segunda-feira, janeiro 30, 2012

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 30/01/12



Não vejo o Brasil sendo muito afetado, diz Setubal

"Estou vendo tanto pessimismo que estou ficando mais otimista", disse o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual.

Esse era o tom entre empresários e executivos brasileiros presentes no Fórum Econômico Mundial, encerrado ontem em Davos, na Suíça.

"O Brasil está muito bem-visto, com economia sólida, distante dos problemas que estamos vendo nos EUA e na Europa", afirmou Roberto Setubal, presidente do Banco Itaú Unibanco.

A percepção sobre o Brasil está bastante consolidada como muito positiva, em condições de manter uma economia razoável.

Os banqueiros brasileiros tiveram reuniões com seus pares de outros países.

"Eles veem o Brasil com muito mais interesse, mais respeito, os próprios bancos brasileiros com mais respeito. O BC é também muito bem-visto. É sobretudo o conjunto da obra que traz esse prestígio que o Brasil está desfrutando", afirmou.

Setubal observou o grande interesse de investidores. "Até de gente que não tem nada a ver com o Brasil. Interesse variadíssimo, desde gente que quer investir em terras no Brasil até querendo fazer serviços para o banco, empresas que não estão no Brasil, mas gostariam de ir, americanos, europeus..."

"A Europa é o centro das preocupações aqui, os temas euro e Europa estiveram presentes em todas as discussões que eu vi, acho que, de fato, merece preocupação grande. Acho que veremos na melhor hipótese a Europa crescendo muito pouco, por muito tempo, acho que tem de fazer um grande ajuste nas suas finanças, no seu modelo político inclusive. Acho que vai ser um período bastante difícil. Por outro lado, os EUA têm dado sinais mais sólidos de recuperação e isso ajudará certamente o mundo a manter o crescimento."

"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas", disse.

Para Setubal, a economia crescerá mais neste ano do que em 2011.

"Entre 3,5% e 4%. A redução de juros já mostra sinais de estímulo na economia. A política monetária demora um pouco para fazer efeito, mas já começa a se perceber. Tivemos o segundo semestre de forma geral muito fraco, especialmente o terceiro trimestre, mas já estamos sentindo uma reativação."

O governo precisaria tomar outras medidas de estímulo?

"É necessário ter um pouco de paciência", respondeu. "Às vezes, se adotam pela impaciência várias medidas e quando todas fazem efeito, a dose é muito forte, para qualquer dos lados, isso acaba criando certa volatilidade no crescimento econômico, o que não é bom. O ideal é que a gente consiga manter sempre um crescimento relativamente estável, em torno de 4% ou 5%."

Com relação à política econômica, o presidente do Itaú Unibanco afirma observar uma mudança positiva.

"Vejo um peso maior na política fiscal. O Brasil tem tradição de controle da inflação via juros, via política monetária. Esse governo tem uma preocupação maior, um compromisso maior com a parte fiscal, que, acho, vai ajudar muito na redução dos juros de forma mais estável." "Acho que vamos ver esse maior compromisso em ter uma política mais apertada pode criar condições de a gente ter uma redução definitiva de juros reais no Brasil", disse.

"Não vejo o Brasil sendo muito afetado por tudo isso. A gente é uma economia muito mais movida pelo mercado interno e acho que as condições no Brasil estão boas"

ROBERTO SETUBAL
presidente do Itaú Unibanco

DAVI E GOLIAS

"É só falar com brasileiros e indianos para se sentir uma lufada de otimismo", comentou o CEO de um banco europeu. Mas, em meio ao prestígio brasileiro no evento, ouviram-se também críticas, por exemplo, em relação ao protecionismo brasileiro, em um momento em que os Brics "invadem outros mercados".

Em resposta, o presidente da Embraer, Frederico Curado, lembrou em um dos painéis em que discursou, ao lado de Pascal Lamy e ministros de outros países, que há diferenças entre os Brics.

"O Brasil não está ameaçando a indústria de ninguém. Está tendo seu mercado doméstico ameaçado. E tem o câmbio, a força do real. Não podemos fingir que não existe. Na verdade, o Brasil tem deficit de balança comercial de produtos industrializados de US$ 50 bilhões", disse.

A Embraer participou de reuniões com grupo de aviação e de transportes, em geral, em que se discutiu um projeto de visto eletrônico. "Tudo o que favorece a mobilidade das pessoas, favorece o setor", afirmou. "A Embraer tem muito mais visibilidade do que seu tamanho. Por ser de alta tecnologia de país, há alguns anos, subdesenvolvido. Há uma certa simpatia aqui, como Davi e Golias, por ela ter sobrevivido em meio a gigantes. Ainda é uma empresa pequena, muito menor do que seus pares aqui, que têm receita de US$ 50 bi, quase dez vezes maior que a Embraer."

DA 'MONTANHA MÁGICA'

Crise não terá igual impacto no Brasil, diz Renault

Carlos Ghosn, presidente global das montadoras Renault e Nissan, disse à coluna que a Europa terá uma contração inevitável, mas que ela não terá o mesmo impacto no Brasil.

"Em 2012 o Brasil vai se manter bem, apesar da influência da Europa. Investimos em fábrica no Rio de Janeiro e vamos continuar a investir no país, conforme havíamos planejado", disse.

"Estou otimista com o Brasil para os próximos anos."

Antes, no debate "Difíceis Escolhas em Tempos de Crise", com foco no Japão e nos últimos desastres naturais, quando indagado sobre como agiu ante dificuldades nas empresas, ele recomendou agir sem autopiedade.

"Escolha uma só prioridade, não duas. E saiba que será bombardeado, impopular, mas faça o que tem de ser feito. É para isso que você está lá. Se não aguentar o emocional, deixe o cargo para que outro possa fazê-lo."

REDIMENSIONADO

Para André Esteves, do BTG Pactual, a coincidência de os três bancos brasileiros estarem em Davos, dois deles (Bradesco e BTG) pela primeira vez, se explica pela importância adquirida por instituições financeiras brasileiras. "Com a crise, nossos bancos ficaram grandes. Participamos de reuniões com os principais bancos do mundo. Mudamos de patamar."

PRESENÇA CONFIRMADA

Nunca vieram tantos empresários brasileiros ao Fórum nos alpes suíços como neste ano. Foram 42, boa parte, estreante no encontro global de lideranças empresariais e políticas.

O número é ainda muito discreto se comparado ao de indianos e chineses. Apesar de o maior feriado chinês ter coincidido com o evento suíço, ainda assim 63 representantes marcaram presença.

O número recorde de brasileiros representa um avanço ainda mais significativo dada a notada ausência do governo brasileiro.

A presidente Dilma Rousseff declinou do convite e, pela primeira vez, em muitos anos, faltaram ao mesmo tempo o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central. Só o ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) e Luciano Coutinho, presidente do BNDES, vieram a Davos.

A tradicional noite de gala deste ano foi organizada pelo governo brasileiro, via Apex. O convite enviado a participantes tinha a assinatura do ministro Fernando Pimentel, da Indústria e Comércio, que não veio.

"Foi gasto um dinheiro nosso nisso e nem o ministro vem...", lamentou um empresário brasileiro peso-pesado.

Aversão defasada

Para Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, alguns participantes de painéis estavam um pouco defasados em relação ao que vem acontecendo na Europa no período pós-Draghi no BCE (Banco Central Europeu), como se não tivessem ainda se dado conta de que a aversão ao risco diminuiu muito na Europa e nos EUA.

"As tensões europeias se reduziram significativamente quando o Mario Draghi praticamente decretou que não teremos cadáveres bancários na Europa. O alívio dessa preocupação tirou em grande medida a tensão do tema fiscal, ainda que requeira ajustes por um bom tempo."

Barros elogiou alguns painéis, como o que tratou do "futuro da ciência econômica", com Robert Shiller (de Yale), Joseph Stiglitz (de Columbia) e Peter Diamond (do MIT). "Defendem as modelagens sofisticadas, mas sempre reconhecendo que são muito restritas. Foi [uma reflexão] antológica."

om JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ

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