segunda-feira, outubro 22, 2012

NOTA DE ESCLARECIMENTO DE ELISEU PADILHA

Sobre a nota "DOIS EX-MINISTROS PROCESSADOS POR IMPROBIDADE" publicada na COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO em 20/10, recebí correspondência do ex-ministro Eliseu Padilha que transcrevo abaixo.



Prezado Sr. Murilo.

Como vi a publicação da matéria intitulada DOIS EX-MINISTROS PROCESSADOS POR IMPROBIDADE, relativamente a abertura de processo por improbidade administrativa, contra mim e o Ministro Eduardo Jorge, peço para esclarecer, no mesmo espaço que:

I - Não se trata de um novo processo ou coisa da ordem. Esta ação tramitava desde o ano de 2003 e a Justiça Federal de Primeira Instância já a havia rejeitado;

II - Como o Ministério Público Federal recorreu, a notícia dada por ele que motivou sua postagem é de que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília, teria decidido pelo andamento de tal Ação;

III - No Mérito, caso tal Ação venha a tramitar, nada, absolutamente nada tenho a temer. Nada fiz de improbo. Logo não há do que temer. Minha participação no assunto foi a seguinte:

1 - Meu Gabinete recebeu, da Secretaria Geral da Presidência da República o Aviso 214/SGEm 23 de setembro de 1997, expediente de rotina, nos seguintes termos:

"Aviso 214/SGEm 23 de setembro de 1997

Senhor ministro, Encaminho, em anexo, a correspondência do Deputado Alvaro Gaudêncio Neto, que trata de assunto relacionado a área de competência desse Ministério.

Muito agradeceria providências de Vossa excelência que permitam o exame do referido documento e, posteriormente, o envio de informações a esta Secretaria-Geral do
seu resultado.

Atenciosamente.

EDUARDO JORGE CALDAS PEREIRA

2 - Cumprido a praxe do Ministério, tal correspondência e o anexo foram encaminhados para a Autarquia DNER, que tinha Autonomia Administrativa, para a avaliação do solicitado pela Secretaria Geral da Presidência da república. Esta foi a participação de meu Gabinete. Encaminhar, sem acrescer ou subtrair nada;

3 - Tanto no expediente de rotina da Secretaria Geral da Presidência da República, quanto no encaminhamento de tal correspondência ao DNER, nada foi Sugerido, Determinado ou Autorizado.

Tratava-se de mero pedido de informação a uma Autarquia que tinha Autonomia Administrativa.

IV - O fato imputado na Ação do Ministério Público Federal não existe. Não houve nenhuma improbidade de minha parte. Daí porque, passados 15(Quinze) anos - desde 1997 -, sequer o processo estava em andamento;

V - Se e quando eu for instado a me manifestar em tal processo, repetirei o que já fiz antes da Justiça Federal de Primeira Instância o rejeitar: Comprovar que o fato improbo a mim atribuído não existe;

VI - Lastimo profundamente que esta notícia tenha sido "requentada", pela enésima vez, com o fito exclusivo de, injustificadamente, menosprezar e prejudicar a alguns e valorizar e elevar a auto estima de outros.

Agradeço pela oportunidade de, com sua publicação desta, ser conhecida a outra face de tal "requentada" notícia.

Atenciosamente.

ELISEU PADILHA.

Libertando o dragão - RICARDO AMORIM

REVISTA ISTO É


É preciso atenção redobrada com uma série de fatores que favorecem a volta da inflação

Em todo conto de fadas que se preze, para conquistar a formosa princesa, o príncipe precisa antes derrotar um temível dragão. Com a economia brasileira não foi diferente. Por quase duas décadas, nossa princesa do desenvolvimento foi refém do dragão da inflação.

A partir do Plano Real fomos gradualmente domando o monstro. O controle da inflação, somado ao aumento da população em idade de trabalho e aos impactos na economia brasileira da entrada da China na OMC, permitiu que a taxa média de crescimento do PIB do País a partir de 2004 fosse o dobro da média dos 24 anos anteriores. Além disso, a distribuição de renda melhorou muito.

Desde 1999, o dragão inflacionário brasileiro esteve amarrado a um tripé chumbado firmemente. Sua primeira perna é o regime de metas de inflação. À medida que elas foram sendo atingidas, a credibilidade do regime e sua capacidade de balizar as expectativas inflacionárias

e de reduzir o risco de uma aceleração foram crescendo.

A segunda perna do tripé é o câmbio flutuante. Quando a economia mundial está aquecida, os preços das matérias-primas que exportamos sobem e as entradas de capitais no país aumentam, valorizando o real e barateando produtos importados, o que segura a inflação.

A terceira perna é a política de superávit primário do governo. Além de garantir a solvência brasileira - evitando que o País passe por uma crise similar à de muitos países europeus -, essa poupança pública para pagamento de juros limita os gastos do governo, reduzindo o risco de que a demanda interna se aqueça e alimente a fogueira inflacionária.

Acontece que, de uns tempos para cá, o governo vem serrando as três pernas do tripé. O Banco Central tem reduzido a taxa de juros, mesmo com a inflação acima da meta e em elevação. Para piorar, muitos já desconfiam de sua independência em relação ao governo e

de sua capacidade de apertar o cinto, elevando a taxa de juros para segurar a inflação, quando necessário.

A julgar pelos últimos meses, o dólar agora só pode flutuar entre R$ 2 e R$ 2,05. Uma taxa de câmbio mais desvalorizada encarece produtos importados, elevando a inflação.

Por fim, o governo já admite que a meta de superávit primário não será cumprida. De quebra, para proteger alguns setores da indústria, o governo vem elevando a alíquota de importação de diversos produtos, colaborando para preços e inflação mais altos por aqui.

Não bastasse o tripé já meio bambo, o dragão está ganhando força por outros fatores. O desemprego é o mais baixo da história, gerando elevações de salário acima da inflação, o que é ótimo do ponto de vista social, mas também eleva os custos de produção, pressionando os preços.

Além disso, os países ricos emitem moeda no ritmo mais acelerado da história. Isso eleva os preços de matérias-primas, ajudando nossas exportações.

No entanto, sem apreciação cambial, a inflação por aqui aumenta. O preço da gasolina, por exemplo, subirá em breve ou a Petrobras terá de cancelar investimentos.

Por fim, a quebra de safra de grãos em várias partes do mundo devido a um clima desfavorável elevou ainda mais os preços dos alimentos.

Em resumo, se o governo não voltar a reforçar o tripé anti-inflacionário, não se assuste se encontrar o dragão inflacionário voando cada vez mais alto e levando com ele nossa princesa do desenvolvimento.

Sexo virtual - WALCYR CARRASCO

REVISTA ÉPOCA

Confesso: nunca pratiquei. Não nego que tenho certo preconceito, mas quem sabe um dia?



Um amigo notou que o filho adolescente quase não saía mais de casa. O garoto tinha poucos amigos, vida social mínima. O tempo todo no computador. Finalmente, descobriu que o filho “namorava” pela internet. E como! Gatonas mais velhas, com perfil falso. Gatinhas de sua idade, com o verdadeiro. Tudo virtual. Meu amigo ainda não sabe o que fazer. Descobriu que filhos de outros amigos têm o mesmo problema. A internet substituiu a vida social. E, em muitos casos, também a sexual. Como orientar um jovem nesse mundo?

– Eu esperava ter de discutir com meu filho por causa de baladas, porres. E não porque se apaixona pela internet.

– O mundo mudou tanto que já nem sei o que é normal ou deixa de ser – respondi. O computador transformou o jeito de viver das pessoas.

Suspeito quanto o garoto, no fogo da idade, apronta na internet. Não é só coisa de adolescente. Ouço tantas histórias de sexo virtual que, embora não tenha dados estatísticos (e quem vai conseguir?), tudo me faz acreditar que se tornou mais comum do que se pensa. Sob um perfil fake, alguém pode realizar as fantasias. Sem contato físico, é verdade. Mas a mente humana é tão poderosa que, para muita gente, o corpo a corpo talvez se torne até desnecessário. Já não era assim nos tempos do telefone erótico? Ligava-se para um número, a garota “se descrevia”, e o cliente vivia momentos selvagens, cobrados minuto a minuto. O embrião de tudo isso é antigo. Na peça Cyrano de Bergerac, de Edmond de Rostand, do século XIX, o narigudo personagem conquista a bela Roxane escrevendo cartas que o atlético Cristiano envia em seu nome. Um personagem se passa por outro, para viver uma história de amor. Conheço um paulista magro, com cara de vassoura, que entra na internet usando as fotos de seu melhor amigo, malhado e bonitão. Tem incríveis sessões de sexo virtual com mulheres maravilhosas. Quando a garota quer conhecê-lo pessoalmente ou, o que é mais comum, através da câmera, desliga.

– Quando mandava minha foto, elas não respondiam mais. Agora me divirto.

Não fiz mais perguntas. Respeito a loucura alheia.

– Você primeiro, escreveu o professor.Riscos existem. Não só com desconhecidas. Há algum tempo, o juiz de futebol celebridade Diego Pombo abriu a câmera, ficou nu e praticou um sexo que só não foi solitário porque a namorada o observava pela câmera, em casa. A safada gravou tudo, e as imagens foram parar na internet. O rapaz reclamou da “traição”. Tarde demais. O mesmo já aconteceu com outras celebridades. E com gente menos famosa também. Num colégio da periferia de São Paulo havia um diretor heterossexual e autoritário que hostilizava um professor efeminado. Uma noite, o professor entrou numa sala de bate-papo com nome falso. Conversou com um desconhecido. Foram para um chat privado. O desconhecido propôs ligarem a câmera.

Era o tal diretor! O professor simulou um problema em sua câmera e partiu para uma longa simulação de sexo virtual, com pedidos exóticos, tipo:

– Agora abre as pernas!

E o diretor abria. Que escândalo! A gravação foi vista por todo corpo docente e boa parte dos alunos da escola. Até hoje o diretor não sabe onde enfiar a cara.

A fantasia sempre ocupou um enorme papel nas relações íntimas. Na internet, ela pode atingir o ponto máximo. Tanto que pessoas de comportamento tradicional em público, como o tal diretor, são capazes de desfraldar os desejos para um desconhecido, sem pudor, no chat privado. Só entendi o real papel da fantasia quando estive no Japão. Descobri: há homens que se apaixonam por bonecas tamanho natural. A ponto de, nos fins de semana, levarem para passear de carro. Imagino que, quando a robótica se unir à indústria erótica, serão fabricados robôs femininos e masculinos com equipamento sexual completo. Será um passo adiante do sexo virtual, pois o robô corresponderá à fantasia absoluta do outro. Só dependerá de uma programação. Amor e romantismo serão palavras sem sentido, possivelmente. O estranho, o original, será o casal formado por dois seres humanos de carne e osso.

Posso ter exagerado. Mas é por isso tudo que, não nego, tenho certo preconceito contra o sexo virtual. Onde nos levará? Confesso: nunca pratiquei. Até me sinto ultrapassado. Sou do tipo que nunca diz: “Desta água não beberei”. Quem sabe um dia? Mas não está nos meus próximos planos. Ainda gosto de conhecer alguém, olhar nos olhos e dividir a vida.

A ETERNA FALÁCIA DAS COTAS - REVISTA ÉPOCA

REVISTA ÉPOCA


O governo federal está prestes a cometer mais um erro ao estabelecer preferências raciais na contratação de funcionários


O governo federal planeja anunciar, em novembro, a adoção de cotas para negros no funcionalismo público federal. A cada concurso, um determinado número de vagas será reservado a candidatos de acordo com a cor de sua pele. Eles terão de fazer as provas como todos, mas suas chances serão diferentes. Trata-se de uma consequência do Estatuto da Igualdade Racial, aprovado em 2010, a primeira lei em mais de um século que distingue brasileiros por sua cor. É inegável que negros sofrem preconceito no Brasil e, por isso, vivem em condições sociais mais desfavoráveis. Não há evidências, porém, de que a garantia de espaço no funcionalismo público ou nas universidades seja uma maneira eficaz de acabar com isso. A política de cotas promete criar apenas mais uma distorção na já ineficiente máquina estatal brasileira.

A justificativa recorrente de “movimentos sociais” para a adoção de políticas de cotas é a necessidade de corrigir a injustiça provocada pelo passado escravocrata brasileiro. É uma visão simplista de uma questão complexa. A genética mostra que o brasileiro é essencialmente mestiço. Brancos têm genes de negros e vice-versa. Acreditar que os negros brasileiros de hoje são descendentes dos escravos é falta de conhecimento. A união de cotas e emprego público formaliza apenas duas compulsões nacionais: por garantir um espaço econômico com menor concorrência e por pendurar-se no Estado. A partir de 1988, a exigência de concursos consolidou um procedimento civilizado para selecionar funcionários. Apesar do ainda elevado número de cargos que podem ser preenchidos por critérios políticos, a maioria dos servidores é escolhida com base no mérito e na competência. Mas o mérito não pegou no Brasil.

Desde o início das discussões sobre cotas, seus defensores buscavam espaço em universidades e empregos públicos. É curioso que se tente privilegiar o ingresso nos dois últimos passos do caminho profissional, em vez de tentar resolver as deficiências crônicas do ensino fundamental e médio - incapaz de garantir a igualdade de oportunidade tão preconizada pelos movimentos sociais. Será que seus integrantes aceitariam trocar as cotas raciais em universidades ou no serviço público por cotas sociais para crianças pobres nas melhores escolas no ensino fundamental ou médio? Se isso ocorresse, as crianças teriam tempo de aprender e, mais tarde, por seu próprio esforço e mérito, disputar vestibulares e concursos públicos sem precisar da garantia de preferência pela cor da pele.

As cotas raciais foram adotadas nos Estados Unidos na década de 1970, como forma de corrigir distorções causadas por 80 anos de política segregacionista. Foram abandonadas por decisão da Suprema Corte. Na África do Sul, provavelmente o caso mais brutal da história, elas surgiram ao final do regime do apartheid como forma de integrar os negros. Recentemente, migrantes chineses obtiveram o direito de ser incluídos no sistema. Na índia, as castas disputam a tapa o direito de entrar em alguma cota. O Brasil republicano, que nunca separou as pessoas pela cor da pele, trilha agora esse caminho, em vez de aprender com os erros e acertos de quem já andou por aí e teve de voltar atrás.

Minha casa, minha vida - REVISTA VEJA

REVISTA VEJA

O programa do governo de combate ao trabalho escravo era exemplar... até aparecer uma grande empreiteira

ADRIANO CEOLIN

Na próxima semana, o Diário Oficial da União vai publicar a exoneração de Vera Lúcia Albuquerque, secretária de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho. A servidora ocupava o cargo havia quase dois anos e, nos últimos meses, começou a ser pressionada para não cumprir o seu dever. Em março do ano passado, fiscais do Ministério do Trabalho depararam em Americana, no interior de São Paulo, com uma daquelas cenas que ainda constrangem o Brasil. No canteiro de obras de uma empreiteira responsável pela construção de residências do projeto Minha Casa, Minha Vida — o mais ambicioso programa habitacional do governo federal para a população de baixa renda -, foram resgatados 64 trabalhadores mantidos em condições tão precárias que, tecnicamente, são descritas como "análogas à escravidão". Eles eram recrutados no Nordeste e recebiam adiantamento para as despesas de viagem, hospedagem e alimentação. A lógica é deixar o trabalhador sempre em dívida com o patrão. Assim, ele não recebe salário e não pode abandonar o emprego. É o escravo dos tempos modernos.

Os fiscais de Vera Lúcia encontraram trabalhadores em condições irregulares nos canteiros de obras tocadas pela MRV, a principal parceira do governo no Minha Casa, Minha Vida. Isso colocou a construtora na lista das empresas que mantêm seus empregados em condições degradantes, o que as impede de fazer negócios com a União e receber recursos de órgãos oficiais. Assim, em obediência às regras, a Caixa Econômica Federal suspendeu novos financiamentos à MRV, cujas ações perderam valor na bolsa. O que Vera Lúcia não sabia é que muita gente acima dela considera a construtora intocável. Ela conta que começou a receber pressões de seus superiores no ministério para tirar a MRV da "lista suja”. A auditora resistiu, mas as pressões aumentaram muito depois de uma visita de Rubens Menin, dono da MRV, ao ministro do Trabalho, Brizola Neto. Desde então, ela passou a ser questionada pelos assessores do ministro sobre a legitimidade da inspeção da obra de Americana. Um deles chegou a insinuar que os fiscais não tinham critérios nem qualificação para autuar as empresas. "Estão querendo pôr um cabresto político na inspeção do trabalho", disse Vera, dias depois de renunciar ao cargo.

Após a incursão no Ministério do Trabalho, Menin e diretores procuraram Maria do Rosário, ministra da Secretaria de Direitos Humanos, e Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência. Eles tentaram demonstrar que os problemas apontados pela inspeção já haviam sido resolvidos. Na conversa com a ministra Maria do Rosário, a construtora se ofereceu para aderir ao Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, convenção entre o governo, entidades da sociedade civil e empresas. ‘Ainda assim, pelas regras, não havia como tirar a MRV da lista”, disse José Guerra, coordenador-geral da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo.

Além da falta de pagamento de salários e da retenção da carteira de trabalho, os fiscais encontraram o alojamento em péssimas condições de higiene, além de comida de má qualidade e estragada. O relatório da fiscalização listou 44 infrações na obra, comprovadas por meio de fotos e depoimentos de trabalhadores. ”Os trabalhadores tinham restringido seu direito de locomoção em razão de dívida contraída com o empregador, da retenção de suas carteiras de trabalho e, principalmente, por meio do não pagamento do salário”, diz o relatório. Assinado por dois auditores fiscais, o documento afirma que a MRV usou empresas terceirizadas para diminuir custos trabalhistas e aumentar a margem de lucro do empreendimento: “Os contratos de prestação de serviços firmados pela MRV não passam de simulacros”. Os fiscais também registraram o fato de que os proprietários das empresas terceirizadas eram ex-funcionários da própria MRV.

Entre 2003 e 2011, o governo flagrou 35 000 trabalhadores mantidos em condições degradantes. A maior parte dos casos ainda ocorre em fazendas do Norte, mas eles já não são mais uma raridades em áreas urbanas.

A fiscalização e a inclusão das empresas infratoras no cadastro são os instrumentos mais eficientes para inibir a ação dos exploradores. Vera acredita nisso e não cedeu. Só restou ao ministro Brizola Neto indeferir o pedido de reconsideração feito pela MRV ao ministério. A empresa, porém, conseguiu decisão favorável, em caráter liminar, no Superior Tribunal de Justiça. Por essa razão, setores do governo estudam mudanças nos critérios de inspeção. “Há um debate sobre a necessidade de aperfeiçoar os procedimentos de inclusão de empresas na lista, para evitar que eles possam ser questionados na Justiça, como vem ocorrendo”, informa a Secretaria-Geral da Presidência. Fica a lição: não apenas a escravidão, mas as demais mazelas do país tendem a se perpetuar enquanto as Veras Lúcias do serviço público forem obrigadas a sair do caminho por se recusarem a trair sua consciência e compactuar com o erro.

O Brasil é mestiço - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 22/10

Sexta, por volta de 17h, um filho do nosso casseta Hélio de la Pena, Joaquim, de 20 anos, estava com amigos em frente ao BB Lanches, no Leblon, no Rio, quando PMs armados desceram de uma viatura e revistaram o grupo, ameaçadoramente. Em seguida, desculparam-se e alegaram estar "em operação para evitar um assalto à agência do banco Itaú”
Sei não. Parece racismo.

Segue...
O querido humorista ficou triste:
— Não consigo imaginar um bando de assaltantes tomando açaí ao lado do local que planejam assaltar. Fico pensando se a truculência não teria a ver com o fato de meu filho não ser exatamente um tipo caucasiano. Isto não é mais admissível nem no Leblon nem no Complexo do Alemão.
Ele está certo.

‘Ex-my love’

Estão péssimas as relações do Palácio do Planalto com Eduardo Campos, governador de Pernambuco.

Dilma e Carminha

Dilma é noveleira. Mas não deu muita bola para "Avenida Brasil”
Por isso, não lamentou ter perdido o último capítulo, sexta (estava no avião, voltando a Brasília, depois do comício de Nelson Pelegrino em Salvador).

Mas...
A presidente cuidou para que o comício na Bahia terminasse às 21h.

Erro de impressão

A Casa da Moeda já detectou o erro de impressão no lote de passaportes enviado ao nosso consulado em Nova York, que causou a suspensão temporária da emissão do documento lá, motivo de nota aqui sábado.
A empresa diz que uma falha foi encontrada no chip do fornecedor, e as providências estão sendo tomadas.

CIDADE MARAVILHOSAQue cidade no mundo, com o perdão das demais, proporciona um amanhecer como este? Veja o postal captado pelo fotógrafo Marcos Estrella, parceiro da coluna, do alto da Floresta da Tijuca, ontem, nos primeiros minutos do primeiro dia do horário de verão. Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara, abençoe eternamente a querida cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, e a nós não desampare jamais, amém.

Frankfurt 2012

A Intrínseca, a editora da trilogia-sensação "50 tons” adquiriu, na Feira de Frankfurt, o direito de editar o novo livro de Míriam Leitão.
"A história do futuro: o mapa do caminho do Brasil no século XXI’,’ próximo livro da coleguinha, representada pela agência Villas-Boas & Moss, será lançado em 2014.

Maldita, o filme
O livro "A onda maldita’? de Luiz Antonio Mello, que a Nitpress lança dia 27, no Circo Voador, no Rio, vai virar filme, com produção de Renata Almeida Magalhães, direção de Tomás Portella e roteiro de L. G. Bayão.
Conta a história da Fluminense FM, a rádio de rock que revolucionou o dial carioca nos anos 1980.

Isso não se fazComo diria o saudoso Zózimo, não convidem para o mesmo "Bataclan’ (com todo o respeito) Michel Temer e os salientes de Corumbá, MS.
A turma ficou sem diversão estes dias no bar Ponto Chic, reduto de saliência, porque a segurança do vice, que visitava a cidade, reprimiu o negócio. O preju foi de uns R$ 6 mil.

Adams é o caraÉ visível o prestígio do gaúcho Luís Inácio Adams, 47 anos, com a presidente Dilma.
O advogado-geral da União passou a ser consultado para tudo — da regulamentação do polêmico novo Código Florestal a propostas de licitação de aeroportos para os Jogos de 16 e a Copa de 14

Calcinha da madame

Uma empregada doméstica, "cansada de lavar as calcinhas da patroa” procurou o seu sindicato no Rio.
Entrou com ação, alegando "constrangimento’,’ e conseguiu um bom acordo.

Mosquito globalizado
Ajoalheira Henriqueta Hermanny, que lança coleção hoje no Casa Cor, pegou dengue em... Hong Kong.

Papai Noel chegou

Já chegou o Natal na Rocinha.
No fim de semana, camelôs da comunidade já vendiam pisca-piscas natalinos.

Samba da Portela

A direção da querida Portela, sobre nota aqui no sábado, diz que "não é a única a fazer ajustes nos sambas vencedores’ e que "existe, inclusive, um documento assinado pelos compositores, garantindo este direito” É pena.

No mais...

Agora que já se sabe até o quarto segredo de Fátima (quem matou Max)... Salve Jorge.

Sempre na multidão - LUCIA GUIMARÃES


O Estado de S.Paulo - 22/10


NOVA YORK - Encontrei em casa um pedaço de papel amarelado, com caligrafia infantil, que dizia, em inglês:

"Ela está numa reunião".

"Ela está em reuniões fora do escritório, volta amanhã."

"Ela não pode atender no momento, por favor deixe seu número de contato."

Reconheci a caligrafia da minha filha e me lembrei que, no milênio passado, ela se esbaldou no escritório, brincando de recepcionista. A "chefe" temporária havia lhe dado uma lista de instruções para evitar atender clientes. A idade do pedaço de papel já era traída por seu conteúdo analógico. Quem pode, hoje em dia, adiar um problema sob a desculpa de que está fora do escritório?

Acabo de receber mensagem de uma conhecida autora e jornalista, pedindo desculpas por não ter respondido a um pedido de entrevista por email. Durante três semanas. "Estava em Londres", ela se explicou, talvez arrependida por não ter gravado um segmento de TV sobre seu livro.

Não contestei a desculpa, mas lembrei que, quando estava numa área deserta da costa do Estado do Maine, onde as torres de celular são escassas, ainda assim mandei email para provocar o Sérgio Augusto, que não suporta a água fria, toda gabola. Tinha mergulhado no mar com temperatura de 14° C. Ele reagiu com horror munchiano. Lembro que uma versão da tela O Grito, de Edvard Munch, está chegando ao MoMA de Nova York, esta semana.

Quantas vezes você já teve um diálogo semelhante a este:

- Fulana não retornou minha chamada, deve estar viajando.

- Mas ela postou uma foto no Facebook, jantando no restaurante aqui perto.

Quando Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, disse que os jovens contemporâneos esperam menos privacidade, reagi à sua declaração como uma indignação orwelliana. Mas ele constatou o mundo que ajudou a criar.

Meu estimado coconspirador de Caderno 2, Lee Siegel, andou preocupado comigo. Ele disse que eu estava tuitando com uma produtividade tolstoiana, digna do autor de Guerra e Paz. Expliquei que não tinha perdido o juízo - ainda - e que a enxurrada de tweets que ele notou se devia ao nosso blogging ao vivo em noite de debates eleitorais, como a desta segunda-feira, no Radar Global do Estado. Além disso, não tuíto sobre a salada de atum que estou comendo e sim sobre o que considero digno da atenção coletiva.

O fato é que estamos nos transformando em recrutas voluntários num ecossistema huxleyano. No nosso admirável mundo novo, se você tiver contas no Facebook, Twitter Tumbler e outras mídias sociais, pode praticar voyeurismo como um esporte extremo, com amigos e estranhos.

Confesso: outro dia, estava atrasando a entrega de uma reportagem e senti uma tentação irresistível de tuitar um link muito engraçado. Desisti. Se ela tem tempo de tuitar, dirá a produtora, por que não se concentra no prazo vencido? Percebi que havia voltado à adolescência, quando tentava burlar a vigilância paterna.

Vadiar, procrastinar é uma parte integral da criatividade. Você já teve uma idéia no chuveiro ou no trânsito, mais produtiva do que horas de sofrimento diante da tela em branco?

Mas o acesso constante ao que fazemos, onde estamos, o que nos preocupa é uma perda real de privacidade. Como disse o especialista em Direito Constitucional, Jeffrey Rosen, aoAliás, a privacidade impede que sejamos julgados fora de contexto. A fronteira entre o público e o privado, que os arautos da mídia social desprezam, é uma ameaça real à intimidade, o território onde nos permitimos errar. Se a sua intimidade se desenrola numa vitrine, uma vítima certa é a introspecção. E, sem introspecção, como se forma o caráter?

Serra presidente - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 22/10

Já está sendo lançado um movimento no PSDB para que José Serra ocupe a presidência nacional do partido caso ele saia derrotado da eleição à Prefeitura de São Paulo.

FÔLEGO
A eleição dele para o comando do partido seria uma homenagem e uma saída encontrada para que Serra não deixe a vida pública. Já estão previstos os apoios de Fernando Henrique Cardoso e Geraldo Alckmin à ideia. E a oposição de Aécio Neves (PSDB-MG).

EM CASA
A Prefeitura de São Paulo também distribuiu às escolas de sua rede materiais que tratam de diversidade sexual. Um dos livros, destinado a alunos de dez anos, explica que a cidade de SP tem famílias de muitos tipos: nuclear monogâmica, multinuclear (em que as crianças transitam por casas de dois ou mais casamentos dos genitores), com filhos adotivos, com avós criando netos e também "família de casal homossexual sem filhos" e de "casal homossexual com filhos".

EM CASA 2
O material foi enviado por Alexandre Schneider (PSD-SP), candidato a vice de Serra, quando era secretário municipal de Educação. Apesar da polêmica que o assunto tem causado na campanha, ele afirma que não vê "problema" em tratar do tema nas escolas com as crianças. "A sociedade ainda tem níveis grandes de intolerância e seria um equívoco não abordarmos o assunto. Falamos não só das diferenças ligadas à sexualidade como também em relação aos deficientes, por exemplo, o que ajudou muito na inclusão de alunos com problemas nas salas de aula."

EM CASA 3
Quando secretário, Schneider estendeu aos funcionários gays os mesmos direitos dos heterossexuais, como o de licença em caso de morte. "A maior riqueza da nossa sociedade é a sua diversidade", diz ele.

BOLSA CAUÃ
Com o fim de "Avenida Brasil", Cauã Reymond pode agora se dedicar à sua estreia como produtor de cinema. Ele desembarca nesta semana em SP para apresentar a algumas empresas o projeto de "Azuis", filme baseado na obra de Rodrigo de Souza Leão.

DA SERRA AO MAR
"Sangue Azul" será a primeira grande produção rodada integralmente no arquipélago de Fernando de Noronha (PE). Para viver o protagonista, Daniel Oliveira abriu mão da superprodução "Serra Pelada", de Heitor Dhalia.

O longa sobre o garimpo seria inicialmente rodado no meio do ano, mas acabou atrasando e embolando suas filmagens com as de "Sangue" -ambas em novembro.

HOMEM-BALA
Oliveira será um homem-bala no filme. "A história começa com um circo voltando para a ilha e trazendo como atração principal um menino que tinha saído de lá há 20 anos", conta o produtor Renato Ciasca. A atriz Carol Abras, que foi a Begônia de "Avenida Brasil", vai interpretar o par do protagonista. A direção é de Lírio Ferreira ("Árido Movie").

MY NAMES IS NEYMAR
Neymar nem inaugurou seu complexo esportivo, a Arena Soccer Grass Neymar Junior, em São Paulo, e já tem proposta para abrir uma unidade na Flórida, nos Estados Unidos.

E na festa de inauguração do espaço, hoje, o cantor Robson Machado, que canta "Vem Dançar com Tudo", da abertura de "Avenida Brasil", fará um show.

CABARÉ
O ator e diretor Cacá Rosset e a pianista Cida Moreira reencenam nos dias 16 e 17 de novembro, na Casa de Francisca, o espetáculo-cabaré "Ornitorrinco Canta Brecht e Weill". Rosset e seu grupo, o Ornitorrinco, montaram a peça nos anos 70.

Lança doida
Junior Franch

A novela está longe do fim para Gaby Amarantos, 34. Depois de "Ex Mai Love" em "Cheias de Charme", a paraense emplaca "Beba Doida" em "Salve Jorge", ambas na Globo. Como atriz, vai participar de série da Fox produzida pela O2, de Fernando Meirelles.

A parceria com a produtora não fica por aí: Gaby será dirigida por Cassiano Prado no clipe de "Chuva". Ela tem planos, ainda, de gravar um DVD com um diretor francês. "É ótimo poder ser eu mesma e deixar de ser conhecida como a Beyoncé de algum lugar."

CHORANDO SE FOI
Denise Fraga interpreta uma moradora de rua em "Chorinho", de Fauzi Arap, que estreou no teatro Eva Herz. Os atores Leopoldo Pacheco e Guilherme Leme foram ver a peça, em que também atua Cláudia Mello.

LIBERDADE EDITORIAL
O médico e apresentador Drauzio Varella lançou o livro "Carcereiros". Sua mulher, Regina Braga, e a atriz Bárbara Paz foram à sessão de autógrafos, na Livraria Cultura.

Curto-circuito

Maria Gadú e a portuguesa Mariza se apresentam na premiação do Melhor Dentista do Mundo, promovida pela ONG Turma do Bem, de Fábio Bibancos. Hoje, no teatro Abril.

O Ministério Público de SP lança hoje revista jurídica, na Casa das Rosas.

Zuzu Abuh lê trechos de "Um Lugar para se Perder", livro de Alexandre Staut, na Livraria da Vila dos Jardins. Às 19h30.

A oncologista Silvia Brandalise, do Centro Infantil Boldrini, é tema do documentário "Andrés", exibido hoje no MIS. Livre.

Enterrar os mortos e cuidar dos vivos - J. A. PINHEIRO MACHADO

ZERO HORA - 22/10


Lisboa

A hóspede ranzinza, que fazia palavras cruzadas, chamou um empregado e reclamou que estava incomodada com o som do piano no amplo saguão de entrada do hotel Tivoli. Discretamente, o empregado do hotel informou que ao piano, naquele momento, um gênio, o inexcedível Arthur Rubinstein, depois do café da manhã, decidira alegrar uns amigos lisboetas com uma canja inesperada, tocando uma das peças que apresentaria à noite no teatro.

“Então deixe estar, assim não gasto dinheiro com o bilhete para o concerto dele” – disse a reclamante, sem surpresa, entrando em definitivo para o folclore da cidade e do hotel que é um verdadeiro ícone de Lisboa: ali já se hospedaram Mick Jagger, Claudia Cardinale, Frank Sinatra, Cary Grant, Margot Fonteyn, Nureyev, entre tantas outras celebridades.

Na semana passada, no saguão do Tivoli, em vez de acordes de Rubinstein e do burburinho de famosos, ouviam-se sussurros de conversas nervosas de políticos, empresários e jornalistas. “Crise”, nestes dias, é a palavra mais repetida, nos salões e nas ruas.

Desde o aeroporto, ouvi as reclamações e as incertezas, do motorista ao porteiro do Tivoli, do empresário ao jornalista: o brutal aumento de impostos, as dívidas do país, os cortes de subsídios, empresas grandes e pequenas fechando, desemprego, o governo que vacila e, acima de tudo o pior de todos os males: falta de esperança... No ranking da aflição europeia, pela ordem, só Espanha e Grécia aparecem em situação pior.

A história se repete, nem sempre como farsa, ao contrário do postulado de Marx. Basta ver o que Eça de Queiroz escrevia em 1872: “Nós estamos num estado comparável somente à Grécia: mesma pobreza, mesma indignidade política, mesma trapalhada econômica, mesmo abaixamento dos caracteres, mesma decadência de espírito”. Até parece que foi hoje. Os séculos passam e as dores não mudam.

Fernando Pessoa via no caráter português a vitória da emoção sobre a razão: “A imaginação é tão forte que integra a inteligência, formando uma nova qualidade mental”. Os Descobrimentos seriam o emprego intelectual, prático, da imaginação.

Por isso, tantos séculos atrás, o Infante D. Henrique e o imperador Afonso de Albuquerque, “criadores respectivamente do mundo moderno e do imperialismo moderno”, aflitos com as precariedades da terrinha, teriam convocado Cabral, Vasco da Gama e os outros para lançar Portugal aos mares. Foi a oportunidade, segundo Pessoa, de o país mostrar que a habilidade de fazer tudo constrói a habilidade para ser tudo.

Nesse sentido, é inevitável pensar nas guerras, invasões, terremotos e devastações que desabaram por aqui: em mais de mil anos, Portugal aprendeu a resistir aos problemas e, especialmente, à falta de esperança. É sempre bom, nestas horas, recordar o Marquês do Pombal entre as ruínas da Lisboa devastada pelo terremoto de 1755: “Vamos enterrar os mortos e cuidar dos vivos”.

O amor nos cemitérios - JOSÉ DE SOUZA MARTINS


O Estado de S.Paulo - 22/10


As obras de arte nos cemitérios de São Paulo não celebram apenas a dor. Várias das mais belas celebram o amor. Escritos derradeiros também. Apaixonados que a morte separou mandaram gravar na pedra a poesia de seus sentimentos imorredouros por quem se foi. Raramente são textos de qualidade literária. Mas pode-se vislumbrar nas mal traçadas linhas a beleza que continua a unir quem ficou e quem partiu. Há entre nós uma literatura cemiterial que comporta compreensão. Versos que não foram para os livros, mas para o túmulo. Último arroubo de corações apaixonados e inconformados com a partida dos que se foram antes do tempo.

Mas é nas esculturas que os sentimentos são mais intensos e mais belos. Certamente porque os poemas foram escritos por amadores e as esculturas tenham sido feitas por artistas consagrados ou a caminho da consagração. Já a partir dos anos 1920, surgiram no Consolação, no Araçá e no São Paulo os primeiros monumentos que celebram sem qualquer timidez a paixão no pleno sentido da palavra que é a paixão carnal. Sinal de que os paulistas não se intimidavam diante da carolice repressiva tão característica de nossa sociedade. Ciclo inaugurado com Solitudo, um nu que Francisco Leopoldo e Silva, irmão mais moço do arcebispo dom Duarte, em cuja casa morava e esculpia, talhou em granito, em 1922, para o túmulo de Teodureto de Carvalho e a mulher, no Consolação. Teodureto era advogado, frequentava os meios literários e artísticos. Em 1909, fizera parte do grupo que levou Anatole France ao Alto da Serra para um almoço de despedida.

Também no Consolação, uma escultura de Nicola Rollo, no túmulo da família Trevisiolli, relembra a tragédia de Orfeu e Eurídice, unidos pelo amor e separados pela morte e só na morte se reencontrariam. Amor eterno e mítico.

E no mesmo cemitério uma escultura lindíssima e sensual, anônima, proclama a paixão de um jovem marido, imigrante italiano, por Luisa Crema Marzoratti, falecida em 1922. Na delicadeza do mármore branco, o escultor recobriu pudicamente com um véu de pedra a nudez de uma jovem cujo corpo exuberante insurge-se contra o perecimento descabido e injusto.

Tributo. Mas a grande e emocionante celebração do amor nos cemitérios da cidade de São Paulo é a escultura Último Beijo, de Alfredo Oliani, no túmulo de Antonio e Maria Cantarella, no Cemitério São Paulo. Maria, que faleceria em 1982, dez anos mais moça do que o marido, falecido em 1942, pedira ao escultor uma obra que expressasse com clareza seus sentimentos em relação ao marido morto, o que também manifestou no escrito que acompanha a escultura: "Ó Nino, meu esposo, meu guia e motivo eterno de minha saudade e de meu pranto. Tributo de Maria." Na escultura, um homem em pleno vigor e cheio de vida beija, no estertor da paixão, a mulher morta.

A chave dos votos - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 22/10


Aos políticos interessados em se manter ou conquistar poder em médio prazo, leia-se 2014, recomenda-se cruzar os dados das eleições municipais que terminam no próximo domingo com os estudos sobre a classe média brasileira. Isso porque a nova classe C passou a englobar mais da metade dos brasileiros pela primeira vez em 2011, ou seja, a força eleitoral dessa massa está em curso de forma inédita neste pleito.

Os dados sobre a nova classe média podem ser encontrados no site da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), que, no ano passado, fez um seminário a respeito em Brasília. Aí, instituições oficiais, sociólogos, economistas, educadores e toda uma gama de profissionais e associações de classe apresentaram seus estudos e estatísticas.

Mostrou-se, por exemplo, que, em 1992, quando Itamar Franco assumiu o poder e lançou o Plano Real, a classe C correspondia a 34,96% da população. Hoje, são 52%, dominante do ponto de vista eleitoral e econômico. Os eleitores com nível universitário nesse segmento saltaram de 6 milhões para 9 milhões. Em 2014, serão 11 milhões.

Qualquer político, para se inserir no futuro próximo, terá que entender o que se passa com essas pessoas. Os estudos sobre esse segmento indicam que o “esperto”, que só quer “se dar bem” desprezando valores, sem dúvida ficará para trás. Na classe C, em que 68% dos jovens estudaram mais que seus pais, o valor básico é a importância do trabalho duro e continuado. Mais educados e conectados, esses jovens são inclusive os formadores de opinião em suas famílias, onde 79% confiam mais nas recomendações de seus parentes do que na propaganda da tevê. Ou seja, o perfil do brasileiro de um modo geral mudou e, com ele, a forma de conquistá-lo do ponto de vista eleitoral.

Lula e FHC

Nos últimos anos, duas referências na política brasileira perceberam essa guinada. Não por acaso, o ex-presidente Lula buscou para candidato a prefeito de São Paulo um nome novo dentro do PT, o do ex-ministro da Educação Fernando Haddad, com um perfil que se encaixa perfeitamente nos valores ressaltados pela nova classe média. O outro atento a essa mudança foi Fernando Henrique Cardoso. Há mais de um ano, alertou seu partido para a necessidade de prestar atenção na classe C e seu poder eleitoral.

A sucessora de Lula, a presidente Dilma Rousseff, entendeu esse recado. Em todas as oportunidades, fala da classe média. Nos palanques no último fim de semana, não foi diferente, embora o destaque tenha ficado para os ataques que fez ao PSDB de José Serra.

Dilma tem dito a seus ministros que o objetivo do governo é a classe média. Não por acaso, determinou atenção especial aos planos de Saúde, que viraram febre de consumo na classe C. Mas esse novo segmento social quer mais. Na área de Educação, os gastos com pagamento de escola, material escolar e livros estavam na faixa de R$ 1,8 bilhão em 2002. Hoje, ultrapassam os R$ 15 bilhões, conforme dados disponíveis no site da SAE.

Enquanto isso, no palanque…

Quem observou os palanques do partido em São Paulo no último fim de semana percebeu claramente as mudanças no PT. Na primeira fila, à exceção de Lula — a maior referência do partido—, de sua mulher, dona Marisa, e do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, os demais eram as “novidades”, sejam os próprios candidatos sejam ministros da presidente Dilma Rousseff. Talvez esteja aí o segredo pelo qual o julgamento da Ação Penal 470, vulgo mensalão, entra em seu capítulo final sem afetar a agremiação sob o ponto de vista eleitoral. O PT soube, em meio ao doloroso processo de julgamento, se renovar. Dilma, da sua parte, separou o governo do julgamento. Sendo assim, o eleitor fez o mesmo.

A partir de agora, passada a eleição municipal na semana que vem, será a hora de preparar o próximo jogo. E, nesse campo, quem souber ler e traduzir melhor os desejos da classe C terá a vantagem. Esse é o maior desafio. Podem apostar.

Ulysses - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 22/10


Os brasileiros lembram neste mês, com reverência, os 20 anos do desaparecimento de Ulysses Guimarães. Ele foi e será sempre símbolo da luta pela democracia e pela justiça social, que encontra sua melhor tradução na Constituição.

Guardamos para sempre sua imagem histórica erguendo o primeiro exemplar e anunciando a "Constituição Cidadã", trazendo luz ao país após um longo período de sombras.

Ulysses conviveu com uma singular geração de homens públicos. De Tancredo, como dizia Tales Ramalho, era parceiro em uma dança da qual só eles conheciam os passos. Os dois lideraram alas distintas da oposição e agiam de forma complementar, ciosos da necessidade de manter a coesão em torno do fundamental desafio daquele tempo: vencer o regime de exceção. São dois grandes exemplos da dimensão ética e transformadora que a ação política pode ter.

Eram líderes leais ao Brasil, honravam a palavra dada e colocavam sempre o interesse do país cima de quaisquer outros.

Permitiu o destino que, anos depois, eu me sentasse na cadeira de Ulysses, na Presidência da Câmara dos Deputados, e não foram poucas as vezes em que, para tomar decisões complexas, me inspirei no velho timoneiro. Foi nesse período que, com o apoio de diferentes forças políticas, acabamos com a imunidade parlamentar para crimes comuns e criamos na Câmara o conjunto de medidas que ficou conhecido como Pacote Ético.

Dr. Ulysses e sua geração nos deixaram um denso legado. A defesa das razões de Estado, o fortalecimento das instituições, o adensamento da democracia e o compromisso com a Federação criaram uma realidade nova e permitiram que mais adiante pudéssemos continuar avançando com a estabilidade econômica e a inclusão social de milhões de brasileiros.

Lamentavelmente perdemos essa ideia-força -o sentido da construção nacional como tarefa coletiva e dever de todos. Acabamos reféns de um modelo que substituiu o projeto de país por um projeto de poder. As grandes reformas foram abandonadas. As pontes construídas no passado em torno das causas nacionais sucumbiram a um ciclo de governo que apequenou-se e tenta reescrever a história de forma quase messiânica, como se o Brasil do nosso tempo fosse obra de poucos e tivesse sido fundado ontem. Não foi.

Por tudo isso, é importante que as novas gerações conheçam as convicções, o espírito público e a grande generosidade com que o doutor Ulysses sempre trabalhou pelo Brasil. E reconheçamos aqueles que, com coragem, lucidez e coerência, nos ensinaram que é possível sempre semear um novo país. A memória pode ser um eficaz antídoto à descrença e ao desalento que vemos hoje nos brasileiros em relação à política.

A jabuticaba e os vira-latas nacionais - SERGIO LEO

VALOR ECONÔMICO - 22/10


Oscar Niemeyer é uma jabuticaba arquitetônica. O Bolsa Família é jabuticabalmente admirado e copiado pelas instituições internacionais que lidam com pobreza. A agilidade do sistema financeiro brasileiro, jabuticanabolizada pela sobrevivência à hiperinflação, não tem igual no mundo. O Plano Real, baseado em experiências internacionais e aclimatado para o solo brasileiro, foi uma jabuticabeira providencial, que rende frutos até hoje.

O ditado da jabuticaba é uma versão pouco frutuosa do que o economista Albert Hirschman, baseado em sua experiência como consultor internacional, especialmente na América Latina, chamava de "fracassomania": a incapacidade de ver os méritos nas adaptações e soluções locais, o pessimismo em relação às políticas - inclusive os aperfeiçoamentos incrementais e heterodoxos do capitalismo. Fernando Henrique Cardoso, amigo e admirador de Hirschman (como, aliás, José Serra), foi um dos que popularizam o termo fracassomania (que, curiosamente, Hirschman aplicou também a certos aspectos da teoria cardosiana da dependência).

Complexo de vira-lata não é um problema do Brasil

Hirschman desenvolveu sua tese a partir de outra expressão, em francês, também sacada da experiência em países em desenvolvimento: "la rage de vouloir conclure", a raiva de querer concluir: na ânsia de soluções e na pressa de terminar obras, governos, economistas, especialistas, inclinam-se pela aplicação dogmática de fórmulas já prontas e testadas em algum outro lugar, de preferência em países comprovadamente bem-sucedidos - sem notar que a receita de sucesso de um pode ser o caminho para o fracasso de outro, sujeito a condições diferentes.

A insistência em apontar as dificuldades e não reconhecer os avanços, ainda que incipientes ou insuficientes, está na raiz da fracassomania, como se queixava Fernando Henrique - que, porém, usou o termo equivocadamente ao defender, contra os críticos, a política de dólar desvalorizado dos anos 90. Ao rejeitar políticas originais e inovadoras como fatalmente ineficazes e destinadas ao fracasso, a ortodoxia, à direita e à esquerda, parece ignorar que situações inéditas podem exigir ações também singulares.

Não cabem metáforas de jabuticaba para analisar soluções e problemas que frutificaram por aqui. A emergência dos tais 40 milhões de novos integrantes da classe média, por exemplo, impulsionada por aumentos reais no salário mínimo e extensão da rede de proteção social, que foram possíveis devido a condições favoráveis no país e no mercado externo, trouxe ao Brasil novos padrões de consumo e poupança, ainda não inteiramente compreendidos. Essa jabuticaba merece mais que as preguiçosas avaliações sobre o esgotamento iminente do crescimento baseado no consumo.

Também faltam "jabuticabólogos" para orientar a excepcional situação do Brasil no cenário de comércio internacional, como grande produtor e exportador de commodities agrícolas e minerais, e portador, ao mesmo tempo, de um vigoroso mercado interno e uma complexa e diversificada estrutura industrial.

A ideia de partir para a liberalização da economia com a derrubada de barreiras a importados não encontra solo fértil em um país tão sensível aos lobbies industriais; mas a aplicação sem nuances de exigências de conteúdo nacional e de novas barreiras aos importados também entra em choque com um mundo de produção internacionalizada e pressão global por acordos de livre comércio, especialmente nas economias dinâmicas da Ásia.

Fazem falta no debate público vozes originais e tropicalizadas, como a do economista Antônio Barros de Castro, um dos primeiros a apontar a necessidade de uma estratégia mais sofisticada para lidar com o fortalecimento da China e com bilhetes premiados do Brasil, como as reservas do pré-sal, para as quais ele defendia uma política de exploração controlada, sem a urgência dos interessados em rentabilidade imediata.

A tese da fracassomania, que rejeita a singularidade da jabuticaba, se liga a outro clichê nacional equivocado: o complexo de vira-lata, diagnosticado pelo escritor Nelson Rodrigues para descrever a baixa auto-estima do brasileiro quando confrontado com o resto do mundo. Apesar do pedigree literário, essa é outra metáfora infeliz; Nelson Rodrigues estava correto ao criticar o narcisismo "às avessas" do brasileiro que "cospe em sua própria imagem"; mas errou ao eleger o malandro vira-lata como termo de comparação.

No imaginário popular, o mais conhecido vira-lata é um personagem de desenho animado, a quem Walt Disney deu independência e autoconfiança invejáveis. Disso entendem os Estados Unidos, que sempre louvaram suas jabuticabas, a ponto de transformar em ponto de honra a "excepcionalidade americana".

O vira-lata, mestiço e sem dono, não conhece limites, adapta-se às circunstâncias, sobrevive mesmo em condições precárias e reage às ameaças com sabedoria. Não merece ser comparado aos que, fracassomaníacos, desconfiam da própria capacidade de evitar os becos sem saída.

Quem se submete às vontades alheias, tem campo de ação regulado e costuma trocar a criatividade por truques ensinados pelo dono, são os cães de raça - todos, aliás, descendentes de vira-latas, resultado de gerações de cruzamentos para eliminar o inesperado e consolidar certas características especializadas.

Os cães de raça sempre serão úteis. Confiáveis, executam bem as ordens que recebem. Mas são os vira-latas que, na balbúrdia da rua, podem descobrir os melhores caminhos, com a autoconfiança que lhes garante a sobrevivência. Desde, é claro, que se livrem da coleira.

Nelson Rodrigues estava errado. O problema do Brasil não é o complexo de vira-lata. São os vira-latas complexados.

Nova realidade - EDITORIAL O GLOBO


O Globo - 22/10


Em entrevista ao GLOBO, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, João Oreste Dalazen, observou, a propósito das leis que regulam as relações entre patrões e empregados no Brasil, que "o mundo e a sociedade evoluíram. Tudo mudou, exceto a legislação trabalhista". Foi preciso: a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) está completando 70 anos, impondo, a uma sociedade em dinâmica transformação, praticamente as mesmas regras de pactuação elaboradas nos anos 40 do século passado, quando foi editada.

Anacrônica, alinhada com um passado em que o computador ainda não havia saído das páginas de obras de ficção científica, a CLT é um entrave à modernização do mercado de trabalho. Com isso, perdem as empresas e empregados, imobilizados por uma legislação que inviabiliza negociações baseadas na dinâmica do mercado em vez de privilegiar o acordo sobre o legislado.

A título de exemplo, recente julgamento no TST deixou evidente a ineficácia da CLT diante de temas que não lhe são contemporâneos: ao examinar a questão do chamado teletrabalho (quando o empregado é acionado por celular ou pela internet), a Corte determinou que se trata de atividade a ser compensada com 30% de adicional sobre a hora trabalhada - uma relação de trabalho impensável há duas décadas. Sem um capítulo na CLT que trate especificamente dessa questão, o tribunal optou por uma solução que claramente se refletirá negativamente na lucratividade e na produtividade das empresas, óbvios elementos que pesam na geração de empregos.

Com a flexibilização da legislação, questões como as horas extras do teletrabalho seriam mais bem resolvidas em negociações diretas entre empregadores e empregados, uma tendência em todo o mundo, mas ainda um tabu no Brasil. Na citada entrevista, o presidente do TST esmiuçou com acerto a sua análise do ônus de as relações de trabalho serem ditadas por um conjunto de leis envelhecido: "(...) é uma regulação rígida, que praticamente engessa toda relação entre patrão e empregado; segundo, é excessivamente detalhista e confusa, o que gera insegurança jurídica e, inevitavelmente, descumprimento; e, terceiro, está cheia de lacunas." Como decorrência desse hiato entre a realidade de uma nação que mudou radicalmente em 70 anos e suas anacrônicas leis trabalhistas, o Brasil é um dos países recordistas em ações trabalhistas.

Em boa hora, o governo acena com o envio ao Congresso de um projeto para flexibilizar a legislação trabalhista, principalmente no que diz respeito a acordos negociados entre empresas e seus empregados - fórmula moderna para superar litígios e assegurar termos que não comprometam a saúde financeira de quem emprega e afastem o fantasma de redução de postos de trabalho. São mudanças impostas por novos desafios de um mundo em transformações aceleradas, ao qual o Brasil precisa se adequar.

ONGs, transparência e sociedade - WILLIAM EID JUNIOR


O ESTADÃO - 22/10


As organizações não governamentais (ONGs) estão sob os holofotes. Criadas há séculos como entidades mais voltadas para a caridade, hoje atendem a um sem-número de demandas sociais - da citada benemerência a outras, como informar a sociedade sobre atividades dos governos. Mas são reconhecidas em todo o mundo, sobretudo, como parceiras importantes na formulação e implementação de políticas sociais. Só no Brasil temos hoje 340 mil ONGs.

O problema que as levou aos holofotes - o uso delas em estruturas de corrupção - tem origem bastante simples: a falta de transparência. Assim como a maioria das empresas no País, as ONGs não têm de divulgar informações sobre suas operações, principalmente as financeiras. Mesmo as que são respeitadíssimas por sua reconhecida atuação social pouco divulgam a respeito de suas finanças.

Curioso é que o foco da discussão tem passado longe desse problema básico. Discutimos se o número de ONGs realmente envolvidas em falcatruas nos ministérios é representativo, ou se o volume de recursos é importante. Muitos protestos foram ouvidos quando a Presidência da República suspendeu os repasses a todas essas organizações por 30 dias. Muitos protestaram, indicando que foram misturados o joio e o trigo, outros afirmaram que 30 dias era um prazo muito curto para se fazer alguma coisa. Poucos propuseram algo na linha de maior transparência generalizada. E é isto que nos interessa como cidadãos: saber se o dinheiro utilizado pelas ONGs foi bem aplicado. Afinal, o dinheiro é sempre nosso, seja oriundo de uma conta do governo, e ele vem dos impostos que pagamos, ou diretamente do nosso bolso na forma de doação. E é fundamental que saibamos para onde vai.

É interessante ressaltar que muitos, a começar pela presidenta Dilma Rousseff, defendem a transparência. Em carta enviada às organizações da sociedade civil durante sua campanha eleitoral, Dilma afirmou que "o compromisso com a democracia implica o estabelecimento de relações entre o Estado brasileiro e a sociedade civil organizada pautadas no respeito à autonomia, na liberdade de expressão e organização da sociedade, na transparência, na probidade e integridade no tratamento do interesse público". No Congresso Nacional há 19 projetos que propõem algum controle adicional sobre as ONGs, 18 na Câmara dos Deputados e 1 no Senado.

Pior, já temos legislação sobre o assunto, obrigando as ONGs a divulgar informações. A Lei 9.790/99, que regulamenta a atuação das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, nas quais se incluem as ONGs, no artigo 4.º, § VII, alínea b, estabelece que "se dê publicidade por qualquer meio eficaz, no encerramento do exercício fiscal, ao relatório de atividades e das demonstrações financeiras da entidade, incluindo-se as certidões negativas de débitos junto ao INSS e ao FGTS, colocando-os à disposição para exame de qualquer cidadão". Isto é, essas organizações têm a obrigação de tornar públicas as suas demonstrações financeiras.

A questão que fica no ar é: por que apenas uma minoria muito pequena obedece à lei? O Instituto Ayrton Senna, a Laramara - Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual e a Associação Imago de Ciência, Saúde, Educação e Apoio à Pesquisa são algumas das poucas ONGs que divulgam as informações previstas na citada lei. Por que só essas?

O deputado federal Vinicius Gurgel (PR-AP) apresentou, em 5 de julho, o Projeto de Lei 4.171/2012, que propõe que as entidades do terceiro setor que captam recursos públicos para o desempenho de suas atividades regulares fiquem obrigadas a prestar contas dos recursos recebidos a qualquer título em cada exercício financeiro. Na justificativa o autor destaca que "é preciso zelar pela transparência e moralidade na atuação dessas entidades, que pode ser viabilizada com maior eficácia por meio de adequada e regular escrituração de suas contas e pela elaboração das respectivas demonstrações financeiras". É fundamental que o projeto seja aprovado.

Há vários motivos para acreditar que a transparência deva ser a tônica nas ações das ONGs. Em primeiro lugar, o rápido crescimento do número delas e sua crescente influência as tornaram titulares de papéis fundamentais nas sociedades atuais, com o consequente aumento de suas responsabilidades e, claro, da necessidade de maior transparência. Em segundo lugar, seu sucesso ao transformar as políticas, tanto locais como globais, tem levado diversos outros agentes a questionar sua legitimidade, e esta só será solidificada com maior transparência. Em terceiro lugar, seu crescimento tem ultrapassado a capacidade das sociedades e dos governos de efetivamente regulá-las. E novamente a transparência, advinda de regulação e de autorregulação, é a chave para a manutenção do seu sucesso. Em quarto lugar, há a necessidade de as ONGs manterem a confiança da sociedade e sem transparência isso é impossível. Finalmente, a própria necessidade das ONGs de diversificarem suas fontes de recursos é fator que induz à transparência total.

Em outros países já há tempos as ONGs têm regulações voltadas para a transparência. E essas regulações tiveram como base justamente problemas similares aos que estamos enfrentando aqui. Só que as sociedades desses países, como EUA e Holanda, reagiram prontamente e desenvolveram os mecanismos que hoje permitem uma visão clara da efetividade e da lisura das ações promovidas por tais organizações.

Enfim, o fundamental é que haja transparência. ONGs, assim como outras organizações cuja atuação tem impacto na sociedade, devem prestar contas a essa sociedade. A divulgação ampla dos seus atos, com destaque para os aspectos financeiros, é essencial.

Mas fazer o quê? - RODRIGO AMARAL


O Globo - 22/10


Aí vêm mais dois meses de IPI menor. Vamos comemorar! Afinal, quem é contra redução de impostos no Brasil? Afora aspectos mais complexos, é bom que o cidadão possa acessar bens mais baratos, ainda que por um tempo. Mas e depois? Já em novembro, virá uma ressaca. Antecipamos demanda.

Em primeiro lugar, que tal reduzir impostos permanente e amplamente? Onde mais se taxam indústrias com um imposto que mais parece uma multa? Não sou especialista, mas nunca vi nada igual alhures. Ao menos nos países importantes, ou que querem sê-lo. Uma economia desonerada talvez nem precisasse de medidas de exceção. Afinal, mesmo se o objetivo é apenas produzir e vender mais carros, não podemos fazê-lo em detrimento do sucesso econômico geral: há um limite à capacidade de absorver mais carros, que precisam ser pagos, mantidos e de uma infraestrutura para rodar.

E se o objetivo é esse, há muito a fazer, do lado fiscal, no custo de propriedade e estrategicamente. Com os impostos: a) dar previsibilidade - se a cada "x" anos vemos que o imposto estrangula o negócio, vamos reduzi-lo em definitivo em "y%"; b) ser seletivo: há carros mais adequados e há itens desejáveis para esses mesmos veículos - tributar conforme as emissões (e parece que finalmente começamos a nos movimentar nesse sentido!), estimular os pneus "verdes" etc.; c) isentar itens de segurança - após quanto tempo e quantas vidas, air bag e ABS serão de série? Poderiam sê-lo há anos, ajudados por isenção.

Também o custo de propriedade inibe os negócios, sem receber merecida atenção. Resumindo, comprar carro é fácil. O difícil é mantê-lo. Um popular custa R$ 2.000 mensais, entre depreciação, custo de capital, manutenção, seguros, sinistros, impostos, gasolina, multas etc. E há aquele tema de sempre: qualidade das vias de tráfego. Antes de trem-bala, queremos a infraestrutura existente funcionando.

Nossa indústria automotiva, relativamente mais importante que a da média dos países desenvolvidos e na qual o governo aposta suas fichas sempre que pensa na economia, não é muito competitiva. Pior, está em um provável ponto de inflexão, onde os importantes centros de desenvolvimento, produção e consumo exploram a propulsão híbrida e elétrica. E nós - mais ninguém - insistindo no etanol e só nele, sacrificando a lavoura em prol de um benefício ambiental que se dissipa planeta afora, sem cobrar por isso. Não dá para ser o quinto do mercado, ficar à margem da tecnologia e perder o bonde de novo. Cabe a mão do governo.

Outro aspecto estratégico é a produção de eletrônica embarcada, que só cresce em quantidade e valor. Corremos o risco de virar uma megazona franca automotiva. Mais importante que soja, alumínio, minério, trem-bala, copa e olimpíada seria ter uma indústria de componentes eletrônicos que suportasse essa e outras cadeias industriais. Os desafios colocados à indústria são muito mais sérios que uma simples crise temporária de demanda.

Um sonho de Vinicius - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 22/10


RIO DE JANEIRO -
Parece incrível, mas Vinicius de Moraes teria feito 99 anos na sexta-feira última. Como se não bastasse, a data foi o ponto de partida para o seu centenário -que, para todos os efeitos, já começou. Uma vasta programação, incluindo reedições de sua obra e antologias de textos nunca publicados em livro, uma caixa de seus discos (dispersos por vários selos), uma exposição itinerante, shows, palestras etc., ocupará os próximos 12 meses. E isso é só o Vinicius oficial.
Ótimo. Efemérides como essa devem zarpar de um projeto institucional e, daí, abrir-se a adesões -sempre que possível, sem ônus. Foi o que determinou o sucesso do centenário de Nelson Rodrigues, ainda em curso, e, há tempos, o fracasso do centenário de outros artistas -pela ganância dos herdeiros.
Quando se dizia que Vinicius era um ser plural, não estavam brincando. Poeta, diplomata, letrista, cantor, cronista e homem de teatro, cinema, uísque e mulher, ele pode ser abordado de muitos ângulos. Um ano será pouco para homenageá-lo, daí terem começado tão cedo.
Repórter da "Manchete", fui entrevistá-lo em princípios de 1968, em sua casa na Gávea. Vinicius estava no banho, mas já vinha, me disseram. OK. Só que quem apareceu primeiro foram duas jovens repórteres,
rindo muito. Em seguida, surgiu Vinicius, num rastro de sabonete e talco, recém-saído da banheira onde recebia todo mundo. Por acaso, recebeu-me à paisana.
Devo ter toda a poesia e música de Vinicius. Mas o que me orgulho mesmo de possuir são os dois números da incrível revista "Filme", que ele editou com Alex Viany em 1949 e que encontrei num sebo. Fazer uma revista de cinema, de nível internacional, era um sonho antigo, a que ele se atirou com amor. E conseguiu. Pena ter ficado nesses dois números -Chaplin na capa do nº 1, Fred Astaire na do nº 2.

O que é uma vida decente? - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 22/10


O que é melhor, um pai ou marido corrupto ou pobre? Honestidade, conforto ou bem-estar?



Quando se fala de corrupção, todo mundo mente. Quase todo mundo prefere um pai ou marido corrupto a um honesto, mas pobre. Para resistir à corrupção, você tem que ser radical, ou religioso, ou moral ou político.

Parafraseando Hanna Arendt em seu "Eichmann em Jerusalém", quando ela disse que os nazistas estavam preocupados com a aposentadoria e chamou isso de banalidade do mal, eu diria que existe uma "banalidade da corrupção" inscrita na perversão do que seria uma vida decente.

Não quero "desculpar" a corrupção, quero trazer à tona uma causa ancestral de corrupção da qual não se fala no silêncio do cotidiano.

O julgamento do mensalão não significou nada para o eleitor, mesmo para aquele que se julga "crítico". Ninguém dá bola para a corrupção do seu partido do "coração". Também foi importante para ver o modo de operação da corrupção ideologicamente justificada inventada pelo PT: só faltava dizer que foi a direita de Marte que inventou tudo.

Já se falou muito que quando classes sociais mais baixas ascendem socialmente e tentam imitar os hábitos da aristocracia ficam ridículas. Isso é descrito como "novo rico". Mas o "novo corrupto" é tão ridículo quanto. Que "saudade" dos corruptos clássicos do coronelismo nordestino, que negavam, mas não apelavam para uma inocência ideologicamente justificada, ou simplesmente não se davam ao trabalho de negar. Os mensaleiros continuam a agir como um clero de puros de coração.

Mas não é disso que quero falar. Quero falar do fato de que, para além do debate político -que acho chatinho e quase sempre um circo-, a corrupção se alimenta de algo muito mais profundo.

Damos pouca atenção a esse fato porque a substância da moral pública é a hipocrisia, por isso é melhor brincar de dizer que a causa é só política, quando na realidade é mais banal do que isso.

Quase ninguém quer ter um pai ou marido pobre, e sim prefere um pai ou marido corrupto, mas que dê boas condições de vida. Esta é a verdade que não se fala.

Imagine que você é uma jovem mulher que vai casar com um jovem rapaz. Antes que me acusem de "sexista" (mais um termo usado para quebrar a espinha dorsal do debate público, semelhante a acusar alguém de pedófilo), o que vou descrever pode acontecer também com um homem, mas é mais comum ser mulher, porque elas ainda são mais financeiramente dependentes e continuam execrando homem sem sucesso profissional, apesar das mentiras das feministas.

Agora imagine que seu marido será um policial honesto até o fim da vida. A chance de ele acabar pobre é enorme. O mesmo pode acontecer, ainda que num grau mais alto em termos financeiros, com qualquer um que venha ocupar um cargo nos variados escalões do governo.
Agora imagine que, no começo, ele seja honesto e com ereção e vigor, e você também seja uma jovem mulher cheia de vida e expectativas. Agora imagine que se passaram 20 anos... 30 anos... O que importa? A honestidade dele ou ele pensar "no bem-estar da família"? Espere, não responda em voz alta, guarde para si a resposta, senão você mentirá na certa.

Por "pensar no bem-estar da família", quero dizer: roupa, comida boa, escola dos filhos, melhor casa para morar, ajudar os sogros doentes e idosos, viajar para Miami e Paris, apartamento na praia, iPhone, no mínimo para as crianças, carro novo, uma bolsa de marca, ainda que "em conta", sair com amigos para jantar, levar as crianças para comer pizza no domingo, poder mostrar para os cunhados que você está melhor de vida (isso às vezes vale mais do que tudo na escala da miséria moral de todos nós), viajar de avião, comprar coisas nos EUA, ter TV de 200 polegadas, iPads, enfim, "ter uma vida".

Em situações de risco, em guerras, a covardia é a regra -ao contrário dos mentirosos que até hoje se dizem filhos de "la résistance française".

No dia a dia, isso tem outro nome: honestidade não vale nada, o que vale é ter uma "vida decente": segurança para os filhos, uma esposa feliz porque pode comprar o que quiser (dentro do orçamento, claro, mas quanto menor o orçamento menor o amor...), enfim, um "futuro melhor".

A farra do crédito - PAULO GUEDES


O Globo - 22/10


A farra da moeda e do crédito é tema recorrente na História. Há um século, o termo "inflação" descrevia essa farra, uma excessiva expansão da moeda e do crédito. Não era como hoje, que chamamos de inflação o aumento dos preços de bens e serviços, eventuais sintomas daquela farra. Muito importantes, mas que nem sempre ocorriam.

A estabilidade de preços nos Estados Unidos dos anos 1920 e no Japão dos anos 1980 deu sinais falsos de que tudo estava bem, enquanto prosseguiam as inflações da moeda e do crédito, que desembocaram em crises colossais. A mesma farra ocorre nos EUA de 2002 a 2012. As bolhas em série nas bolsas e nos imóveis foram alimentadas pelas mesmas "inflações", embora estivessem também desligados neste episódio os radares inflacionários.

A explicação é simples. Mera aplicação da Lei de Walras, princípio da Teoria de Equilíbrio Geral, à economia mundial contemporânea. Os radares inflacionários foram desligados pelo mergulho de 3,5 bilhões de eurasianos nos mercados de trabalho globais. Por isso, sofrem os salários no lado ocidental. E, como derramam sua produção do lado de cá por meio das exportações, impedem também as elevações de preços que resultariam da grande farra. Para onde se deslocam as pressões? Tudo depende de para onde escorre o excesso de liquidez. Há rastros de excessos nas bolsas, no mercado imobiliário e agora pistas ainda frescas de que prosseguem nos mercados de títulos públicos do mundo inteiro.

Chegamos então ao caso brasileiro. Estávamos financeiramente desalavancados e dessincronizados da grande farra contemporânea. Voltávamos da clínica de recuperação, após um porre inflacionário, quando desabou o teto do mundo em 2008-2009. Bebemos pouco e escapamos da quebradeira. Mas desde então escorregamos lentamente em direção aos excessos.

A armadilha da farra global nos ameaça. Percebendo a desaceleração de preços nos mercados globais, nosso Banco Central derrubou os juros até o limite. Prosseguimos também com a vertiginosa expansão do crédito público, alimentada por grandes operações parafiscais, uma inflação de crédito que escapa dos controles orçamentários usuais. O desligamento dos radares inflacionários é uma perigosa miragem, pois nunca foi garantia de que tudo vai bem.

A cidade e o Serra - MARCELO MADUREIRA

FOLHA DE SÃO PAULO - 22/10


Serra não é simpático? E daí, se é competente? A eleição de SP é nacional. Não se pode fortalecer o PT, que se alia ao que há de pior por seu projeto caudilhesco


O Brasil é um país complicado. Por um lado, a democracia dá um salto de qualidade, impulsionada pela ação do Supremo Tribunal Federal no julgamento do mensalão. Do outro lado, assistimos nestas eleições de 2012, mais uma vez, articulações de forças intestinas na direção do atraso, do patrimonialismo autoritário e obscurantista.

A cidade de São Paulo é a principal arena deste MMA político brasileiro. Queira ou não queira, o segundo turno paulistano, como sempre, alcança dimensão nacional. São Paulo não é só a nossa maior metrópole, mas também, por sua multiplicidade, uma síntese do Brasil. Além da gestão da cidade, o que esta em jogo são dois projetos políticos distintos e antípodas.

Coerente com o perfil autoritário do ex-presidente Lula, o candidato Fernando Haddad, enfiado goela a dentro do PT, dá continuidade ao projeto lulista.

Esse lulismo traz dentro de si tudo aquilo que a civilização brasileira quer transformar em página virada. O projeto caudilhesco de Lula usa o aparelhamento do Estado, a demagogia populista e não contempla uma transformação virtuosa da sociedade brasileira.

Fernando Haddad é mais uma peça desse projeto. Projeto que tem como único arcabouço "ideológico" o poder pelo poder, a qualquer preço, e com as alianças com aquilo de pior que existe na política brasileira. E a lista é grande: são Malufes, Sarneys, Barbalhos, Calheiros, Collors e Valdemares Costa Neto. Está nos autos.

O mensalão foi um atentado à democracia brasileira. Uma traição explícita à Constituição, pedra fundamental do Estado de Direito que, no ato de posse, o presidente jura manter, proteger e cumprir.

Mas palavra de honra não me parece que seja coisa para se levar em conta no lulismo. Para Lula e os seus áulicos, a democracia é um valor burguês, uma figura de retórica a ser utilizada segundo a conveniência do momento.

O povo de São Paulo, guardião intransigente da Constituição brasileira, honrando o movimento constitucionalista de 1932, tem o dever de derrotar esse projeto político.

José Serra pode não ser um candidato simpático. Muito pelo contrário. O ex-governador de São Paulo Mário Covas também não era. Mas, como o saudoso Covas, Serra já provou mais de uma vez retidão e competência na gestão da coisa pública, e isso é o mais importante. O eleito, afinal, não vai ganhar um programa de humor, mas uma prefeitura para administrar.

A única lembrança que Haddad deixou do seu período à frente do Ministério da Educação, por outro lado, foi a sua desastrosa gestão do Enem, com fraudes e erros de organização que prejudicaram milhões de alunos em um momento crucial das suas vidas.

Desnecessário dizer que, se votasse em São Paulo, votaria no Serra. Subtraindo seus defeitos e somando as suas virtudes, José Serra é a melhor alternativa.

Inclusive acredito que o compromisso que o candidato tucano propõe aos paulistanos não será interrompido por uma eventual candidatura à presidência, como tanto se comenta. Serra sabe que o seu sonho com o Planalto já passou e que a oposição brasileira, em nível nacional, pede novos protagonistas.

Caramba! Nunca escrevi tão sério! Deve ser a influência do Serra...

Lições de 2012 - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


O Estado de S.Paulo - 22/10


Não importa o resultado do segundo turno, esta eleição deixará lições valiosas. Não é obrigatório prestar atenção, mas permite cometer erros novos, em vez de repetir os mesmos de sempre.

Lição dos partidos: quanto mais candidatos, mais prefeitos eleitos.

Parece óbvio e é, mas poucos partidos seguiram essa regra. PSB e PT cresceram em prefeituras porque lançaram mais candidatos a prefeito do que no pleito anterior. Já PMDB e PSDB começaram a encolher sua base municipal quando deixaram de lançar tantos candidatos em 2012 quanto em 2008. Os avanços petista e socialista não foram acaso, mas investimento.

O PT tem a menor eficiência entre os grandes partidos na eleição de candidatos a prefeito. Elege 1 a cada 3, enquanto o PMDB quase chega à relação de 1 para 2. Porém, a maior taxa de sucesso peemedebista tem a ver com o tamanho dos municípios onde disputa a eleição: em pequenas cidades, é mais comum haver apenas dois candidatos, aumentando a probabilidade de vitória.

Isso significa que o PMDB é mais eficiente em quantidade de prefeituras conquistadas, mas não em eleitorado a governar. O PT conquistou cidades cujo porte médio é duas vezes maior que o dos municípios onde o PMDB elegeu seus prefeitos. O PSB está no meio do caminho. Vai governar prefeituras de cidades que são, em média, 1/3 maiores do que as peemedebistas e 1/3 menores do que as petistas. Os tucanos estão entre PSB e PT.

O tamanho médio das cidades que o PSDB governará é 22% maior que o das do PSB e 21% menor que o das do PT. Os tucanos elegeram 43% de seus candidatos a prefeito. Tudo isso seria ótimo, se o partido não tivesse conquistado menos prefeituras que em 2008. Para ser atraente, um partido precisa, acima de tudo, ter perspectiva de poder. O PSB saiu ganhando das urnas pois está em ascensão e, ao contrário do PSD, não só nos cafundós.

Lição dos candidatos: conhecimento alto importa menos que rejeição alta.

Candidatos muito conhecidos tendem a sair na frente nas pesquisas de intenção de voto graças ao que os pesquisadores chamam de recall bias, ou viés de memória. Indagados muito tempo antes da eleição sobre em quem pretendem votar, os eleitores, em grande parte, tendem a apontar o nome que lhes é mais familiar - não porque de fato estejam pensando em votar nele, mas para não se mostrarem desinformados sobre a eleição. Esse candidatos podem cansar cedo. Foram os casos de Moroni Torgan (DEM), em Fortaleza, e Humberto Costa (PT), no Recife. Saíram disparados na frente, mas nem pagaram placê no final.

Altas taxas de intenção de voto em pesquisas na fase pré-eleitoral não indicam necessariamente o candidato mais competitivo para um partido. Se o mesmo candidato aparecer nas mesmas pesquisas com porcentuais altos de rejeição, é provável que a taxa de intenção de voto dele seja, na prática, o teto do candidato. Dali é mais fácil ir para baixo do que para cima.

Quanto mais um partido se deixa levar pelo recall bias das pesquisas pré-eleitorais, menos ele areja seus quadros. Candidatos novos, mas desconhecidos, nunca têm vez. No curto prazo, o partido pode até ganhar, mas só quando o adversário é ainda mais rejeitado. No longo prazo, tende à extinção.

Lição das pesquisas: a tendência vale mais que o retrato.

A primeira reação da mídia ao resultado das urnas foi destacar os erros reais e imaginários das pesquisas de intenção de voto. E a segunda reação foi perguntar quando sairiam as primeiras pesquisas do segundo turno. Essa relação bipolar entre jornalistas e pesquisadores se deve, em grande parte, à fixação com o número estático e a dificuldade de identificar tendências.

Se o líder está caindo na reta final e, ao mesmo tempo, dois adversários estão subindo, em algum ponto os três estarão empatados. Mas só por um momento. No instante seguinte o ex-líder prosseguirá em sua rota rumo ao esquecimento e os adversários assumirão a liderança. Quem olha as curvas de tendência identifica os movimentos. Quem olha só as fotos, não.

Nos EUA, a tendência é as pesquisas eleitorais serem cada vez mais frequentes e menos precisas. Porque é do movimento que vem a boa análise, não do retrato estático de um momento específico. Quanto mais pesquisas num intervalo menor de tempo, maior a chance de assistirmos ao filme todo e antevermos o seu final. E isso é mais fácil de fazer com pesquisas online.

O instituto Ipsos, um dos maiores do mundo, começou a fazer pesquisas eleitorais 100% pela internet nesta eleição presidencial dos EUA. É uma revolução, porque explode os conceitos de amostra probabilística, de intervalo de confiança e de margem de erro. Se fossem feitas no Brasil, estariam proibidas de ser publicadas porque não se adequariam à lei. "É o futuro", diz o CEO mundial da divisão de pesquisas de opinião do Ipsos, Darrell Bricker. "Pode demorar, 5, 10 ou 15 anos, mas virá", prevê a CEO do Ibope Inteligência, Márcia Cavallari. Enquanto isso, no Brasil, os institutos ainda são obrigados a fazer pesquisas eleitorais usando questionários de papel só para os partidos poderem contá-los se quiserem.

A balança pende - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 22/10


O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello sinaliza que poderá condenar por formação de quadrilha o núcleo político do mensalão. Apesar de ter absolvido do crime outros réus, assim como Rosa Weber e Cármen Lúcia, ele afirma que utilizou argumento distinto do das ministras. "Eu jamais me pronunciei sobre essa dualidade entre coautoria e quadrilha." Se isso ocorrer, frustrará a expectativa de advogados de um empate, o que deveria beneficiar os réus.

Critério No voto em que absolveu, entre outros, o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP), o ministro justificou que não estava formada uma associação de mais de três pessoas para configurar uma quadrilha.

Veja bem Advogados pinçam, no entanto, outros argumentos do magistrado para rejeitar o crime. Citam uma ação de novembro de 2011 no Supremo em que o ministro decidiu ''fulminar'' as denúncias para nove réus alegando excesso de imputações do Ministério Público.

Do contra Outros ministros apostam que Mello poderá votar pelo empate para "polemizar" na corte e forçar o voto de minerva do presidente do STF, Carlos Ayres Britto. ''Ele é muito complexo'', brinca um colega.

Dois pesos Parlamentares saíram em defesa de Mauro Hauschild, demitido por Dilma Rousseff após se licenciar para fazer campanha política. Segundo eles, ministros como Aloizio Mercadante (Educação) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento e Indústria) tiraram férias para reforçar suas bases eleitorais.

Última palavra Eles alegam que a petista decidiu exonerar o então presidente do INSS, na semana passada, porque o seu ex-marido Carlos Araújo apoiava candidatos adversários aos de Hauschild no Rio Grande do Sul.

Corpo... Após mal-estar entre Sérgio Cabral e Michel Temer, parlamentares peemedebistas falam em evitar esforços para barrar a aprovação do projeto que prevê nova regra de distribuição dos royalties no Congresso.

...mole A ideia é deixar que o governador do Rio apele à presidente para que vete mudanças na proposta.

Teoria... A despeito do pacto de não-agressão propalado por Fernando Haddad, a campanha petista perderá 16 minutos na sua propaganda de rádio em consequência de três direitos de resposta concedidos a José Serra. O QG tucano obteve, ainda, duas liminares contra inserções de TV do candidato petista.

... e prática Num dos despachos contra Fernando Haddad, o juiz eleitoral Henrique Harris afirma não aceitar "o 'vale-tudo' nas campanhas, que apenas tem o intuito de degradar o adversário."

Mantra A polêmica acerca da renovação dos contratos das OSs da saúde, tema que mais preocupa o PT na reta final, já levou o candidato a tentar obstruir dois comerciais televisivos de Serra.

Aí, não Integrantes do PSB se queixaram do discurso de Lula no final de semana atacando Jonas Donizete (PSB) em Campinas. Afirmam que o ex-presidente ''pegou pesado'' ao dizer que não há radialista que distribui cadeiras de rodas que tenha dado certo como prefeito. Donizete é ex-radialista.

Expansão Para socialistas, vencer o PT em Campinas virou a prioridade de Eduardo Campos neste segundo turno já que, caso o PSB derrote a legenda em Fortaleza, será uma vitória do governador do Ceará, Cid Gomes.

Importação 1 O Conselho Federal da OAB decidirá hoje se vai flexibilizar as regras para atuação de escritórios estrangeiros de advocacia no país em parcerias com empresas nacionais.

Importação 2 Em meio aos lobbies das multinacionais e das grandes bancas, a tendência é que a maioria dos conselheiros rejeite qualquer mudança na norma.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

tiroteio

"A prevalecer a opinião do revisor, para se considerar quadrilha como tal devemos exigir estatuto e registro em cartório."
DO SENADOR PEDRO SIMON (PMDB-RS), sobre Ricardo Lewandowski alegar
que a caracterização do crime depende de atuação contínua e não eventual.

Contraponto

A vida imita a arte

Na quinta-feira, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro disse em uma palestra estar preocupado com a concorrência de "Avenida Brasil". Aos presentes, ele afirmou desconhecer o assassino do personagem Max, mas brincou:
- Eu só sei que o Joaquim Barbosa prenderá todo o elenco até descobrir!
Diante dos risos, uma participante gritou:
- Foi a Carminha, mas ela vai procurar você, Kakay!