terça-feira, fevereiro 07, 2012

À mão armada - DORA KRAMER

 O Estado de S.Paulo - 07/02/12



O governador da Bahia, Jaques Wagner, não é o primeiro nem será o último a enfrentar uma das piores situações a que pode ser submetida uma população: rebeliões de agentes responsáveis pela segurança do público.

Já aconteceu em Minas Gerais, no Ceará, em São Paulo, ameaça acontecer no Rio de Janeiro. Sem entrar no mérito dos antecedentes até por ausência de dados precisos sobre as circunstâncias de cada um deles, Wagner, contudo, depara-se com a peculiaridade de pertencer a um partido que há dez anos, quando oposição, apoiou o que com propriedade agora chama de "levante", na mesma Bahia hoje governada por ele.

Sejam greves ou movimentos de protesto, não podem ser vistos como fenômenos naturais da democracia por uma diferença essencial em relação a tantos outros. Trata-se de manifestantes armados no exercício da obstrução do direito fundamental de ir e vir (com vida) do cidadão que espera deles proteção. Por obrigação funcional.

Já o Estado, detentor do monopólio do uso legal da força, tem o dever de garantir o cumprimento da lei e a manutenção da ordem.

Posição conservadora, de direita? Era o que dizia o PT quando longe das obrigações governamentais e o que ainda alega quando o problema não lhe atinge diretamente os calos.

Violência não tem ideologia, bem como agressões à legalidade são uma afronta ao Estado de Direito de qualquer ângulo ou sob quaisquer justificativas.

Reivindicações todos têm. Mas nem todos detêm o poder de recorrer ao terror como fizeram policiais baianos ao invadir ônibus, obrigar os passageiros a descer e tumultuar a cidade de Salvador na semana passada.

Movimentos grevistas aceitáveis não levam pânico à sociedade. De uma só vez não paralisam as aulas, não fecham o comércio, não provocam o cancelamento de shows, não afugentam turistas e, sobretudo, não provocam um aumento de 130% nos crimes de homicídio no período de seis dias.

Não ocupam uma assembleia legislativa, fazendo crianças e familiares de escudo, nem dão abrigo a gente com prisão decretada pela Justiça. Foragidos, pois.

O governador Jaques Wagner não tem se notabilizado pela eficiência da política de segurança pública. Os índices de criminalidade na Bahia cresceram na sua gestão.

Pode-se também criticá-lo por ter sido surpreendido com a magnitude do movimento e, além do mais, enquanto estava ausente em Cuba, vestido a caráter, em guayabera, trocando amabilidades com o regime Castro e já de agenda marcada para, na volta, visitar barracões de escolas de samba no Rio de Janeiro.

Mas não dá para lhe tirar a razão quando se recusa de antemão a anistiar os revoltosos e quando se refere como "bandidos" aos que, armados, disseminam o desvario tentando sobrepor suas vontades ao bem-estar da população.

O uso político-eleitoral do episódio é outro aspecto dos mais lamentáveis e inaceitáveis. Ah, o PT faz isso? Sempre que está ao seu alcance. Na greve baiana de 2001, Lula chegou a acusar o então governador César Borges (DEM) de incentivar o levante para jogar os policiais contra a população.

Não há mérito nessa lógica, também muito usada pelo PT, de que o erro quando coletivo adquire feição de acerto. O "todo mundo faz" é primo-irmão da falta de argumento, do desapreço ao discernimento, do menosprezo pela obediência à lei como fator de soberania democrática. Quem pega carona no discurso fácil de atacar o adversário apenas pelo fato de ser adversário, não raro diz besteira.

"Acusar" o governador de recorrer ao Exército para intimidar, se não reprimir, a materialização da transgressão inscreve-se entre uma das mais robustas.

Saber administrar o melhor desfecho, dentro dos parâmetros da lei, é da responsabilidade do governador. Critique-se se o fizer ao molde do abuso de poder.

Mas sem perder de vista de que lado está a legalidade: do governo eleito para, entre outras obrigações, impedir que a baderna se instaure e que grupos se apropriem de funções exclusivas do Estado; e da Justiça, cujas decisões quando não cumpridas configuram, aí sim, a barbárie.

Domado - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 07/02/12


A presidente Dilma e o vice Michel Temer conversaram sobre o líder do PMDB na Câmara, Henrique Alves (RN). Ela estava intrigada com seu comportamento, pois ele pretende presidir a Câmara nos dois últimos anos de seu mandato. Temer assumiu a tarefa de enquadrar Alves e pedir moderação. Ontem, um ministro comentou que a ação surtiu efeito: "Ele está se empenhando. Isso é notório nestes últimos quatro ou cinco dias."

Fratura exposta
A principal preocupação política do Planalto neste início dos trabalhos do Congresso é evitar a convocação do ministro Guido Mantega (Fazenda) para dar explicações sobre denúncias de corrupção que derrubaram o ex-presidente da Casa da Moeda Luiz Felipe Denucci. O temor é que um mau desempenho de Mantega em eventual depoimento afete os mercados. Apesar de a presidente Dilma ter mandado o ministro dar explicações sobre o caso, a avaliação no governo é que ele foi inábil na entrevista coletiva, concedida semana passada, ao tensionar ainda mais a relação com o PTB, que faz parte da base aliada.

"Emplacamos três ministros” — Henrique Alves, líder do PMDB na Câmara (RN), fazendo piada ontem, ao lado do líder no Senado, Renan Calheiros (AL), vindo do andar, no Planalto, onde fica o gabinete da presidente Dilma 

BANDEIRA BRANCA. Em visita do presidente nacional do PT, Rui Falcão, a Mato Grosso do Sul, no sábado, o ex-governador Zeca do PT declarou que vai apoiar o senador Delcídio Amaral (PT-MS) para o governo do estado, em 2014. Os dois eram desafetos. Zeca do PT também defendeu uma aliança com o atual governador, André Pucinelli (PMDB). Delcídio é visto como um estranho no ninho no PT por já ter sido filiado ao PSDB. Ele também desagradou a petistas ao presidir a CPI dos Correios.

Menos PT
A exemplo da pasta de Ciência e Tecnologia, a futura ministra das Mulheres, Eleonora Menicucci, também não é petista. Depois de sair da cadeia, na ditadura, em 1974, ela trocou a militância partidária pelo movimento feminista.

Timing
Apesar de querer deixar o governo para disputar a prefeitura de Vitória, Iriny Lopes pretendia ficar no cargo até 8 de março, Dia da Mulher. Ela sai em meio aos preparativos das comemorações oficiais, cujo tema seria sustentabilidade.

Depois da querela, a cooperação
Os palácios do Planalto e dos Bandeirantes estão decididos a trabalhar juntos no caso de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). O governo federal está satisfeito com a decisão do governador Geraldo Alckmin de construir 5 mil casas. Por sua vez, o Ministério das Cidades e a Caixa procuram áreas públicas, como as pertencentes à Rede Ferroviária Federal, para reassentar os desalojados. O Planalto quer usar dívidas com a União para reassentar algumas famílias em Pinheirinho.

Vetado
Pressão do PT contra a eventual nomeação do deputado Vieira da Cunha (PDT-RS) para o Ministério do Trabalho. Não o perdoam por ter relatado a CPI da Segurança Pública, que atingiu a gestão do governador Olívio Dutra (RS).

Niterói
O secretário estadual Rodrigo Neves elegeu 45% dos delegados que vão escolher o candidato do PT à prefeitura de Niterói. O deputado federal Chico D´Angelo fez 30%. Já o ex-vereador Romério Duarte vai decidir. Ele fez 25% dos delegados.

NA CHUVA. A presidente Dilma não demonstra estar disposta a trocar o ministro Paulo Sérgio Passos (Transportes) para agradar ao PR.

O GOVERNO da Rússia enviou carta ao Planalto oferecendo financiamento de 85% do valor dos caças Sukhoy se forem adquiridos para reequipar a FAB.

EMBAIXADORA. A presidente da CNA e senadora Kátia Abreu (PSD-TO) fala, quinta-feira, para um grupo de alunos e professores da Universidade de Harvard sobre "Cenários de crescimento da agropecuária brasileira: produção e sustentabilidade".

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 07/02/12



Medida terá pouco impacto nas vendas, diz setor de material de construção

A nova linha de financiamento do governo federal para a compra de material de construção não será suficiente para melhorar as vendas, segundo empresas do setor.

A intenção de compra do consumidor continua mais baixa que a registrada há 12 meses, segundo estudo do Programa de Administração do Varejo e da Fundação Instituto de Administração.

"Esperamos que 2012 seja semelhante ou pouco melhor que o ano passado. Há muitos imóveis para serem entregues, então não haverá retração", diz o diretor-geral da C&C, Jorge Gonçalves Filho.

As vendas de 2011 foram 4,5% melhores que as do ano anterior, segundo a Anamaco (associação nacional dos comerciantes do setor).

O novo financiamento, que terá recursos do FGTS e sairá ainda neste mês, prevê juros de 12% ao ano e 120 meses para pagar.

Para o copresidente da Dicico, Jorge Letra, o governo poderia ter adotado uma medida mais eficiente. "O crédito não fará diferença. Não devemos ter resultados superiores aos de 2011."

A expectativa do setor é que as vendas melhorem a partir de março. "Está chovendo muito nos últimos meses. Quando parar, muita coisa terá de ser reconstruída no país", explica o presidente da Anamaco, Cláudio Conz.

A Telhanorte espera pequena desaceleração em 2012, mas prevê que a medida aumente a confiança de empresas e do consumidor.

"Não devemos ter retração em 2012 devido aos lançamentos que já estavam previstos desde o ano passado"
JORGE GONÇALVES FILHO
diretor-geral da C&C

"Em vez de crédito, o consumidor deveria poder antecipar seu FGTS para reformar, e não apenas para comprar a casa própria"
JORGE LETRA
copresidente da Dicico

Regulação decisiva

A regulação é o fator que mais influencia o trabalho dos executivos do setor financeiro, segundo a Accenture.

Mais da metade (53%) dos 536 entrevistados classificaram essa característica como sendo de "alto impacto".

Em seguida aparece a permanente volatilidade dos mercados, com 46%.

Para minimizar o problema da volatilidade, 67% dos executivos concentram seus esforços no gerenciamento de custos. Outras soluções indicadas são a administração dos riscos e o planejamento do fluxo do caixa.

Orçamento para gestão

Apenas 2% do faturamento das empresas é destinado ao aperfeiçoamento da gestão, segundo pesquisa da Fundação Nacional da Qualidade, entidade privada que reúne empresas como Braskem, Bradesco e Gerdau, entre outras.

O percentual, porém, é considerado suficiente pelo superintendente-geral da fundação, Jairo Martins.

"Entre 2% e 5% é razoável. As empresas já sabem que investir em gestão reduz custos."

Das 309 empresas ouvidas, 46% acreditam que o setor automobilístico é o que mais se preocupa com gestão.

Fundo Estocado

O volume de cotas de fundos abertos e fechados chegou a R$ 931,9 bilhões em janeiro na Cetip (depositária de títulos privados de renda fixa).

O valor é 20% superior ao registrado no mesmo período de 2011, quando o total era de R$ 772,4 bilhões.

A maior parte do estoque atual é formada por cotas de fundos abertos -R$ 859,9 bilhões contra R$ 55,3 bilhões de fundos fechados.

Idiomas A Fisk inaugura nesta semana sua primeira unidade na Flórida -a sexta nos Estados Unidos. Até o final do semestre, a empresa abrirá sua primeira franquia no Chile. A Cultura Inglesa, por sua vez, terá mais duas unidades próprias em SP neste ano.

com JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ

GOSTOSA


Saída "made in USA" - JOSÉ PAULO KUPFER

O ESTADÃO - 07/02/12

Sinais interessantes têm chegado da economia americana. Números da criação líquida de postos de trabalho, nos Estados Unidos, registram taxas positivas, mês após mês, sobretudo desde o último trimestre de 2011, sempre acima das expectativas dos analistas. As estatísticas de janeiro surpreenderam ainda mais.

Depois de revisado, o total líquido de vagas abertas evoluiu de 157 mil, em novembro, e 203 mil, em dezembro, para 243 mil, em janeiro de 2012. A criação de novos empregos refletiu na taxa de desemprego. Ela vem caindo também mês a mês. Em janeiro, desceu a 8,3%, o menor índice em três anos.

Há consenso de que o quadro do emprego pinta melhor, mas não se pode tomá-lo sem ressalvas. Primeiro, porque o desalento no mercado de trabalho ainda é elevado - muitos desistiram, pelo menos temporariamente, de procurar emprego - e as taxas de desemprego mais suaves se devem, em boa medida, à redução da população ativa. Depois, porque a recuperação é lenta e está longe de compensar as perdas ocorridas depois da eclosão da crise. No ritmo atual, a reposição dos estimados 10 milhões de vagas perdidas levaria perto de sete anos.

Gatos escaldados com a ameaça não concretizada de retomada em fins de 2010, os analistas estão tendendo a refrear o otimismo diante dos indicadores melhores. Mas o fato é que a atividade econômica, principalmente na indústria e em segmentos dos serviços, como turismo e entretenimento, está revelando vigor antes inexistente. O valor médio das horas trabalhadas na indústria, por exemplo, alcançou em janeiro o nível mais alto em seis anos.

São muitos, obviamente, os riscos de que a tendência positiva agora vislumbrada em cores mais nítidas venha a não se confirmar. Um recrudescimento da crise na Europa e estouros descontrolados das bolhas acumuladas na economia chinesa, possibilidades que não podem ser descartadas, com suas previsíveis repercussões negativas nas economias emergentes, tenderiam a quebrar o ritmo da recuperação esboçada nos Estados Unidos.

De todo modo, mesmo com essas sombras no horizonte, pode valer a pena tentar investigar as razões da incipiente, talvez frágil, certamente insuficiente, mas visível retomada econômica americana. A receita da saída "made in USA" da crise é clássica e se apoia em duas pernas. Uma delas é o afrouxamento monetário, usado para sustentar o setor financeiro, mas também para reduzir os custos de produzir e, mais do que tudo, desvalorizar o dólar e, assim, impulsionar exportações. A outra é uma política fiscal se não expansionista, pelo menos não contracionista.

O déficit do governo, no ano fiscal de 2011, que se encerrou em 30 de setembro do ano passado, subiu ligeiramente em relação a 2010, para US$ 1,3 trilhão, mantendo-se nas vizinhanças de 9% do PIB. É menos do que o pico de 10% do PIB registrado em 2009 - o mais elevado desde 1945 -, mas ainda assim muitíssimo alto e um verdadeiro Himalaia diante das pretensões das lideranças da zona do euro de limitar os déficits dos Tesouros de seus países a 0,5% do PIB.

Cabe, porém, ao esforço exportador a parcela mais expressiva da fórmula americana da retomada. Há exatamente dois anos, no discurso sobre o estado da União, o presidente Barack Obama espantou os analistas com o lançamento do desafio de dobrar o volume das exportações em cinco anos, levando-as, em 2015, a superar US$ 3 trilhões. A maior surpresa dessa história é que está funcionando. No ano passado, as exportações cresceram 16% e superaram US$ 2 trilhões. Mantido o ritmo, a meta será atingida com folga.

Ainda que a taxa média de incremento das exportações fique em 8% - metade da verificada em 2011 -, como analistas consideram mais realista, diante da possibilidade de menor crescimento dos emergentes e de contração no mercado internacional, especialmente no segmento das commodities, ocorreria um aumento de 60% no volume exportado pelos Estados Unidos. Isso seria suficiente para suportar mais de 15 milhões de postos de trabalho.

Não é só o dólar desvalorizado que anda operando o "milagre". A taxa de câmbio mais favorável tem sido turbinada por estímulos à produção - que, por sinal, estão promovendo aumentos de produtividade - e, acima de tudo, por ações agressivas de Washington no comércio exterior. De um lado, o governo não alivia as pressões para a valorização da moeda chinesa e, de outro, não descansa na negociação de acordos comerciais com países e blocos.

O prazer da contradição - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 07/02/12

SÃO PAULO - Há algo de pedagógico na alternância do poder: percebemos com que facilidade situação e oposição trocam de papéis -e de princípios. A greve da PM baiana é uma oportunidade sem igual de ver a natureza humana em ação.

Em 2001, membros da corporação deflagraram uma paralisação, que também degenerou em violência. Na ocasião, o PT, por intermédio de Lula, defendeu a legitimidade da greve e responsabilizou o governo baiano, que era do PFL, pela barbárie. Hoje, o governador petista Jaques Wagner chama alguns dos grevistas de bandidos e se recusa a negociar. Denuncia a utilização política do movimento.

Ainda mais instrutivo é ver como os blogs de simpatizantes e antipatizantes do PT tratam a disputa, que ainda ganha pitadas do caso Pinheirinho.

A pergunta que fica é: as pessoas não se dão conta de suas contradições? E a resposta é "muito pouco".

O psicólogo Drew Westen mostrou que, na política, emoções falam mais alto que a lógica. Ele monitorou os cérebros de militantes partidários enquanto viam seus candidatos favoritos caindo em contradição. Como previsto, eles não tiveram dificuldade para perceber a incongruência do "inimigo", mas foram bem menos críticos em relação ao "aliado".

Segundo Westen, quando confrontados com informações ameaçadoras às nossas convicções políticas, redes de neurônios associadas ao estresse são ativadas. O cérebro percebe o conflito e tenta desligar a emoção negativa. Circuitos encarregados de regular emoções recrutam, então, crenças capazes de eliminar o estresse. A contradição é apenas fracamente percebida.

A surpresa foi constatar que esse processo de relativização não se limita a desligar as emoções negativas. Ele também dispara sensações positivas, acionando circuitos do sistema de recompensa, que coincidem com as áreas ativadas quando viciados em drogas tomam uma dose. Em suma, políticos e simpatizantes sentem prazer ao ignorar suas contradições.

Guerra civil na Bahia - CLÁUDIO GONÇALVES COUTO

VALOR ECONÔMICO - 07/02/12

Num momento em que a boa fase econômica do país permite olhar para o futuro de forma alentada, a calamitosa situação provocada pela greve de policiais militares na Bahia não permite esquecer que o país ainda padece de seríssimos problemas atinentes à qualidade de suas instituições, de seus recursos humanos e das políticas públicas em diversas áreas. Problemas tão sérios que permitem questionar até que ponto a onda positiva é sustentável e um necessário salto de qualidade está ao alcance. No caso em tela, a precariedade da segurança pública, elementar para a efetividade de todas as demais políticas governamentais, revela uma fragilidade institucional mais profunda do que perceptível no movimento paredista.

A debilidade é evidenciada por um dado tétrico: o volume de homicídios na Região Metropolitana de Salvador atingiu a casa da centena em uma semana de greve. Por si só tal cifra já seria aterradora, pois corresponde ao dobro do registrado na semana precedente - cinquenta e duas mortes, um número altíssimo. Mas há algo pior, notado pelo governador do Estado, Jaques Wagner. Em entrevista à Folha de S. Paulo de ontem, ele acusa policiais militares de, utilizando armas, ameaçarem passageiros de ônibus, bloquearem vias de trânsito e, o mais terrível, assassinarem moradores de rua (algo que o governador admite ser, por enquanto, uma suspeita). Se tais ações são por si só lastimáveis, simplesmente por já terem acontecido, elas embutem algo ainda mais preocupante em relação ao futuro: serão os policiais perpetradores dessa barbárie os responsáveis por zelar pela segurança dos cidadãos e pela preservação da lei e da ordem após o final da greve. Dá para confiar? Como cantou Chico Buarque, "chame o ladrão!".

Greve dos PMs baianos revela instituições frágeis

Por um lado, o evento evidencia um problema institucional das polícias país afora, que repetidamente emerge: uma cultura de truculência e banalização de ações ilegais. Quando tal modo de agir se dirige a criminosos ordinários, justiçados ao arrepio do direito, alguns segmentos da sociedade brasileira - em particular da mídia e da classe política - dão de ombros ou até mesmo aplaudem. "Menos um", diriam certos cronistas midiáticos da violência cotidiana, apelando ao atavismo dos espectadores. Vez por outra, contudo, essa mesmíssima truculência, corriqueiramente empregada contra bandidos, dirige-se a cidadãos comuns, que ou não cometeram crime algum, ou apenas ultrapassaram a fronteira jurídica dos microdelitos.

Quando os vilipendiados habitam periferias das grandes cidades, quase nada vira notícia, pois os atingidos não dispõem nem de status social, nem de conexões que lhes permitam vocalizar seus reclamos e denunciar a violência sofrida. Já quando a truculência atinge os que dispõem de status e poder político ou econômico, há repercussão - o caso das ações desastradas da PM paulista na USP não nos deixam mentir. Para justificar tais deslizes, os porta-vozes da polícia costumam dizer que não se trata de um problema da corporação, mas de um ato individualizado de homens que não honram a farda. Nada mais enganoso, pois o caráter reiterado das transgressões (das quais é preciso escusar-se apenas quando se tornam públicas) revela que a honra corporativa passa, em boa medida, por ações de violência e demonstrações de força incompatíveis com a ordem legal vigente em qualquer Estado democrático de direito.

Os eventos na Bahia explicitam que o hábito de lançar mão da violência de acordo com seu próprio arbítrio pode, em circunstâncias particulares, levar ao flerte com a guerra civil. Senão, como classificar uma situação em que homens armados tomam de assalto um parlamento, promovem o terror contra cidadãos comuns e assassinam indivíduos vulneráveis para coagir o poder constituído a fazer-lhes concessões? Tanto mais grave por se tratarem justamente de "homens da lei".

Por outro lado, é forçoso reconhecer que os PMs baianos têm uma causa justa. Assim como os professores de escolas públicas, policiais recebem salários aviltantes. Todavia, se no caso dos professores uma política nacional voltada a garantir-lhes um piso nacional mínimo foi implantada e deu início a um lentíssimo processo de recuperação da dignidade e das condições de trabalho da categoria, o mesmo não aconteceu com os policiais. O governador da Bahia tem razão quando observa que o movimento mira na PEC-300, que visa justamente conferir a policiais uma remuneração nacional mínima. E não seria o caso, então, de buscar uma solução para o pleito? Certamente isto não deve ocorrer como fruto de uma chantagem de criminosos fardados, que colocam uma faca no pescoço do governo com seu motim. A razão legítima é que dificilmente qualquer política de segurança prosperará no país sem que salários condignos sejam pagos a policiais - sobretudo num momento de melhora na remuneração dos trabalhadores brasileiros em geral, aumentando a disparidade e, por conseguinte, o desprestígio social da categoria e sua insatisfação.

O mais sério obstáculo à elevação da remuneração é o passivo previdenciário do setor público. Enquanto certas categorias do funcionalismo recebem altos salários, mas são pouco numerosas, impactando menos as combalidas contas previdenciárias do serviço público, professores e policiais são muitos, e que qualquer aumento de seus salários gera de imediato um novo choque de gastos previdenciários. Neste momento, em que o governo federal tenta aprovar o fundo de previdência dos servidores, é o caso de articular sua aprovação com políticas de reestruturação das condições de carreira e remuneração de setores do funcionalismo, permitindo políticas salariais necessárias ao bom trabalho e sustentáveis no longo prazo. Mudanças nessa direção teriam inclusive o condão de melhorar o recrutamento, atraindo gente mais capacitada para funções primordiais do serviço público. Nada disso será viável, entretanto, sem que se olhe também para a questão previdenciária.

Espancar as alternativas - ANTONIO DELFIM NETTO

VALOR ECONÔMICO - 07/02/12


O teimoso retorno das discussões sobre qual é a "taxa de juros real neutra" sugere que algumas tribos da nação dos economistas professam uma espécie de platonismo. Os conceitos que utilizam seriam aproximações físicas deformadas de sua existência perfeita e eterna no mundo das ideias. Se você "acredita" (do verbo crer) que apesar de complexidade da demanda física global ela mantém uma relação unívoca contínua e decrescente com relação à taxa de juro real, então podemos afirmar (aqui já não é mais uma questão de "crença" mas de lógica que parece lhe dar um ar de "ciência") que deve EXISTIR uma taxa de juro real única que iguala a demanda global a qualquer oferta global (que resta determinar). Trata-se da curva de demanda total.

E como se determina a oferta global? Voltemos ao mundo platônico das ideias e imaginemos que existe uma "função de produção" matemática bem educada, contínua, diferenciável (mais algumas propriedades convenientes) e que revela a produção global (oferta) máxima com relação ao uso de dois fatores de produção: trabalho (horas trabalhadas) e o estoque de capital. Com um dos fatores fixo, a função revela rendimentos decrescentes quando aumentamos o uso do outro. Mesmo no mundo das ideias o estoque de capital (trabalho do passado cristalizado em máquinas, equipamentos, estradas, portos etc) é fixo no curto prazo. Podemos, portanto, explorar as variações da "função de produção" (a oferta máxima) para cada acréscimo de hora trabalhada. Essa relação é conhecida como "produtividade marginal" física do trabalho.

Para lançar um pouco de luz sobre essa caverna platônica, suponha uma fábrica de sapatos na qual o aumento de uma hora de trabalho produz mais um par de sapatos. Se o empresário quiser maximizar o seu lucro quantas horas de trabalho ele deve contratar? Como o estoque de capital físico é fixo, a produtividade marginal do trabalho é decrescente. Logo, a última hora que ele empregará é a que lhe custará exatamente o valor do seu sapato. A condição de maximização do lucro é, portanto, que o preço do sapato multiplicado pela produtividade marginal física do trabalho seja igual ao salário nominal. Em outras palavras, o salário real do trabalhador deve ser igual à sua produtividade marginal (decrescente quando aumenta o mínimo de horas utilizadas).

No mundo platônico das ideias, todas as funções de produção (desde as de uma usina atômica até a de um pé de banana) podem ser agregadas e todas as horas trabalhadas somadas, o que revela o nível de emprego. Para maximizar o "bem estar geral" e obter a oferta máxima de um misterioso bem chamado "Produto Interno Bruto", basta determinar quantas horas de trabalho (qual o nível de emprego) serão utilizadas. Mas para fazer isso é preciso conhecer o salário real (físico) idêntico à produtividade marginal física do trabalho.

Como se faz isso? Pensemos um nível fixo de preços. O salário real é igual ao salário nominal dividido por ele. A oferta e a procura de trabalho dependem, no mundo platônico das ideias, apenas do salário real. Supondo, de novo, que essas ligações sejam bem comportadas, a oferta de trabalho cresce e a demanda decresce com o crescimento do salário real. Num ponto qualquer (como uma é crescente e a outra decrescente) elas se cruzam e determinam o salário real de equilíbrio, onde, por hipótese, todos os que podem e desejam trabalhar têm emprego. Isso exclui, por construção, qualquer desemprego "involuntário". No ponto de encontro da oferta e da procura a produtividade marginal física do trabalho é igual ao salário real e determina o ponto ótimo do emprego.

Temos assim a oferta global que maximiza o lucro do capital e, por construção, produz o "pleno emprego". É preciso entender que essa oferta global é fixa no curto prazo. O passo seguinte é juntar esta conclusão à relação inicial (que liga a taxa de juros real à demanda global) e verificar que, então, deve EXISTIR uma taxa de juros real "neutra" que iguala a oferta global à demanda global que, em condições estáticas, produzirá o máximo PIB, o pleno emprego e a estabilidade da taxa de inflação.

O problema é que mesmo no mundo platônico podem acontecer choques de oferta (quebra de safra) ou de demanda (excesso de crédito, pressões redistributivas etc) e a taxa de inflação flutuará sob a pressão dos eventuais desequilíbrios entre a oferta e a procura global. Essa relação é chamada de curva de Phillips. Ela sugere aos Bancos Centrais um mecanismo de controle (uma regra monetária) que relaciona a diferença entre a taxa de inflação e a meta de inflação desejada (a que aconteceria no mundo congelado) aos desequilíbrios entre a oferta e a procura globais.

Temos aqui três relações: a primeira que liga a demanda global à taxa de juro real, que exige o conhecimento da taxa de juros real "neutra"; a segunda que liga a taxa de inflação às pressões derivadas das diferenças entre o nível do PIB e o desconhecido PIB potencial; e a terceira que dá ao Banco Central a possibilidade de manobrar a política monetária para manter na meta a taxa de inflação (fixada pelo poder político).

As contas fecham no mundo platônico das ideias, mas as coisas ficam mais feias no mundo real. Nele não há equilíbrio estático. A complexidade das relações é muito maior e instável. Existe assimetria de informação e as estimativas da "taxa de juro neutra" e do "produto potencial" são imprecisas e seus erros têm custos sociais importantes. Se olharmos com cuidado, mesmo os mais sofisticados modelos de que dispomos (o Samba, do nosso Banco Central, por exemplo) têm no seu DNA a sementinha daquelas três relações. É por isso que vale a pena escrutinizar cuidadosamente as suas estimativas. Está na moda espancá-las para ver se elas ficam de pé...

Casa da Moeda ou da mãe joana? - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO - 07/02/12

Todos ficaram mal no bate-boca sobre a nomeação do último presidente da Casa da Moeda, Luiz Felipe Denucci Martins, demitido, há poucos dias, depois de denúncias sobre movimentação de recursos em paraísos fiscais. Investigações poderão determinar se ele cometeu algum malfeito ou se foi vítima de acusações sem fundamento. Mas o governo e seus aliados já expuseram à luz, mais uma vez, uma das maiores aberrações políticas brasileiras - o loteamento administrativo como forma rotineira e "normal" de ocupação do setor público. A aberração, neste episódio, chegou a um nível nunca atingido na série de escândalos iniciada com a divulgação das bandalheiras no Ministério dos Transportes, no ano passado.

O fio de ligação entre todas essas histórias sempre foi a partilha de postos federais como um grande butim conquistado por tropas de assalto. A novidade, agora, foi a espantosa troca de acusações entre o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e a liderança de um grupo aliado, o PTB. Ninguém assume a responsabilidade pela indicação de um indivíduo para presidir nada menos que a Casa da Moeda, o departamento responsável pela impressão e pela cunhagem do dinheiro em circulação no País. Só não é exatamente uma piada pronta porque isso ultrapassa a imaginação dos melhores humoristas.

Segundo o presidente do PTB, Roberto Jefferson, o ministro da Fazenda pediu ao líder do partido na Câmara, deputado Jovair Arantes, um aval ao nome de Luiz Felipe Denucci. "Ele não é do PTB", disse Jefferson. "É do Mantega." O ministro contestou. Declarou desconhecer o possível candidato ao posto, nunca tê-lo encontrado e ter recebido seu currículo do deputado Jovair Arantes. Segundo Mantega, o currículo era adequado e Denucci até conseguiu modernizar a Casa da Moeda. Além disso, ele atribuiu ao partido as denúncias de operações irregulares no exterior.

O ministro da Fazenda disse isso cumprindo ordem da presidente Dilma Rousseff para se manifestar sobre a demissão e esclarecer a participação do PTB na história. E, segundo se informou em Brasília, a cúpula do Planalto aprovou seu desempenho. Em outras palavras, a presidente e seus conselheiros mais próximos teriam ficado satisfeitos porque o ministro se eximiu da responsabilidade pela escolha de um presidente da Casa da Moeda e a lançou sobre um partido aliado. Segundo as mesmas fontes, a presidente da República teria cobrado a nomeação de um técnico para o posto.

A presidente pode insistir na nomeação de um técnico, mas isso de nenhum modo elimina a questão básica: a quem cabe a responsabilidade pela nomeação de ministros, de dirigentes de estatais e de autarquias e, de modo geral, de ocupantes de postos de confiança? Ao jogar para o PTB a responsabilidade pela nomeação de Luiz Felipe Denucci, o ministro da Fazenda reiterou de forma inequívoca a resposta conhecida até agora: as nomeações são sujeitas a critérios de loteamento. O encarregado de assinar o ato oficial - no caso, o ministro - pode até rejeitar algum nome, mas a indicação, de toda forma, cabe a um partido, de acordo com algum critério de partilha.

Em outras condições de normalidade, um ministro julgaria humilhante assumir publicamente o papel de mero carimbador de uma nomeação para um cargo vinculado ao seu gabinete. Mas os critérios dominantes em Brasília são de outra natureza. As palavras "não conhecia, nunca tinha visto o Luiz Felipe Denucci" estão no segundo parágrafo de uma nota divulgada sexta-feira no portal do Ministério da Fazenda. Não constam de uma acusação ao ministro. São elementos - quem diria? - de sua defesa.

Mas o ministro age segundo critérios considerados normais para a gestão pública brasileira. Esses critérios foram reafirmados pela presidente, ao manter sob controle do PP o Ministério das Cidades. Partidos têm cotas no governo. Obviamente, só brigam pela conquista e pela manutenção de cotas porque esperam servir-se da administração pública. Presidencialismo de coalizão é isso, no Brasil, e a presidente nunca renegou essa concepção. Apenas a aperfeiçoou, ao aceitar que um ministro negue sua responsabilidade pela nomeação do presidente da Casa da Moeda.

O enigma do desemprego baixo no Brasil - ILAN GOLDFAJN

O ESTADÃO - 07/02/12


Algo interessante está ocorrendo no Brasil. No final do ano passado o desemprego atingiu 4,7% (ou 5,5%, levando em conta a sazonalidade favorável de dezembro), um recorde de baixa. A princípio, mereceria apenas os festejos de sempre. Mas há algo mais enigmático. O desemprego tem melhorado num contexto de piora da economia: o crescimento do PIB desacelerou para cerca de 2,7% no ano passado, o que normalmente levaria a um aumento do desemprego. O que está acontecendo? O mercado de trabalho está-se descolando do resto da economia? Quais as consequências?

O comportamento do desemprego é importante demais numa economia para ser ignorado. Afeta o bem-estar da população de forma relevante: pesquisas mostram a relação de satisfação com a taxa de desemprego. O desemprego também afeta o desempenho da economia via produtividade e crescimento, assim como o impacto na inflação.

Uma parte da explicação é simplesmente a existência de defasagens na economia. O mercado de trabalho é normalmente o último da cadeia a sentir o impacto da desaceleração. As vendas caem e a produção tem de diminuir para evitar acúmulo de estoques desnecessários. O desemprego aumenta quando as empresas diminuem a produção e o emprego fica ocioso. Pode ser que ainda estejamos no início do processo. Se for, devemos esperar uma subida do desemprego daqui em diante. Mas a defasagem parece longa demais e o mercado de trabalho, forte demais para fazer acreditar que nada mudou desta vez. Há duas teorias alternativas (não excludentes).

A primeira diz respeito à produtividade do trabalhador. Alguns temem que a combinação do desemprego em recorde de baixa com economia fraca seja sinal de problemas à frente. Afinal, estamos produzindo menos com mais gente - produtividade menor. A economia poderia estar mostrando sinais de esgotamento mais duradouros. Uma economia com produtividade menor está fadada a crescer menos e/ou a ter mais inflação. O risco é que a retomada da economia venha a diminuir ainda mais o desemprego, tornando a mão de obra mais escassa, elevando custos para empresas, o que poderia resultar em mais inflação. Controlar a inflação exigiria crescer menos.

Mas qual seria a razão para a produtividade do trabalhador estar caindo? Com o crescimento maior da economia nos últimos anos, as empresas têm encontrado dificuldades crescentes para contratar mão de obra, principalmente qualificada. A solução tem sido contratar um contingente da população cuja capacitação é inferior à dos empregados atuais. Resolve as necessidades imediatas, mas a produtividade desses trabalhadores é inferior, o que derruba a produtividade média da economia. Ao longo do tempo esses trabalhadores poderão adquirir qualificação maior com treinamento nos seus próprios empregos, o que diminuiria o problema, mas pode levar tempo.

A falta de mão de obra é resultado, em parte, de um menor crescimento da população economicamente ativa (PEA), aquela apta a se empregar. Em 1980 a taxa de crescimento da PEA era acima de 3% ao ano; hoje o crescimento é de 1,3%, dada a distribuição populacional. Com menos gente disponível para trabalhar, um período de crescimento maior reduz o desemprego e limita o crescimento sustentado.

A falta de mão de obra qualificada no Brasil é resultado de melhorias ainda insuficientes na educação para fazer frente às necessidades atuais. As defasagens são longas. O esforço atual na melhoria da educação será determinante para o futuro, nas próximas décadas.

A segunda teoria alternativa é que os empresários podem estar evitando demitir. O custo para as empresas de demitir e voltar a empregar é alto no País. Se os empresários têm confiança na retomada da economia e no seu crescimento no médio prazo, podem preferir manter os trabalhadores ociosos por um tempo a demiti-los (e depois recontratá-los). A experiência dos últimos anos, principalmente a reação à crise de 2008-2009, poderia estar induzindo esse comportamento. A economia brasileira recuperou-se rapidamente do impacto da crise internacional. Os empresários não demitem, a economia mantém um contingente de trabalhadores ociosos prontos para serem utilizados mais adiante. É uma "poupança de trabalhadores", como referida na literatura.

Nessa alternativa, o desemprego baixo é função das expectativas quanto à volta do crescimento futuro. Quando a economia voltar a acelerar (acreditamos que o PIB volte a acelerar ainda este ano, principalmente no segundo semestre), essa poupança será utilizada, em vez de maior procura por mão de obra e sobreaquecimento do mercado de trabalho. A evidência dessa alternativa é a queda das horas trabalhadas (em vez de demissões).

É importante citar que parte da queda do desemprego é devida à menor procura por emprego. Não se considera desempregado quem não se encontra ativamente procurando emprego. Parte da queda recente do desemprego é consequência desse "desalento" (por exemplo, a PEA cresceu apenas 0,7% em dezembro de 2011 em relação a dezembro de 2010), mas não explica todo o fenômeno.

Acreditamos que as alternativas acima não sejam excludentes. A facilidade com que a economia incorporou mão de obra no passado (e alavancou o crescimento) pode não se repetir no futuro. Alguma perda de produtividade pode estar ocorrendo como consequência da qualificação ainda insuficiente da mão de obra para o crescimento desejado. Mas parte do que estamos observando pode ser um fenômeno cíclico - preservação do emprego numa economia aprendendo a conviver com altos e baixos. O comportamento do desemprego, da inflação e do crescimento a partir da retomada deste ano depende da força de cada um desses fatores.

Pequena empresa não elege ninguém - PAULO FELDMANN


O Estado de S. Paulo - 07/02/12


Faz parte das regras de todos os países que praticam formas saudáveis de capitalismo defender suas pequenas empresas. Porque, se isso não for feito, é inevitável que a grande maioria dos setores econômicos acabe sendo dominada pelas grandes empresas. Estas, justamente por causa de seu tamanho, conseguem ter características que lhes conferem vantagens enormes. Nada contra as grandes, só que elas não carecem de proteção especial. As pequenas, sim, necessitam dessa proteção, caso contrário a competição será desigual. Vejam alguns exemplos internacionais.

Nos Jogos Olímpicos de Londres, em julho, a maioria das atividades de apoio, bem como os serviços de atendimento ao público, será prestada por pequenas empresas. Aliás, os estádios, as edificações e a maioria das obras que serão sede de eventos também foram construídos ou estão sendo montados por pequenas construtoras. Isso tudo porque em 2008 o governo britânico baixou um decreto - Small Business Act - definindo que era imperativo priorizar a utilização das pequenas empresas como forma de apoiar seu crescimento e diminuir o predomínio das grandes.

Uma das maiores redes mundiais de supermercado é francesa e tem forte atuação no Brasil. Porém, quem já foi a Paris estranhou não ter encontrado nenhuma loja da megarrede na cidade. Ocorre que, para não prejudicar o pequeno comércio, o governo francês proíbe a atuação das megarredes nos perímetros urbanos. Elas só podem abrir suas lojas nas estradas e, assim mesmo, bem afastadas das grandes cidades. Por sinal, a maior empresa do mundo é uma rede de supermercados norte-americana: quem já foi a Nova York, Chicago ou qualquer grande cidade dos EUA certamente não viu nenhuma loja dessa megarrede. As razões são as mesmas.

Os números do Sebrae dizem que, de cada 100 pequenas empresas que são criadas em nosso país, apenas 24 conseguem completar o 5.º aniversário. Esse número não pode ser maior porque o Brasil não oferece nenhuma proteção às pequenas. Se não existirem medidas de apoio, quem vai dominar os mercados é a grande empresa. E é por isso que na Alemanha e na Itália, por exemplo, a pequena empresa representa mais de 60% de toda a produção econômica, ou seja, do PIB. No Brasil as pequenas não conseguem ter nem 20% do PIB. Apesar de serem 99% do número total de empresas brasileiras. Ou seja, 80% da produção brasileira está com as grandes e médias, que são apenas 1% do total de empresas existentes.

O Brasil é o paraíso da grande empresa. Por quê? Justamente porque faltam políticas públicas de apoio aos pequenos empresários. Por isso não temos estímulos à formação de consórcios, não temos agências desenvolvendo inovação e tecnologias e muito menos políticas de compras governamentais destinadas aos pequenos. A causa está na legislação eleitoral. Graças a ela, nossos governantes e parlamentares são apoiados em suas campanhas eleitorais pela grande empresa, que é quem tem condições de canalizar recursos para elas. O pequeno empresário não tem a mínima possibilidade de apoiar as campanhas eleitorais porque está permanentemente correndo o risco de fechar suas portas. O pequeno empresário brasileiro só consegue pensar na sobrevivência da sua empresa, pois sua família dela depende.

Ocorre que, quando eleitos, nossos políticos precisam retribuir a ajuda que tiveram e nisso está a perversidade do modelo atual, pois eles acabam fazendo leis e governando sempre a favor da grande empresa, pois foi esta que apoiou suas campanhas.

A verdadeira democracia é aquela que impede o abuso do poder econômico, como o fazem a Holanda, a Alemanha e a Suécia, onde inclusive as campanhas eleitorais são modestas. Precisamos rever nossa legislação eleitoral nos baseando nos países desenvolvidos que simplesmente proíbem empresas de todo e qualquer tamanho de apoiar campanhas eleitorais. Aí, sim, poderemos dizer que somos uma verdadeira democracia.

Nas asas estatais - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 07/02/12

A privatização dos aeroportos foi um sucesso de ágio, houve disputa, mas, como a privatização dos tucanos, foi estatizada demais. O defeito é o mesmo. Fundos de pensão de estatais garantem as empresas privadas, o BNDES financiará 80% dos investimentos, e a Infraero vai pagar parte da conta. Os maiores operadores mundiais perderam o leilão nos três aeroportos.

O consórcio Ivepar, que comprou Guarulhos, em São Paulo, é 80% formado por Previ, Petros e Funcex, ou seja, os mesmos fundos de pensão estatais que sustentaram as privatizações do governo Fernando Henrique. A diferença é que naquela época era mais difícil conseguir financiamento para o Brasil. Tem como sócio o operador de vários aeroportos da África do Sul.

Além disso, a estatal que vendeu o ativo, a Infraero, permanece com 49% e, portanto, pagará metade da conta de R$ 16,2 bilhões. Fica na estranha situação de pagar por ter vendido. Há ainda o compromisso de em Guarulhos investir R$ 4,5 bilhões em 15 anos, sendo R$ 1,4 bilhão até a Copa. O BNDES vai emprestar 80% dos recursos.

- O que achei estranho é que os grandes operadores - aeroportos como os de Cingapura, Zurique e Houston - perderam. Também ficaram de fora as empreiteiras mais sólidas, como Odebrecht e CCR. O ágio foi alto, mas se fosse com os grandes operadores, tudo bem, porque eles estão acostumados a tirar leite de pedra, mas os pequenos, talvez não - avalia o especialista em aviação Respício do Espírito Santo.

O mesmo ceticismo é compartilhado por outro analista: o professor Hugo Ferreira Braga Tadeu, da Fundação Dom Cabral e autor do livro "Logística Aeroportuária".

- Lá fora, os projetos são pensados como cidades-aeroportos, com o entorno, acessos, hotéis, shopping centers. Isso tudo permite que a rentabilidade das empresas fique muito maior, com mais espaço para investimentos. A taxa de retorno é de 20%; aqui, é de 6%. No Brasil se pensa em aeroportos como terminal e pista, apenas - afirmou.

O grupo que ganhou a disputa pelo Aeroporto Juscelino Kubitschek, de Brasília, é o mesmo que ganhou o de São Gonçalo do Amarante e ainda não conseguiu terminar o project finance, e por isso está tendo dificuldade de se financiar. A Engevix, que esteve envolvida em alguns casos controversos, está associada a um grupo argentino no aeroporto. Foi quem deu o maior ágio: de 679%.

O grupo que ganhou o aeroporto de Viracopos, em Campinas, é o mesmo que venceu um leilão do governo de São Paulo para administrar a Rodovia dos Trabalhadores. O problema é que ele não conseguiu apresentar as garantias e foi desclassificado em favor da Eco Rodovias, que estava em segundo lugar.

O que ganhou Guarulhos, a Invepar, é operador do Metrô do Rio, da Linha Amarela e da Rodovia Rio-Teresópolis. A ACSA, da África do Sul, administra aeroportos pelos quais passam 30 milhões de passageiros por ano. Seu maior trunfo, no entanto, é que 80% do consórcio são os três maiores fundos de pensão de estatais.

O modelo do leilão privilegiou o tamanho do ágio. Venceu quem deu o maior lance. O mesmo modelo dos tucanos que foi muito criticado principalmente pela presidente Dilma Rousseff quando era ministra. Ela, naquele tempo, preferia o que chamava de "modicidade tarifária". Ou seja, quem cobrasse menos do consumidor. Nos aeroportos, voltou a ser o maior ágio.

Os grupos terão que pagar grandes ágios, fazer investimentos e ainda entregar parte da receita para um fundo que vai investir em aeroportos menos rentáveis. O especialista em logística Paulo Fleury, do instituto Ilos, acha que esse é um ponto a favor do modelo:

- Desta forma, vai se investir em aeroportos que não são rentáveis agora, mas são importantes na logística do país.

Sobre a excessiva participação estatal nos consórcios, através de fundos de pensão, investimentos financiados pelo BNDES e a sociedade da Infraero, Paulo Fleury explica:

- Isso é um defeito da nossa economia, os grupos privados são excessivamente dependentes do Estado. O investimento em infraestrutura não pode ser feito com financiamento privado porque é caro demais.

Seja como for, há o fato de que a Infraero terá metade do custo do ágio de lances dos quais não participou; terá metade do custo, mas não terá qualquer influência na gestão, que será toda das empresas privadas.

Não há dúvida de que o passo da privatização dos aeroportos precisava ser dado, e não pela Copa ou Olimpíadas, que são eventos que terão um tempo específico. A demanda brasileira é que está aumentando em um ritmo muito rápido.

O professor Braga Tadeu disse que um estudo da Boeing mostra que o transporte aéreo de passageiros tem crescido 10% ao ano no Brasil e assim deve continuar pelos próximos 10 anos.

- Isso significa dobrar o setor em uma década. Em 2011, tivemos 130 milhões de passageiros, e em 2014 teremos 160 milhões. Não é preciso Copa do Mundo e Olimpíadas para que o setor fique estrangulado, ele já está - afirmou.

Resta torcer para que novos gestores e o compromisso de investimento aumentem a eficiência dos aeroportos. E que a modelagem da segunda rodada - que deve incluir os aeroportos do Galeão, de Confins e Recife - tenha aperfeiçoamentos que permitam a entrada de grandes operadores do mundo com experiência e conhecimento. Desta vez, os mais experientes não quiseram pagar tão alto quanto os menos experientes se dispuseram a pagar.

O impacto deste leilão - CELSO MING


O Estado de S. Paulo - 07/02/12


O sucesso do leilão de concessões dos aeroportos de Guarulhos, Brasília e Campinas, realizado ontem, não pode ser medido somente pelo forte interesse despertado entre os 11 consórcios concorrentes (ágio médio de 348%) e pela nova fonte de receitas para o Estado, de nada menos que R$ 24,5 bilhões.

O principal fator desse sucesso está em ter demonstrado definitivamente que a transferência da gestão de importantes serviços públicos para o setor privado é o único modo de garantir rápido avanço à infraestrutura do Brasil.

Esses três aeroportos movimentam juntos cerca de 30% dos passageiros; 57% das cargas; e 19% das aeronaves que passam pelos terminais do País. E, uma vez ampliados, contribuirão decisivamente não só para o aumento dos transportes de passageiros e carga, mas para a redução das tarifas, à medida que elevarão a escala de operação.

Ainda resiste dentro do governo Dilma - especialmente no PT, principal partido da base de sua sustentação política - o entendimento de que qualquer iniciativa com algum cheiro de privatização é um atentado contra interesses nacionais. Essa gente continua apegada a velhos preconceitos ideológicos e por isso refuga tudo o que transpira delegação de serviços públicos. Ignora que o Tesouro está excessivamente espremido. E não há recursos que deem conta de tudo quanto tem de ser feito para evitar os apagões do serviço público no Brasil.

Nas últimas semanas que precederam à realização do leilão, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Sindicato Nacional dos Aeroviários e outros mais tentaram ação desesperada para impedir o fato consumado. Argumentaram que o leilão transfere o filé mignon dos projetos de ampliação dos aeroportos e deixa os ossos para Infraero - estatal que controla a infraestrutura de 69 aeroportos no Brasil -; desvia recursos públicos administrados pelo BNDES; e exige participação de capitais estrangeiros na administração dos terminais.

Pois os resultados do leilão mostram não apenas que a Infraero continua com 49% de todos os negócios na área, como também dispõe agora de nada menos que R$ 24,5 bilhões, com o quais não contava, para obras de expansão por meio do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac).

O outro foco de críticas dentro do governo é a transferência de recursos do BNDES para o financiamento das obras dos consórcios vencedores. Repete-se aí o surrado discurso daqueles que condenaram a participação do BNDES nos processos de privatização realizados ao longo do governo Fernando Henrique. E, no entanto, esses financiamentos cumpriram, como cumprem ainda, a função de aumentar o interesse pelos leilões. De mais a mais, o BNDES existe para financiar atividades privadas, não para bloqueá-las.

A participação de empresas estrangeiras nos consórcios foi exigida porque nenhuma das brasileiras tem experiência em operar terminais aeroportuários. Não se trata de desnacionalizar o setor ou quaisquer outros, como esses fundamentalistas tentaram fazer acreditar.

Se esse leilão contribuiu para o reencontro do governo Dilma com as melhores práticas de investimento público e governança, então seu sucesso não será limitado aos bons resultados obtidos ontem.

Merkozy - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 07/02/12


O apoio que a chanceler alemã, Angela Merkel, está ostensivamente dando à reeleição do presidente francês, Nicolas Sarkozy, é tratado por ela como uma questão de política partidária. Segundo disse ontem, é normal apoiar um candidato da mesma linhagem política, da mesma maneira que o candidato socialista, François Hollande, participou recentemente do congresso do Partido Social Democrata alemão, o SPD.

Merkel lembrou ainda que Sarkozy a apoiou em 2009, quando concorreu à reeleição. A promessa de que se engajaria na campanha presidencial da França começou a ser cumprida ontem, com a reunião da chanceler alemã com o presidente Nicolas Sarkozy.

Os dois comandaram um conselho de ministros binacional que tem o objetivo oficial de analisar os acordos de cooperação mútua e estabelecer as bases para uma harmonização de impostos e taxas de juros.

Ainda na mesma tarde, os dois deram uma entrevista coletiva à imprensa e, à noite, apareceram novamente juntos, em outra entrevista, desta vez transmitida pela televisão dos dois países.

Nunca o apelido de Merkozy, nome pelo qual a dupla está sendo conhecida, teve tanta adequação quanto neste momento de campanha presidencial.

Um momento especialmente crítico para Sarkozy, em que ele está em segundo lugar nas pesquisas, mas sob o risco de nem chegar ao segundo turno se a candidata ultradireitista Marine Le Pen conseguir viabilizar sua candidatura. Ela tem cerca de 20% da preferência, contra 24% de Sarkozy.

O front nacional está com dificuldade para conseguir o apoio de pelo menos 500 delegados que podem validar uma candidatura presidencial.

Marine Le Pen acusa o governo de estar pressionando prefeitos para não a apoiar.

Sem a candidatura de Le Pen, o presidente francês estaria empatado com o socialista no primeiro turno da eleição.

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, já comentou que nunca houve um momento na História francesa recente em que a relação de França e Alemanha fosse tão boa, e ele está convencido de que esse é um trunfo de sua candidatura, junto com sua experiência nas negociações internacionais.

Ele fez esse comentário para o ex-chanceler social- democrata alemão Gerhard Schröder, em quem ele declaradamente se inspira para tomar medidas duras neste momento de campanha presidencial.

Na verdade, Sarkozy faz um jogo duplo neste momento: ao mesmo tempo em que quer se mostrar um líder político que se preocupa mais com o destino do país do que com sua própria reeleição, ele conta com essa imagem de desprendimento para melhorar nas pesquisas eleitorais.

Como está em vias de ser derrotado pelo socialista François Hollande, o presidente francês pode fazer manobras radicais para tentar reverter o quadro.

Schröder teria avisado Sarkozy de que Angela Merkel, por sua formação, é muito rigorosa e assume posições políticas com muita cautela.

Pelo visto, a chanceler alemã já decidiu que o melhor caminho é apoiar Sarkozy, mesmo que isso irrite o provável vencedor.

O candidato socialista, aliás, pediu formalmente um encontro com a chanceler alemã, o que é uma tradição entre os dois países.

Enquanto isso, ele joga com uma histórica rivalidade entre França e Alemanha para criticar essa aproximação, avisando que, eleito, reduzirá a influência da Alemanha.

No entanto, a julgar pelas informações da embaixada alemã em Paris, uma pesquisa de opinião registrou a aprovação dessa aproximação, enquanto a maioria acredita que a relação terá que ser aprofundada devido à crise europeia.

O que está por trás dessa ligação tão forte entre os dois países é uma tentativa de estabelecer princípios definidos para o futuro da União Europeia, baseados no modelo alemão, que mantém a economia mais robusta da região do euro.

Essa mesma pesquisa feita pela embaixada da Alemanha mostra que a harmonia entre França e Alemanha tanto em direitos trabalhistas quanto em questões fiscais é aprovada por cerca de 70% dos entrevistados.

A união de França e Alemanha se opõe à tentativa da Inglaterra de impor seus pontos de vista na União Europeia, e por isso o governo alemão considera que será "uma catástrofe" a eleição de um socialista para a presidência da França em maio.

Além de perder um importante aliado estratégico, o socialismo, na visão de Merkel, seria uma forma ultrapassada de governar que não se daria bem em um momento em que a Europa necessita de políticas fiscais rígidas para superar a crise.

A reunião bilateral de ontem tem um sentido político de fazer com que os dois países tenham o mesmo conceito tributário, e nesse sentido há negociações sobre a nova taxa de transações financeiras que o presidente francês anunciou recentemente na televisão.

O primeiro-ministro inglês, David Cameron, classificou- a de "uma bobagem", e é importante para Sarkozy que a maior economia europeia a adote para transformá-la em uma taxa aceitável pela maioria dos países.

A negociação se encaminha, porém, para que a nova taxa seja cobrada apenas sobre grandes negócios nas bolsas, o que seria aceitável por Merkel.

O presidente Nicolas Sarkozy está convencido que o modelo alemão é o caminho para a recuperação da competitividade francesa e europeia, e retomou antigas bandeiras que não conseguiu aprovar durante os últimos anos, como a reforma trabalhista com flexibilização de certas regras.

Ninguém sabe quanto custará a Copa - GIL CASTELLO BRANCO

O GLOBO - 07/02/12

A Torre de Babel, segundo a Bíblia, foi construída na Mesopotâmia, pelos descendentes de Noé. A decisão era fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Esta soberba provocou a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os espalhou por toda a Terra.

O mito vem à tona no acompanhamento dos gastos da Copa 2014. Para começar, existem pelo menos 5 portais na internet com dados globais sobre o evento, criados pela Controladoria Geral da União (CGU), Senado Federal, Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério do Esporte e Instituto Ethos. Apesar da louvável intenção de dar transparência ao megaevento, faz-se necessário o trânsito permanente de informações entre os governos municipais, estaduais e federal para que os sites estejam sempre atualizados, o que infelizmente não está acontecendo.

Assim, ganha um doce quem conseguir dizer quanto custará a Copa do Mundo 2014.

A Controladoria Geral da União (www.portaldatransparencia.

gov.br), por exemplo, informa que os investimentos em aeroportos, portos, estádios, mobilidade urbana e os financiamentos para novos hotéis custarão R$ 27 bilhões.

Aliás, faltando 28 meses para o início do mundial, o próprio site do governo federal evidencia o atraso da programação, ao mostrar que somente R$ 9,9 bilhões (37%) foram contratados e apenas R$ 1,4 bilhão (5,2%) foi pago.

Lentidão à parte, convém ressaltar que os R$ 27 bilhões correspondem somente ao chamado Primeiro Ciclo, não incluindo itens como segurança, telecomunicações, infraestruturas energética e turística, saúde e qualificação profissional.

Mesmo o valor previsto para a etapa inicial (R$ 27 bilhões) está longe da realidade. Os financiamentos públicos para hotelaria, por exemplo, deverão ser muito maiores do que os que estão lançados no portal. Os R$ 350,1 milhões contratados até agora destinam-se à implantação de dois novos empreendimentos, em Botafogo e Copacabana, à revitalização do Glória e à instalação de hotel em Aparecida do Norte (SP). Muito provavelmente, outros hotéis serão construídos. O valor total disponibilizado pelas linhas de financiamento do BNDES e dos Fundos Constitucionais (Norte, Nordeste e Centro-Oeste) para essa finalidade é de R$ 1,9 bilhão, podendo ser ampliado conforme a demanda.

Outro exemplo de discrepância gritante entre o valor orçado e o real é o Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha. O custo frequentemente divulgado é de R$ 688,3 milhões.

Nesse montante, porém, não está incluída a cobertura da arena que acaba de ser licitada, elevando o dispêndio para cerca de R$ 850 milhões.

Também não constavam da previsão original as despesas com o gramado, a iluminação, as cadeiras, os elevadores, dentre outros "deta lhes". Ou seja, a estimativa do Governo do Distrito Federal refere-se, basicamente, à estrutura de concreto. Algo como se fosse possível calcular o custo de uma casa sem telhado, piso, luz etc...

De fato, encontrar o custo real do elefante branco em construção na Capital não é tarefa fácil. O valor de R$ 688,3 milhões (sem cobertura, gramado etc..) ainda é informado nos sites da CGU e do Ministério do Esporte (www.copa2014.gov.br). No site do Instituto Ethos (www.jogoslimpos.

com.br) encontra-se R$ 745,3 milhões.

No site do Senado ( www.copatransparente.

gov.br) consta R$ 671,1 milhões. Até mesmo a foto do estádio que ilustra os portais do Tribunal de Contas da União e do Ethos é a da ver são inicial do projeto, já completamente alterada. Quanto à execução financeira, embora estejamos em fevereiro de 2012, os dados mais recentes computados no portal do Senado (30/6/2011) mostram que foram pagos R$ 223,8 milhões dos R$ 671,1 previstos (33%). No site da CGU os valores executados até 9 de novembro de 2011 somam R$ 73,99 milhões dos R$ 688,3 milhões previstos (11%). Para o governador Agnelo Queiroz, as obras já estão na metade.

Assim como ocorre com o estádio em Brasília, os portais divulgam informações desatualizadas, incompletas e até contraditórias sobre outros empreendimentos, nas diversas cidades- sede. A promessa de que qualquer cidadão poderia acompanhar os custos da Copa ainda não foi cumprida.

É urgente, portanto, que seja criada uma sistemática regular de alimentação e atualização desses portais, para que atendam à finalidade para a qual foram criados.

Até porque — ao contrário do que foi dito inicialmente — os recursos públicos é que irão custear a festa. Assim, é natural que os brasileiros queiram saber o total dessa conta. Com a verdadeira "babel" de informações, não se chegará ao céu. Na prática, até agora, ninguém sabe quanto custará a Copa, nem mesmo a Dilma que chegou do Haiti.

Quem te viu, quem te vê - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 07/02/12


BRASÍLIA - Na Bahia, o governador Jaques Wagner (PT) partiu para o confronto com policiais em greve, chamou o Exército e bateu o pé mesmo diante dos cadáveres que se amontoam por falta de segurança.

Em Brasília, o governo federal comemora alegremente o sucesso dos leilões de privatização dos aeroportos da própria capital, de Guarulhos e de Campinas, com resultado de R$ 24,5 bilhões, bem acima das expectativas.

Indaga-se: por que o PT condenou tão acidamente a repressão do governo do PFL-DEM a um movimento semelhante na Bahia em 2001? E por que não só criticou ferrenhamente as privatizações do governo FHC como as usou contra os adversários nas campanhas de 2002, 2006 e 2010?

Ou as greves dos policiais na era DEM eram legítimas e na era PT passaram a ser ilegítimas, ou o PT tem um discurso na oposição e uma prática na situação. Ou... o PT mudou.

Ou as privatizações eram ruins e agora são boas para o país, ou o PT de Lula e agora de Dilma aderiu ao vale-tudo eleitoral e mentiu, ironizou e foi sarcástico contra uma política que não apenas aprovava como agora aplica, feliz da vida.

Durante três campanhas seguidas, o partido recorreu ao mesmo discurso, atribuindo aos adversários tucanos a intenção até de privatizar o BB, a CEF, a Petrobras e a mãe de todos os eleitores. Era o PT antiprivatização versus o PSDB privatizante, o PT patriótico versus o PSDB impatriótico.

E agora, qual o discurso? Dilma e Lula deveriam pedir desculpas: ou mentiram aos eleitores ou estavam errados e agora reconhecem que greve de policiais era e é inadmissível e que a política de privatizações do governo adversário era e é correta. Suspeita-se que não vão fazer nem uma coisa nem outra. Vão deixar pra lá, como se nada tivesse acontecido.

Moral da história: greve no governo dos outros é bom, mas no nosso não pode; privatização no governo dos outros é impatriótica, mas no nosso é um sucesso do patriotismo.

Os românticos de Cuba - ARNALDO JABOR


O Estado de S.Paulo - 07/02/12


Dilma foi a Cuba. Eu também já fui. Somos, eu e a presidente, quase da mesma geração e provavelmente ficamos extasiados com os 12 guerreiros de Fidel e Che que, sozinhos, declararam do alto da Sierra Maestra: "Os dias da ditadura de Batista estão contados".

Na adolescência, vivíamos animados pelas imagens da conquista de Havana, com os heróis lindos e suas metralhadoras, hippies armados, intelectuais corajosos.

Fidel era jovem, macho, libertador, barbado, tudo. Já contei esse "causo" aqui e vou repeti-lo. Vale a pena ler de novo.

Fui a Cuba em 87, com meu filme Eu Sei Que Vou Te Amar, que passou no Festival de Havana.

Mas, muito antes de ir, eu sonhava com essa ilha tropical igual à Bahia (vi depois), onde o socialismo paranoico de Stalin seria criticado e salvo. Naquela época, o socialismo era nossa religião e os operários, os santos, símbolos do futuro. Eu era editor do jornal dos estudantes da UNE e às vezes ficava até de madrugada na Lapa, na oficina gráfica. E via os operários como ídolos, sentia em sua força calma uma beleza "pura", uma grandeza simples, superior aos intelectuais neuróticos. Como amávamos os operários!... Na alta madrugada, eu os olhava imprimindo as páginas ainda no chumbo e eles, com seus braços fortes, pareciam gravuras soviéticas. Andava atrás deles, com ensinamentos políticos, elogios, sorrisos. Éramos tão fascinados pelos futuros "sujeitos" da História, os líderes hegelianos que hoje vejo que alguns até ficavam desconfiados de nosso estranho amor. "Serão bichas, esses garotos? Serão veadinhos?", pensavam com certeza. Não - éramos apenas comunistas.

Passaram-se 20 e tantos anos e, finalmente, fui a Cuba. Depois da derrocada de uma fé atrás da outra, restava-me ainda a paixão pela paixão que eu tivera por aquela utopia e seu Comandante. Comi lagostas no ex-palácio do milionário Dupont em Varadero e ouvi o jazz do grande Arturo Sandoval. Mas, minha primeira impressão foi um choque: as casas de Cuba não estavam pintadas; todas as fachadas de tradição espanhola se descascavam em verdes pálidos ou em rosa desmaiada. Senti ali o primeiro calafrio de decepção - o descuido com a beleza e a preservação. Achava que o trabalho socialista era do amor à coisa pública, o cuidado com a tradição. Não sabia ainda do burocratismo, dos privilégios da "nomenklatura", do egoísmo e da pouca generosidade do trabalho coletivo. Aliás, o que mais me entristeceu no socialismo foi a incompetência geral que percebia em detalhes, na lentidão das providências, no medo de decidir que eu via entre os funcionários. O filme Guantanamera, de Gutiérrez Alea, é um retrato perfeito da ineficiência cubana. Claro que sabia do cruel bloqueio comercial americano e da "ajuda" soviética oportunista. Além dos desmandos posteriores de Fidel, da repressão, dos fuzilados, meu sonho acabou quando vi Cuba caindo nos braços de Kruchev.

Mas, minha fé e meu amor, mesmo em 87, ainda me faziam esquecer as dúvidas e decepções.

Uma noite, fui a um coquetel no Hotel Nacional.

A grande atração seria o próprio Fidel. Suspense geral entre os convidados. Tudo ficava meio provisório, porque Fidel iria chegar. Lá pelas tantas, estou de costas para a porta e senti, como um vento, a chegada do Comandante, cercado de seguranças, que entrou pela sala como um trem. Fidel foi cercado por todos, latinos, europeus, asiáticos. Uma amiga ao meu lado fez uma crítica fashion: "Uniforme de tergal, com esse verde horroroso... Tinha de ser de puro algodão, sei lá, outro verde..." Senti um pouco da crise do socialismo estampada naquele tergal barato.

Mas, tudo era pequeno diante da presença de Fidel. Era a materialização de um herói, como se Aquiles tivesse saído da Ilíada pra conversar comigo. Enfiei-me no grupo que o cercava e consegui chegar até bem perto dele.

"Comandante!..." - falei com firmeza. Fidel me olhou, sorriu e me deu a mão. Arfante, agarrei-lhe a mão e comecei a falar: "Soy de Brasil... hago peliculas..." Mas o grupo de 'tietes' era voraz e Fidel foi empurrado para o outro lado da sala. Firme em meu propósito, continuei agarrado em sua mão, enquanto ele respondia à pergunta de um asiático pigmeu chatíssimo falando do "bloqueio". Fidel jogava como um barco e eu ali, grudado, não largava sua mão. Lembro-me até hoje que sua mão era quente e larga, a palma generosa e macia. Sua mão se aninhava confortavelmente na minha, enquanto eu tentava lhe falar. "Comandante"... - comecei de novo, gago de emoção. Fidel me olhou, vagando naquele mar de gente e eu, feito um náufrago da revolução, pressionava sua mão com vigor, sorrindo-lhe, fixando-me em seus olhos para ele me ouvir. Mas, os 'tietes' ridículos me atrapalhavam.

Foi então que a mão de Fidel começou a sentir demais a presença da minha. Sua palma começou a estranhar aquele contato. O que fora uma irmanação política, fraternal de "companheiros", foi virando uma intimidade física, com as duas peles se colando. Uma finíssima camada de suor umedeceu a palma do Comandante, pois se apagava a fina fronteira entre a amizade revolucionária e o perigo homossexual: dois homens ali de mãos dadas. E a mão de Fidel começou a querer se livrar do firme aperto da minha. Ela tentou sair pela direita, pela esquerda, se contorceu, se apinhou em dedos juntos e foi se desprendendo da minha, que insistia no aperto emocionado. Eu lutava para não largar a palma do Comandante, mas sua mão, cada vez mais sinuosa, impaciente, se apequenou e num esforço, quase um solavanco, conseguiu afinal se libertar da minha, enquanto o olhar espantado de Fidel cortou o meu olhar por um segundo.

"Será que é uma bicha brasileira, infiltrada?" - tenho certeza que ele pensou. Não, comandante, eu não era uma bicha; apenas um ex-comunista. Foi a única vez que vi Fidel.

Miséria do urbanismo - VLADIMIR SAFATLE

FOLHA DE SP - 07/02/12


Quem olha para o céu de São Paulo tem, muitas vezes, os olhos aprisionados por emaranhados de fios elétricos que mais parecem teias metálicas de aranha.

Eles fornecem a melhor metáfora involuntária das cidades brasileiras. Tudo se passa como se, nesses fios resultantes de uma gambiarra infinita, encontrássemos as marcas mais evidentes da lógica da precariedade urbana e da ausência de qualquer planejamento de longo prazo.

Mesmo em bairros nobres da capital paulista, eles estão lá para lembrar que a miséria que vive o urbanismo brasileiro é uma das poucas coisas que, aqui, desconhece divisão de classe social.

Podemos afirmar que, nesta incapacidade crônica da classe dirigente do Brasil de pensar como devem ser as suas cidades, encontra-se a verdadeira imagem do nosso desenvolvimento.

Em cinco anos, seremos a quinta maior economia do mundo, mas nossas cidades continuarão dignas de países africanos, como o Egito ou a Nigéria. Pois há muito o Estado brasileiro deixou de apelar aos urbanistas para que interviessem em nossas cidades.

A capital federal, Brasília, foi o ápice e o fim deste modelo de gestão pública. Hoje, o Estado prefere deixar esse trabalho para a especulação imobiliária.

Isto talvez explique por que, da mesma forma como a riqueza produzida pelo desenvolvimento nacional não circula, nossas cidades têm sua infra-estrutura viária bloqueada.

Para um país no qual as classes mais favorecidas preferem estar desconectadas, mais interessante do que aumentar a conectividade viária é isolar-se em paraísos artificiais sob a forma de condomínios fechados.

Há pouco, o ministro das Cidades caiu. O mais interessante foi notar como seu ministério, que deveria ser fundamental para a transformação do desenvolvimento em melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, era simplesmente irrelevante -sem capacidade propositiva, sem corpo gerencial técnico capaz de desenvolver estudos de médio e longo prazo que orientariam políticas públicas.

Em sua criação, ele representava uma ideia interessante. Tal ideia, infelizmente, perde-se em alguma negociação com "a base aliada".

Por fim, fica cada dia mais claro que a esperança de que eventos de grande porte -como a Copa- produzam um novo momento na reflexão urbana de nossas cidades é uma piada de mau gosto.

Os benefícios que tais eventos deixarão na infraestrutura das cidades são, mais uma vez, insuficientes e limitados, isto quando não serão simplesmente mais uma adaptação provisória.

Obsessões atuais - LUIZ ZANIN


O Estado de S.Paulo - 07/02/12


Amigos, talvez influenciado por colegas do colunismo esportivo, minha obsessão atual se chama Barcelona. Não perco um jogo. E sempre estou à espera de um recital, que não tem vindo. Tenho visto o time catalão empatar ou sofrer para ganhar, como no sábado, contra a Real Sociedad.

Observo a superioridade manifesta do Barcelona em relação ao adversário, traduzida na posse de bola sempre muito mais expressiva. Mas não tenho visto esse valor numérico ser transformado em gols. O próprio Messi anda em maré baixa, ou andava, já que no sábado conseguiu fazer o seu. Vi-o complicar a defesa da Real Sociedad, mas, ao mesmo tempo, sofrer para vencê-la. Duas ou três vezes me pareceu que bota pouquíssima fé em sua perna direita, tanto como tem confiança em sua destreza de canhoto. Heresia falar isso?

Noto que existe um certo pudor dos comentaristas em abordar possíveis deficiências do astro. Compreensível. Como apontar insuficiências em quem já teve a candidatura lançada a maior de todos os tempos? O melhor tem de ser perfeito nesse mundo idealizado dos ídolos absolutos.

Aliás, tenho total compreensão com essa necessidade de erguer o ídolo da hora ao trono máximo e fazer com que o Barcelona pareça um começo absoluto do futebol. Faz parte da vida: toda geração precisa de referências atuais e um ídolo que lhe seja contemporâneo. Para quem começou a ver a bola rolar nos anos 1990 nada mais justo que eleger o Barcelona o maior time de todos os tempos, mesmo sem ter visto os outros.

A mesma coisa em relação a Lionel Messi. O ídolo do passado é como um intruso, um fantasma que vem de outro tempo para nos assombrar com seus feitos e seus números. No fundo é um indesejado; um chato, que não abre espaço para o sangue novo.

Daí me parecerem um tanto estapafúrdias as comparações entre Messi e Pelé. E profundamente injustas com Messi. Como estabelecer paralelos entre uma carreira já encerrada há tantos anos e outra em pleno andamento? Para compará-las, precisaríamos esperar que Messi pendurasse as chuteiras, quando então seria possível avaliar os feitos de um e de outro, tanto do ponto de vista qualitativo como quantitativo. Quem pode duvidar que Messi termine sua trajetória fulgurante com três Copas do Mundo e mais de mil gols no currículo? Antes disso, me parece, não dá para falar nada. Só dá para tietar.

Clássico. Palmeiras e Santos fizeram um clássico equilibrado, a meu ver. O Santos tem mais talento, o Palmeiras, mais dedicação e coerência tática. O calor insano de Presidente Prudente pesou igual para ambos, mas atingiu menos o time com mais tempo de preparação. O Santos começou a pré-temporada mais tarde, por causa do Mundial. É o calendário. Não há desculpas. O Palmeiras se encorpa com as novas contratações e vai melhorar ainda mais com Barcos e com Wesley, se vier. O Santos manteve Neymar e tem alguns outros destaques em seu elenco. Ganso, por exemplo, se resolver jogar bola ao invés de fazer marola. Agora, com a defesa do Santos nenhum adversário deve se desesperar ou descrer da vitória - ela pode vir a qualquer momento do jogo. É um castelo de cartas.

PMs e governos - JANIO DE FREITAS


FOLHA DE SP - 07/02/12
Não há o que negociar com invasores armados de uma casa legislativa, que tem de ser inviolável à força militar

Uma parte ainda indefinida da Polícia Militar carioca/fluminense trabalha a proposta de uma greve da corporação durante o Carnaval. Não há indicação da receptividade ou recusa à proposta em setores da tropa. Mas o assunto é objeto de considerações no governo estadual, apesar da convicção de que nenhum movimento impróprio prosperaria na PM e na polícia civil.
É certo, porém, que a insatisfação com os vencimentos é bastante difundida na PM. E, dada a necessidade de contingente cada vez maior, para efetivar a pacificação de favelas e áreas difíceis, além de outras ações, o orçamento de pessoal das polícias também é um problema difícil e crescente para o governo estadual.
A propósito, o governo da Bahia não poderia, sob pena de agravar a fraqueza de sua autoridade, propor qualquer índice de aumento de vencimentos para os invasores da Assembleia Legislativa e os autores de violências criminosas contra a população indefesa. Confirmação da inferioridade em que o governo se põe, a recusa aos ofertados 6,5% de aumento foi mais uma humilhação imposta pelos amotinados aos governantes.
Não há o que negociar com invasores armados de uma casa legislativa, peça que no regime democrático tem de ser inviolável à força militar ou militarizada.
As imagens de PMs com a cabeça encoberta e arma a ameaçar, como bandidos, motoristas e passageiros de ônibus; os assassinatos às dezenas, praticados por esses que enfim se mostram com as caraterísticas de criminosos, e tanto mais, complementam a obviedade de que ao governo do Estado não cabe curvar-se a nenhum tipo de bandidagem. Não importa qual seja a sua procedência.
Depois do alheamento diante do que parte da PM lhe preparava e à população, a atitude elevada de que o governo da Bahia dispõe é, apenas, a de enfrentar a realidade de sua polícia, livrando-se já do que deve ser excluído, sejam quantos forem. E começar a formação de uma nova PM. É o jeito de sair em pé.

A AUTORIA
Destaque em jornais e em noticiários falados, este foi o trecho de sucesso no pronunciamento do ministro Cezar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal, na decisão sobre os poderes investigatórios do CNJ (aprovados por 6 a 5, contra o voto de Peluso):
"Só uma nação suicida ingressaria em processo de degradação do Judiciário. Esse caminho nefasto conduziria a uma situação inconcebível que significaria retorno à massa informe da barbárie".
A frase é eloquente, sim. Seria a nação, porém, a degradar o Judiciário ou é o Judiciário que se degrada, para lástima da nação?
A história indica que, mesmo nas ditaduras e nos regimes autoritários em geral, é o Judiciário que se degrada por si mesmo, ao sujeitar-se (e servir) às imposições do poder alheio. Os brasileiros somos testemunhas disso, quanto tão poucos ministros dos tribunais superiores foram capazes de exonerar-se ou confrontar a ditadura.

Triste Bahia - EDITORIAL FOLHA DE SP


FOLHA DE SP - 07/02/12


Movimento de policiais militares baianos persegue reivindicações salariais com métodos violentos, em desafio ao Estado de Direito
Em afronta às normas constitucionais e aos direitos da população da Bahia, uma obscura associação de policiais lidera desde terça-feira movimento grevista da Polícia Militar daquele Estado que ganhou contornos dramáticos.
Se a intenção dos grevistas era aumentar o clima de insegurança e a violência nas ruas, os objetivos foram alcançados. Em menos de uma semana, já se registrou em Salvador quase uma centena de homicídios, contra 172 ao longo do mês de janeiro.
Lideranças acantonaram-se na Assembleia Legislativa, com o evidente intuito de intimidar o governo do Estado. Não se descarta um confronto mais sério com contingentes do Exército, da Polícia Federal e da Força Nacional convocados para restaurar a ordem pública.
Os grevistas reivindicavam aumento salarial de 40%, que levaria os vencimentos dos soldados a R$ 2.685, acima do que é pago pelo governo de São Paulo (R$ 2.366), mas já aceitam reajuste em torno de 20%. O governador Jaques Wagner (PT) alega que os policiais tiveram reajustes 30% acima da inflação em seu governo e que não dará mais que os 6,5% da inflação de 2011 previstos para todo o funcionalismo baiano.
A peculiar estridência da greve se explica no contexto de uma movimentação mais ampla, pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 300, de 2008, que estabelece um piso nacional.
A ideia era equiparar os salários dos militares estaduais aos valores pagos pelo Distrito Federal (inicial em torno de R$ 4.000, o mais elevado do país). Se aprovada a PEC 300, o piso será definido por lei federal em até 180 dias.
A proposta é torpedeada por petistas e aliados, pois caberia ao governo federal pagar a diferença entre soldo atual e novo piso, com um fundo de auxílio aos Estados.
A paralisação baiana, que eclodiu depois de movimentos similares no Ceará e no Maranhão, tem sido fomentada por uma articulação interestadual de PMs como trampolim para uma greve nacional.
Não há dúvida de que policiais militares precisam ser valorizados, não só com treinamento e equipamentos adequados, mas também por salários condizentes com o risco e a importância de suas funções.
Não é aceitável, entretanto, que recorram a métodos violentos e ilegais. A Constituição proíbe militares e PMs de fazerem greve.
Em entrevista à Folha, o governador Jaques Wagner tratou os líderes da paralisação como "bandidos". Para um ex-sindicalista, causa perplexidade que se declare surpreendido com a greve e mostre tão escassa disposição para negociar.
Claro está que só deve fazê-lo sob a condição de retorno imediato ao trabalho e à disciplina, mas de sua habilidade como líder político e sindical depende agora a restauração da tranquilidade na Bahia.

CLAUDIO HUMBERTO

“Muitos dançam na boquinha da garrafa, mas só o DEM segura o tchan”Senador Demóstenes Torres (Democratas-BA), em discurso no seminário do partido


PARA OPOSIÇÃO, DEUCCI É LIGADO A GUIDO MANTEGA

“Operação abafa” tenta blindar o ministro Guido Mantega (Fazenda) em relação ao escândalo de corrupção na Casa da Moeda, subordinada a seu gabinete e cujo presidente, Luiz Felipe Denucci, é acusado de receber propinas de US$ 25 milhões no exterior. Mas a oposição suspeita de que o ministro mentiu quando atribuiu a indicação de Denucci ao PTB. O partido apenas “endossou” a escolha de Mantega.

NEGÓCIO MAIOR

Intrigam a oposição os valores das supostas propinas, exagerados para terem sido pagas apenas por fornecedores da Casa da Moeda.

PROTEÇÃO TOTAL

O ministro sabia que Luiz Felipe Denucci era investigado pela Polícia Federal e pela Receita Federal, mas ainda assim o manteve no cargo.

OUVIDOS MOUCOS

O ministro da Fazenda também não tomou qualquer atitude quando, há um ano, o PTB retirou o “endosso” a Denucci, citando as acusações.

DESEMBUCHA, MINISTRO

Certos de que Mantega tem muito a explicar, os senadores Álvaro Dias (PSDB-GO) e Demóstenes Torres (DEM-GO) querem sua convocação.

TROCO: BRASIL ENDURECE COM TURISTAS ESPANHÓIS

Finalmente, caiu a ficha do governo brasileiro, após anos de humilhação e maus-tratos de compatriotas nos aeroportos da Espanha. A partir de abril, os espanhóis deverão exibir à Polícia Federal o que exigem dos brasileiros para entrar na União Europeia: passagem de ida e volta marcadas, mínimo de R$ 170 por dia, hotel reservado ou carta de apresentação de quem vai hospedá-los aqui, registrada em cartório. 

AS VOLTAS DO MUNDO

Será uma ducha fria nos espanhóis que fogem do desemprego provocado pela agonia do euro. O mundo dá mesmo muitas voltas.

BYE, BYE, BAHIA

A embaixada dos EUA alertou os americanos para o risco de viagens a Salvador. Só em caso de “viagem essencial”. Férias, por exemplo? 

RECORDAR É SOFRER

Jaques Wagner, o governador de volta para o futuro: em 2001, sob inspiração petista, uma greve deixou a Bahia entregue aos bandidos. 

PERSONA NON GRATA

José Serra até se insinuou, mas o Democratas não o convidou para o seminário que reuniu a fina-flor do partido, em São Paulo, ontem. A direção fez questão de convidar seu rival tucano, Geraldo Alckmin.

DISCURSOS ELOGIADOS

Além da extinção da sigla DEM, uma triste invenção, o Democratas se uniu, em São Paulo, nos elogios aos discursos do senador Demóstenes Torres (GO) e do vice-governador de Alagoas, José Thomaz Nonô.

GRANA NO MEIO

Lula receberá o título de cidadão de Santo André (SP) em cerimônia oficial marcada para março, quando ungirá seu candidato à prefeitura: um deputado que atende pelo singelo nome Grana. Carlos Grana. 

SEM PAPO

Os presidentes José Sarney (Senado) e Marco Maia (Câmara) bem que tentaram descontrair a presidente Dilma. Ontem, ela estava sisuda, constrangida, na posse do novo ministro das Cidades, Agnaldo Ribeiro. 

TEM APOIO

O líder do PR no Senado, Blairo Maggi (MT), diz que “não há qualquer objeção dentro do partido” quanto a indicar o deputado Luciano Castro (RR) para substituir Paulo Passos no comando dos Transportes.

CONSPIRAÇÃO

Setores do governo do DF estranham fatos envolvendo a Polícia Militar, como um atraso injustificado no pagamento da folha (o responsável faltou, outro “adoeceu”). Nada estimularia mais a ameaça de “greve”, na verdade um motim, que se articula na PM mais bem paga do País.

CONTA OUTRA

A Justiça negou indenização que o “aloprado” Freud Godoy pediu ao jornal O Globo, por mostrar a lorota da “segurança armada” de 

R$ 1,5 milhão da empresa dele, a Caso, justificando “malfeitos” na Bancoop. 

TEMPO DE NEGOCIAR

Advogados da União, que trabalham muito e ganham pouco, tentam negociação salarial com o Ministério do Planejamento. A associação que os representa, Anauni, já havia se reunido com Duvanier Paiva, que morreu, e tudo voltou à estaca zero. Greve ainda está descartada.

PENSANDO BEM...

...Sem carnaval, a Bahia acaba antes do fim do mundo, este ano. 

PODER SEM PUDOR

GENTILEZA COMO REMÉDIO

Impopular porque impunha sua presença aos paulistas, em 1932, Getulio Vargas descansava em uma fazenda no interior quando adoeceu. Chamaram um médico local muito respeitado e jeitoso, dr. Adhemar de Barros. O ilustre paciente tomou remédios e adormeceu. Mais tarde, ao despertar, ainda encontrou o dedicado médico à cabeceira:

– Que horas são?... – perguntou Getúlio.

– As horas que o senhor desejar, presidente... – respondeu o médico, gentil.

Ali nascia a amizade que faria do dr. Adhemar o interventor de São Paulo.