segunda-feira, março 24, 2008

ACENDER AS VELAS

Artigo - RUY CASTRO
Folha de S. Paulo

Nos EUA, os senadores Barack Obama e Hillary Clinton têm conseguido conduzir suas campanhas à indicação pelo Partido Democrata sem golpes baixos ou referências àquelas que, para todo mundo, são suas caraterísticas mais evidentes: o fato de serem um negro e uma mulher. E nem eles são malucos: qualquer alusão a gênero ou cor da pele significaria derrota imediata para o agressor.
No Rio, a campanha pela prefeitura nem começou, e um candidato já jogou o nível da discussão para o fundo do poço: o senador Marcelo Crivella (PRB), ao acusar um possível adversário, o deputado Fernando Gabeira (PV-PSDB-PPS), de defender "aborto, homem com homem e maconha". Supondo que a plataforma de Gabeira contemple esses itens, a grossura com que Crivella trata o assunto dá uma idéia do que fará ou dirá se for eleito.
Esta é uma forma perigosa de tratar a política. Crivella falou para o eleitorado como fala para as platéias de seus templos, onde deve reinar a homofobia. Imagine se Gabeira, em retaliação, apelar para o voto católico -que, queira ou não o evangélico Crivella, ainda é majoritário no Brasil. De repente, a eleição para a Prefeitura do Rio pode se transformar numa guerra religiosa, valendo, de um lado, chutes na santa e, de outro, a excomunhão de "bispos" suspeitos.
Todos os candidatos têm características pessoais passíveis de ser exploradas pelos adversários. O próprio Crivella, também "bispo" (ou ex, como prefere), é ligado a uma igreja que vive tendo de se explicar na Justiça. Mas, até prova em contrário, não seria justo confundi-lo com ela.
O presidente Lula já demonstrou sua disposição para fazer acordos com Deus e o diabo para derrotar a Rede Globo. Ao apoiar o senador Crivella, ele acende uma vela a um e a outro.

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