Como desconfia dos políticos, o leitor deve estar se perguntando se em ano de eleição municipal a destinação de verbas do Orçamento federal às pequenas prefeituras não irá atender a interesses partidários. Isso de fato pode acontecer. Afinal, o Congresso é a casa dos políticos, e eles costumam mesmo legislar em causa própria.
Acontece que hoje a destinação dos recursos das emendas dos parlamentares já atende a interesses político-partidários. Primeiro, o dinheiro fica retido no cofre do governo, porque as emendas nunca escapam da tesoura da equipe econômica. Depois são liberadas a conta-gotas, de acordo com o interesse político de um comando instalado no Palácio do Planalto, que usa esses recursos para todo tipo de barganha no Congresso.
A proposta do deputado Chinaglia pode, sim, colocar azeitonas na empada de alguns prefeitos candidatos à reeleição, mas também abre uma janela para a participação da sociedade nessa discussão tão importante, que é o rateio das verbas do Orçamento federal. E abre um canal direto entre a sociedade e o Congresso.
O relator ainda busca uma forma de diferenciar essas emendas no Orçamento, facilitando o controle social sobre a execução das despesas. Nada disso é garantido, mas abre uma porta para que a decisão sobre a liberação das emendas parlamentares não fique restrita a um pequeno grupo, confortavelmente instalado no quarto andar do Palácio do Planalto.

CELSO MING - Em jogo, o futuro do euro



Em jogo, o futuro do euro
CELSO MING
O ESTADÃO - 21/10/11

É imprevisível o resultado das reuniões de cúpula dos chefes de Estado da área do euro, agendadas para domingo e quarta-feira, em Bruxelas, Bélgica. Foram convocadas para encontrar uma saída permanente para a crise. Mas são tantos interesses paroquiais que solapam uma solução que não dá para apostar em que o impasse será, finalmente, superado. (Veja, ainda, o Confira)

Ninguém espera pelo fim dos problemas dos fundamentos do euro. O objetivo é atacar emergências: ameaça de crise bancária sistêmica (quebras em cadeia); e falta aguda de recursos para provável suspensão de pagamentos pela Grécia e, eventualmente, por outras economias à beira do colapso. Esta Coluna tratará do que está em questão no sistema financeiro do bloco.

A novidade é a perspectiva de calote de Estados soberanos. Em julho ficou acordado que credores privados (bancos, fundos de pensão, etc.) seriam induzidos a aceitar corte (haircut) de 21% no valor dos créditos que detêm sobre a Grécia. Foi admitido o princípio de que dívida soberana (de Tesouros nacionais) pode, sim, ser caloteada. E isso implica assumir riscos, antes, negligenciados.

A primeira reação do presidente da França, Nicolas Sarkozy, foi dizer que o corte da Grécia não era exatamente calote, por ser aceito "voluntariamente" pelos bancos. E, também, porque os adicionais de juros cobrados na venda dos títulos já supunham possível inadimplência.

Esse ponto de vista não foi acatado por dois motivos. Primeiro, no caso de corte das dívidas, os credores teriam direito ao "seguro" previsto nos contratos de Crédit Default Swap (CDS). Ou seja, ficaria caracterizado o default (quebra). E, segunda razão, esse calote não está sendo engolido "voluntariamente", mas por imposição. Fora isso, já se viu que não será de só 21%; terá de ser de cerca de 50%.

O reconhecimento de que a exposição dos bancos a títulos soberanos acarreta riscos levou à necessidade de adequação do patrimônio bancário à proporção dos ativos. Especialistas entendem que a dimensão de capital para blindar os bancos deverá corresponder a 9% dos créditos em carteira ponderados pelo risco. Os cálculos do Fundo Monetário Internacional apontaram pouco mais de 200 bilhões de euros. É volume muito alto para ser disposto pelo mercado, hoje muito resistente a subscrever ações novas de bancos cujo passivo real se desconhece.

Esse nível de secura empurra as instituições financeiras para a venda de parcelas dos seus ativos (créditos). Mas uma forte desova nos mercados poderia provocar duas graves consequências: desvalorizar os títulos pelo efeito procura maior do que oferta, o que pode exigir mais reforço de capital; e abrupto estancamento do crédito nos mercados, o que geraria recessão, desemprego e a piora da crise.

A outra opção seria determinar que os próprios Tesouros provessem capital novo para os bancos. Uma saída algo abstrusa, à medida que Tesouros altamente endividados tivessem de salvar com ainda mais dívida os créditos da própria dívida.

Uma das propostas sobre a mesa é alavancar o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, cujo patrimônio, agora de 440 bilhões de euros, também serviria para reforçar os bancos. O problema é que esse Fundo não foi criado para capitalizá-los e já é cobertor curto demais para salvar os Estados nacionais.

Ficam para a próxima Coluna os outros problemas a serem equacionados nas reuniões de domingo e quarta-feira.

O interesse maior. No evento de despedida de Jean-Claude Trichet na quarta-feira, em Frankfurt, Helmut Schmidt, de 92 anos, ex-chanceler da Alemanha, advertiu de sua cadeira de rodas os críticos do euro: "Quem considera interesses de seu país mais importantes que os da Europa comum prejudica interesses fundamentais do próprio país". Assim relatou, nesta quinta-feira, o New York Times.

Novo adiamento. Também desta vez, boatos estavam certos. Nota oficial confirmou segunda reunião de cúpula no bloco do euro para a próxima quarta-feira. Nessa etapa posterior, será batido o martelo sobre questões ainda sem consenso.