segunda-feira, janeiro 30, 2012
O sobrenatural sumiço da direita - EUGÊNIO BUCCI
REVISTA ÉPOCA
Uns acreditam em horóscopo. Mesmo que seja impossível demonstrar o nexo lógico entre a posição do planeta Vênus e o gosto de um beijo, acreditam no zodíaco. Há quem ponha fé em duendes e demais animaizinhos mitológicos. Outros creem que as marcas da moda, como um logotipo de todo tamanho nas hastes dos óculos de sol, exerçam um fascínio lúbrico sobre o sexo oposto. Não há prova empírica, nada, mas milhões de consumidoras adotam essa crendice e andam por aí com logomarcas à guisa de antolhos. Coerentemente, veneram o poder mágico das grifes, amuletos que hoje são mais cultuados do que santinhos e água benta. Uns temem o fogo dos infernos, outros esconjuram assombrações. As crenças humanas são incontáveis e, por favor, elas não estão em debate aqui. Pero que las hay, las hay.
Entre todas, a superstição mais intrigante de nossa era é essa de eleitores brasileiros que creem na direita sem que a direita exista no Brasil. Explicando melhor: há eleitores que se identificam com as teses de direita e manifestam sua fidelidade à direita, mas, no plantel de políticos em atividade, não há nenhum - ao menos não há nenhum que possa ser considerado viável - que se declare abertamente de direita. Logo, os eleitores de direita creem no que não existe.
Temos aí um fenômeno que não pode ser explicado pelos cientistas ou pelos comentaristas políticos. Estamos diante de uma ocorrência que não cabe na lógica deste mundo; é coisa do outro mundo, coisa do além. Os políticos de direita evaporaram. Como fantasmas à luz do sol, como a neblina e as miragens, simplesmente sumiram no ar.
Antes havia Antônio Carlos Magalhães, pelo menos. Era nauseante, por certo, mas era mais compreensível. Até outro dia, puxemos pela memória, a política brasileira era mais, vejamos, mais normal. A gente olhava para um lado, e, como seria normal, num país normal, ali estava a turma da esquerda, mesmo que em desalinho. Depois, a gente olhava para o outro lado e podia vê-los com nossos próprios olhos, pois os homens públicos de direita eram visíveis: um ou outro brucutu de farda, aqueles civis de terno escuro, todos orgulhosamente de direita, com sorrisos soturnos.
Hoje, a gente olha, olha de novo, esfrega os olhos e... Mas o que é isso? Não ficou ninguém? Como saci-pererê, a direita no Brasil é algo em que se crê, mas não se vê.
Na casa da esquerda de hoje, todo mundo entra, até Fernando Collor. Ela ficou indefinível, cheia de gente de todo tipo
Se o sujeito quer votar na direita, pense bem, leitor, quem ele poderá, digamos, sufragar? O Jair Bolsonaro? Só? O flanco destro se acha desguarnecido. Já as colinas à esquerda, que exuberância, que diversidade, que profusão de fenótipos! Até mesmo Delfim Netto, sim, ele, foi visto e foi lido na região, agora enunciando denúncias contra o neoliberalismo. Outro que ronda as cercanias é o prefeito paulistano, Gilberto Kassab. Ele, que já dissera que seu novo partido, o PSD, não era de direita e também não era de esquerda, justo ele, egresso do malufismo, agora corteja a coalizão liderada pelo PT. Ninguém vai lhe bater a porta na cara, por certo, porque as portas ali estão sempre abertas.
Pensando melhor, existe ainda alguma porta por ali? E paredes? Existem paredes? As perguntas procedem. Como naquela cantiga de Vinícius de Moraes, a velha edificação ideológica da esquerda virou "uma casa muito engraçada", temos de admitir. Ela não tem porta, nem janela, nem parede, nem teto, nem nada. Nos versos do poeta, a casa era tão engraçada que "ninguém podia entrar nela não, porque na casa não tinha chão". Nas plagas da esquerda de hoje, todo mundo entra, até Fernando Collor, mas a casa, ela mesma, ficou assim, indefinível, intangível e também cheia de gente de todo tipo. "Na rua dos bobos, número zero."
Com a direita, o destino foi menos irônico e mais impiedoso. Dela não ficou nem casa nem morador. Os antigos caciques, como José Sarney, acharam melhor sair de mudança, transmigrar para a esquerda, apoiar o governo Lula e, claro, criticar a imprensa. Que país sobrenatural. Nele, ninguém mais defende o capital. Ninguém mais briga pelo latifúndio. Claro, existe o Aldo Rebelo, o mais inflamado defensor do novo CÓDIGO FLORESTAL, que, segundo alegam na casa da esquerda, é o paraíso do latifúndio. Mas o Aldo é do PCdoB - e o PCdoB, segundo consta, seria de esquerda. Portanto, o Aldo não conta. Donde voltamos ao princípio. Onde foi parar a direita?
Foi abduzida por óvnis? Ou será que ficou desnecessária, pois a fulgurante casa da esquerda assumiu o serviço que era dela? Só os espíritos saberão explicar.
MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO
FOLHA DE SP - 30/01/12
Não vejo o Brasil sendo muito afetado, diz Setubal
"Estou vendo tanto pessimismo que estou ficando mais otimista", disse o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual.
Esse era o tom entre empresários e executivos brasileiros presentes no Fórum Econômico Mundial, encerrado ontem em Davos, na Suíça.
"O Brasil está muito bem-visto, com economia sólida, distante dos problemas que estamos vendo nos EUA e na Europa", afirmou Roberto Setubal, presidente do Banco Itaú Unibanco.
A percepção sobre o Brasil está bastante consolidada como muito positiva, em condições de manter uma economia razoável.
Os banqueiros brasileiros tiveram reuniões com seus pares de outros países.
"Eles veem o Brasil com muito mais interesse, mais respeito, os próprios bancos brasileiros com mais respeito. O BC é também muito bem-visto. É sobretudo o conjunto da obra que traz esse prestígio que o Brasil está desfrutando", afirmou.
Setubal observou o grande interesse de investidores. "Até de gente que não tem nada a ver com o Brasil. Interesse variadíssimo, desde gente que quer investir em terras no Brasil até querendo fazer serviços para o banco, empresas que não estão no Brasil, mas gostariam de ir, americanos, europeus..."
"A Europa é o centro das preocupações aqui, os temas euro e Europa estiveram presentes em todas as discussões que eu vi, acho que, de fato, merece preocupação grande. Acho que veremos na melhor hipótese a Europa crescendo muito pouco, por muito tempo, acho que tem de fazer um grande ajuste nas suas finanças, no seu modelo político inclusive. Acho que vai ser um período bastante difícil. Por outro lado, os EUA têm dado sinais mais sólidos de recuperação e isso ajudará certamente o mundo a manter o crescimento."
"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas", disse.
Para Setubal, a economia crescerá mais neste ano do que em 2011.
"Entre 3,5% e 4%. A redução de juros já mostra sinais de estímulo na economia. A política monetária demora um pouco para fazer efeito, mas já começa a se perceber. Tivemos o segundo semestre de forma geral muito fraco, especialmente o terceiro trimestre, mas já estamos sentindo uma reativação."
O governo precisaria tomar outras medidas de estímulo?
"É necessário ter um pouco de paciência", respondeu. "Às vezes, se adotam pela impaciência várias medidas e quando todas fazem efeito, a dose é muito forte, para qualquer dos lados, isso acaba criando certa volatilidade no crescimento econômico, o que não é bom. O ideal é que a gente consiga manter sempre um crescimento relativamente estável, em torno de 4% ou 5%."
Com relação à política econômica, o presidente do Itaú Unibanco afirma observar uma mudança positiva.
"Vejo um peso maior na política fiscal. O Brasil tem tradição de controle da inflação via juros, via política monetária. Esse governo tem uma preocupação maior, um compromisso maior com a parte fiscal, que, acho, vai ajudar muito na redução dos juros de forma mais estável." "Acho que vamos ver esse maior compromisso em ter uma política mais apertada pode criar condições de a gente ter uma redução definitiva de juros reais no Brasil", disse.
"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas"
ROBERTO SETUBAL
presidente do Itaú Unibanco
DAVI E GOLIAS
"É só falar com brasileiros e indianos para se sentir uma lufada de otimismo", comentou o CEO de um banco europeu. Mas, em meio ao prestígio brasileiro no evento, ouviram-se também críticas, por exemplo, em relação ao protecionismo brasileiro, em um momento em que os Brics "invadem outros mercados".
Em resposta, o presidente da Embraer, Frederico Curado, lembrou em um dos painéis em que discursou, ao lado de Pascal Lamy e ministros de outros países, que há diferenças entre os Brics.
"O Brasil não está ameaçando a indústria de ninguém. Está tendo seu mercado doméstico ameaçado. E tem o câmbio, a força do real. Não podemos fingir que não existe. Na verdade, o Brasil tem deficit de balança comercial de produtos industrializados de US$ 50 bilhões", disse.
A Embraer participou de reuniões com grupo de aviação e de transportes, em geral, em que se discutiu um projeto de visto eletrônico. "Tudo o que favorece a mobilidade das pessoas, favorece o setor", afirmou. "A Embraer tem muito mais visibilidade do que seu tamanho. Por ser de alta tecnologia de país, há alguns anos, subdesenvolvido. Há uma certa simpatia aqui, como Davi e Golias, por ela ter sobrevivido em meio a gigantes. Ainda é uma empresa pequena, muito menor do que seus pares aqui, que têm receita de US$ 50 bi, quase dez vezes maior que a Embraer."
DA 'MONTANHA MÁGICA'
Crise não terá igual impacto no Brasil, diz Renault
Carlos Ghosn, presidente global das montadoras Renault e Nissan, disse à coluna que a Europa terá uma contração inevitável, mas que ela não terá o mesmo impacto no Brasil.
"Em 2012 o Brasil vai se manter bem, apesar da influência da Europa. Investimos em fábrica no Rio de Janeiro e vamos continuar a investir no país, conforme havíamos planejado", disse.
"Estou otimista com o Brasil para os próximos anos."
Antes, no debate "Difíceis Escolhas em Tempos de Crise", com foco no Japão e nos últimos desastres naturais, quando indagado sobre como agiu ante dificuldades nas empresas, ele recomendou agir sem autopiedade.
"Escolha uma só prioridade, não duas. E saiba que será bombardeado, impopular, mas faça o que tem de ser feito. É para isso que você está lá. Se não aguentar o emocional, deixe o cargo para que outro possa fazê-lo."
REDIMENSIONADO
Para André Esteves, do BTG Pactual, a coincidência de os três bancos brasileiros estarem em Davos, dois deles (Bradesco e BTG) pela primeira vez, se explica pela importância adquirida por instituições financeiras brasileiras. "Com a crise, nossos bancos ficaram grandes. Participamos de reuniões com os principais bancos do mundo. Mudamos de patamar."
PRESENÇA CONFIRMADA
Nunca vieram tantos empresários brasileiros ao Fórum nos alpes suíços como neste ano. Foram 42, boa parte, estreante no encontro global de lideranças empresariais e políticas.
O número é ainda muito discreto se comparado ao de indianos e chineses. Apesar de o maior feriado chinês ter coincidido com o evento suíço, ainda assim 63 representantes marcaram presença.
O número recorde de brasileiros representa um avanço ainda mais significativo dada a notada ausência do governo brasileiro.
A presidente Dilma Rousseff declinou do convite e, pela primeira vez, em muitos anos, faltaram ao mesmo tempo o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central. Só o ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) e Luciano Coutinho, presidente do BNDES, vieram a Davos.
A tradicional noite de gala deste ano foi organizada pelo governo brasileiro, via Apex. O convite enviado a participantes tinha a assinatura do ministro Fernando Pimentel, da Indústria e Comércio, que não veio.
"Foi gasto um dinheiro nosso nisso e nem o ministro vem...", lamentou um empresário brasileiro peso-pesado.
Aversão defasada
Para Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, alguns participantes de painéis estavam um pouco defasados em relação ao que vem acontecendo na Europa no período pós-Draghi no BCE (Banco Central Europeu), como se não tivessem ainda se dado conta de que a aversão ao risco diminuiu muito na Europa e nos EUA.
"As tensões europeias se reduziram significativamente quando o Mario Draghi praticamente decretou que não teremos cadáveres bancários na Europa. O alívio dessa preocupação tirou em grande medida a tensão do tema fiscal, ainda que requeira ajustes por um bom tempo."
Barros elogiou alguns painéis, como o que tratou do "futuro da ciência econômica", com Robert Shiller (de Yale), Joseph Stiglitz (de Columbia) e Peter Diamond (do MIT). "Defendem as modelagens sofisticadas, mas sempre reconhecendo que são muito restritas. Foi [uma reflexão] antológica."
om JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ
Não vejo o Brasil sendo muito afetado, diz Setubal
"Estou vendo tanto pessimismo que estou ficando mais otimista", disse o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual.
Esse era o tom entre empresários e executivos brasileiros presentes no Fórum Econômico Mundial, encerrado ontem em Davos, na Suíça.
"O Brasil está muito bem-visto, com economia sólida, distante dos problemas que estamos vendo nos EUA e na Europa", afirmou Roberto Setubal, presidente do Banco Itaú Unibanco.
A percepção sobre o Brasil está bastante consolidada como muito positiva, em condições de manter uma economia razoável.
Os banqueiros brasileiros tiveram reuniões com seus pares de outros países.
"Eles veem o Brasil com muito mais interesse, mais respeito, os próprios bancos brasileiros com mais respeito. O BC é também muito bem-visto. É sobretudo o conjunto da obra que traz esse prestígio que o Brasil está desfrutando", afirmou.
Setubal observou o grande interesse de investidores. "Até de gente que não tem nada a ver com o Brasil. Interesse variadíssimo, desde gente que quer investir em terras no Brasil até querendo fazer serviços para o banco, empresas que não estão no Brasil, mas gostariam de ir, americanos, europeus..."
"A Europa é o centro das preocupações aqui, os temas euro e Europa estiveram presentes em todas as discussões que eu vi, acho que, de fato, merece preocupação grande. Acho que veremos na melhor hipótese a Europa crescendo muito pouco, por muito tempo, acho que tem de fazer um grande ajuste nas suas finanças, no seu modelo político inclusive. Acho que vai ser um período bastante difícil. Por outro lado, os EUA têm dado sinais mais sólidos de recuperação e isso ajudará certamente o mundo a manter o crescimento."
"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas", disse.
Para Setubal, a economia crescerá mais neste ano do que em 2011.
"Entre 3,5% e 4%. A redução de juros já mostra sinais de estímulo na economia. A política monetária demora um pouco para fazer efeito, mas já começa a se perceber. Tivemos o segundo semestre de forma geral muito fraco, especialmente o terceiro trimestre, mas já estamos sentindo uma reativação."
O governo precisaria tomar outras medidas de estímulo?
"É necessário ter um pouco de paciência", respondeu. "Às vezes, se adotam pela impaciência várias medidas e quando todas fazem efeito, a dose é muito forte, para qualquer dos lados, isso acaba criando certa volatilidade no crescimento econômico, o que não é bom. O ideal é que a gente consiga manter sempre um crescimento relativamente estável, em torno de 4% ou 5%."
Com relação à política econômica, o presidente do Itaú Unibanco afirma observar uma mudança positiva.
"Vejo um peso maior na política fiscal. O Brasil tem tradição de controle da inflação via juros, via política monetária. Esse governo tem uma preocupação maior, um compromisso maior com a parte fiscal, que, acho, vai ajudar muito na redução dos juros de forma mais estável." "Acho que vamos ver esse maior compromisso em ter uma política mais apertada pode criar condições de a gente ter uma redução definitiva de juros reais no Brasil", disse.
"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas"
ROBERTO SETUBAL
presidente do Itaú Unibanco
DAVI E GOLIAS
"É só falar com brasileiros e indianos para se sentir uma lufada de otimismo", comentou o CEO de um banco europeu. Mas, em meio ao prestígio brasileiro no evento, ouviram-se também críticas, por exemplo, em relação ao protecionismo brasileiro, em um momento em que os Brics "invadem outros mercados".
Em resposta, o presidente da Embraer, Frederico Curado, lembrou em um dos painéis em que discursou, ao lado de Pascal Lamy e ministros de outros países, que há diferenças entre os Brics.
"O Brasil não está ameaçando a indústria de ninguém. Está tendo seu mercado doméstico ameaçado. E tem o câmbio, a força do real. Não podemos fingir que não existe. Na verdade, o Brasil tem deficit de balança comercial de produtos industrializados de US$ 50 bilhões", disse.
A Embraer participou de reuniões com grupo de aviação e de transportes, em geral, em que se discutiu um projeto de visto eletrônico. "Tudo o que favorece a mobilidade das pessoas, favorece o setor", afirmou. "A Embraer tem muito mais visibilidade do que seu tamanho. Por ser de alta tecnologia de país, há alguns anos, subdesenvolvido. Há uma certa simpatia aqui, como Davi e Golias, por ela ter sobrevivido em meio a gigantes. Ainda é uma empresa pequena, muito menor do que seus pares aqui, que têm receita de US$ 50 bi, quase dez vezes maior que a Embraer."
DA 'MONTANHA MÁGICA'
Crise não terá igual impacto no Brasil, diz Renault
Carlos Ghosn, presidente global das montadoras Renault e Nissan, disse à coluna que a Europa terá uma contração inevitável, mas que ela não terá o mesmo impacto no Brasil.
"Em 2012 o Brasil vai se manter bem, apesar da influência da Europa. Investimos em fábrica no Rio de Janeiro e vamos continuar a investir no país, conforme havíamos planejado", disse.
"Estou otimista com o Brasil para os próximos anos."
Antes, no debate "Difíceis Escolhas em Tempos de Crise", com foco no Japão e nos últimos desastres naturais, quando indagado sobre como agiu ante dificuldades nas empresas, ele recomendou agir sem autopiedade.
"Escolha uma só prioridade, não duas. E saiba que será bombardeado, impopular, mas faça o que tem de ser feito. É para isso que você está lá. Se não aguentar o emocional, deixe o cargo para que outro possa fazê-lo."
REDIMENSIONADO
Para André Esteves, do BTG Pactual, a coincidência de os três bancos brasileiros estarem em Davos, dois deles (Bradesco e BTG) pela primeira vez, se explica pela importância adquirida por instituições financeiras brasileiras. "Com a crise, nossos bancos ficaram grandes. Participamos de reuniões com os principais bancos do mundo. Mudamos de patamar."
PRESENÇA CONFIRMADA
Nunca vieram tantos empresários brasileiros ao Fórum nos alpes suíços como neste ano. Foram 42, boa parte, estreante no encontro global de lideranças empresariais e políticas.
O número é ainda muito discreto se comparado ao de indianos e chineses. Apesar de o maior feriado chinês ter coincidido com o evento suíço, ainda assim 63 representantes marcaram presença.
O número recorde de brasileiros representa um avanço ainda mais significativo dada a notada ausência do governo brasileiro.
A presidente Dilma Rousseff declinou do convite e, pela primeira vez, em muitos anos, faltaram ao mesmo tempo o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central. Só o ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) e Luciano Coutinho, presidente do BNDES, vieram a Davos.
A tradicional noite de gala deste ano foi organizada pelo governo brasileiro, via Apex. O convite enviado a participantes tinha a assinatura do ministro Fernando Pimentel, da Indústria e Comércio, que não veio.
"Foi gasto um dinheiro nosso nisso e nem o ministro vem...", lamentou um empresário brasileiro peso-pesado.
Aversão defasada
Para Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, alguns participantes de painéis estavam um pouco defasados em relação ao que vem acontecendo na Europa no período pós-Draghi no BCE (Banco Central Europeu), como se não tivessem ainda se dado conta de que a aversão ao risco diminuiu muito na Europa e nos EUA.
"As tensões europeias se reduziram significativamente quando o Mario Draghi praticamente decretou que não teremos cadáveres bancários na Europa. O alívio dessa preocupação tirou em grande medida a tensão do tema fiscal, ainda que requeira ajustes por um bom tempo."
Barros elogiou alguns painéis, como o que tratou do "futuro da ciência econômica", com Robert Shiller (de Yale), Joseph Stiglitz (de Columbia) e Peter Diamond (do MIT). "Defendem as modelagens sofisticadas, mas sempre reconhecendo que são muito restritas. Foi [uma reflexão] antológica."
om JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ
Os ilegais e o Brasil legal - JORGE FONTOURA
Correio Braziliense - 30/01/12
A Polícia Federal tem impedido a entrada de haitianos na ponte da Brasileia, no Acre, e em Tabatinga, no Amazonas, a reescrever mais um capítulo da tragédia universal dos refugiados, agora em nossas portas. De forma legal, já recepcionamos grande contingente deles, o que não justifica o anunciado uso de mediadas draconianas, com os rigores da lei, para evitar que venham muitos mais. Usa-se o simplismo ingênuo, de cara anglo-saxã, de proibir, vigiar e punir, na convicção de que em migrações indesejáveis basta fechar-se a porta, a ponte, o porto, para que tudo esteja resolvido.
Os haitianos são sobreviventes de inúmeras tragédias, algumas naturais, como terremotos e tempestades. Outras humanas, como o processo histórico trágico de que são vítimas, com sucessivos surtos de exploração e desgoverno, a gerar hordas errantes, em busca de nova vida e de novos horizontes. Como metáfora, o Haiti é a nossa África e não podemos fazer dela o que os europeus fazem com seus extracomunitários, estigmatizados até pela expressão infeliz que inventaram.
Se os haitianos querem vir para o Brasil, nada impedirá que o façam, com ou sem polícia. Por um lado, imigrantes clandestinos são obstinados e corajosos para desafiar as leis; por outro, podem constituir força de trabalho inigual, como o Brasil hoje necessita, em tantas novas áreas de desenvolvimento, carentes de empenho e de disposição. O Canadá, que está na moda, recebe mais de 250 mil imigrantes por ano, em política inteligente e de benéficos resultados para toda a sociedade.
Aqui, no caso dos haitianos, vê-se desde logo imenso campo de trabalho potencial, como no setor de hotelaria primitiva de que dispomos, a beneficiar-se com o aporte maciço de trabalhadores dispostos e hábeis em línguas internacionais. A construção civil, os grandes projetos hidrelétricos, a cultura açucareira, entre outros, são setores que poderiam capitalizar o elã desses trabalhadores, sem prejudicar a mão de obra nacional.
Soluções legais para a avalanche de imigrantes que se prenuncia são difíceis à luz do Novo Estatuto do Estrangeiro, a Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980, que, apesar do nome, já é legislação obsoleta e ultrapassada. A falta de respostas fáceis, no entanto, não representa obstáculo à capacidade criadora do Ministério da Justiça, em particular do secretário executivo, Luis Paulo Barreto, reconhecida autoridade em temas de direito internacional e do direito do estrangeiro.
Talvez em primeiro momento fosse desejável conceder visto temporário de trabalho ou algo de natureza emergencial, apenas para acomodar juriricamente a gravidade da situação. Depois, seria essencial o engajamento da sociedade civil, em grande campanha nacional, para reunirem-se esforços na recepção ordenada dos tantos infelizes que nos vêm procurar.
O Sebrae, os sindicatos, as delegacias regionais do trabalho, os clubes de serviço, as associações comerciais, entre tantas outras instituições, seriam essenciais na condução de programas abrangentes de treinamento e de incorporação de haitianos a nosso mercado de trabalho. O Brasil, que dá lições ao mundo com sua atuação na Minustah (Mission des Nations Unies pour la stabilisation en Haiti), poderia agora dar outro exemplo dignificante, a exercer na prática a vocação generosa do povo.
Se no passado o Brasil é em certa medida a história de imigrações desordenadas e caóticas que ocasionaram aflições e heroísmos desmedidos, no presente, razões e motivações não nos faltam para bem acolher estrangeiros. Afinal, eles são apenas como muitos de nossos ancestrais que um dia também quiseram ser brasileiros.
Por fim, se assim o fizermos, demonstraremos que nossa Constituição não é apenas um amontoado de letras frias na defesa de direitos humanos e de valores humanitários abstratos. Superaremos assim a retórica para passar a ação, com atos de governo e com engajamento cívico e social, na contundência inequívoca das decisões de Estado.
A mulher, o bebê e o intelectual - LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SP - 30/01/12
Os comunistas mataram muito mais gente no século 20 do que o nazismo, o que é óbvio para qualquer pessoa minimamente alfabetizada em história contemporânea.
Disse isso recentemente num programa de televisão. Alguns telespectadores indignados (hoje em dia ficar indignado facilmente é quase índice de mau-caratismo) se revoltaram contra o que eu disse.
Claro, a maior parte dos intelectuais de esquerda mente sobre isso para continuar sua pregação evangélica (no mau sentido) e fazer a cabeça dos coitados dos alunos. Junto com eles, também estão os partidos políticos como os que se aproveitam, por exemplo, do caso Pinheirinho para "armar" a população.
O desespero da esquerda no Brasil se dá pelo fato de que, depois da melhoria econômica do país, fica ainda mais claro que as pessoas não gostam de vagabundos, ladrões e drogados travestidos de revolucionários. Bandido bom é bandido preso. A esquerda torce para o mundo dar errado e assim poder exercer seu terror de sempre.
Mas voltemos ao fato histórico sobre o qual os intelectuais de esquerda mentem: os comunistas (Stálin, Lênin, Trótski, Mao Tse-tung, Pol Pot e caterva) mataram mais do que Hitler e em nome das mesmas coisas que nossos intelectuais/políticos radicais de esquerda hoje pregam.
Caro leitor, peço licença para pedir a você que leia com atenção o trecho abaixo e depois explico o que é. Peço principalmente para as meninas que respirem fundo.
"(...) um novo interrogador, um que eu não tinha visto antes, descia a alameda das árvores segurando uma faca longa e afiada. Eu não conseguia ouvir suas palavras, mas ele falava com uma mulher grávida e ela respondia pra ele. O que aconteceu em seguida me dá náuseas só em pensar. (...): Ele tira as roupas dela, abre seu estômago, e arranca o bebê. Eu fugi, mas era impossível escapar do som de sua agonia, os gritos que lentamente deram lugar a gemidos e depois caíram no piedoso silêncio da morte. O assassino passou por mim calmamente segurando o feto pelo pescoço. Quando ele chegou à prisão, (...), amarrou um cordão ao redor do feto e o pendurou junto com outros, que estavam secos e negros e encolhidos."
Este trecho é citado pelo psiquiatra inglês Theodore Dalrymple em seu livro "Anything Goes - The Death of Honesty", Londres, Monday Books, 2011. Trata-se de um relato contido na coletânea organizada pelo "scholar" Paul Hollander, "From Gulag to the Killing Fields", que trata dos massacres cometidos pela esquerda na União Soviética, Leste Europeu, China, Vietnã, Camboja (este relato citado está na parte dedicada a este país), Cuba e Etiópia.
Dalrymple devia ser leitura obrigatória para todo mundo que tem um professor ou segue um guru de esquerda que fala como o mundo é mau e que devemos transformá-lo a todo custo. Ou que a sociedade devia ser "gerida" por filósofos e cientistas sociais.
Pol Pot, o assassino de esquerda e líder responsável por este interrogador descrito no trecho ao lado, estudou na França com filósofos e cientistas sociais (que fizeram sua cabeça) antes de fazer sua revolução, e provavelmente tinha como professor um desses intelectuais (do tipo Alain Badiou e Slavoj Zizek) que tomam vinho chique num ambiente burguês seguro, mas que falam para seus alunos e seguidores que devem "mudar o mundo".
De início, se mostram amantes da "democracia e da liberdade", mas logo, quando podem, revelam que sua democracia ("real", como dizem) não passa de matar quem não concorda com eles ou destruir toda oposição a sua utopia. O século 20 é a prova cabal deste fato.
Escondem isso dos jovens a fim de não ter que enfrentar sua ascendência histórica criminosa, como qualquer idiota nazista careca racista tem que enfrentar seu parentesco com Auschwitz.
Proponho uma "comissão da verdade" para todas as escolas e universidades (trata-se apenas de uma ironia de minha parte), onde se mente dizendo que Stálin foi um louco raro na horda de revolucionários da esquerda no século 20. Não, ele foi a regra.
Com a crise do euro e a Primavera Árabe, o "coro das utopias" está de volta.
Os comunistas mataram muito mais gente no século 20 do que o nazismo, o que é óbvio para qualquer pessoa minimamente alfabetizada em história contemporânea.
Disse isso recentemente num programa de televisão. Alguns telespectadores indignados (hoje em dia ficar indignado facilmente é quase índice de mau-caratismo) se revoltaram contra o que eu disse.
Claro, a maior parte dos intelectuais de esquerda mente sobre isso para continuar sua pregação evangélica (no mau sentido) e fazer a cabeça dos coitados dos alunos. Junto com eles, também estão os partidos políticos como os que se aproveitam, por exemplo, do caso Pinheirinho para "armar" a população.
O desespero da esquerda no Brasil se dá pelo fato de que, depois da melhoria econômica do país, fica ainda mais claro que as pessoas não gostam de vagabundos, ladrões e drogados travestidos de revolucionários. Bandido bom é bandido preso. A esquerda torce para o mundo dar errado e assim poder exercer seu terror de sempre.
Mas voltemos ao fato histórico sobre o qual os intelectuais de esquerda mentem: os comunistas (Stálin, Lênin, Trótski, Mao Tse-tung, Pol Pot e caterva) mataram mais do que Hitler e em nome das mesmas coisas que nossos intelectuais/políticos radicais de esquerda hoje pregam.
Caro leitor, peço licença para pedir a você que leia com atenção o trecho abaixo e depois explico o que é. Peço principalmente para as meninas que respirem fundo.
"(...) um novo interrogador, um que eu não tinha visto antes, descia a alameda das árvores segurando uma faca longa e afiada. Eu não conseguia ouvir suas palavras, mas ele falava com uma mulher grávida e ela respondia pra ele. O que aconteceu em seguida me dá náuseas só em pensar. (...): Ele tira as roupas dela, abre seu estômago, e arranca o bebê. Eu fugi, mas era impossível escapar do som de sua agonia, os gritos que lentamente deram lugar a gemidos e depois caíram no piedoso silêncio da morte. O assassino passou por mim calmamente segurando o feto pelo pescoço. Quando ele chegou à prisão, (...), amarrou um cordão ao redor do feto e o pendurou junto com outros, que estavam secos e negros e encolhidos."
Este trecho é citado pelo psiquiatra inglês Theodore Dalrymple em seu livro "Anything Goes - The Death of Honesty", Londres, Monday Books, 2011. Trata-se de um relato contido na coletânea organizada pelo "scholar" Paul Hollander, "From Gulag to the Killing Fields", que trata dos massacres cometidos pela esquerda na União Soviética, Leste Europeu, China, Vietnã, Camboja (este relato citado está na parte dedicada a este país), Cuba e Etiópia.
Dalrymple devia ser leitura obrigatória para todo mundo que tem um professor ou segue um guru de esquerda que fala como o mundo é mau e que devemos transformá-lo a todo custo. Ou que a sociedade devia ser "gerida" por filósofos e cientistas sociais.
Pol Pot, o assassino de esquerda e líder responsável por este interrogador descrito no trecho ao lado, estudou na França com filósofos e cientistas sociais (que fizeram sua cabeça) antes de fazer sua revolução, e provavelmente tinha como professor um desses intelectuais (do tipo Alain Badiou e Slavoj Zizek) que tomam vinho chique num ambiente burguês seguro, mas que falam para seus alunos e seguidores que devem "mudar o mundo".
De início, se mostram amantes da "democracia e da liberdade", mas logo, quando podem, revelam que sua democracia ("real", como dizem) não passa de matar quem não concorda com eles ou destruir toda oposição a sua utopia. O século 20 é a prova cabal deste fato.
Escondem isso dos jovens a fim de não ter que enfrentar sua ascendência histórica criminosa, como qualquer idiota nazista careca racista tem que enfrentar seu parentesco com Auschwitz.
Proponho uma "comissão da verdade" para todas as escolas e universidades (trata-se apenas de uma ironia de minha parte), onde se mente dizendo que Stálin foi um louco raro na horda de revolucionários da esquerda no século 20. Não, ele foi a regra.
Com a crise do euro e a Primavera Árabe, o "coro das utopias" está de volta.
Com olhos na Argentina - SERGIO LEO
Valor Econômico - 30/01/12
A presidente Dilma Rousseff viaja a Cuba nesta semana, incomodada porque, no Brasil, parece haver mais preocupação com a questão dos direitos humanos na ilha que com o possível papel do Brasil nas transformações liberalizantes do modelo econômico dirigido por Raúl Castro. Mas é ao Sul, e não no Caribe, que está o maior incômodo sentido no Palácio do Planalto. Há más notícias vindas da Argentina, e elas podem ficar piores.
No governo e na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), sabe-se que os argentinos atravessarão dificuldades para fechar suas contas externas neste ano, de queda de preços nas commodities de exportação, quebra de safras com a seca e retração de mercados mundiais. Nos últimos dias, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, pediu audiência à presidente argentina, Cristina Kirchner, e tem defendido a busca de alternativas para melhorar as contas de comércio na Argentina. Um estudo, realizado ainda no governo Luiz Inácio Lula da Silva, orienta as sugestões do executivo.
No governo Lula, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), chegou a fazer um levantamento sobre a competitividade argentina, na busca da desejada e ainda frustrada integração produtiva com o vizinho. Até hoje, apenas a indústria automotiva conseguiu êxito na integração dos parques produtivos de Brasil e Argentina, e mesmo essa enfrenta agora problemas nas linhas de montagem com os atrasos de entrega de peças provocado pelo protecionismo argentino. A ABDI chamou atenção para a competitiva indústria de petróleo e gás e para a incipiente e promissora indústria naval no país vizinho.
Não é por outra razão que esses dois exemplos têm sido citados por Skaf. Mas o estudo da ABDI mostrou obstáculos aos argentinos para se associar ao parque produtivo brasileiro de gás e petróleo ou fornecer embarcações: falta padrão comum de certificação, há requisitos técnicos divergentes e a legislação que privilegia fornecedores nacionais no Brasil teria de ser alterada para incluir empresas do país vizinho. A novidade é a postura da Fiesp, em busca de acordo com a Argentina - negligenciada pela indústria brasileira em favor de mercados mais promissores, segundo admitiram empresários paulistas reunidos há duas semanas na sede da federação.
Duas vozes foram importantes para garantir o tom conciliatório na Fiesp: o diretor de Relações Internacionais e Comércio Exterior, Roberto Giannetti, e o consultor e ex-secretário de Comércio Exterior no governo Lula Welber Barral.
A boa vontade não é consensual, porém. Executivos do setor de calçados, furiosos com as constantes retenções indevidas de mercadorias nas alfândegas, acusam a Argentina de não cumprir acordos, como o firmado pelo setor para uma cota informal de exportações àquele mercado.
Os conflitos comerciais apartam os parques produtivos e desencorajam empresários que poderiam sentir atração pela soma dos dois mercados. Como o estudo da ABDI, há outras iniciativas ensaiadas no governo Lula - como um projeto para financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para empresas argentinas - que acabaram paralisadas com a falta de sintonia entre os dois governos. Não bastassem as divergências entre as equipes econômicas, é palpável a falta de paciência de Dilma Rousseff com Cristina Kirchner.
Analistas argentinos reparam que as medidas protecionistas no Brasil, ao contrário das adotadas pelo governo Kirchner, não criaram incertezas nem interromperam as cadeias de fornecimento nacionais, e cuidaram de preservar os sócios do Mercosul. A Argentina não cogita isentar o Brasil das restrições de entrada de mercadorias; está premida pela carência de divisas para cumprir suas obrigações internacionais. Como avaliou uma consultoria argentina, para a Fiesp, um superávit comercial inferior a US$ 5 bilhões levaria o país à bancarrota.
Os problemas argentinos, como os dançarinos, no tango, vêm em dupla: a encrenca econômica anda abraçada à política, que complica a interlocução com o país vizinho. Difícil saber com quem afinar os passos: o encarregado do mais recente controle sobre importações, Ricardo Echegarray, presidente da Anfip (a Receita Federal argentina) recebeu caneladas do poderoso secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, que andou se estranhando com o vice-presidente Amado Boudou e disputa influência no governo com o outrora influente ministro de Planejamento e Investimento Público Júlio de Vido.
Echegarray divulgou as normas para a declaração antecipada que, a partir de 1º de fevereiro, todos importadores terão de entregar à Anfip para ter liberada a entrada das mercadorias no país em um prazo que prometeu não ser superior a dez dias corridos. Moreno telefonou a dirigentes de associações empresariais exigindo que os importadores lhe mandem por e-mail um formulário diferente do da Anfip com dados pormenorizados sobre o que querem importar; e informou que deve levar até quinze dias úteis para analisar os dados, até porque tem só oito funcionários para a tarefa.
Boudou entrou em cena, em entrevista para uma rádio local, para dizer que ninguém precisa mandar nenhum e-mail a Moreno, pois a Anfip será a "janela única" para informar ao governo.
Boudou também andou eriçando sensibilidades com declarações sobre um possível terceiro mandato para Cristina - o que alguns interpretaram como uma tentativa de abafar a disputa já existente entre peronistas, para saber quem sucederá a presidente. É nesse ambiente movediço que o Brasil quer evitar novas barreiras ao comércio bilateral. Cada passo exigirá muito ensaio, e os calos são muitos; será quase impossível não pisar em algum.
Liberdade, em papel ou eletrônica - ALEXANDRE BARROS
O Estado de S.Paulo - 30/01/12
Tive recentemente a primeira experiência de ler um livro integralmente na tela. E acho que vale a pena compartilhar com você, leitor.
Li no Estadão (19/11/2011) a crítica do livro Em Casa - Uma Breve História da Vida Doméstica (Companhia das Letras), de Bill Bryson, um americano que viveu quase 30 anos na Inglaterra e lá comprou uma casa vitoriana. Bryson resolveu estudar a história da casa e acabou produzindo um excelente texto sobre a história das moradias desde a Idade da Pedra até os nossos dias. O principal foco é a arquitetura inglesa.
Busquei o livro na internet e o achei numa biblioteca americana, na qual estou matriculado, de onde poderia tomá-lo emprestado. Até aí, nada de mais. Pedi, então, um exemplar e recebi um e-mail avisando que uma cópia estaria disponível no meu computador (cadastrado na biblioteca) por 14 dias. Em tempo: trata-se de um computador, não de um tablet, mas tudo o que aqui descrevo se aplica ao uso de um tablet (mas não para leitores exclusivos como o Kindle).
Comecei a lê-lo e, como aprendi depois lendo outras obras de Bryson, de quem virei fã, o livro tende a ser agradavelmente enciclopédico e exaustivo, contando as histórias interessantes sobre temas que a maioria dos professores insiste em ensinar da maneira mais enfadonha e ineficiente possível. Quem começa a ler um livro enciclopédico na tela se depara com muita coisa da qual nunca ouvira falar. Se esse livro fala de habitações desde a Idade da Pedra até o século 20, a coisa se complica mais ainda.
Aqui vem o que, para mim, foi inédito - e confesso que nunca havia lido nada sobre usar o computador e a internet para livros do ponto de vista que passo a descrever. Apareciam referências aos mais diferentes estilos arquitetônicos, desde as cavernas até os equipamentos utilizados para tornar as moradias mais confortáveis, mais quentes no inverno e mais amenas no verão, e tudo isso envolvia termos que eu não tinha a menor ideia do que se tratava. Sem pensar, quase instintivamente, quando me deparava com essa situação clicava em meia dúzia de teclas e pulava para o Google (em especial para as imagens) ou, para mais detalhes, para a Wikipédia.
Foi aí que se abriu um mundo novo para este leitor com 69 anos de carreira. Todas as casas, coisas, ferramentas e tecnologias apareciam, aos toques, maravilhosas, em cores, como se eu estivesse lendo um livro infinitamente ilustrado. Simples, não?
Essa foi a mais fantástica descoberta de um uso ainda desconhecido das ferramentas mais básicas da informação na internet. Consegui transformar a experiência de ler uma excelente obra toda em texto, especialmente usando a busca de imagens, num livro exaustivamente ilustrado, que, se fosse de papel, teria consumido, seguramente, três ou quatro vezes mais páginas do que as que foram usadas somente nesse texto.
A ajuda eletrônica para ilustrar a leitura foi uma experiência fantástica. Ignoro quantos leitores já tiveram essa experiência, mas para mim foi inédita e excelente.
Comentei com um amigo, que, ceticamente, me disse ser perfeitamente possível fazer isso lendo um livro de papel e indo ao computador cada vez que precisasse de uma ilustração. Claro que isso é possível, mas a rapidez e o automatismo de estar lendo na tela e com meia dúzia de toques chegar a um mundo fascinante de imagens novas eram inéditos para mim.
Isso para um leitor a quem o máximo de ilustrações permitidas na infância e na juventude foram uns bicos de pena de reis famosos com perucas encaracoladas e as ilustrações da coleção infantil de Monteiro Lobato, que materializavam para as crianças a Emília, o Pedrinho, a Narizinho, a Dona Benta, a Tia Nastácia e o Visconde de Sabugosa. Além disso, só um odioso livro chamado João Felpudo, que mostrava as consequências nefastas dos maus hábitos de higiene e aterrorizava as crianças com as consequências de não cortar as unhas ou o cabelo e não tomar banho.
A qualidade do livro - traduzido do alemão, segundo uma amiga versada na cultura germânica - era discutível quando eu já tinha aprendido tudo o que precisava sobre higiene. O uso do desodorante, se bem me lembro, nem era mencionado... Já aos 20 e alguns anos achei uma velha cópia em casa e percebi que o belo chapéu que eu admirava no João Felpudo era uma vasta cabeleira que o autor chamava de imunda e imprópria, mas, na década de 1960, já havia virado moda, lançada pelo roqueiro Jimmy Hendrix e pela ativista política de esquerda americana Angela Davis.
Em suma, todas essas lembranças são para dizer quão afortunados somos por dispormos de tecnologias fantásticas como as que nos propiciam as novas ferramentas eletrônicas.
Tomara que a campanha liderada pela Wikipédia para barrar de vez a tramitação no Congresso americano dos projetos de lei do Sopa (Stop Online Piracy Act) e do Pipa (Protect Intellectual Property Act) - que pretendem acabar com a pirataria proibindo a difusão do conhecimento - acabe dando certo. Esqueceram-se os autores do projeto da destruição criativa do capitalismo, de Joseph Schumpeter, que (em Capitalismo, Socialismo e Democracia) atribui aos produtores o custo de inovar e descobrir soluções para ganhar dinheiro e sobreviver por meio da competição, fornecendo mais, e não menos, alternativas aos consumidores e deixando a estes, e não à lei, a escolha do que querem ler, ver ou consumir.
Talvez seja a hora de rever o filme O Povo Contra Larry Flynt, o herói maldito da liberdade de expressão, que está paraplégico por causa do tiro de um fanático e segue publicando sua revista Hustler - de péssimo gosto, na minha opinião. Isso porque a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que mais importante do que tudo é a liberdade de expressão - e agora dispondo da nova fronteira eletrônica dos livros, das enciclopédias e da revista Hustler na internet.
Menos sacolas, mais lixo nas ruas - LÍVIO GIOSA
FOLHA DE SP - 30/01/12
As moscas sumiram, pois o lixo orgânico é embalado nas sacolas plásticas; com o seu banimento, veremos lixo pelas ruas ou em caixas de papelão
Quem está com a razão? Os supermercados, os fabricantes, o poder público ou o consumidor?
O debate sobre o acordo do governo com os supermercados a respeito do banimento das sacolas plásticas tem de começar imediatamente e em nome da verdade.
Quais interesses estão realmente envolvidos?
O detalhe é que este acordo voluntário entre o governo e os supermercadistas só atende a um dos lados da balança.
Até agora, parece que os argumentos político e econômico afloram, já que o meio ambiente está só de pano de fundo.
Os supermercados gastam R$ 500 milhões ao ano com as sacolinhas plásticas. Ao tentar bani-las, a pergunta é: eles irão repassar esse custo ao consumidor diminuindo o valor dos produtos?
Esse mesmo consumidor já adquiriu um direito, e agora resolveram tirá-lo sem consultar.
As sacolas plásticas significam somente 0,2% dos aterros sanitários. Elas são muito menos poluentes em todo ciclo de produção e, principalmente, são reutilizáveis.
A questão da saúde pública, pouco abordada neste debate, precisa vir à tona.
Onde estão as moscas? Sumiram, porque o lixo orgânico é embalado nas sacolas plásticas.
Com a operação de banimento, teremos de comprar muito mais sacos de lixo para minimizar este impacto. A conta é simples: em média R$ 75,00 a mais por mês no orçamento doméstico. As classes C, D e E irão aguentar?
Veremos, assim, muito lixo jogado nas ruas ou em caixas de papelão. Vai ocorrer uma ampliação das doenças infecciosas.
Por outro lado, já que o governo, tão cioso pela causa ambiental, entrou nessa história, há uma questão básica a abordar.
Só em São Paulo, mais de 100 mil trabalhadores, direta ou indiretamente, perderão seus empregos.
O governo, como instituição imparcial e isenta, deveria, minimamente, ouvir o conjunto da sociedade envolvida. Assim, além dos citados no início do artigo, os trabalhadores necessariamente teriam que participar do debate.
Diante de tal situação, porque os deputados estaduais não propuseram audiências públicas para coletivizar o debate e tirar conclusões mais imparciais?
Cabe aqui, portanto, algumas conclusões e proposições, diante do cenário que se apresenta:
1) Os interesses econômicos e políticos envolvidos nesta questão estão acima do ambiental;
2) O governo de São Paulo deveria sugerir um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) para definir uma ação conjunta entre os envolvidos e chegar a um acordo que possa satisfazer, a médio prazo, o interesse comum da sociedade;
3) A educação ambiental para o consumo responsável deveria ser o objetivo indutor que formaria a consciência e a sensibilização de todos, voltados para práticas sustentáveis e que relevem o consumo consciente.
Aí sim, ajustados à causa e com imparcialidade, a sociedade e os herdeiros do futuro sustentável agradecerão.
Quem está com a razão? Os supermercados, os fabricantes, o poder público ou o consumidor?
O debate sobre o acordo do governo com os supermercados a respeito do banimento das sacolas plásticas tem de começar imediatamente e em nome da verdade.
Quais interesses estão realmente envolvidos?
O detalhe é que este acordo voluntário entre o governo e os supermercadistas só atende a um dos lados da balança.
Até agora, parece que os argumentos político e econômico afloram, já que o meio ambiente está só de pano de fundo.
Os supermercados gastam R$ 500 milhões ao ano com as sacolinhas plásticas. Ao tentar bani-las, a pergunta é: eles irão repassar esse custo ao consumidor diminuindo o valor dos produtos?
Esse mesmo consumidor já adquiriu um direito, e agora resolveram tirá-lo sem consultar.
As sacolas plásticas significam somente 0,2% dos aterros sanitários. Elas são muito menos poluentes em todo ciclo de produção e, principalmente, são reutilizáveis.
A questão da saúde pública, pouco abordada neste debate, precisa vir à tona.
Onde estão as moscas? Sumiram, porque o lixo orgânico é embalado nas sacolas plásticas.
Com a operação de banimento, teremos de comprar muito mais sacos de lixo para minimizar este impacto. A conta é simples: em média R$ 75,00 a mais por mês no orçamento doméstico. As classes C, D e E irão aguentar?
Veremos, assim, muito lixo jogado nas ruas ou em caixas de papelão. Vai ocorrer uma ampliação das doenças infecciosas.
Por outro lado, já que o governo, tão cioso pela causa ambiental, entrou nessa história, há uma questão básica a abordar.
Só em São Paulo, mais de 100 mil trabalhadores, direta ou indiretamente, perderão seus empregos.
O governo, como instituição imparcial e isenta, deveria, minimamente, ouvir o conjunto da sociedade envolvida. Assim, além dos citados no início do artigo, os trabalhadores necessariamente teriam que participar do debate.
Diante de tal situação, porque os deputados estaduais não propuseram audiências públicas para coletivizar o debate e tirar conclusões mais imparciais?
Cabe aqui, portanto, algumas conclusões e proposições, diante do cenário que se apresenta:
1) Os interesses econômicos e políticos envolvidos nesta questão estão acima do ambiental;
2) O governo de São Paulo deveria sugerir um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) para definir uma ação conjunta entre os envolvidos e chegar a um acordo que possa satisfazer, a médio prazo, o interesse comum da sociedade;
3) A educação ambiental para o consumo responsável deveria ser o objetivo indutor que formaria a consciência e a sensibilização de todos, voltados para práticas sustentáveis e que relevem o consumo consciente.
Aí sim, ajustados à causa e com imparcialidade, a sociedade e os herdeiros do futuro sustentável agradecerão.
A fraude na renúncia - DEMÓSTENES TORRES
O GLOBO - 30/01/12
O artigo 57 da Constituição diz em seu parágrafo 4º que o mandato dos membros de Mesa das Casas do Congresso é de dois anos. Texto idêntico está no artigo 59 do Regimento Interno do Senado, que no parágrafo 6º do artigo 88 determina que igual se aplica a presidente e vice de comissões. A sopa de números não é detalhe burocrático do juridiquês. O tempo que o ocupante eleito fica no cargo são dois anos e pronto.
Em 1º de fevereiro de 2011, pouco antes da eleição da Mesa, a enxurrada de denúncias dando conta da divisão de mandatos me levou a suscitar questão de ordem ao presidente José Sarney. Indaguei se a duração é ou não de dois anos. Sarney confirmou que a resposta não era sua, mas da Carta Magna. Parecia óbvio. Meu intuito era alertar os colegas petistas Marta Suplicy e José Pimentel, Paulo Paim e Ana Rita, Eduardo Suplicy e Delcídio Amaral, além dos tucanos Lúcia Vânia e Flexa Ribeiro. Avisei para evitar que incorressem em fraude, quebra de decoro e improbidade, o que poderia ensejar medidas administrativas e judiciais.
Pelo pactuado, as duplas dividiriam o mandato. Ao final do primeiro ano, o titular renunciaria para haver nova eleição e seria escolhido o companheiro. Houve até sorteio para quem exerceria a etapa inicial. Assim, Marta ficaria na vice-presidência do Senado até o dia 1º de fevereiro deste ano, renunciaria, seria aberta nova votação e - surpresa! - Pimentel se elegeria. Ajuste semelhante ocorreria nas comissões, sempre ao arrepio da legalidade.
Mas acordo prévio não é renúncia, pode ser objeto de mandado de segurança preventivo para resguardar o direito dos eleitores senadores ludibriados. Procuradores da República e qualquer cidadão podem agir. A ofensa ao artigo 55 da Constituição é cristalina quanto ao procedimento incompatível com o decoro, clara como as pressões, mostradas atualmente na mídia, para que Lúcia, Paim, Delcídio e Marta deixem os postos. A palavra-chave em renúncia é espontaneidade e não ajuste, farsa. Mandato interno no Senado tem dois anos para haver estabilidade na gestão, como na Câmara dos Deputados, no STF, nos tribunais superiores. Não se pode brincar com regra que dá equilíbrio aos Poderes, nos quais é inadmissível o embuste para presidente dividir mandato com o vice ou que um senador faça o mesmo com suplente.
Um antecessor no enredo, Saturnino Braga, prometeu dividir o mandato com um suplente, o hoje notório Carlos Lupi. Embora a negociata tenha sido reconhecida como indecorosa pelo Conselho de Ética, seu mandato foi preservado porque a trama aconteceu antes da diplomação. Os oito atuais teriam sorte diferente, pois negociaram após e concretizariam a falta no início do próximo mês. Além dos atos de improbidade que importam enriquecimento ilícito e causam prejuízo ao Erário, a lei 8.429 cita no artigo 11 os que atentam "contra os princípios da administração pública" com "qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições".
Por que criar crise logo na abertura dos trabalhos legislativos? Humberto Costa, o correto líder do PT, quando da questão de ordem, culpou a mídia e supôs que se almejava "julgar ou apenar alguém por um mal que está previsto se fazer daqui a um tempo". Um ano depois, a mesma imprensa divulga que Costa aperta os ocupantes atuais para que renunciem e sejam realizadas quatro novas eleições, em flagrante ilicitude.
Revezamento é aplaudido no atletismo e falsa renúncia cabe em trecho de música. Fiz um alerta, agora faço um apelo para Lúcia, Delcídio, Paim e Marta honrarem o mandato de dois anos. Além da ilegalidade dos conchavos, será frustrante para os colegas que neles votaram crendo na seriedade do juramento em cumprir a Constituição. Não se pode acreditar que oito senadores tão verdadeiramente equilibrados e admirados tentem sair das cadeiras que ocupam para as de investigados em conselhos e tribunais.
Deuses e bestas - LEE SIEGEL
O ESTADÃO - 30/01/12
Um novo filme baseado no Coriolano de Shakespeare, dirigido e estrelado por um eletrizante Ralph Fiennes, acaba de estrear - e não poderia ser mais oportuno. A peça aborda o pior pesadelo da democracia: o líder que repentinamente revela viver acima das normas sociais. O frenético combate entre Mitt Romney e Newt Gingrich pela nomeação presidencial de seu partido trata precisamente disso. Cada um tenta provar que o outro, por baixo das aparências respeitáveis, é um sociopata.
Tive a maravilhosa sorte de estudar Coriolano há 1 milhão de anos com um dos maiores conhecedores mundiais de Shakespeare, o acadêmico inglês Frank Kermode, que morreu há um ano e meio. Ele próprio uma pessoa de voz mansa e modos polidos, Kermode saboreava o tratamento das duras realidades políticas da peça. Ele citou a ideia, atribuída a Aristóteles, de que a pessoa incapaz de viver em sociedade é ou um deus ou uma besta. O medo corrosivo na vida americana é da chegada de um líder que convença as pessoas de que é um deus encarregado de salvar o país - e de que, uma vez eleito, ele, ou ela, se revele uma besta amoral, antidemocrática.
Para encurtar a história, após várias maquinações, o talentoso general Coriolano concorre ao posto de cônsul em Roma. Com o apoio tanto do Senado como do povo, está prestes a vencer quando eclodem tumultos fomentados por seus adversários. Enfurecido, Coriolano não consegue controlar sua arrogância e sua raiva. Ele destila escárnio na ideia de democracia e insulta o povo romano, chocando-o com seu desprezo. Em razão de seus destemperos, ele é banido da cidade, sitia-a e depois é convencido a fazer uma trégua. Quando retorna à cidade, seus inimigos o assassinam. Depois de ser alçado à condição de um deus quando era um general triunfante, ele vira uma besta ao se confrontar com instituições democráticas.
O deus/besta assombra a imaginação americana. Considerem o caso do presidente Barack Obama. Até seus detratores foram silenciados pela beleza simbólica de sua eleição à Casa Branca três anos atrás. Ele alcançara um status de divindade. Poucos meses após sua posse, contudo, já era atacado como comunista, traidor, simpatizante de terroristas e, não menos importante, alguém que gostava de uma boa comida francesa. Para a angustiada mente americana, o ser divino, redentor havia se tornado um animal enfurecido determinado a dilacerar a democracia americana.
Não se trata apenas de Obama, é claro. O congressista de Nova York Anthony Weiner, um dia considerado um aposta certa como o próximo prefeito de Nova York, foi apanhado enviando imagens dele mesmo seminu a mulheres pela internet. A besta, exposta! John Edwards, que já foi tido como um candidato presidencial decente, progressista, foi apanhado com uma amante. Besta! Mark Sanford, o ex-governador sereno e polido da Carolina do Sul, foi descoberto pelo fato da própria América Latina - descobriram que tinha uma amante argentina - ser, no fundo, um inimigo bestialmente mortal da democracia americana. Grrrr!
Estou tratando de tudo isso na brincadeira, mas o anseio pelo (e o terror do) deus que se revela uma besta não é assunto para risos. A democracia é o sistema político mais frágil da Terra. Suas bênçãos de abertura, inclusão e oportunidade são também a maldição de sua vulnerabilidade a manipulações, acordos secretos, corrupção. Não se pode acalentar o sonho da democracia sem ficar constantemente vigilante sobre a possibilidade do pesadelo de sua dissolução.
E assim Gingrich acusa o rico e prestigiado Romney de ser um destruidor implacável de empregos e um sonegador fiscal. Romney acusa o bem-sucedido e respeitável Gingrich de ser um mentiroso e traidor de seu eleitorado durante seu mandato no Congresso. Gingrich se apresenta a admiradores como um defensor da moralidade tradicional e dos valores familiares. A mídia o expõe como um adúltero compulsivo que enviou papéis de divórcio a sua segunda mulher enquanto ela morria de câncer. Romney se apresenta a admiradores como alguém que se importa com as aflições da classe média. A mídia o expõe como alguém que um dia tentou intimidar uma mãe solteira a doar seu filho para adoção quando era bispo da igreja Mórmon. Em cada caso, o medo coletivo é que, por trás da fachada, os dois homens sejam, nas palavras de Kermode, "governantes ingovernáveis". Sociopatas. Bestas.
A despeito de todo seu sensacionalismo e alarmismo fabricado, a mídia está desempenhando uma função importante, como a mão confortadora de um pai que protege de pesadelos um filho vulnerável. Meu próprio medo é que um dia surja um deus/besta sem segredos sórdidos a expor. Uma falta de imperfeição humana parece ser a única qualidade que aplacará o escrutínio angustiado da democracia. Mas uma falta de imperfeição é a marca de uma implacável desumanidade. O dia do juízo da democracia americana será a chegada do deus/besta que não tem nada a esconder.
Apagão tributário - RENATA LO PRETE
FOLHA DE SP - 30/01/12
FÁBIO ZAMBELI (interino)
Falha na atualização de softwares impede que cinco milhões de empresas inscritas no SuperSimples Nacional usufruam as novas regras do programa, anunciadas por Dilma Rousseff com o alegado objetivo de estimular o crescimento da economia. Diante da pane, Estados e municípios que regulamentaram a lei ficam privados do recolhimento de impostos relativos a janeiro.
O problema técnico, de responsabilidade do Serpro, preocupa também o governo federal. Em novembro, ao sancionar o reajuste de 50% no teto de faturamento apto à simplificação tributária, a presidente cobrou celeridade na largada do novo regime de arrecadação.
Enquete Sem prazo para solucionar o impasse, o Comitê Gestor do Simples consultou secretários estaduais e municipais de finanças. Quer discutir a melhor forma de efetuar a cobrança dos tributos. Uma das opções estudadas é permitir que as empresas façam o pagamento duplicado em fevereiro.
Colegiado Depois da polêmica quanto à intervenção policial na cracolândia paulistana, o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) ouvirá amanhã titulares da Segurança Pública de Estados que serão integrados ao Plano Nacional de Combate ao Crack.
Lá e cá Cobrada em seu reduto eleitoral, Gleisi Hoffmann enfrenta um dilema. A incumbência de carimbar os principais projetos dos ministérios antes do aval de Dilma obrigará a chefe da Casa Civil a diminuir sua presença no Paraná, onde planeja disputar o governo em 2014.
Escolinha 1 A Infraero começou a treinar 39 funcionários, entre diretores, superintendentes, gerentes e assessores para atuar nas SPEs criadas para operar, via concessão, os aeroportos de Brasília, Campinas e Guarulhos.
Escolinha 2 A estatal também criou comitê que dará suporte técnico quanto às regras de participação acionária em concessionárias.
Para depois Antes de discursar enaltecendo o papel dos aliados tradicionais do PT na eleição paulistana, anteontem, Fernando Haddad combinou com integrantes do seu conselho político "uma pausa" nas declarações sobre a possível composição com Gilberto Kassab.
Conselheira Geraldo Alckmin escolheu a ex-procuradora Cristiana de Castro Moraes para ocupar a vaga de Fulvio Biazzi no Tribunal de Contas paulista. Extraído de lista tríplice de auditores que chegou ao Bandeirantes em dezembro, o nome passará pelo crivo da Assembleia.
Voto indireto Três deputados disputam outras duas cadeiras abertas este ano no TCE-SP: o estadual Jorge Caruso (PMDB) e os federais Dimas Ramalho (PPS) e Vanderlei Macris (PSDB).
Biblioteca O livro "Curar", que Alckmin deu a Lula na sexta-feira, é um dos preferidos do governador. Ele já havia presenteado Antonio Palocci com a publicação, que trata do combate ao estresse sem medicamentos.
Sacolinha O PSDB paulistano recorrerá às direções nacional e estadual da sigla para custear as prévias. A ideia é dividir a conta da votação, além da campanha dos quatro pré-candidatos.
Roadshow O PSD abre sexta-feira, em Curitiba, maratona de seminários para debater seu programa.
Memória seletiva Luiz Marinho (PT) dará nome de José Alencar ao novo hospital de clínicas de São Bernardo. O centro educacional do bairro Três Marias homenageará Celso Daniel. Outra unidade será denominada Regina Rocco, mãe da ex-primeira-dama Marisa Letícia da Silva.
Veja bem A despeito das críticas à gestão da Fundação Casa, a secretária paulista de Justiça, Eloísa Arruda, nega atrito com a presidente da entidade, Berenice Gianella.
Tiroteio
"Se o STF mantiver a liminar contra o CNJ, o Judiciário cairá em descrédito total com a população, que já o considera arrogante, antidemocrático e sem transparência."
DO PRESIDENTE DA OAB-RJ, WADIH DAMOUS, sobre o ato público que entidade fará amanhã, com apoio da CNBB e de artistas, defendendo a prerrogativa de o Conselho Nacional de Justiça investigar a conduta de magistrados.
Contraponto
Coreografia eleitoral
Flagrado na quarta-feira passada em pose semelhante à registrada em célebre fotografia de 1961 na qual o ex-presidente Jânio Quadros aparece com as pernas torcidas e os pés apontando para lados diferentes, o prefeito paulistano, Gilberto Kassab (PSD), disse:
-Aquilo é uma montagem. Ensaiei a noite inteira aquela pose e não consegui fazer de novo!
FÁBIO ZAMBELI (interino)
Falha na atualização de softwares impede que cinco milhões de empresas inscritas no SuperSimples Nacional usufruam as novas regras do programa, anunciadas por Dilma Rousseff com o alegado objetivo de estimular o crescimento da economia. Diante da pane, Estados e municípios que regulamentaram a lei ficam privados do recolhimento de impostos relativos a janeiro.
O problema técnico, de responsabilidade do Serpro, preocupa também o governo federal. Em novembro, ao sancionar o reajuste de 50% no teto de faturamento apto à simplificação tributária, a presidente cobrou celeridade na largada do novo regime de arrecadação.
Enquete Sem prazo para solucionar o impasse, o Comitê Gestor do Simples consultou secretários estaduais e municipais de finanças. Quer discutir a melhor forma de efetuar a cobrança dos tributos. Uma das opções estudadas é permitir que as empresas façam o pagamento duplicado em fevereiro.
Colegiado Depois da polêmica quanto à intervenção policial na cracolândia paulistana, o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) ouvirá amanhã titulares da Segurança Pública de Estados que serão integrados ao Plano Nacional de Combate ao Crack.
Lá e cá Cobrada em seu reduto eleitoral, Gleisi Hoffmann enfrenta um dilema. A incumbência de carimbar os principais projetos dos ministérios antes do aval de Dilma obrigará a chefe da Casa Civil a diminuir sua presença no Paraná, onde planeja disputar o governo em 2014.
Escolinha 1 A Infraero começou a treinar 39 funcionários, entre diretores, superintendentes, gerentes e assessores para atuar nas SPEs criadas para operar, via concessão, os aeroportos de Brasília, Campinas e Guarulhos.
Escolinha 2 A estatal também criou comitê que dará suporte técnico quanto às regras de participação acionária em concessionárias.
Para depois Antes de discursar enaltecendo o papel dos aliados tradicionais do PT na eleição paulistana, anteontem, Fernando Haddad combinou com integrantes do seu conselho político "uma pausa" nas declarações sobre a possível composição com Gilberto Kassab.
Conselheira Geraldo Alckmin escolheu a ex-procuradora Cristiana de Castro Moraes para ocupar a vaga de Fulvio Biazzi no Tribunal de Contas paulista. Extraído de lista tríplice de auditores que chegou ao Bandeirantes em dezembro, o nome passará pelo crivo da Assembleia.
Voto indireto Três deputados disputam outras duas cadeiras abertas este ano no TCE-SP: o estadual Jorge Caruso (PMDB) e os federais Dimas Ramalho (PPS) e Vanderlei Macris (PSDB).
Biblioteca O livro "Curar", que Alckmin deu a Lula na sexta-feira, é um dos preferidos do governador. Ele já havia presenteado Antonio Palocci com a publicação, que trata do combate ao estresse sem medicamentos.
Sacolinha O PSDB paulistano recorrerá às direções nacional e estadual da sigla para custear as prévias. A ideia é dividir a conta da votação, além da campanha dos quatro pré-candidatos.
Roadshow O PSD abre sexta-feira, em Curitiba, maratona de seminários para debater seu programa.
Memória seletiva Luiz Marinho (PT) dará nome de José Alencar ao novo hospital de clínicas de São Bernardo. O centro educacional do bairro Três Marias homenageará Celso Daniel. Outra unidade será denominada Regina Rocco, mãe da ex-primeira-dama Marisa Letícia da Silva.
Veja bem A despeito das críticas à gestão da Fundação Casa, a secretária paulista de Justiça, Eloísa Arruda, nega atrito com a presidente da entidade, Berenice Gianella.
Tiroteio
"Se o STF mantiver a liminar contra o CNJ, o Judiciário cairá em descrédito total com a população, que já o considera arrogante, antidemocrático e sem transparência."
DO PRESIDENTE DA OAB-RJ, WADIH DAMOUS, sobre o ato público que entidade fará amanhã, com apoio da CNBB e de artistas, defendendo a prerrogativa de o Conselho Nacional de Justiça investigar a conduta de magistrados.
Contraponto
Coreografia eleitoral
Flagrado na quarta-feira passada em pose semelhante à registrada em célebre fotografia de 1961 na qual o ex-presidente Jânio Quadros aparece com as pernas torcidas e os pés apontando para lados diferentes, o prefeito paulistano, Gilberto Kassab (PSD), disse:
-Aquilo é uma montagem. Ensaiei a noite inteira aquela pose e não consegui fazer de novo!
Da janela vê-se Primrose Hill - IVAN LESSA
O ESTADÃO - 30/01/12
Tom Jobim previra tudo, menos Cristo Redentor em Londres.
Que lindo.
Não entendo porque no Rio de Janeiro não se construiu uma réplica da mãe-parlamento, Westminster, ano passado, na moita. Ou no peito e na marra, que fosse. Em homenagem aos Jogos Olímpicos deste ano aqui em Londres.
Já dava para ter erguido e caído com muitos poucos mortos e nenhum laudo pericial. Teria sido uma bela homenagem digna dos ideais do barão de Coubertin.
Os ingleses não têm jeito para essas coisas.
Já nós, brasileiros, vejam o que vem sendo publicado aqui. A manchete que mais me feriu os olhos, fazendo também suas cócegas, foi a do Evening Standard de 27 de janeiro: "Brasil quer escultura gigante em Primrose Hill".
Primrose Hill é uma parte simpática, quase que dá para se dizer bucólica, do bairro de Camden, aqui em Londres.
"Escultura gigante" é coisa beirando os 10 metros.
E traduzindo o graúdo em miúdos, o esquema é simples - ou complicadérrimo -: descobriu-se que correm planos secretos para se construir uma réplica do Cristo Redentor no local mencionado como homenagem pouco espontânea, frise-se, às Olimpíadas de 2016, a terem lugar, em ainda havendo construções em pé a essa altura, no Rio de Janeiro.
O projeto, que leva fundos do governo brasileiro, segundo pelo menos o diário londrino Standard já mencionado (circulação: 610.226 exemplares) dividiu a opinião pública, de Camden e fora de Camden, inclusive a bela cabecinha da top model Kate Moss, residente do bairro, e outras pessoas apenas pessoas, top apenas para seus entes queridos.
Segundo o Standard, o projeto é tão importante que a população local vem sendo consultada por equipes especializadas inglesas contratadas pelos brasileiros para angariar dados.
Logo depois, sem cantinho, sem violão, os resultados serão apresentados às autoridades do bairro em questão.
Consta que os brasileiros querem a estátua erguida próxima ao pináculo da região, Primrose Hill, de forma a ser vista, como nosso Cristo Redentor (...e eu que era triste...), até onde os olhos puderem alcançar.
Tudo isso para comemorar o momento em que a tocha olímpica passará da mão dos ingleses para a dos brasileiros ao final dos atuais Jogos Olímpicos após a cerimônia de encerramento a ter lugar no dia 12 de agosto do ano corrente.
Os organizadores de Corcovado II (a Junta de Turismo Brasileira) exigem, ou querem, silêncio total em torno do evento. (Muita calma pra pensar?) Tal não foi possível. O Bom Tom, poeta e compositor, previra tudo, até as gravações com Sinatra, menos Corcovado em Primrose Hill.
Malcolm Kafetz, diretor da Associação de Amigos de Primrose Hill, considera a estátua unsuitable (inadequada). Um gentleman este senhor Kafetz.
Já um porta-voz para a firma Dalton Warner Davis, que trabalha com, como diz o samba, "muita coisa pra pensar" e a Junta de Turismo Brasileira, declarou que há um "número de outras opções em vista e qualquer comentário seria prematuro".
Não sendo minha vista, ou de minha janela, danem-se e "prematuro" é os tinflas. Para variar, a besteira ronda Londres.
Sou mais Chega de Saudade ou Desafinado. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.
Não entendo porque no Rio de Janeiro não se construiu uma réplica da mãe-parlamento, Westminster, ano passado, na moita. Ou no peito e na marra, que fosse. Em homenagem aos Jogos Olímpicos deste ano aqui em Londres.
Já dava para ter erguido e caído com muitos poucos mortos e nenhum laudo pericial. Teria sido uma bela homenagem digna dos ideais do barão de Coubertin.
Os ingleses não têm jeito para essas coisas.
Já nós, brasileiros, vejam o que vem sendo publicado aqui. A manchete que mais me feriu os olhos, fazendo também suas cócegas, foi a do Evening Standard de 27 de janeiro: "Brasil quer escultura gigante em Primrose Hill".
Primrose Hill é uma parte simpática, quase que dá para se dizer bucólica, do bairro de Camden, aqui em Londres.
"Escultura gigante" é coisa beirando os 10 metros.
E traduzindo o graúdo em miúdos, o esquema é simples - ou complicadérrimo -: descobriu-se que correm planos secretos para se construir uma réplica do Cristo Redentor no local mencionado como homenagem pouco espontânea, frise-se, às Olimpíadas de 2016, a terem lugar, em ainda havendo construções em pé a essa altura, no Rio de Janeiro.
O projeto, que leva fundos do governo brasileiro, segundo pelo menos o diário londrino Standard já mencionado (circulação: 610.226 exemplares) dividiu a opinião pública, de Camden e fora de Camden, inclusive a bela cabecinha da top model Kate Moss, residente do bairro, e outras pessoas apenas pessoas, top apenas para seus entes queridos.
Segundo o Standard, o projeto é tão importante que a população local vem sendo consultada por equipes especializadas inglesas contratadas pelos brasileiros para angariar dados.
Logo depois, sem cantinho, sem violão, os resultados serão apresentados às autoridades do bairro em questão.
Consta que os brasileiros querem a estátua erguida próxima ao pináculo da região, Primrose Hill, de forma a ser vista, como nosso Cristo Redentor (...e eu que era triste...), até onde os olhos puderem alcançar.
Tudo isso para comemorar o momento em que a tocha olímpica passará da mão dos ingleses para a dos brasileiros ao final dos atuais Jogos Olímpicos após a cerimônia de encerramento a ter lugar no dia 12 de agosto do ano corrente.
Os organizadores de Corcovado II (a Junta de Turismo Brasileira) exigem, ou querem, silêncio total em torno do evento. (Muita calma pra pensar?) Tal não foi possível. O Bom Tom, poeta e compositor, previra tudo, até as gravações com Sinatra, menos Corcovado em Primrose Hill.
Malcolm Kafetz, diretor da Associação de Amigos de Primrose Hill, considera a estátua unsuitable (inadequada). Um gentleman este senhor Kafetz.
Já um porta-voz para a firma Dalton Warner Davis, que trabalha com, como diz o samba, "muita coisa pra pensar" e a Junta de Turismo Brasileira, declarou que há um "número de outras opções em vista e qualquer comentário seria prematuro".
Não sendo minha vista, ou de minha janela, danem-se e "prematuro" é os tinflas. Para variar, a besteira ronda Londres.
Sou mais Chega de Saudade ou Desafinado. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.
Funai e meio ambiente - DENIS LERRER ROSENFIELD
O GLOBO - 30/01/12
A Funai publicou em 12/1, no Diário Oficial da União, a Instrução Normativa n.º 1, que versa sobre novas prerrogativas desse órgão nos processos de licenciamento ambiental de terras indígenas e de seu entorno. Mais precisamente, ela se autoinstitui como órgão licenciador para novos empreendimentos, avançando sobre as atribuições do Ibama.
O momento de edição dessa instrução normativa não deixa de ser revelador, pois ocorreu às vésperas de a Câmara dos Deputados reanalisar o novo Código Florestal. É como se ela já se contrapusesse à nova lei antecipadamente, desconsiderando assim todo o trabalho desenvolvido na Câmara e no Senado. Seria tentado a dizer que estamos diante de um abuso "legislativo", que se faz por mero ato administrativo, contrapondo-se a leis verdadeiramente ditas, elaboradas e aprovadas no Congresso Nacional.
Num primeiro momento, poder-se-ia ter a impressão de que a Funai estaria simplesmente agindo segundo suas competências, normatizando a questão ambiental dentro das terras indígenas. As aparências, porém, enganam, como se diz em linguagem popular. Nos artigos 1.º e 2.º, inciso I, fica manifesto que a atividade da Funai "no processo de licenciamento ambiental de empreendimentos causadores de impactos ambientais e socioculturais a terras e povos indígenas" diz respeito a "terras indígenas ou em seu entorno". O problema reside, então, no "entorno", termo vago e impreciso. No artigo 9.º, § 1.º, há outra precisão importante, pois é dito que terras indígenas incluem "áreas em revisão de limites ou com reivindicações previamente qualificadas quanto à tradicionalidade da ocupação".
Terras indígenas e "seu entorno" podem incluir, na verdade, qualquer extensão que um antropólogo e equipe considerarem como necessária à "reprodução física e cultural" das etnias em questão, o que significa tanto alguns poucos como dezenas de quilômetros. Não se pode esquecer de que qualquer demarcação de terras indígenas, para a Funai, diz respeito a milhares de hectares. Uma empresa envolvida num processo desses se torna, portanto, refém de qualquer tipo de arbitrariedade antropológico-administrativa, ficando à mercê de processos que se estenderiam certamente por anos. Em áreas próximas a terras indígenas passaria a Funai a agir como órgão licenciador, avançando sobre as funções do Ibama e dos órgãos ambientais estaduais.
Para além do problema do entorno, apresenta-se, ainda, outra questão da maior relevância: a de que áreas indígenas incluem terras em processo de identificação e demarcação, assim como de "revisão de limites". Ou seja, qualquer terra que estiver em processo preparatório e preliminar de estudos de identificação e demarcação deverá ser objeto de estudo ambiental controlado pela Funai, que visa a impedir que empreendimentos sejam feitos nessa área.
O absurdo chega às raias da inconstitucionalidade quando a instrução normativa estipula que terra indígena inclui "revisão de limites", eufemismo para burlar a determinação do STF quando do julgamento da Raposa-Serra do Sol, que veda a ampliação de terras indígenas. A Funai, por ato administrativo, desconsidera, com efeito, a decisão do STF!
Há um componente que poderíamos chamar de governo x governo nessa instrução normativa, como se o próprio PAC, por exemplo, devesse ser solapado. Se essa instrução for efetivamente aplicada, empreendimentos como o de Belo Monte se tornarão inviáveis. Todo projeto de construção de hidrelétricas, sobretudo na Região Amazônica, será literalmente paralisado, se não inviabilizado.
Ressalte-se que a instrução normativa vale para todo o País, e não apenas para a Região Amazônica. Considere-se que aproximadamente 13,5% do território nacional é constituído de terras indígenas, equivalentes a cerca de 110 milhões de hectares; considere-se, igualmente, que a Funai pensa aumentar significativamente esse número com novos processos de identificação e demarcação e ampliações. O resultado desse processo só poderá ser um prejuízo incalculável para novos empreendimentos, tanto nos setores da agropecuária e do agronegócio quanto na construção civil, em estradas, hidrelétricas e mineração. Note-se que não apenas empresas privadas serão prejudicadas, como também grandes empreendimentos estatais.
Segundo o artigo 4.º, § 2.º, a Funai poderá "receber petições e solicitações de acompanhamento de empreendimentos ou atividades potencial e efetivamente causadoras de impactos ambientais e socioculturais a terras e povos indígenas assinadas por: a) Comunidades indígenas; b) Organizações indígenas; c) Organizações constituídas legalmente no Brasil cujo objetivo social tenha pertinência com a defesa dos povos indígenas ou a proteção do meio ambiente; d) Órgãos licenciadores; e) Ministério Público Federal; f) Demais interessados". Atente-se para os itens b e c, que inevitavelmente estabelecerão como partes o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e ONGs, tanto nacionais quanto internacionais, sediadas no País. Abre-se um enorme espaço de atuação administrativa e política para esses ditos movimentos sociais e ONGs. A politização ideológica fecha, então, esse quadro.
A participação das comunidades indígenas potencialmente afetadas se fará durante toda a tramitação do processo, passando elas a opinar e mesmo decidir sobre a criação de um novo empreendimento público ou privado, não apenas em seu próprio território, como lhe é constitucionalmente assegurado, mas também em seu "entorno", o que é uma arbitrariedade.
Nesse contexto, a última palavra em todo empreendimento terminará nas mãos de comunidades e entidades indígenas, por intermédio de suas organizações, movimentos sociais e ONGs nacionais e internacionais. O mais sensato a ser feito pelo Ministério da Justiça é a pura e simples revogação dessa instrução normativa, sob pena de acirramento de conflitos e paralisia econômica.
EM CARTAZ - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 30/01/12
A Prefeitura de São Paulo arrecadou R$ 72 milhões em multas da Lei Cidade Limpa em 2011. Ao longo do ano, foram recolhidos 537 mil anúncios irregulares, de acordo com a Secretaria de Coordenação das Subprefeituras. É o maior número desde que a lei entrou em vigor, em 2007. Em 2010, menos de 180 mil peças publicitárias foram removidas das ruas.
COLA NA LESTE
Das 31 subprefeituras paulistanas, as da zona leste recolheram metade das propagandas irregulares no ano passado: 272 mil. Na zona sul, foram 116,5 mil peças retiradas. Na zona norte, 89 mil; no Centro, 31 mil, e na zona oeste, 29 mil.
FORÇA GOSPEL
A decisão do governo de considerar o gospel manifestação cultural, com direito a usar a lei de incentivo fiscal, já rende para os músicos do gênero. A banda Prisma foi autorizada pelo Ministério da Cultura a captar R$ 1,968 milhão via Lei Rouanet para uma turnê com 26 apresentações. "Fazemos shows como qualquer outro artista. Nossa atividade não é religiosa, mas cultural", diz Eli Prates, fundador da Prisma.
DANDO SANGUE
A Secretaria Estadual da Saúde e o Fundo Social de Solidariedade de SP lançarão nesta semana campanha para doação de sangue em empresas. Querem levar postos de coleta da Fundação Pró-Sangue aos locais de trabalho. Começarão pelos funcionários do Palácio dos Bandeirantes, na quarta.
NO PAPEL
O PTB, que sustenta que lançará o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D'Urso, como candidato à prefeitura da capital, escolheu os três coordenadores do programa de governo: o sindicalista Murilo Campos, o ex-secretário dos Transportes Dario Rais e o ex-subprefeito Marcos Gadelho.
INTERCÂMBIO
Reitores de 15 instituições de ensino canadenses visitarão a partir de hoje cinco universidades do Rio e de São Paulo, como a USP, a Unesp, a Unicamp e a UFRJ, e o hospital A.C. Camargo. Eles integram um comitê para formar lideranças para as escolas do país. Irão também à Fapesp, fundação paulista de amparo à pesquisa.
DUAS PEÇAS
Gisele Bündchen fotografou nova campanha de lingerie da Hope; no ano passado, a Secretaria de Políticas para as Mulheres acusou uma propaganda da mesma grife estrelada pela top de desrespeitar a condição feminina
ROCK NA PISTA
O stylist Ciro Midena, o cantor Péricles Martins, do Boss in Drama, e a figurinista Kali Leuzzi foram ao show da banda The Rapture, no Cine Joia, em SP.
ARTE NA RUA
Manuel Engels e Jonas Wiese, do coletivo alemão Urbanscreen, e artista Stephan Doitschinoff foram à abertura da Mostra de Arte Pública Urbe, no CCBB-SP. A produtora Lia Rodrigues também circulou pelo evento.
FORA DO QUADRO
Thomas Cohn resolveu fechar a galeria que leva seu nome depois de 30 anos. No período, representou nomes como Leonilson e Adriana Varejão. Aos 77, ele acredita que o mercado virou "um jogo de bolsa". "O público que está comprando arte vê a coisa sob o prisma do investimento. E há artistas badalados que não fazem arte."
FORRÓ DE PASSAPORTE
O Forró in the Dark, grupo formado por brasileiros que vivem em Nova York, será uma das atrações da Varanda Elétrica de Preta Gil no Camarote 2222, no Carnaval de Salvador.
David Byrne, ex-vocalista da banda Talking Heads, já cantou "Asa Branca" em um CD dos forrozeiros.
É SÓ RECOMEÇAR
Alguns atores já participaram de leituras para a nova montagem de "Trair e Coçar É Só Começar", peça de Marcos Caruso que ficou 25 anos em cartaz. A versão repaginada terá direção de Ernesto Piccolo. Letícia Spiller, Claudia Mauro e Tarcísio Filho são alguns dos interessados no projeto.
Curto-circuito
As chefs Bel Coelho e Renata Cruz comandam a Semana da Culinária do Lapinha Spa, em março.
A top brasileira Martha Streck fotografa amanhã campanha da Dior.
O filme "Anamaria - A Mulher de Branco de Ipanema", de Chico Canindé, será exibido no MuBE, hoje, às 20h30. Livre.
A instalação "Máximo Silêncio em Paris" fica exposta até o dia 4, no Rio.
com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY
COLA NA LESTE
Das 31 subprefeituras paulistanas, as da zona leste recolheram metade das propagandas irregulares no ano passado: 272 mil. Na zona sul, foram 116,5 mil peças retiradas. Na zona norte, 89 mil; no Centro, 31 mil, e na zona oeste, 29 mil.
FORÇA GOSPEL
A decisão do governo de considerar o gospel manifestação cultural, com direito a usar a lei de incentivo fiscal, já rende para os músicos do gênero. A banda Prisma foi autorizada pelo Ministério da Cultura a captar R$ 1,968 milhão via Lei Rouanet para uma turnê com 26 apresentações. "Fazemos shows como qualquer outro artista. Nossa atividade não é religiosa, mas cultural", diz Eli Prates, fundador da Prisma.
DANDO SANGUE
A Secretaria Estadual da Saúde e o Fundo Social de Solidariedade de SP lançarão nesta semana campanha para doação de sangue em empresas. Querem levar postos de coleta da Fundação Pró-Sangue aos locais de trabalho. Começarão pelos funcionários do Palácio dos Bandeirantes, na quarta.
NO PAPEL
O PTB, que sustenta que lançará o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D'Urso, como candidato à prefeitura da capital, escolheu os três coordenadores do programa de governo: o sindicalista Murilo Campos, o ex-secretário dos Transportes Dario Rais e o ex-subprefeito Marcos Gadelho.
INTERCÂMBIO
Reitores de 15 instituições de ensino canadenses visitarão a partir de hoje cinco universidades do Rio e de São Paulo, como a USP, a Unesp, a Unicamp e a UFRJ, e o hospital A.C. Camargo. Eles integram um comitê para formar lideranças para as escolas do país. Irão também à Fapesp, fundação paulista de amparo à pesquisa.
DUAS PEÇAS
Gisele Bündchen fotografou nova campanha de lingerie da Hope; no ano passado, a Secretaria de Políticas para as Mulheres acusou uma propaganda da mesma grife estrelada pela top de desrespeitar a condição feminina
ROCK NA PISTA
O stylist Ciro Midena, o cantor Péricles Martins, do Boss in Drama, e a figurinista Kali Leuzzi foram ao show da banda The Rapture, no Cine Joia, em SP.
ARTE NA RUA
Manuel Engels e Jonas Wiese, do coletivo alemão Urbanscreen, e artista Stephan Doitschinoff foram à abertura da Mostra de Arte Pública Urbe, no CCBB-SP. A produtora Lia Rodrigues também circulou pelo evento.
FORA DO QUADRO
Thomas Cohn resolveu fechar a galeria que leva seu nome depois de 30 anos. No período, representou nomes como Leonilson e Adriana Varejão. Aos 77, ele acredita que o mercado virou "um jogo de bolsa". "O público que está comprando arte vê a coisa sob o prisma do investimento. E há artistas badalados que não fazem arte."
FORRÓ DE PASSAPORTE
O Forró in the Dark, grupo formado por brasileiros que vivem em Nova York, será uma das atrações da Varanda Elétrica de Preta Gil no Camarote 2222, no Carnaval de Salvador.
David Byrne, ex-vocalista da banda Talking Heads, já cantou "Asa Branca" em um CD dos forrozeiros.
É SÓ RECOMEÇAR
Alguns atores já participaram de leituras para a nova montagem de "Trair e Coçar É Só Começar", peça de Marcos Caruso que ficou 25 anos em cartaz. A versão repaginada terá direção de Ernesto Piccolo. Letícia Spiller, Claudia Mauro e Tarcísio Filho são alguns dos interessados no projeto.
Curto-circuito
As chefs Bel Coelho e Renata Cruz comandam a Semana da Culinária do Lapinha Spa, em março.
A top brasileira Martha Streck fotografa amanhã campanha da Dior.
O filme "Anamaria - A Mulher de Branco de Ipanema", de Chico Canindé, será exibido no MuBE, hoje, às 20h30. Livre.
A instalação "Máximo Silêncio em Paris" fica exposta até o dia 4, no Rio.
com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY
Cai ou não cai? - ROBERTO ZENTGRAF
O GLOBO - 30/01/12
Pelo visto, dessa vez a taxa cai... Pelo menos foi o que entendi ao ler as diversas análises feitas com base na última ata do Copom, pois já se fala em Taxa Selic de um dígito! Cairá para 9% ao ano? E, caso caia, isso é bom ou é ruim para nosso bolso?
Partindo da atual Selic (10,5% ao ano), se tal fato vier a se concretizar, a queda será de quase 15%, o que já deixa muita gente animada com a possibilidade de o país passar ao clube dos que praticam taxas civilizadas. Mas será que todos os agentes econômicos locais repassarão a queda aos seus preços?
Honestamente, tenho cá minhas dúvidas. Você acredita que os bancos reduzirão, na mesma proporção, as infames taxas cobradas no cheque especial? Veja nas estatísticas do Banco Central (http://bit.ly/chequespecial): há bancos cobrando até 10,33% ao mês pelo uso dessa modalidade cômoda de empréstimo, o que dá fantásticos 225,33% ao ano. Também não vejo chances de reduções proporcionais nas taxas de administração cobradas pelos fundos de investimento ou mesmo nas alíquotas do Imposto de Renda. Para quem aplica em títulos de longo prazo, por exemplo, isso significaria pagar um pouco menos de 13% de IR e não os atuais 15%. Decerto a idade me tornou mais cético, reconheço.
E já que toquei na questão etária, alerto aos que hoje guardam dinheiro pensando no complemento futuro de suas aposentadorias: com taxas menores, o valor do complemento irá se reduzir. Assim, tomando por base as NTN-B Principal com vencimento para 15 de maio de 2035 (com a Selic de 10,5%, pagam 5,45% ao ano, além da correção da inflação pelo IPCA), fiz algumas simulações para quem começasse a investir em 15 de fevereiro de 2012.
1. Nas atuais condições, e pressupondo que a inflação de 2011 (6,50%) se mantenha nesse patamar até 2035, você receberia 4,77% ao ano além da inflação e já descontado o IR, o que equivale a 0,3890% ao mês (taxa real líquida). Quem aplicasse mil reais mensais durante todo o período (tomando o cuidado em corrigir a contribuição pela inflação acumulada) acumularia (a valores de hoje) R$502 mil, equivalente a uma renda perpétua de R$1.953 mensais ou de R$3.223 por 20 anos. Não encontrei mudanças sensíveis quando variei a inflação entre 4,5% e 8,5% ao ano.
2. Se tanto a taxa oferecida pela NTN-B quanto a inflação projetada caíssem na mesma proporção que a Selic (em bases anuais, a NTN pagaria 4,67%, e a inflação ficaria em 5,57%), a taxa real líquida se reduziria para 0,3289% mensais, permitindo ao aplicador o acúmulo de R$456 mil, equivalente a uma renda perpétua de R$1.500 mensais ou de R$2.750 mensais por mais 20 anos.
3. O pior cenário ocorrerá se toda a queda da Selic for absorvida apenas na taxa oferecida pela NTN-B, que neste caso passará a pagar apenas 3,76% ao ano, mantida a inflação no atual nível (6,5%). Assim, a taxa real líquida ficará em 0,2557% mensais, permitindo o acúmulo de R$406 mil, equivalente a uma renda perpétua de R$1.039 mensais ou R$2.267 mensais por mais 20 anos. Uma alternativa será aproveitar o cenário atual de taxas altas e aplicar tudo de uma vez, mas neste caso você precisará ter hoje um pouco mais de R$170 mil para, em 2035, acumular os R$502 mil do primeiro cenário... Você consegue?
Um grande abraço e até a próxima semana!
O tango do crioulo doido - ROBERTO GIANNETTI DA FONSECA
VALOR ECONÔMICO - 30/01/12
Talvez os leitores argentinos, e nem mesmo os brasileiros mais jovens, tenham entendido o título deste artigo como a analogia que faço a um famoso sucesso musical no Brasil do final dos anos 60. O "Samba do Crioulo Doido" é uma paródia composta em 1968 pelo escritor e jornalista Sérgio Porto, sob pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta, que pelo sucesso então alcançado, cunhou uma expressão muito comum até hoje no vocabulário popular, para se referir a coisas sem sentido, confusas, mirabolantes, estapafúrdias, sem nexo.
A analogia que faço ao Brasil de 30 ou 40 anos atrás é porque naquela época vivemos crises sequenciais de escassez de divisas cambiais e de elevada inflação, o que levava os governantes de então a lançar medidas heterodoxas, muitas vezes conflitantes entre si, e sempre com alto grau de intervenção do Estado na economia. Entre elas, recordamos o Programa de Comércio Exterior, que cada empresa pública ou privada brasileira era obrigada a apresentar anualmente para a avaliação da Cacex (Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil), que por sua vez limitava as importações ao absolutamente essencial e ao que não houvesse similar nacional. Tudo mais seria proibido. A justificativa política para tal extremo era a absoluta escassez de divisas externas para o país fazer frente aos seus compromissos externos de serviço da dívida, de importação de petróleo e demais produtos, e ainda demais serviços de turismo, seguros, royalties, dividendos, etc.
Efeitos das medidas de exceção na política de importação argentina devem ser mitigadas no âmbito do Mercosul
As importações eram autorizadas uma a uma, por meio de Licenças de Importação, liberadas a conta gota pelas autoridades de plantão, sob a vigilância cerrada de um nervoso Banco Central do Brasil. Somente em 1990, a partir do tratamento de choque do Plano Collor e depois do Plano Real, é que essas medidas foram sendo revogadas e o Brasil evoluiu gradualmente na década de 90 para um regime de livre importação e de câmbio flutuante, ainda que com alguns vestígios burocráticos e legais daquela fase, mas infinitamente mais livre do que era na época do "Samba do Crioulo Doido".
Vemos agora o governo argentino adotando políticas de importação semelhantes àquelas da época da Cacex, e nos perguntamos em primeiro lugar: estará a Argentina à beira de um novo colapso cambial? Se a resposta for não, então qual o sentido dessas novas medidas de "Declaración Juramentada de Importaciones"? Se a resposta for sim ou um hesitante talvez, então devemos ser mais uma vez tolerantes com nossos hermanos, e procurar mitigar os efeitos dessas medidas no âmbito do Mercosul. De fato, o mar não está para peixe em 2012: preços de commodities agrícolas em baixa, quebra de cerca de 20% nas safras de trigo, soja, e milho por conta da La Niña, crise financeira internacional, sem a perspectiva de um tostão de crédito novo para a Argentina, e uma tradição portenha de fuga de dólares que precipita as crises cambiais, como se fosse uma autoprofecia.
Isto posto, cabe refletir como poderíamos preservar um mínimo de dignidade moral e jurídica para o Mercosul diante dessas medidas de exceção? Em primeiro lugar, acordando um "waiver" (perdão) antecipado, mas não incondicional. Medidas de exceção têm que ser temporárias e ter prazo de vigência definido (dois anos?). Outra condição que julgo imprescindível seria a de exclusão das importações em moeda local, ou seja, pagos em pesos sem uso das escassas divisas em dólares no âmbito do SML (Sistema de Pagamentos em Moeda Local, que Brasil e Argentina estabeleceram entre si anos atrás, e até o momento foi pouquíssimo usado). Dessa forma, o Mercosul seria relativamente preservado, sem explícita quebra de contrato, ou litígio na OMC e no próprio Mercosul.
Sendo o Brasil superavitário atualmente no comércio bilateral com a Argentina, cremos que o Banco Central do Brasil poderia ficar um pouco desconfortável com a contínua acumulação de pesos em suas reservas (como se o dólar também hoje em dia não causasse apreensões após a farra de expansão monetária que os EUA têm promovido desde 2008). A sugestão que pode ser avaliada seria a de transferir tais reservas em pesos para o Fundo Soberano (que anda sub-utilizado desde sua criação), sob a gestão do Tesouro Nacional, o qual disponibilizaria estes pesos para duas possíveis finalidades: 1) capitalização (equity) de empresas brasileiras com investimentos de expansão ou novas aquisições na Argentina, ou 2) financiamento de médio e longo prazo em pesos pelo BNDES para empresas argentinas e brasileiras na Argentina adquirirem bens e serviços brasileiros para suas atividades locais. Assim, estaríamos mitigando o risco de uma eventual desvalorização da moeda argentina, e promovendo de fato uma maior integração regional, em momento da história no qual a própria União Europeia tem um destino incerto. Dizem que tango é uma música para sempre se dançar a dois: pois então dancemos sem hesitação, e com certa nostalgia, o "Tango do Crioulo Doido".
Talvez os leitores argentinos, e nem mesmo os brasileiros mais jovens, tenham entendido o título deste artigo como a analogia que faço a um famoso sucesso musical no Brasil do final dos anos 60. O "Samba do Crioulo Doido" é uma paródia composta em 1968 pelo escritor e jornalista Sérgio Porto, sob pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta, que pelo sucesso então alcançado, cunhou uma expressão muito comum até hoje no vocabulário popular, para se referir a coisas sem sentido, confusas, mirabolantes, estapafúrdias, sem nexo.
A analogia que faço ao Brasil de 30 ou 40 anos atrás é porque naquela época vivemos crises sequenciais de escassez de divisas cambiais e de elevada inflação, o que levava os governantes de então a lançar medidas heterodoxas, muitas vezes conflitantes entre si, e sempre com alto grau de intervenção do Estado na economia. Entre elas, recordamos o Programa de Comércio Exterior, que cada empresa pública ou privada brasileira era obrigada a apresentar anualmente para a avaliação da Cacex (Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil), que por sua vez limitava as importações ao absolutamente essencial e ao que não houvesse similar nacional. Tudo mais seria proibido. A justificativa política para tal extremo era a absoluta escassez de divisas externas para o país fazer frente aos seus compromissos externos de serviço da dívida, de importação de petróleo e demais produtos, e ainda demais serviços de turismo, seguros, royalties, dividendos, etc.
Efeitos das medidas de exceção na política de importação argentina devem ser mitigadas no âmbito do Mercosul
As importações eram autorizadas uma a uma, por meio de Licenças de Importação, liberadas a conta gota pelas autoridades de plantão, sob a vigilância cerrada de um nervoso Banco Central do Brasil. Somente em 1990, a partir do tratamento de choque do Plano Collor e depois do Plano Real, é que essas medidas foram sendo revogadas e o Brasil evoluiu gradualmente na década de 90 para um regime de livre importação e de câmbio flutuante, ainda que com alguns vestígios burocráticos e legais daquela fase, mas infinitamente mais livre do que era na época do "Samba do Crioulo Doido".
Vemos agora o governo argentino adotando políticas de importação semelhantes àquelas da época da Cacex, e nos perguntamos em primeiro lugar: estará a Argentina à beira de um novo colapso cambial? Se a resposta for não, então qual o sentido dessas novas medidas de "Declaración Juramentada de Importaciones"? Se a resposta for sim ou um hesitante talvez, então devemos ser mais uma vez tolerantes com nossos hermanos, e procurar mitigar os efeitos dessas medidas no âmbito do Mercosul. De fato, o mar não está para peixe em 2012: preços de commodities agrícolas em baixa, quebra de cerca de 20% nas safras de trigo, soja, e milho por conta da La Niña, crise financeira internacional, sem a perspectiva de um tostão de crédito novo para a Argentina, e uma tradição portenha de fuga de dólares que precipita as crises cambiais, como se fosse uma autoprofecia.
Isto posto, cabe refletir como poderíamos preservar um mínimo de dignidade moral e jurídica para o Mercosul diante dessas medidas de exceção? Em primeiro lugar, acordando um "waiver" (perdão) antecipado, mas não incondicional. Medidas de exceção têm que ser temporárias e ter prazo de vigência definido (dois anos?). Outra condição que julgo imprescindível seria a de exclusão das importações em moeda local, ou seja, pagos em pesos sem uso das escassas divisas em dólares no âmbito do SML (Sistema de Pagamentos em Moeda Local, que Brasil e Argentina estabeleceram entre si anos atrás, e até o momento foi pouquíssimo usado). Dessa forma, o Mercosul seria relativamente preservado, sem explícita quebra de contrato, ou litígio na OMC e no próprio Mercosul.
Sendo o Brasil superavitário atualmente no comércio bilateral com a Argentina, cremos que o Banco Central do Brasil poderia ficar um pouco desconfortável com a contínua acumulação de pesos em suas reservas (como se o dólar também hoje em dia não causasse apreensões após a farra de expansão monetária que os EUA têm promovido desde 2008). A sugestão que pode ser avaliada seria a de transferir tais reservas em pesos para o Fundo Soberano (que anda sub-utilizado desde sua criação), sob a gestão do Tesouro Nacional, o qual disponibilizaria estes pesos para duas possíveis finalidades: 1) capitalização (equity) de empresas brasileiras com investimentos de expansão ou novas aquisições na Argentina, ou 2) financiamento de médio e longo prazo em pesos pelo BNDES para empresas argentinas e brasileiras na Argentina adquirirem bens e serviços brasileiros para suas atividades locais. Assim, estaríamos mitigando o risco de uma eventual desvalorização da moeda argentina, e promovendo de fato uma maior integração regional, em momento da história no qual a própria União Europeia tem um destino incerto. Dizem que tango é uma música para sempre se dançar a dois: pois então dancemos sem hesitação, e com certa nostalgia, o "Tango do Crioulo Doido".
Educar - AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP - 30/01/12
Vamos deixar de lado, por um instante, aquilo que a educação no Brasil tem de números, numa matemática cruel que pouco soma e muito subtrai -um dos piores cenários da exclusão social no âmbito da nossa sociedade. E falar de outro tipo de deficit educacional: o deficit da qualidade.
Não existe, sabemos, a menor possibilidade de uma nação figurar entre as grandes do mundo -e esta é uma justa e viável aspiração do povo brasileiro- se os bancos escolares não servirem de ponto de partida para o nascimento de cidadãos plenos, bem informados e academicamente preparados. Mas também cidadãos donos de suas próprias ideias e convicções, resultado de um esforço coletivo aluno-professor-instituição que vá muito além das demandas do mercado de trabalho.
Trato desse tema hoje e escolho essas palavras para fazer uma homenagem ao escritor Bartolomeu Campos de Queirós, falecido neste mês.
Reconhecido internacionalmente, reverenciado em Minas Gerais e respeitado por tantos autores nacionais, Bartô -permitam-me o afeto da amizade- dedicou sua inteligência apurada e sua militância sensível às causas da educação e da literatura.
"O homem é feito de real e de ideal", dizia ele, no depoimento que acompanhou o manifesto fundador do Instituto Brasil Literário, organização não governamental cuja causa ele abraçou com dedicação. Sendo assim, prosseguia, a educação não pode se contentar em informar o que já foi feito e, sim, abrir a porta para a imaginação e a fantasia.
Se a escola é o lugar da transformação, e não somente o da informação, não há como aceitar a redução dos currículos à acumulação estatística de saberes específicos.
Ao liberar o direito de todos de criar, recriar, imaginar e romper o limite do provável- dizia ele- a educação estará exercendo o imprescindível dom da democratização.
Em lugar de impor dogmas, cabe fermentar, no cultivo da dúvida e da inquietação, o direito cidadão de firmar sua trajetória cultural e intelectual. Refletir deixa de ser, assim, um privilégio de classe.
Aprendemos muito com pessoas como Bartolomeu. Ele estava convencido de que a literatura poderia ser o grau zero para o profícuo estímulo da imaginação criadora.
Dirão os céticos: tudo isso é romântico demais quando se trata de reparar, já, agora, deficiências bem pragmáticas no ensino brasileiro.
As prioridades cobram atitudes imediatas, é verdade. Mas que qualquer iniciativa se assente em base humanista, sem desprezar a dimensão que a educação encerra de valores fundamentais ao ser humano.
Como disse nosso escritor: "A gente só suporta o dia de hoje porque tem uma perspectiva do amanhã".
Vamos deixar de lado, por um instante, aquilo que a educação no Brasil tem de números, numa matemática cruel que pouco soma e muito subtrai -um dos piores cenários da exclusão social no âmbito da nossa sociedade. E falar de outro tipo de deficit educacional: o deficit da qualidade.
Não existe, sabemos, a menor possibilidade de uma nação figurar entre as grandes do mundo -e esta é uma justa e viável aspiração do povo brasileiro- se os bancos escolares não servirem de ponto de partida para o nascimento de cidadãos plenos, bem informados e academicamente preparados. Mas também cidadãos donos de suas próprias ideias e convicções, resultado de um esforço coletivo aluno-professor-instituição que vá muito além das demandas do mercado de trabalho.
Trato desse tema hoje e escolho essas palavras para fazer uma homenagem ao escritor Bartolomeu Campos de Queirós, falecido neste mês.
Reconhecido internacionalmente, reverenciado em Minas Gerais e respeitado por tantos autores nacionais, Bartô -permitam-me o afeto da amizade- dedicou sua inteligência apurada e sua militância sensível às causas da educação e da literatura.
"O homem é feito de real e de ideal", dizia ele, no depoimento que acompanhou o manifesto fundador do Instituto Brasil Literário, organização não governamental cuja causa ele abraçou com dedicação. Sendo assim, prosseguia, a educação não pode se contentar em informar o que já foi feito e, sim, abrir a porta para a imaginação e a fantasia.
Se a escola é o lugar da transformação, e não somente o da informação, não há como aceitar a redução dos currículos à acumulação estatística de saberes específicos.
Ao liberar o direito de todos de criar, recriar, imaginar e romper o limite do provável- dizia ele- a educação estará exercendo o imprescindível dom da democratização.
Em lugar de impor dogmas, cabe fermentar, no cultivo da dúvida e da inquietação, o direito cidadão de firmar sua trajetória cultural e intelectual. Refletir deixa de ser, assim, um privilégio de classe.
Aprendemos muito com pessoas como Bartolomeu. Ele estava convencido de que a literatura poderia ser o grau zero para o profícuo estímulo da imaginação criadora.
Dirão os céticos: tudo isso é romântico demais quando se trata de reparar, já, agora, deficiências bem pragmáticas no ensino brasileiro.
As prioridades cobram atitudes imediatas, é verdade. Mas que qualquer iniciativa se assente em base humanista, sem desprezar a dimensão que a educação encerra de valores fundamentais ao ser humano.
Como disse nosso escritor: "A gente só suporta o dia de hoje porque tem uma perspectiva do amanhã".
Um alfaiate na cruz - JOSÉ DE SOUZA MARTINS
O Estado de S.Paulo - 30/01/12
O teatro amador, nos bairros e no subúrbio de São Paulo, fez época. Até os anos 40 ainda disputava preferência com o cinema. Ocupava salões de paróquias, de sindicatos, de sociedades de mútuo socorro, de clubes de fábrica. Alguns deles tinham até palco com cortina, caso do da Associação Auxiliadora das Classes Laboriosas, na Rua do Carmo. Os atores das chamadas sociedades filodramáticas aproveitavam, também, a passagem dos circos pelos bairros para neles se apresentarem. A Semana Santa era a melhor época. O circo era pra fazer rir, o que na Semana Santa ainda era pecado. Mas os grupos locais de teatro tinham no repertório peças religiosas, apropriadas para a ocasião. Se o cinema apresentava filmes sobre a Paixão de Cristo, como O Rei dos Reis, de 1927, de Cecil B. DeMille, e era todo ano a mesma coisa, sempre havia algo mais intenso no teatro de circo.
Fazia parte de um desses grupos teatrais, em São Caetano, com a esposa, desde os anos 20, Otávio Tegão. Era um alfaiate magérrimo, bem talhado para representar a figura de Cristo na teatralização da Paixão. Quando voltava da escola primária, eu passava invariavelmente na porta de sua pequena alfaiataria. Lá estava ele, de cigarro pendurado no beiço, riscando ou cortando pano, ou costurando. Foi ele quem fez o primeiro tailleur de minha mãe.
Lembro bem dele porque estava de moda uma música de Luiz Gonzaga, que muitos repetiam: "Ai, que vida ingrata o alfaiate tem..." E lá vinha o refrão que grudava na memória da molecada: "Vai cortando o pano, vai cortando o pano..."
Contou-me um de seus conhecidos, Henry Veronesi, que numa das apresentações de Semana Santa, já estava ele preso à cruz, só de fralda, para representar a crucificação de Cristo. Continuava com o cigarro na boca, fumando, distraído. Começavam a abrir a cortina, quando, advertido pelo bom ladrão, cuspiu o cigarro que, em vez de cair no chão, caiu-lhe no cós da fralda folgada, indo parar-lhe no púbis, entre pelos e pele. O ator desempenhou-se bem, como sempre, nos primeiros minutos daquele que era o último ato da peça. Lancetado pelo soldado romano, marido de uma lavadeira de minha rua, que fazia a Verônica, começou a contorcer-se, tentando, com o movimento de uma perna sobre a outra, livrar-se do cigarro que o queimava. Já em desespero, revirou os olhos para o alto e gemeu com profunda dor: "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito". E pendeu a cabeça banhado em suor, as lágrimas escorrendo-lhe pelo rosto. A multidão delirava com o realismo de seu desempenho. Muitos choravam. Fechada a cortina, Tegão foi desamarrado e livrou-se do cigarro. Reaberto o pano para os aplausos, foi ele ovacionado pelo povaréu em transe. Nunca, jamais, em tempo algum, um alfaiate desempenhara com tanta perfeição o papel de crucificado.
O lado de Tombini - RICARDO BALTHAZAR
FOLHA DE SP - 30/01/12
SÃO PAULO - O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, voltou a desconcertar a praça na semana passada. Ao explicar as razões que levaram a instituição a baixar novamente a taxa básica de juros neste mês, ele avisou que o país terá em breve juros de um dígito.
Vai demorar até que isso faça alguma diferença para quem vive pendurado no cheque especial e vê a fatura do cartão de crédito engordar todo mês. Mas a novidade provocou alarido em bancos e consultorias pagos para decifrar os comunicados do BC e adivinhar o futuro.
Os analistas do mercado acham que o Banco Central comunica suas decisões de forma errática. Uma hora parece que Tombini está preocupado com a inflação e vai interromper a queda dos juros, como o BC sugeriu em dezembro. Outra hora ele indica o contrário, como na última semana.
Mas ninguém precisa saber o que é um modelo analítico estocástico bayesiano para descobrir de que lado Tombini está. Sob o seu comando, o BC está fazendo o que a presidente Dilma Rousseff espera que faça.
Dilma quer que a economia cresça com mais vigor neste ano e acha que a crise externa criou uma oportunidade para levar as taxas de juros do país a níveis civilizados. Se for preciso aceitar uma inflação um pouco maior para cumprir os dois objetivos, ninguém perderá o sono em Brasília.
Aos olhos de Dilma, Tombini sempre pareceu o homem certo para a missão. Em 2008, quando Henrique Meirelles presidia o BC, a instituição reagiu à eclosão da crise internacional seguindo o manual e subiu os juros. Tombini, que fazia parte da diretoria do banco, foi contra a medida.
Meirelles teve grande autonomia nos oito anos em que esteve à frente do Banco Central, porque poucos confiavam na capacidade do PT de conduzir a economia. Esse medo passou. Tombini ganhou a confiança dos petistas porque trabalha com discrição e em sintonia com Dilma. Seu futuro depende mais disso do que da boa vontade do mercado.
SÃO PAULO - O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, voltou a desconcertar a praça na semana passada. Ao explicar as razões que levaram a instituição a baixar novamente a taxa básica de juros neste mês, ele avisou que o país terá em breve juros de um dígito.
Vai demorar até que isso faça alguma diferença para quem vive pendurado no cheque especial e vê a fatura do cartão de crédito engordar todo mês. Mas a novidade provocou alarido em bancos e consultorias pagos para decifrar os comunicados do BC e adivinhar o futuro.
Os analistas do mercado acham que o Banco Central comunica suas decisões de forma errática. Uma hora parece que Tombini está preocupado com a inflação e vai interromper a queda dos juros, como o BC sugeriu em dezembro. Outra hora ele indica o contrário, como na última semana.
Mas ninguém precisa saber o que é um modelo analítico estocástico bayesiano para descobrir de que lado Tombini está. Sob o seu comando, o BC está fazendo o que a presidente Dilma Rousseff espera que faça.
Dilma quer que a economia cresça com mais vigor neste ano e acha que a crise externa criou uma oportunidade para levar as taxas de juros do país a níveis civilizados. Se for preciso aceitar uma inflação um pouco maior para cumprir os dois objetivos, ninguém perderá o sono em Brasília.
Aos olhos de Dilma, Tombini sempre pareceu o homem certo para a missão. Em 2008, quando Henrique Meirelles presidia o BC, a instituição reagiu à eclosão da crise internacional seguindo o manual e subiu os juros. Tombini, que fazia parte da diretoria do banco, foi contra a medida.
Meirelles teve grande autonomia nos oito anos em que esteve à frente do Banco Central, porque poucos confiavam na capacidade do PT de conduzir a economia. Esse medo passou. Tombini ganhou a confiança dos petistas porque trabalha com discrição e em sintonia com Dilma. Seu futuro depende mais disso do que da boa vontade do mercado.
O que queremos do novo ministro da Educação? - MARIA ALICE SETUBAL
FOLHA DE SP - 30/01/12
Os jovens estão abandonando os estudos, pois a escola é vista por eles como desinteressante, sem conexão com o mundo real e com o mercado de trabalho
Refletir sobre o que queremos do novo ministro da Educação é também uma oportunidade para estabelecermos um debate sobre qual educação o Brasil precisa para realizar o seu potencial de país emergente.
A educação é uma questão prioritária para a realização desse potencial. O nível educacional da população é um fator imprescindível para o desenvolvimento. Já sentimos hoje no Brasil a falta de mão de obra qualificada para suprir as demandas de expansão da economia.
Mas os nossos jovens estão abandonando os estudos, pois a escola é vista por eles como desinteressante, sem conexão com o mundo real e com o mercado de trabalho.
A exigência de maior qualificação poderia ser respondida de imediato com a readequação do ensino médio e com a implementação de cursos técnicos, tecnológicos e profissionalizantes. Eles são, sem dúvida, da maior importância.
Entretanto, a questão é bem mais complexa. Tivemos inúmeros avanços na melhoria da qualidade de vida da nossa população. A continuidade dessas políticas é de fundamental importância. Ainda estamos, porém, distantes uma educação de qualidade para todos.
O Ministério da Educação é o responsável pela definição e pela indução de políticas. É nos Estados e municípios, entretanto, que a educação acontece.
É necessário, portanto, que o governo federal costure um pacto com os entes federados. Para uma real mudança na qualidade da educação, dois pontos são prioritários para esse pacto e devem ser considerados de forma conjunta: novos parâmetros para a profissionalização docente e a definição de um currículo ou de metas de aprendizagem para o século 21.
Vivemos a transição para uma sociedade cujos eixos centrais são a diversidade, a justiça social, a democracia e a sustentabilidade. O mundo tem discutido novas formas para uma economia mais verde com energia limpa, com inovação para produtos e com serviços ligados à agricultura, à cultura criativa, à indústria e à gestão de recursos naturais.
As diversas manifestações políticas, ainda que de forma desordenada, tanto em nível nacional como internacional, têm apontado para o estabelecimento de criativas e inovadoras relações entre o Estado, o mercado e a sociedade civil.
Os avanços tecnológicos possibilitaram o surgimento de novas formas de comunicação global e de acesso à informação e à construção do conhecimento.
É fundamental um novo currículo, adequado a esse novo tempo. É também fundamental que a profissão do professor seja socialmente valorizada, com salários adequados e melhores condições de trabalho.
É necessário também que as formações inicial e continuada ocupem um espaço central no exercício docente. Essa formação deve estar atrelada aos novos conhecimentos exigidos na sociedade contemporânea, para que a sala de aula possa refletir a articulação de conteúdos variados.
Além disso, a capacitação do professor e os currículos dos alunos devem ser coerentes com as diversidades regionais e culturais do país.
É preciso reforçar que alguns avanços devem ser reconhecidos: o Plano Nacional de Educação, que está para ser votado pelo Congresso; e o debate iniciado em torno do currículo, da formação docente e da proposta de um exame nacional para professores.
Assim, esperamos que o novo ministro leve adiante as conquistas e tenha a ousadia de estabelecer um real diálogo com toda a sociedade.
Um diálogo pautado em metas claras de implementação de políticas que reflitam não apenas a prioridade da educação para o desenvolvimento do país, mas, sobretudo, que contemplem o que a sociedade considera importante para formar as nossas crianças e jovens.
Os jovens estão abandonando os estudos, pois a escola é vista por eles como desinteressante, sem conexão com o mundo real e com o mercado de trabalho
Refletir sobre o que queremos do novo ministro da Educação é também uma oportunidade para estabelecermos um debate sobre qual educação o Brasil precisa para realizar o seu potencial de país emergente.
A educação é uma questão prioritária para a realização desse potencial. O nível educacional da população é um fator imprescindível para o desenvolvimento. Já sentimos hoje no Brasil a falta de mão de obra qualificada para suprir as demandas de expansão da economia.
Mas os nossos jovens estão abandonando os estudos, pois a escola é vista por eles como desinteressante, sem conexão com o mundo real e com o mercado de trabalho.
A exigência de maior qualificação poderia ser respondida de imediato com a readequação do ensino médio e com a implementação de cursos técnicos, tecnológicos e profissionalizantes. Eles são, sem dúvida, da maior importância.
Entretanto, a questão é bem mais complexa. Tivemos inúmeros avanços na melhoria da qualidade de vida da nossa população. A continuidade dessas políticas é de fundamental importância. Ainda estamos, porém, distantes uma educação de qualidade para todos.
O Ministério da Educação é o responsável pela definição e pela indução de políticas. É nos Estados e municípios, entretanto, que a educação acontece.
É necessário, portanto, que o governo federal costure um pacto com os entes federados. Para uma real mudança na qualidade da educação, dois pontos são prioritários para esse pacto e devem ser considerados de forma conjunta: novos parâmetros para a profissionalização docente e a definição de um currículo ou de metas de aprendizagem para o século 21.
Vivemos a transição para uma sociedade cujos eixos centrais são a diversidade, a justiça social, a democracia e a sustentabilidade. O mundo tem discutido novas formas para uma economia mais verde com energia limpa, com inovação para produtos e com serviços ligados à agricultura, à cultura criativa, à indústria e à gestão de recursos naturais.
As diversas manifestações políticas, ainda que de forma desordenada, tanto em nível nacional como internacional, têm apontado para o estabelecimento de criativas e inovadoras relações entre o Estado, o mercado e a sociedade civil.
Os avanços tecnológicos possibilitaram o surgimento de novas formas de comunicação global e de acesso à informação e à construção do conhecimento.
É fundamental um novo currículo, adequado a esse novo tempo. É também fundamental que a profissão do professor seja socialmente valorizada, com salários adequados e melhores condições de trabalho.
É necessário também que as formações inicial e continuada ocupem um espaço central no exercício docente. Essa formação deve estar atrelada aos novos conhecimentos exigidos na sociedade contemporânea, para que a sala de aula possa refletir a articulação de conteúdos variados.
Além disso, a capacitação do professor e os currículos dos alunos devem ser coerentes com as diversidades regionais e culturais do país.
É preciso reforçar que alguns avanços devem ser reconhecidos: o Plano Nacional de Educação, que está para ser votado pelo Congresso; e o debate iniciado em torno do currículo, da formação docente e da proposta de um exame nacional para professores.
Assim, esperamos que o novo ministro leve adiante as conquistas e tenha a ousadia de estabelecer um real diálogo com toda a sociedade.
Um diálogo pautado em metas claras de implementação de políticas que reflitam não apenas a prioridade da educação para o desenvolvimento do país, mas, sobretudo, que contemplem o que a sociedade considera importante para formar as nossas crianças e jovens.