segunda-feira, fevereiro 04, 2013

Relojoeiro cego - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 04/02


Vejo mesmo o comercial: "Dê a seu filho o que você tem de melhor, Bradesco Biotecnologia"


Você vai ao médico, ele pede um exame de sangue e você descobre que seu filho terá síndrome de Down. O que você faria?

Pensará nos custos? Você não é uma pessoa excepcionalmente egoísta, mas, em meio a sua agenda, como conseguirá lidar com uma criança assim? A agenda já é pesada com trabalho, sexo top (lembre-se: gostosa sempre!), estudos na pós-graduação (afinal, hoje em dia é imperativo agregar valor à vida profissional e pessoal), férias...

Quem tomará conta da criança? Você tem alguém com quem possa contar? Irmãs, mãe, marido? Escola especial? Psicoterapeuta, psicopedagoga?

Claro que essa questão não diz respeito a quem tem já filhos com esse quadro clínico, mas sim aqueles que um dia passarão por isso. Tampouco cabe aqui o argumento de que aqueles que já tem um filho assim o amam e aprenderam a conviver bem com essa situação. Enfim, não se trata de amar ou não os filhos que já se tem, mas sim de escolher os filhos que teremos.

No Brasil, sendo o aborto ilegal numa situação como está, a tendência, com a chegada até nós desse tipo de exame, é o aumento do aborto ilegal.

A ciência vive pressionando a ética: trata-se aqui da ampliação do poder de escolha informada. Aumentando os recursos técnicos da medicina pré-natal, aumenta-se proporcionalmente a possibilidade de se evitar determinados tipos de gravidez. O nome disso, segundo o filósofo americano Francis Fukuyama, é "design babies" (bebês de prancheta, na tradução brasileira): bebês ao portador, com grau máximo de saúde.

Católicos dirão que a vida pertence a Deus. Quem não crê nisso, tem diante de si a seguinte questão: por que devo me submeter ao mero acaso? Afinal, a criança não foi fruto de um orgasmo (masculino, no mínimo)? Se o acaso decidiu qual óvulo e espermatozoide que estariam a postos, por que devo eu me submeter a tamanho capricho cego?

Não seria essa criança apenas uma carta triste no baralho, baralho este criado por um relojoeiro cego? Explico: a teoria do design inteligente (Deus criou o universo) afirma que sendo o universo organizado, não seria possível imaginar que ele teria surgido sem um criador inteligente (o relojoeiro criador).

Ateus em geral, ironizando, até aceitam que exista uma ordem, mas esta ordem seria fruto do acaso cego, daí o "relojeiro cego" que fala o darwinista Richard Dawkins em seu livro "Blind Watchmaker" (relojoeiro cego).

Se não devemos nada a ninguém, por que não tomarmos nosso destino nas mãos e ter o "melhor filho" possível? Tomar o destino em nossas mãos é optarmos pelos ganhos técnicos à mão, ou seja, a artificialização da vida.

Quanto aos crentes, em tempo abraçarão a causa, dirão que Deus nos fez inteligentes para tomarmos decisões inteligentes. A Igreja Católica, mais lenta, 500 anos depois também aceitará, como aceitou Galileu.

O processo de ampliação de escolha informada implica, num prazo de tempo não muito preciso, a crescente artificialização da atividade reprodutiva humana. Isso é tão inevitável como a ampliação dos direitos civis, tais como voto das mulheres, casamentos gays, direitos da mulher sobre seu corpo, e afins.

Se você vê um dia um homem aparentando 60 anos, mas com corpo e disposição de 40, correndo no Ibirapuera ao lado de uma gostosa de 25, você talvez não imagine quantos remédios ele tomou quando acordou, entre eles, um Viagra.

Isto é a artificialização da vida. Dito assim, parece um absurdo do cinema de ficção científica, mas na prática, é banal como tomar vitaminas e vacinas.

Num futuro próximo, ter filhos pelo método do acaso será como negar vacinas aos filhos. Um ato de irresponsabilidade reprodutiva. Empresas de seguro cobrarão mais caro por apólices de crianças geradas pelo relojoeiro cego. Ou simplesmente recusarão estas apólices.

ONGs farão campanhas para criminalização da reprodução não assistida pela medicina pré-natal genética em nome da sustentabilidade social das crianças geradas e dos custos de saúde pública.

Vejo mesmo o comercial: "Dê a seu filho o que você tem de melhor, Bradesco Biotecnologia".

Bumbuns não beijados - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 04/02


RIO DE JANEIRO - "Em bunda que mamãe beijou vagabundo nenhum põe tarja", disse certa vez Paulo Francis, na Redação do "Correio da Manhã". Significava que ele nunca sairia por aí apregoando o logotipo do fabricante de suas roupas. E olhava com ar de reprovação para a etiqueta de couro no bolso traseiro do meu jeans, onde se lia, em quase meio palmo, a palavra "Lee" -obrigatória no bumbum dos garotos de 1968, mesmo os de alguns repórteres do "Correio da Manhã".

Francis tinha razão: nada mais cafona do que uma pessoa se vestir pendurada de marcas, como um piloto de Fórmula 1. Mas isso se tornou quase impossível de evitar, porque os logos vêm conspicuamente impressos nas camisas, calças e até cuecas. Pagamos por um produto e ainda temos de alardeá-lo pelas ruas.

Humilhação equivalente é a que estão se submetendo as escolas de samba cariocas em 2013. Com o declínio dos bicheiros, que sempre as sustentaram como extensões naturais de seus domínios, elas tiveram de se virar para levantar dinheiro. E foram buscá-lo em empresas privadas, governos estaduais e países estrangeiros. É assim que, entre outros, a revista "Caras", os criadores de cavalos manga-larga, a Alemanha e a Coreia do Sul botaram o seu neste ano.

Nada demais nisto -as escolas, por mais tradicionais, nunca foram o reduto da pureza, e não haveria problema em que, em seus ensaios, barracões e quadras, os logos dos patrocinadores fossem exibidos com destaque. Mas o samba perde em dignidade quando esses exigem ver seus prosaicos produtos cantados na avenida como, no passado, se cantavam Zumbi e a princesa Isabel.

No futebol, a mesma coisa. Ontem, ouvi o Campeonato Paulista ser chamado de "Paulistão Chevrolet". Estranhei. Depois entendi: ninguém na Federação se preocupou em defender o bumbum que a mãe deles beijou.

A nova juventude - CARLOS ALBERTO DI FRANCO

O ESTADÃO - 04/02

A Europa continua sob o fogo cerrado de uma crise econômico-financeira sem precedentes. Os números do desemprego na Espanha, por exemplo, são assustadores. Dados divulgados recentemente apontam que 26% da população está sem trabalho, totalizando quase 6 milhões de pessoas. Mais da metade dos jovens está sem emprego. Assiste-se ao comprometimento de toda uma geração. O país vive uma fuga crescente de jovens talentos. Em um ano, a população de 20 a 24 anos diminuiu em 100 mil pessoas; de 25 a 29 anos a queda foi de 150 mil. O impacto da crise entre os jovens preocupa as autoridades e suscita análises sociológicas.

A juventude europeia não foi preparada para a adversidade. A frustração apresenta uma pesada fatura: violência, aborto, doenças sexualmente transmissíveis, aids e drogas. A ausência de cenários promissores compõe a trágica equação que ameaça destruir o sonho juvenil e escancarar as portas para uma explosão de contestação.

O quadro brasileiro é bem diferente. Felizmente. Temos, é certo, muitos problemas - violência, drogas, corrupção, desigualdade, baixa qualidade da educação -, todavia somos um país de gente alegre, com capacidade de sonhar. Expectativa de futuro define a vida das pessoas e o rumo das sociedades. "O Brasil", dizia-me um conhecido jornalista espanhol, "tem muitas coisas que não funcionam." Mas acrescentou: "Vocês têm problemas, porém têm alegria, fé, futuro. Nós, europeus, perdemos a esperança".

O Brasil de hoje, independentemente das sombras que pairam no quadro financeiro mundial e que, queiramos ou não, toldarão o horizonte da economia real, é um emergente respeitável. O nosso grande capital, o nosso diferencial, apesar do notável emagrecimento do perfil demográfico brasileiro, é o vigor da juventude. Uma moçada batalhadora, com vontade de acontecer e, ao contrário do que imaginam os pessimistas crônicos, sedenta de valores éticos, familiares e profissionais.

O novo mapa da juventude não é novidade para quem mantém contato permanente com o universo estudantil. A juventude real está identificando valores como respeito, fidelidade, família, ética. Há uma demanda de âncoras morais e de normalidade afetiva.

O desinteresse pela política - evidente e medido em inúmeras pesquisas - é, na verdade, uma rejeição ao comportamento imoral de grande parte dos políticos. E isso é bom. Trata-se, no fundo, de um sinal afirmativo. Os jovens estão em rota de colisão com a politicagem tradicional. Os políticos não se dão conta, mas o modelo está esgotado. Os partidos, se quiserem ter alguma interlocução com a juventude, vão ter de se reinventar. A renovação ética do Brasil não virá do blá-blá-blá vazio dos caciques partidários, mas da base da pirâmide etária. A política das coligações, marcadas pelo pragmatismo aético, vai ruir como um castelo de areia. É somente uma questão de tempo.

Mas há também em andamento profundas mudanças comportamentais. Os filhos e os netos da permissividade moral sentem uma profunda nostalgia de valores. Os anos da revolução sexual produziram muito sexo e pouco amor. O relacionamento descartável deixou o travo do vazio. Agora o auê vai sendo substituído pelo sentido do compromisso.

A juventude atual, não a desenhada por certa indústria cultural que vive isolada numa bolha ideológica e de costas para a realidade, manifesta uma procura de firmeza moral, de valores familiares e religiosos. Deus, família, fidelidade, trabalho, realidades tidas como anacrônicas nas últimas décadas, são valores claramente em alta. A Jornada Mundial da Juventude, encontro do papa com os jovens, em julho no Rio de Janeiro, vai surpreender muita gente. Espera-se mais de 2 milhões de jovens de todos os continentes. É muito mais do que a Copa do Mundo e a Olimpíada juntas.

A família, não obstante sua crise evidente, é uma forte aspiração dos jovens. Ao contrário do que se pensa em certos ambientes politicamente corretos, os adolescentes atribuem importância decisiva ao ambiente familiar. Mesmo os jovens que convivem com a violência doméstica consideram importante a base familiar. A relação no lar é fundamental, ainda que haja conflito. Parece paradoxal, mas é assim. Eles acham melhor ter uma família danificada do que não ter ninguém. Em casa deixaram de rotular os pais de "caretas" para buscarem neles a figura do companheiro. Os jovens, em numerosas pesquisas, apontam a família tradicional como a instituição de maior ascendência em suas decisões.

No campo da afetividade, antes marcado pelo relacionamento descartável e pela falta de vínculos, vai-se impondo a cultura da fidelidade. O tema da sexualidade, puritanamente evitado pela geração que se formou na caricata moral dos tabus e das proibições, acabou explodindo, sem limites, na síndrome do relacionamento promíscuo e transitório. Agora o rio está voltando ao seu leito. O frequente uso de alianças na mão direita, manifestação visível de compromisso afetivo, revela algo mais profundo. Os jovens estão apostando em relações duradouras.

Assiste-se, na universidade e no ambiente de trabalho, ao ocaso das ideologias e ao surgimento de um forte profissionalismo. Ao contrário das utopias do passado, os jovens acreditam "na excelência e no mérito como forma de se fazer revolução". Defendem o pluralismo e o debate das ideias. O pensamento divergente é saudável. As pessoas querem um discurso diverso, não um local onde se pregue apenas uma corrente de pensamento.

Quem não perceber, na mídia e fora dela, essa virada comportamental perderá conexão com um importante segmento do mercado de consumo editorial.

Tragédia pastelão - LÚCIA GUIMARÃES

O Estado de S.Paulo - 04/02


Um bunker subterrâneo abriga, no começo do fim de semana, enquanto escrevo, um menino de 5 anos que chora pelos pais. O bunker foi construído por Jimmy Lee Dykes, de 65 anos, conhecido num município rural do Alabama por se trancar lá dentro por vários dias. Tem eletricidade, comida e TV. Por um tubo de ventilação, a policia passou remédios para o menino refém, que sofre de autismo. O garoto foi arrancado por Dykes do ônibus escolar, depois que seu captor executou o motorista do ônibus que se havia se recusado a entregar dois outros meninos.

O captor armado é possivelmente doente mental. Mas, na narrativa fronteiriça americana, pode se passar por um excêntrico com temperamento violento, exercitando seus direitos fantasiosos sob a segunda emenda da Constituição. Ele estava intimado a comparecer a um tribunal depois de ter feito disparos contra uma vizinha, o filho e o neto da mulher, aborrecido com uma disputa por um quebra-molas na estrada de terra batida onde vive.

Um repórter nova-iorquino gravou uma assembleia no Norte do Estado, em que um xerife de fato tentava explicar a proprietários de armas como cumprir a lei recém-passada pelo governador Andrew Cuomo, como reação ao massacre de Newtown. Caçadores de cervos, convencidos de que precisam de suas armas automáticas e centenas de rodadas de munição para capturar o jantar, prometem uma insurreição e desafiaram o xerife a vir prendê-los. O xerife estava assustado e tentava apaziguar os candidatos a delinquentes que se enrolam na bandeira para justificar seu radicalismo.

Como um vespeiro perturbado, não por um passante desavisado, mas pelo resultado da eleição de novembro, figuras como Jimmy Lee Dykes e os caçadores de Nova York estão zunindo em vários Estados, brandindo suas armas, sejam as de fogo ou as retóricas, as que servem de munição para o delírio paranoico que é parte da sustentação do lobby das armas, a NRA. Ao assinar ordens executivas para regular o porte de armas e reduzir o arsenal militar em mãos de cidadãos privados, Obama deu um presente aos mercadores da paranoia.

O porta-voz da NRA, Wayne LaPierre, foi depor numa comissão do Senado sobre armas de fogo, motivada pelo massacre da escola de Newtown, Connecticut, em dezembro. Chegou cercado por capangas que não se contentaram em empurrar repórteres. Revistaram alguns deles, em flagrante violação das regras da casa dos representantes do povo. A paranoia de LaPierre é justificada. A julgar por seu depoimento, ele teme ser atingido por um projétil de raciocínio coerente. E como não temer? Trata-se de um sujeito que formula cenário em que os cidadãos, abandonados pelo governo, "quando um furacão ou tornado chega", só podem "se proteger no frio e na escuridão" com suas armas. Logo, logo, a moça do tempo vai recomendar o calibre ideal, em caso de ventania.

Não é difícil fazer de LaPierre objeto de chacota, como provaram os comediantes de fim de noite durante a semana. Mas o que fazer do infinitamente mais articulado e brilhante David Mamet? Não precisa ajustar seus óculos, você leu o nome correto. O dramaturgo que eletrizou plateias em tantos países, inovando o diálogo teatral com jóias como "Glengarry Glenn Ross", uma condenação da cultura do comércio amoral, se orgulha, recentemente, de pertencer ao coro que ele chama de conservador.

Mas não posso insultar os conservadores que conquistaram o epíteto por métodos mais nobres. O direitismo expressado por Mamet é como um tique nervoso. Não é neoconservador, é neolunático. Vejamos: numa longa diatribe contra a iniciativa de Obama, publicada com destaque lamentável pela Newsweek, Mamet começa por explicar ao seu rebanho que a máxima de Karl Mark "De cada um, de acordo com suas habilidades, a cada um, de acordo com suas necessidades" nada mais é do que linguagem em código para a função do Estado, de tomar e distribuir como melhor lhe parecer. Levaria nota baixa em marxismo, porque o espantalho invocado por Mamet estava pensando numa utopia do proletariado, não do Estado. O dramaturgo segue com o argumento canastrão, que não haveria de tolerar, partindo de seus melhores personagens: Obama quer proteger sua família com o Serviço Secreto, mas não quer deixar o xerife Mamet se armar para proteger seus rebentos. Aqui, detectamos o odor inconfundível de outro código de linguagem: qualquer obstáculo ao hiperindividualismo de John Wayne é elitista.

Há elitismo maior do que se conceder o privilégio de mentir?

''A marcha da insensatez'' - parte I - EVERARDO MACIEL

O ESTADÃO - 04/02

Barbara Tuchman (1912-1989), renomada escritora e historiadora norte-americana, fez muito sucesso, nos anos 1980, com o livro A Marcha da Insensatez. Nele, a autora aponta a insensatez ou a obstinação como uma opção política recorrente no curso da História, acarretando a ruína ou o infortúnio dos governos. Em favor de sua tese, oferece inúmeros exemplos, desde o cavalo de Troia até a aventura norte-americana no Vietnã.

A política tributária presta-se com singular utilidade para a prática da insensatez. Assim ocorre quando há exação imoderada, linguagem complexa ou obscura, sobrecarga de burocracia, etc. No Brasil, temos inúmeros exemplos de insensatez tributária. Neste artigo, destaco um deles.

Elisão fiscal ou planejamento tributário é tema ainda sujeito a muitas controvérsias doutrinárias. Corresponde à possibilidade de o contribuinte, pretendendo à economia tributária inerente à própria gestão dos negócios, fazer uso de brechas legais.

A legislação de inúmeros países considera abusivo o planejamento que busca exclusivamente a economia tributária. Neste caso, a administração, sem desfazer os atos ou negócios jurídicos efetivados, desconsidera seus efeitos tributários.

A Lei Complementar n.º 104, de 2001, introduziu o parágrafo único do artigo 116 no Código Tributário Nacional (CTN), admitindo a possibilidade de desconsideração administrativa dos atos ou negócios jurídicos praticados, na hipótese de dissimulação. Conferiu eficácia limitada à norma, porque condicionou sua concretude à aprovação de procedimentos específicos em lei ordinária.

O foco dessa norma geral antielisiva é a dissimulação, entendida como um meio real de encobrir algo também real, nos limites da lei. Em contraste, a simulação, qualificável como crime, é a pretensão de enganar em relação a algo que não é verdadeiro.

Os artigos 13 a 19 da Medida Provisória n.º 66/2002 cuidaram de estabelecer os procedimentos que dariam eficácia plena à norma antielisiva. O Congresso Nacional, no entanto, os rejeitou no projeto de lei de conversão. Em consequência, a norma não pode ser aplicada, até que sobrevenha a aprovação de um regramento específico.

Não é assim que tem feito o Fisco. Fazendo uso de subterfúgios de linguagem, como deslocamento ou reclassificação de rendimentos, com frequência autos vêm sendo lavrados envolvendo, na prática, a desconsideração administrativa do que se presume ser dissimulação, desconhecendo a exigência dos procedimentos específicos.

Na esteira dessa prática, foram lavrados, no ano passado, autos bilionários. Em tese, nada demais, desde que sejam procedentes.

Pude constatar, contudo, autos que têm por base uma pretensa dissimulação, mesmo sem uma vinculação ostensiva ao parágrafo único do artigo 116 do CTN. Quais as consequências disso? Repercussões sobre a imagem das empresas, que se obrigam a noticiar como fato relevante danos patrimoniais expressos imediatamente na queda do valor das ações, inibição de negócios com possíveis investidores, inclusive estrangeiros.

Não são bem autos de infração. São autos de fé, seja porque reproduzem a tortura falsamente moralista da Inquisição, seja porque decorrem mais da fé que da convicção da autoridade lançadora.

Admitindo-se que não prosperem esses autos, quem irá reparar os danos morais e financeiros desses contribuintes? Não temos uma legislação que efetivamente cuide da responsabilidade objetiva do Estado. Não há sucumbência administrativa.

Não seria mais razoável editar uma legislação que, de uma vez por todas, estabeleça os procedimentos para proceder à desconsideração administrativa? Essa omissão legislativa é extremamente danosa para os investimentos no Brasil.

Em menor escala - nem por isso menos importante - estão sendo julgados lançamentos feitos contra jornalistas e desportistas, a pretexto de prestarem serviços por meio de pessoa jurídica da qual são sócios.

O que, de fato, aconteceu? As inscrições das pessoas jurídicas foram aceitas, mesmo porque não infringiam a legislação. Os impostos foram recolhidos. As obrigações acessórias foram atendidas. Nenhuma restrição por parte do Fisco. Nem sequer um ato declaratório interpretativo foi editado. De repente, as autuações. Não parece deslealdade do Estado?

O artigo 129 da Lei n.º 11.196/05 esclareceu a matéria definitivamente, quando, em caráter interpretativo, disse que a prestação de serviços intelectuais por pessoas jurídicas, em qualquer hipótese, se sujeita tão somente à legislação a ela aplicável. Trata-se de um truísmo necessário, para prevenir situações esdrúxulas.

Desde a edição daquela lei não ocorreram mais autuações. De mais a mais, em 2011, o Código Civil foi alterado para admitir a empresa individual de responsabilidade limitada.

Restou o julgamento de alguns desportistas e jornalistas, escolhidos sabe-se lá por qual critério, quando, em verdade, se tratava de uma prática generalizada, aberta e admitida, além de obviamente lícita. É de esperar que o julgamento desses processos restaure a justiça.

Cachorro louco - JOSÉ DE SOUZA MARTINS

O Estado de S.Paulo - 04/02


Devo a vida ao Instituto Pasteur de São Paulo. Minha tia Sebastiana me dizia: "Ocê nasceu porque vossa mãe foi mordida por um cachorro louco". Minha mãe, ainda solteira, morava na roça, no bairro do Arriá, no Pinhalzinho, quando foi mordida por um cão hidrófobo, aí por 1936. Morto o animal a tiros, teve a cabeça cortada e colocada num saco de estopa. Meu tio Pedro desceu a Serra das Araras a cavalo, levando o embrulho e, em outro cavalo, minha mãe e sua irmã mais velha para que tomassem o trem em Bragança e viajassem para São Paulo. Da Estação da Luz foram para o Instituto Pasteur, na Avenida Paulista. Entregaram a cabeça do cachorro, para confirmar a hidrofobia.

Repetiam o que se tornara comum desde a manhã de 7 de novembro de 1903, quando o Dr. Ivo Bandi, médico italiano, primeiro diretor do Instituto Pasteur, vacinou as duas primeiras vítimas de cães hidrófobos que, finalmente, podiam ser vacinadas aqui mesmo em São Paulo. Até então, eram enviadas de trem para tratamento no Rio de Janeiro. Quem não pudesse fazer a viagem acabava morrendo depois de atroz agonia. As vacinas foram aplicadas numa clínica na Rua Direita nº 22. A primeira pessoa a recebê-la foi uma menina de 9 anos de idade, Dina Preti, moradora na Rua Sólon, no Bom Retiro. A segunda foi o italiano Saverio Micalli, de 45 anos, procedente de Santa Eudóxia, em São Carlos do Pinhal.

O Instituto nascera numa reunião, no Clube Internacional, no dia 6 de agosto, presidida pelo engenheiro Inácio Wallace da Gama Cochrane, com a presença de vários médicos. Seria uma instituição privada e sua fundação dependeria de donativos. Em três semanas foram angariados mais de 23 contos de réis, uma pequena fortuna. O dinheiro era para comprar o local de sua instalação e importar o material de que necessitaria. O dinheiro continuou chegando de paróquias católicas e de câmaras municipais do interior. Fazendeiros, banqueiros, comerciantes, industriais enviaram contribuições. Trabalhadores e pessoas de condições modestas subscreveram listas e enviaram doações. A Associação das Classes Laboriosas, que ainda existe, enviou uma quantia de dinheiro e prometeu fazer uma contribuição anual para manter o Instituto. No dia 8 de novembro o Instituto Pasteur já estava instalado na Avenida Paulista, no prédio em que, com várias alterações na fachada, funciona até hoje. Em 1918, passaria para o Estado.

Como tivesse que permanecer lá até o término do tratamento, minha mãe conheceu outras pacientes. Dentre elas, minha futura tia Amábile, casada com um primo de meu pai, já quarentão. Foi quem arquitetou um almoço na casa de minha futura tia-avó, em São Caetano, para que meu pai e minha mãe se conhecessem. Em 1937, estavam casados e no ano seguinte eu nasceria. Era a bela trama da vida no Instituto Pasteur.

A Ucrânia e o Paquistão são aqui - RENATO JANINE RIBEIRO

Valor Econômico - 04/02


Em 2012 as paixões se exaltaram no Brasil, com o julgamento de um caso que até no nome mostrou uma divisão política acentuada: mensalão, diziam uns, Ação Penal 470, diziam outros. O Judiciário condenou o líder petista que foi o principal ministro do primeiro governo Lula. A discussão do assunto tem-se confinado ao Brasil. Mas a experiência do maior país da América Latina encontra paralelos numa potência regional da Ásia, o Paquistão, e num dos principais Estados que saíram da ex-União Soviética, a Ucrânia.

Yulia Tymoshenko ficou famosa pela imagem e pela ação. Ela é a loura de cabelos trançados que em 2004 liderou a Revolução Laranja, contra o governo da Ucrânia, que teria fraudado as eleições. Depois de intensas manifestações, com a simpatia da mídia internacional e o apoio dos governos ocidentais, ela chegou ao poder. Com idas e vindas foi primeira-ministra da Ucrânia até 2010, quando perdeu as eleições - e logo foi condenada à prisão. Responde a outros processos.

No Paquistão, a Corte Suprema mandou prender o primeiro-ministro Raja Pervaiz Ashraf, acusado de corrupção, às vésperas da campanha eleitoral ora em curso. Dezenas de milhares têm protestado contra a corrupção; o problema, a meu ver, é que parte deles disse ver o nome de Alá nas nuvens sobre Islamabad - o que suscita minha desconfiança. Isso não absolve o governante, que continua livre. A sonegação fiscal é frequente no país, bem como o uso de fundos públicos em campanhas eleitorais.

Justiça ganha poder graças à corrupção política

São três casos diferentes. Cada um dos acusados pode ser inocente - ou culpado. Quem se alegra com a condenação de José Dirceu se revolta com a prisão de Tymoshenko, e vice-versa - ele, querido da esquerda, ela, dos liberais. Mas os dois são acusados do mesmo: abuso do poder.

Há uma lógica parecida nos vários episódios. Ashraf teve a prisão decretada, estando no poder. Dirceu foi condenado, com seu partido no poder - onde continua. Tymoshenko foi julgada após a derrota, mas mesmo assim teve, nas eleições que perdeu, 45% dos votos.

Em todos esses casos vemos uma atuação forte do Judiciário, que enfrenta quem está no governo. É isso bom, é mau? A Justiça é, dos três poderes clássicos, o único não-eleito. Sua composição é aristocrática. Juízes entram na carreira por concurso, o que elege os melhores, os "aristoi" - ou por cooptação, quando os tribunais escolhem quem vai ser juiz ou quem será promovido. Tudo isso contrasta com a escolha, pelo voto popular, dos líderes dos poderes Executivo e Legislativo. Daí, um certo conservadorismo da profissão judicial, que teve seu pior exemplo na Corte Suprema americana na década de 1930, barrando as leis sociais de Franklin Roosevelt.

Duas das três pátrias da democracia moderna, Grã-Bretanha e França (a terceira sendo os Estados Unidos), sempre resistiram à tentação de dar poder demais aos juízes. De Lolme dizia, em 1771, que o Parlamento britânico "pode fazer qualquer coisa, menos transformar um homem em mulher ou uma mulher em homem". Queria dizer que o único limite ao poder do Parlamento era o da impossibilidade natural. Daí o choque para os britânicos, quando a corte (europeia) de Estrasburgo declara inconstitucionais leis votadas em Westminster, porque violariam direitos humanos.

Na França, a convicção da soberania popular é um fio condutor da política desde a Revolução Francesa, vencendo dois imperadores, três reis e um marechal (Pétain), que a tentaram controlar ou negar. Por isso, até recentemente, era difícil arguir a inconstitucionalidade de leis. Só em 1974 a oposição foi autorizada a levantar essa questão ante o Conselho Constitucional; só em 2008 surgiu a possibilidade de questionar uma lei já vigente, ainda assim, em casos excepcionais.

Mas a tendência é a mudar isso, aumentando o poder ou dos tribunais da União Europeia ou do Conselho Constitucional. Assim, aquilo que de Gaulle detestava (o "governo dos juízes") pode vir a acontecer.

Estamos vendo, no Brasil, no Paquistão, na Ucrânia e talvez em mais países, um governo pelos juízes?

Eu não iria tão longe. O que tem legitimado a judicialização - e mesmo a criminalização - da política é, penso eu, apenas o descontentamento com a corrupção na vida pública. Como as cortes têm entre suas missões a de zelar pela honestidade, cresce a expectativa de que elas limpem a política. É esse o espírito da Lei da Ficha Limpa. É o espírito de muitos que vibraram com as condenações do mensalão.

Mas esta é uma situação explosiva. Se dermos aos tribunais o papel de zelar pela política limpa, renunciaremos à cidadania. Porque, em países democráticos, quem escolhe o governo somos nós, cidadãos. Se elegemos gente ruim, a culpa é nossa; o que significa pedir socorro aos juízes? Pedimos para ser tutelados? Dizemos que não conseguimos a democracia, o autogoverno, porque não conseguimos eleger gente honesta?

Há uma alternativa. Ela é os próprios políticos perceberem que dançam à beira do vulcão, posto que se desmoralizam com seu descaso pelas cada vez mais numerosas denúncias de corrupção. Será eles mesmos limparem seus estábulos ou, pelo menos, apurarem o que está errado até o fim e mais além, como sugeri em coluna anterior: não apenas até tirar alguém do cargo, mas até julgá-lo e, se culpado, condená-lo. Mas mesmo essa alternativa é triste. Depende de uma iniciativa dos políticos, não dos cidadãos. É como se nossa sorte democrática estivesse delegada quer aos tribunais suprindo as falhas dos políticos, quer a eles criando vergonha na cara. A melhor opção seria os cidadãos, a sociedade, tomarem a questão em mãos. Mas de que modo?

Em uma canoa só - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 04/01

O procurador-geral do Estado, Elival Silva Ramos, antecipou a integrantes do primeiro escalão de Geraldo Alckmin que deverá opinar contra a hipótese legal de Guilherme Afif acumular o futuro Ministério da Micro Empresa e o cargo de vice-governador de São Paulo. Silva Ramos só vai se manifestar no "momento oportuno" e "mediante fato consumado", mas já examinou a questão. "Não é um caso expresso na lei. Portanto, suscita interpretações, e eu já tenho a minha", afirma.

Muita calma O PSD insiste em formalizar o apoio à reeleição de Dilma Rousseff, em março, antes de se instalar na Esplanada. Por isso, aliados de Gilberto Kassab consideraram prematuras as declarações de Afif sobre sua postulação. "O timing não foi adequado", reconhece interlocutor do ex-prefeito.

Bode Aliados de Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) dizem que o candidato à presidência da Câmara esteve ao menos quatro vezes com Inocêncio Oliveira (PR-PE) no fim de semana para tentar dissuadi-lo de disputar o comando da Casa.

Flutuante Estimativa que chegou a Dilma ontem à tarde dava conta de 250 votos a favor de Alves, o que tornaria real a chance de segundo turno. Já cabos eleitorais do potiguar garantiam que ele teria apoio de 350 deputados.

Na mosca A primeira reação do Planalto à escolha de Eduardo Cunha (RJ) para líder do PMDB foi dar o crédito a Sérgio Cabral: em jantar com a presidente na quinta, ele previu que o conterrâneo seria eleito com 46 votos.

Pânico... Não bastasse a tensão política da eleição do novo líder peemedebista, ontem, o vice-presidente da Caixa, Geddel Vieira Lima, viveu um filme de terror particular: ficou 30 minutos preso num dos elevadores da Câmara.

... em Brasília Depois de mandar pedidos de socorro pelo celular, Geddel foi resgatado, suando e sem camisa, ainda a tempo de acompanhar a votação da bancada.

Day after Mais de 200 empresários se reúnem na CNI, em Brasília, amanhã e quarta para definir as 130 propostas que vão integrar a Agenda Legislativa da Indústria, que será lançada em abril.

Mea culpa 1 Consumada a vitória de Renan Calheiros (PMDB-AL) no Senado com evidente apoio de tucanos, Aécio Neves (PSDB-MG) avaliou que errou ao não discursar para marcar a posição do partido no dia da votação.

Mea culpa 2 Diante da debandada tucana, que fragiliza seu discurso de presidenciável, Aécio diz que os senadores que não seguiram a orientação de votar em Pedro Taques (PDT-MT) "não entenderam que o PSDB tem de se comportar de maneira diferente, mostrar que tem outro projeto para o país".

Verão passado Em agosto, quando ensaiou a candidatura de Edson Lobão à presidência do Senado, o Planalto já sabia do plano do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de apresentar denúncia contra Renan ao Supremo Tribunal Federal.

Fica fria Segundo interlocutores, avisado sobre a preocupação, o recém-eleito presidente do Senado respondeu a emissários do Planalto que não se preocupassem, porque a denúncia não tinha chance de prosperar.

Frevo eleitoral Eduardo Campos convidou os cinco governadores do PSB para o desfile do Galo da Madrugada, sábado, em Recife. Na sexta passada, o socialista foi a Vitória (ES), onde participou da abertura do Carnaval local. Além de Renato Casagrande, chamou Luciano Rezende, prefeito do PPS, para a folia em Pernambuco.

Tiroteio
Dilma vai recorrer ao Procon. Todas as latas de refrigerante do Alvorada vieram com a mesma frase: 'Quanto mais PMDB melhor'.

DO VEREADOR ANDREA MATARAZZO (PSDB-SP) sobre a hegemonia do partido do vice-presidente, Michel Temer, nos cargos de comando do Congresso.

Contraponto


Contra o relógio


Geraldo Alckmin recebia no Palácio dos Bandeirantes pela primeira vez um prefeito do interior que havia tomado posse em janeiro. O político chegou ao gabinete do governador com 11 ofícios debaixo do braço, cada um com uma série de pedidos de recursos para sua cidade.

Assustado, o tucano comentou:

- Calma, prefeito. Ainda estamos no primeiro mês do seu mandato. Temos tempo para tentar resolver isso...

O recém-empossado rapidamente respondeu:

- Não, governador. Eu reconheço: prometi demais. Exagerei! Agora não posso perder tempo.


Falta confiança - PAULO GUEDES

O Globo - 04/02


O nosso potencial de crescimento econômico sustentável é baixo. Há uma crescente percepção do fenômeno. "O PIB patina e revela modelo esgotado. Analistas criticam modelo baseado no consumo e falta de clareza para investir em infraestrutura", alerta O GLOBO em matéria de capa deste domingo. "O desastre da indústria: a produção de todo o setor industrial caiu em média 2,7% em 2012, informou na sexta-feira o IBGE. Mas a fabricação de bens de capital recuou 11,8%, o que é um péssimo prenúncio, pois o potencial de expansão da economia depende do investimento em máquinas, equipamentos, instalações industriais e infraestrutura", registra em editorial o jornal "O Estado de S. Paulo" deste domingo.

O governo reage à dupla tragédia da desaceleração econômica e da desindustrialização com juros baixos, crédito fácil e redução de impostos e encargos trabalhistas. A ameaça do desemprego industrial foi estampada também em manchete de primeira página do "Estadão": "Emprego naufraga no ABC paulista. Indústrias fecharam 52 mil postos de trabalho em 2012, no berço do sindicalismo brasileiro." Mas a redução de impostos e encargos certamente amenizou os impactos sobre o mercado de trabalho. A taxa de desocupação registrada pelo IBGE em dezembro de 2012 foi de 4,6%, a mais baixa dos últimos 10 anos, e "as contratações no setor de serviços tiveram em 2012 o melhor desempenho dos últimos 3 anos", registra o jornal.

Caímos na armadilha social-democrata do baixo crescimento. "Programas sociais de transferência de renda consomem metade das despesas do governo federal, atingindo peso inédito nos gastos públicos e na economia", adverte a "Folha de S.Paulo" em matéria de capa deste fim de semana. O aumento dos gastos públicos e a expansão do crédito são políticas tradicionais de estímulo à demanda na economia. Aumentam a utilização da capacidade produtiva instalada e reduzem a taxa de desemprego a curto prazo, mas não garantem o crescimento econômico a longo prazo. O fenômeno do crescimento sustentável é bastante mais complexo. Até mesmo a ampliação das transferências de renda exige aumentos de produtividade resultantes dos investimentos. E, sem as reformas de modernização, faltam a confiança e o otimismo para que se disparem esses investimentos.

Presidente negro no país de Lincoln - PAULO BROSSARD

ZERO HORA - 04/02

Se o quadriênio passado foi inçado de perigos, o novo continuará assim não se sabe por quanto tempo



A eleição de Barack Hussein Obama para presidente dos Estados Unidos representou sucesso sem precedente na história americana. Basta lembrar que num país em que até ontem existiam setores numerosos de separação radical e belicosa de descendentes de africanos com outros americanos de origem europeia, um homem jovem e sem ligação com o escol econômico e social daquele país, com ascendentes asiáticos e africanos, de tez escura, chefe de família igualmente negra, foi eleito presidente dos Estados Unidos, posto ocupado por Washington, Jefferson, Lincoln, Madison, Roosevelt, Kennedy, e nessa investidura se houve com equilíbrio e moderação, autoridade sem arrogância, temperança e lucidez, a ponto de ser reconduzido à posição presidencial para exercer novo mandato. A mudança, que também era a continuidade, mostrou um homem à vontade, o discurso então proferido porejava firmeza, confiança e coragem. O novo presidente refinou sua oração sem perder a simplicidade, a transparência e a naturalidade. Mas nem tudo é igual ao quadro de 2008, quando eleito pela primeira vez; o mundo mudou e mudou o país dentro de seus limites. A imensa crise que tem a Europa como epicentro adquiriu expressão intercontinental e bateu em cheio nos Estados Unidos. Tudo isto evidencia que o governo que se reinicia não será e não poderá ser a mera continuação do anterior. Não estranha, por isso mesmo, que o discurso de 2013 não se limitasse a reiterar o de 2009, outras dimensões pretensiosas e corajosas, visíveis a olho nu.
Outra vez se repete o fato de o presidente ser do Partido Democrático e a maioria da Casa dos Representantes pertencer ao Partido Republicano. Esta anomalia institucional tem sido apontada por estadistas, políticos, juristas, publicistas, historiadores e tantas vezes registrada pelo incansável doutrinador do parlamentarismo Raul Pilla, em sua longa atividade política, parlamentar, partidária e jornalística.
Enfim, se o quadriênio passado foi inçado de perigos, o novo continuará assim não se sabe por quanto tempo. Contudo, o chefe do governo parece revigorado, músculos retesados, com apetite de enfrentar gigantes. Se isto acontecer, será benfazejo ao seu país e ao resto do mundo.
Já que me aventurei a esgueirar-me por meandros internacionais, ocorre-me recordar o cinquentenário de magno acontecimento na história universal, a criação da União Europeia. O sonho era antigo e antes dele, em 1951, fora criada a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, a primeira realização real no plano dos fatos nascido da inspiração de Schuman e da ação visionária de Jean Bonnet. Em 1957 foi o tratado de Roma que veio a acrescentar novo elo na cadeia que pretendia a federalização da Europa. Mas ainda estava por acontecer um ato necessário nesse processo; teve como partes duas nações que fazia um século vinham se guerreando, a Alsácia passando de francesa a alemã e vice-versa, em 1870, 1914-1918, 1939-1945, com rios de sangue, destruição de vidas, igrejas, bibliotecas, museus, bens materiais de todo o gênero e, por inacreditável que pudesse parecer, no Palácio do Elyseu o presidente da França, que fora o chefe da Resistência, da França Livre, da Cruz de Lorena, Charles de Gaulle, e Konrad Adenauer, chanceler da Alemanha depois do terremoto nazista, assinavam o tratado que sepultaria uma inimizade centenária e sangrenta, cheia de túmulos e ruínas, luto e lágrimas. Pois do tratado do Elyseu decorreu meio século.
Dir-se-á que queixas recíprocas continuam e ainda agora o Reino Unido divulgou a resolução de um plebiscito sobre o que pensa a população acerca da permanência ou saída da comunidade. Contudo, o acontecimento de 1963, passados 50 anos, merecia ser lembrado, e por muitas razões.

Bala de prata - VINICIUS MOTA

FOLHA DE SP - 04/02


SÃO PAULO - Desconfie, leitor, quando ouvir alguém dizer que certo procedimento "não resolve" um problema da sociedade. Duvide, também, quando topar com a assertiva oposta: se adotássemos a medida tal, solucionaríamos o impasse.

A preguiça, a inépcia e a inoperância costumam esconder-se por trás dessas argumentações finalistas, definitivas. Diz-se, por exemplo, da internação compulsória de viciados em drogas que ela não resolve o problema da dependência.

Que não seja solução geral, parece um fato inconteste. Mas será que a medida melhora algumas situações individuais? Será que esse tempo ganho, ao evitar a morte e retardar a deterioração da saúde de uma pessoa incapaz de tomar decisões, pode tornar-se uma etapa para tratamento mais efetivo à frente?

O mito da bala de prata aparece bastante no debate econômico. Para certo time de "desenvolvimentistas", basta manter desvalorizado o real para que tudo o mais se ajuste. Do outro lado estão os fanáticos pela liberdade total dos mercados.

São mais vantajosas as abordagens incrementais, que levam em conta mais de um aspecto do problema e visam à sua melhoria no tempo -nem sempre à "solução". Mas isso requer disposição para o trabalho, o aprendizado e a organização.

O Brasil desempenha-se precariamente nesse quesito. Veja a disfuncionalidade dos mecanismos de prevenção de acidentes com multidões país afora, revelada após o incêndio em Santa Maria (RS).

O objetivo -garantir dispositivos de segurança em locais que recebem aglomerações- perde-se no labirinto de corpos burocráticos estanques, mal treinados e mal controlados. O Brasil, no setor privado e no público, é sobretudo mal gerenciado.

O outro lado da moeda de tanta ineficiência muitas vezes é a especulação em torno da solução definitiva, do lance genial, da norma purificadora, que nunca virão.

Michel sob os holofotes - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE 04/02

A partir de hoje, Dilma Rousseff que se cuide. Tudo bem que o novo líder do PMDB, Eduardo Cunha, é seu aliado e torce pelo sucesso do governo. Mas o coração dele bate pelo partido e pelo grupo que lhe concedeu a vitória. Portanto, ao surgir uma situação em que for obrigado a escolher entre o partido e o governo, o líder dificilmente deixará de atender o primeiro.

Os alicerces da campanha tanto de Eduardo Cunha quanto de Sandro Mabel foram a defesa do partido acima de todas as coisas. Nessa batida, no momento em que uma proposta de Dilma for contra os desejos do PMDB, a presidente terá problemas.

Para equilibrar esse jogo ela poderá contar com o PSD de Gilberto Kassab, que estreia nessa sessão Legislativa sob nova direção e com Kassab mais disponível para fazer politica. E, é claro, o PSB continuará a balançar a árvore palaciana, para ver os peemedebistas despencam. Nesse ritmo, mantido o cenário favorável ao antigo líder Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), no momento em que ele vencer hoje a Presidência da Câmara, as baterias do PSB se voltam para o vice-presidente Michel Temer.

Daqui para frente, tudo o que der errado no PMDB em relação ao governo terá alguém de prontidão entre os partidos para colocar a culpa em Michel. Primeiro, dentro do PMDB há uma (ainda) acanhada torcida no sentido de trocar a aliança com Dilma por uma confraternização ao lado do senador Aécio Neves, do PSDB.

O outro grupo é capitaneado pelo PSB de Eduardo Campos, que invariavelmente atribui as vicissitudes do governo ao PMDB — leia-se o novo presidente do Senado, Renan Calheiros, o deputado Henrique e… Michel. Nessa batida, Dilma e seu companheiro de chapa na campanha presidencial passada estarão sob os holofotes, ela na gestão e condução da economia, e ele na organização política de seu próprio partido e reflexos nos projetos de interesse do governo. Haja equilíbrio para andar nessa corda.

Enquanto isso, no PT…

O PT hoje está como aquele sujeito que até gostaria de comprar um carro novo, mas o dinheiro e as dívidas não permitem. Ou que até trocaria de mulher se pudesse largar a atual sem causar um grande rebuliço na vida, tirando-lhe da zona de conforto, ainda que esse conforto seja apenas aparente. Se Dilma e seu partido tivessem uma bola de cristal que lhes garantisse a vitória em 2014, talvez até se dessem ao luxo de prescindir do PMDB.

Sem essa certeza, o PT não largará o PMDB no meio da rua. Para completar, há uma desconfiança generalizada do PT em relação aos socialistas e o partido de Lula resiste em fazer acordos que joguem 2018 sobre a mesa. Nem Eduardo Campos confiaria hoje nisso. Não é à toa que Lula vai buscar o governador para pedir que permaneça ao lado de Dilma na eleição do ano que vem.

E na Câmara…

Nada está totalmente seguro para Henrique Eduardo Alves se eleger hoje presidente da Câmara. Apesar dos movimentos de última hora em favor de Eduardo Cunha, a matemática da política nas eleições anteriores da Casa recomenda cautela. Marco Maia obteve 375 votos e o apoio de 21 dos 22 partidos em 2011, quando tudo era alegria na estreia de Dilma. Michel, presidente anterior a Maia, conquistou 309 votos no meio do segundo mandato de Lula. Arlindo Chinaglia (PT-SP) foi eleito para o biênio 2007/2008 em segundo turno, com 270 votos.

No colégio eleitoral dos congressistas, há pelo menos 100 dos 513 que são sempre “do contra”. Adicione-se a esse grupo o climão geral da Casa. Há um descontentamento muito grande entre os parlamentares e isso pode desaguar em Henrique. Em terceiro lugar, nem Arlindo nem Michel tiveram que se preocupar em perder votos no chamado baixo-clero quando disputaram contra Aldo Rebelo, hoje ministro do Esporte.

Desta vez, os dois maiores adversários de Henrique — Rose de Freitas, do PMDB capixaba, e Júlio Delgado (PSB-MG) — têm votos na “geral”, ou seja, entre os deputados que ainda não tiveram tanto destaque no parlamento. Especialmente Júlio, companheiro de futebol de muitos deles. E, nesta eleição, a relação pessoal conta. Para completar, nem Michel nem Arlindo passaram pelo corredor polonês de reportagens como aconteceu com Henrique nos últimos dias. Por tudo isso, todo cuidado que ele tiver hoje será pouco, embora aqueles que entendem do traçado do plenário confiem na vitória do peemedebista. Daqui a pouco, vamos saber.


Ladeira abaixo - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 04/02

Além do aumento do preço da gasolina, anunciado pelo governo federal, a Petrobras voltou a entrar em evidência, semana passada, ao perder o posto de maior empresa da América Latina.

O jornal "Financial Times", um dos mais respeitados

no mundo na área financeira, colocou a colombiana Ecopetrol no topo do ranking das empresas de maior valor de mercado. As ações da Petrobras perderam 45% do valor ao longo dos últimos três anos, de acordo com a publicação britânica.

No decorrer de 2012, com perplexidade, o Brasil foi tomando conhecimento da existência das graves dificuldades na gestão da estatal, com aumento das importações, problemas de caixa, desvalorização de seus papéis no mercado, dentre outros. Houve uma troca brusca no comando da empresa, para tentar colocá-la nos trilhos novamente.

Há um estudo recente que traz uma síntese digna de nota sobre os males capazes de corroer a vida de uma companhia pública. Intitulado "Gestão Estatal: Despolitização e Meritocracia", o trabalho foi realizado pelo Instituto Acende Brasil para o setor elétrico, mas suas conclusões são válidas para a Petrobras e outras estatais mal gerenciadas, de uma maneira geral.

Dentre os entraves descritos na literatura econômica tratados no estudo, destaca-se a administração inepta: os dirigentes são nomeados pela sua lealdade aos governantes, desconsiderando-se as qualificações requeridas para o cargo.

As empresas sofrem também com o uso político que se faz delas. A falta de disciplina orçamentária pesa muito. Por terem como acionista majoritário o governo, muitas estatais vivem na expectativa de que eventuais deficits serão necessariamente cobertos por aportes oficiais. O processo decisório burocrático, típico da má administração pública, acaba sendo a cultura dominante, prejudicando a agilidade necessária.

O estudo cita uma estratégia para se bloquear o uso político das estatais, com uma "blindagem" contra as pressões externas. São medidas como recrutamento profissional e competitivo de diretores, uso de indicadores e metas, transparência nos resultados, prestação periódica de contas e aplicação de incentivos e penalidades por desempenho.

O governo federal está na contramão desses preceitos que poderiam oxigenar -e muito- a economia brasileira. De um lado, ocuparam-se as estatais existentes como se patrimônio do PT fossem. De outro, aumenta-se o número delas -levantamento divulgado ano passado mostra que o PT criou mais estatais que todos os governos pós-militares.

Parafraseando um dilema de outrora, a saúva do aparelhamento partidário pode acabar com o Brasil.

Escuta aí, Renan - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 04/02


“A ética é meio, não é fim”
RENAN CALHEIROS, recém-eleito presidente do Senado, especialista em ética


Conselhos que dou de graça ao recém-eleito presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Nada de voar em avião de carreira — a não ser para o exterior. E sob a condição de ser o último passageiro a embarcar na primeira classe, discretamente. Assim evitará o risco de ser ofendido pelos demais passageiros da econômica. Pelo mesmo motivo, nada de frequentar shoppings. Em Maceió, talvez seja possível.

CUIDADO REDOBRADO quando estiver em Brasília. Aqui todo mundo conhece todo mundo. Nem mesmo disfarçado dá para bater perna à beira do Lago Paranoá. Matricular-se em academias? Nem pensar. Lembre-se: Brasília sediou as maiores manifestações pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor em 1992. E do ano passado para cá, passeatas e comícios contra a corrupção.

DE UMA VEZ por todas, jamais esqueça: sua eleição foi uma bofetada forte na cara dos brasileiros. Daquelas que estalam. A maioria deles pode nem ter sentido — mas foi. E a minoria que sentiu não deve ser subestimada. Ela é conhecida pelo nome de opinião pública. Quando desperta, é um alvoroço. A imprensa está sempre atenta a seus humores e costuma refletir o que ela pensa.

NÃO FALE TANTO em "transparência" como fez no seu discurso de posse. "Vou administrar com transparência’! Ou então "vou criar a Secretaria da Transparência’! Parece deboche. Galhofa. Zombaria. Quem o senhor pensa que é para falar em "transparência"? Depois de ter feito o que fez no passado recente, que idiota acreditará em uma promessa dessa natureza?

EM MAIO DE 2007, a imprensa descobriu que o lobista de uma empreiteira pagava a pensão e o aluguel do apartamento onde morava a jornalista Mônica Veloso, mãe de uma filha sua fora do casamento. O senhor alegou que tinha gado o bastante para justificar suas despesas. Apresentou farta documentação para comprovar o que dizia. Jurou por todos os santos ser inocente.

MESMO ASSIM o Conselho de Ética do Senado recomendou a cassação do seu mandato. E no dia 12 de setembro, o senhor escapou por pouco de ser cassado. Dos 81 senadores, 40 votaram a seu favor, é verdade, mas 35 votaram contra e seis se abstiveram. Se os seis, todos eles do PT, tivessem acompanhado os 35, o senhor perderia o mandato e os direitos políticos por dez anos.

ORIENTE SEUS parceiros para não insistirem com a tese de que sua inocência foi reconhecida duas vezes pelo Senado — em setembro e depois em dezembro daquele ano quando novamente o senhor foi julgado. O segundo julgamento não passou de um embuste. Absolveram-no por larga margem de voto. Em troca, o senhor renunciou ao resto do mandato de presidente do Senado.

POR QUE UMA pessoa duas vezes inocentada renuncia ao que tanto desejaria conservar? Para ser deixado em paz, possivelmente. Para enterrar de vez o assunto. Não deu certo. A Polícia Federal investigou a fundo o rei do gado de Alagoas. E o Procurador Geral da República acabou denunciando-o por desvio de dinheiro público, falsidade ideológica e uso de documentos falsos.

EM RESUMO: apurou -se que o senhor não possuía "recursos disponíveis para custear os pagamentos feitos a Mônica’! Agradeça a Deus Todo Poderoso o fato de a denúncia ter caído no colo do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, que não terá pressa alguma em relatá-la. Mas é recomendável proceder de forma a evitar a eclosão de novos escândalos. De 2001 para cá eles derrubaram três presidentes do Senado. Um vexame!

O motor americano - EDITORIAL O ESTADÃO


O ESTADO DE S. PAULO - 04/01


A economia americana cresceu 2,2% no ano passado, segundo o primeiro cálculo oficial divulgado em Washington. Isso é o dobro do crescimento, cerca de 1%, estimado até agora para o Brasil, o menos dinâmico dos Brics e um dos poucos países, em todo o mundo, atolados numa combinação sinistra de estagnação e inflação (5,8%). Além disso, nenhuma outra economia avançada, nem mesmo a alemã, terá tido um desempenho tão bom quanto o americano, se as novas estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) estiverem aproximadamente corretas. De acordo com essa revisão, a produção bruta dos países mais desenvolvidos deve ter-se expandido cerca de 1,3% em 2012. No cenário do Fundo, publicado na semana passada, o avanço americano deveria ter chegado a 2,3%. Mas a diferença de 1 ponto de porcentagem é pouco relevante nessa circunstância.

A boa notícia veio acompanhada de um dado negativo. No quarto trimestre, o Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos encolheu cm ritmo equivalente a 0,1% ao ano, mas esse recuo foi qualificado como passageiro por analistas experientes. Decorreu cm grande parte de uma redução de gastos militares e de uma queda nos investimentos cm estoques. A avaliação otimista foi reforçada no dia seguinte, quinta-feira, pela divulgação, em Chicago, do índice de atividade dos gerentes de compras, bem superior ao projetado por economistas do mercado. Essa informação é considerada um bom indicador indireto do ritmo da produção industrial.

Na quarta-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, saudou como altamente importante a recuperação lenta, mas aparentemente firme, da produção americana. Afinal, a recuperação da maior economia do mundo é benéfica para todos. Não se sabe se o ministro, antes desse comentário, consultou o líder Luiz Inácio da Silva. O ex-presidente havia-se mostrado muito feliz por chegar ao fim do mandato com o Brasil ainda em crescimento e os Estados Unidos cm recessão. Seria um despropósito, exceto em caso de guerra, festejar as dificuldades de qualquer outro país. Mais que um despropósito, seria uma enorme tolice alegrar-se por uma crise no mais importante mercado do mundo. Mas essa tolice ocorreu.

A recuperação dos Estados Unidos é especialmente importante precisamente pela razão apontada pelo ministro da Fazenda. Se a atividade ganhar impulso na maior potência econômica do mundo, haverá efeitos positivos em todos os mercados. O Brasil será com certeza beneficiado, embora o governo petista atribua prioridade estratégica à relação com outros mercados. A reativação americana favorecerá o País pela importação direta de produtos brasileiros e pelo fortalecimento de grandes clientes do Brasil, como a China.

Além do mais, o mercado americano é um dos principais destinos das exportações brasileiras de manufaturados. Em 2012, a indústria manufatureira vendeu aos Estados Unidos produtos no valor de US$ 13,6 bilhões, 14,9% mais que em 2011. Essa receita correspondeu a 50,5% do total vendido àquele mercado. O comércio com os Estados Unidos foi um dos poucos pontos positivos no balanço do ano passado, quando o conjunto das exportações rendeu US$ 242,6 bilhões, 5,3% menos que em 2011.

O FMI projeta para a economia americana uma expansão de 2% em 2013, bem maior que a prevista para o conjunto dos países avançados, 1,4%. Para a zona do curo a estimativa é de mais um ano de contração. O produto regional deve ter encolhido 0,4% em 2012 e deverá diminuir mais 0,2% neste ano. A atividade global dependerá muito dos emergentes, mas com a ajuda, como em 2012, da recuperação americana. O motor da maior economia de novo contribuirá para impulsionar os mercados.

Essa previsão depende, naturalmente, das negociações entre governo e oposição, em Washington, sobre importantes problemas remanescentes. O abismo fiscal foi evitado no começo do ano, mas falta cuidar da elevação do teto da dívida pública e de questões complicadas, como detalhes dos cortes de gastos e o ajuste das contas públicas no médio prazo. O mundo inteiro será afetado por essas discussões.

Desânimo industrial - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 04/02

A indústria produziu menos em 2012 do que em 2011. A recessão foi expressiva na produção de máquinas e equipamentos e de eletrônicos, mas também padeceram as fábricas de matérias-primas, de têxteis e de automóveis e autopeças.

Atribui-se a letargia industrial à reticência do empresariado em investir. Excesso de capacidade ociosa e de estoques, temor da concorrência estrangeira, lucros reduzidos pelos altos custos e desconfiança com a gestão econômica de Dilma Rousseff estão entre os motivos mais apontados para explicar a retranca das empresas.

Os primeiros sinais de 2013 são ainda de algum desânimo do empresário. A persistência da cautela reforça dúvidas sobre o futuro industrial do Brasil. Caso os problemas das fábricas fossem de natureza mais conjuntural, seria razoável esperar mais confiança dos executivos da indústria. Não é esse o caso, mesmo após a batelada de incentivos oferecidos pelo governo.

Foram reduzidos os impostos trabalhistas. A queda da taxa de juros também reduziu os custos.

Estava prevista, e se confirmou, a redução do preço da energia elétrica. O câmbio mais desvalorizado favoreceu a maior parte do setor. Mesmo o tumulto econômico no exterior arrefeceu, embora parceiros importantes do Brasil, como a Europa e a Argentina, ainda enfrentem sérios problemas.

Dado tal contraste, entre custos menores e contexto mais favorável, de um lado, e lerdeza da indústria, de outro, é natural perguntar sobre a eficiência e a competitividade de alguns setores.

Note-se que o setor automobilístico conta com a benesse de impostos de importação altíssimos, entre outras. Ainda assim, perde espaço para importados.

Cabe indagar se, na atual configuração, o setor têxtil terá como sobreviver à competição dos vizinhos da China, para onde se dirige tal indústria, à procura de custos ainda menores.

Torna-se ainda mais inevitável a questão sobre a viabilidade dos setores de eletrônica e de máquinas, caso tais manufaturas não se dediquem intensivamente à pesquisa e ao desenvolvimento, o que raramente é o caso no Brasil.

Sim, cabe perguntar pelo futuro da competitividade brasileira, dado que o governo arrecada demais e investe quase nada em infraestrutura e que a gestão econômica é confusa e atrabiliária. Mas o setor privado precisa também fazer um exame de consciência.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

"Não há autoridades com prerrogativa de foro"
Procurador-geral da República, Roberto Gurgel,sobre denúncia contra Lula



Brasil passa vexame ao adiar evento da ONU

Após o desastre na organização da Rio+20, o governo brasileiro deu nova prova de incompetência ao adiar, na semana passada, a Conferência Científica da UNCCD, que aconteceria de segunda (4) a sexta, em Fortaleza (CE), para tratar do combate à desertificação e à seca. Avisados em cima da hora, os mais de dois mil participantes de 194 países pedem à ONU o ressarcimento das passagens compradas.


Desorganização

O governo pediu à ONU em junho do ano passado para sediar a conferência de cientistas, e agora alega que não teve tempo.


Só propaganda

O ministro Marco Antonio Raupp (Ciência e Tecnologia) e o governador Cid Gomes anunciaram em agosto de 2011 a realização do evento.


Faça o que digo...

O Ministério de Ciência e Tecnologia afirma reconhecer a “importância da conferência”, mas não sabe dizer para quando foi adiada.


... não o que faço

O Nordeste sofre a pior seca em 50 anos, e a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) sequer assinou documento pela realização do evento.


Visita íntima ajuda o PCC, diz juiz antidrogas

A prisão recente de uma quadrilha internacional de drogas, comandada pelo “Primeiro Comando da Capital” e “Comando Vermelho” com ramificação no Paraguai, reforça a tese do juiz federal e “xerife” antidrogas Odilon de Oliveira, de que a “visita íntima” facilita a manutenção dos “negócios” de milhões de reais do tráfico nos presídios federais, que abrigam “chefões” do PCC e seus comandados.


Íntimo e pessoal

Após por na cadeia mais de 200 traficantes, Odilon critica a lei de execuções penais: “é proibido vigiar o que acontece nas visitas”.


À vontade

Ao contrário dos EUA, o preso fala com os advogados, parentes e supostas mulheres, sem vidro ou telefone monitorando a conversa.


Rolou na rede

Com a gasolina custando mais de R$ 3,00 um “eu te busco” agora vale mais que um “eu te amo”.


Bate e volta

Prefeito reeleito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB) foi o relator do processo no Conselho de Ética sobre a cassação do ex-presidente da Câmara e mensaleiro condenado João Paulo Cunha (PT-SP).


Marcha das centrais

As centrais sindicais organizam marcha em Brasília, no dia 6 de março, para reivindicar o fim do fator previdenciário, a redução da jornada de trabalho e 10% do PIB para educação. A previsão é de 50 mil pessoas.


Tiro no pé

Deputados e senadores estão cada vez mais resistentes às pretensões do Ministério Público Federal, como na emenda sobre prerrogativa de investigação. Acham que a "militância política" da Procuradoria Geral da República, tentando influir na eleição no Congresso, sairá pela culatra.


AntiMP

O senador Mário Couto (PA) foi o único tucano que não escondeu seu voto em Renan Calheiros: deixou claro, na reunião da bancada, que jamais votaria em um procurador, como é o caso de Pedro Taques.


Olho em 2014

O deputado Miro Teixeira (RJ), que sugeriu ao PDT o aumento de candidaturas em 2014, não descarta a possibilidade de disputar o governo do Rio: “Não posso propor uma luta, e me recusar a travá-la”.


Welcome

Obrigado pela PF a sair do país por trabalho irregular no aeroporto do Galeão, o sargento americano Cody Tallent deixou “herdeiros”: além das aéreas estrangeiras até a Receita Federal terceiriza seus serviços.


Ouro verde

Ambientalistas do Rio pedem ao ministro Celso Amorim (Defesa) que preserve o bucólico bairro do Leme das garras do Exército, que quer faturar com bondinho unindo três morros tombados ao Pão de Açúcar.


Incompetência

A estatal Infraero resolveu economizar nos contratos com empresas de limpeza, e lançar campanha sugerindo que as pessoas façam xixi em casa, antes de seguir para o aeroporto. Só falta pedir que levem papel.


Muy amigo

Lula festejou em Cuba o ritmo “extraordinário” das obras no porto de Mariel, financiadas pelo Brasil. Já as obras da Copa e do PAC...


Poder sem pudor

A origem dos charutos

Deputado da UDN gaúcha, o general Flores da Cunha escandalizou a Câmara ao defender o presidente Getúlio Vargas da acusação do líder da bancada, Carlos Lacerda, de ser conivente com a corrupção. Getúlio ficou encantado e mandou uns charutos para o general, mesmo temendo sua reação. O funcionário do Catete encontrou-o numa roda de parlamentares:
- Trago uns charutos que o presidente mandou.
- Que presidente, meu filho? – respondeu, fazendo-se de desentendido.
- O presidente do Flamengo – inventou o cuidadoso portador.
- Ah, bom. Então me dê os charutos.

SEGUNDA NOS JORNAIS


Globo: Tragédia de Santa Maria – Até capitais ignoram número de boates
Folha: Governo prepara nova banda larga para 2014
Estadão: Caixa e BB vão disputar com BNDES empréstimo para as concessões
Correio: Tragédia em Santa Maria – Fiscalização fecha 26 bares e boates no DF
Valor: Certidão cria corrida para pagar dívidas trabalhistas
Estado de Minas: Aprovado (mas ainda há o que corrigir)
Jornal do Commercio: De olho na volta às aulas
Zero Hora: Sem plano, boate nunca deveria ter sido aberta