sexta-feira, janeiro 06, 2012

Caveira de burro - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 06/01/12

Tem caveira de burro enterrada no terreno onde a CBF vai erguer o centro de treinamento da seleção, na Barra, no Rio. A pedra fundamental foi lançada em 2009. Mas as obras não começaram por causa de posseiros. Resolvido o problema, agora, descobriu-se que o terreno... é muito ruim, e a recuperação vai onerar o projeto em uns 10%.

Com isso...

Como a obra deve levar de 12 a 14 meses, talvez não fique pronta para servir de local de treinamento da seleção na Copa das Confederações, em 2013. A CBF, que acha o centro de treinos em Teresópolis acanhado, teria de buscar outro lugar.

Abraço no Maracanã...

Aliás, hoje, às 8h, o movimento O Rio Merece Mais Um Jogo do Brasil fará um ato em frente à Estação Carioca do metrô. O grupo vai passar um abaixoassinado que pede à Fifa mais um jogo da seleção no Rio, em 14, e convocar para um abraço no Maracanã, dia 14. Como se sabe, a seleção só jogará na cidade uma vez, e só se chegar à final.

Esquerda, volver

Bresser Pereira, 77 anos, está com tudo. Amanhã, receberá em Chicago o prêmio James Street da Association for Evolutionary Economics. O professor, que foi ministro de Sarney e FH, abandonou o PSDB, ano passado, e foi uma das estrelas do último seminário econômico promovido pelo PT.

Na moda

A Rádio Corredor informa que a Alpargatas negocia a compra da Osklen.

Cinema na rede
José Joffily disponibilizou de graça na internet seu novo filme, o elogiado documentário “Prova de artista”, sobre cinco jovens músicos em busca de vaga em grandes orquestras brasileiras. É só acessar provadeartista. com.br e assistir.

ESTE PEQUENO jacaré-de-papo-amarelo não está de fralda, como sugere a imagem. O bicho, coitado, ficou preso num saco plástico, na Lagoa da Tijuca, que acumula 6 milhões de metros cúbicos de lama e lixo de todo tipo, segundo o biólogo Mário Moscatelli, autor da foto. “É um triste flagrante da fauna residual que tenta sobreviver em meio à imensa lata de lixo em que se transformou o sistema lagunar da Baixada de Jacarepaguá. Há solução? Há, mas a contagem regressiva já começou”, alerta Moscatelli.

Palavras cruzadas
A Ediouro doou ao Timor Leste 100 mil revistas “Coquetel”, aquela das palavras cruzadas. O material é muito útil no país, que luta pela preservação do português, língua proibida no período da ocupação indonésia.

Casal fofo

Daniel Filho e Olivia Byington resolveram se casar no papel este mês.

Brasileira Sophie

Por falar em Daniel Filho, o mestre escolheu a última protagonista que faltava para inteirar as 22 da série “As brasileiras”. Será a tudo de bom (com todo o respeito) Sophie Charlotte.

Lula na Rocinha

Lula disse ao amigo Sérgio Cabral que sua primeira viagem depois do tratamento contra o câncer será ao Rio. Quer visitar a Rocinha pacificada e voltar ao Alemão.

Foi às compras
O grupo Embraplan/Multiplan (leia-se José Isaac Peres), dono, no Rio, do BarraShopping e do New York City Center, comprou o imóvel onde está hoje o supermercado Walmart, na Barra. A Rádio Mercado diz que pagou em torno de R$ 180 milhões à vista. A ideia seria construir ali um centro empresarial classe A.

Ufa!

A Brahma começa hoje a mandar convites para seu camarote na Sapucaí, o que encerra, oficialmente, a dúvida sobre sua continuidade. O número de convidados para o novo espaço será um pouco menor.

Tio Sam no Vidigal

O grupo de parlamentares americanos que visita o Brasil, liderado pelo poderoso presidente da Câmara da terra de Obama, deputado John Boehner, vai à Favela do Vidigal, no Rio, segunda de manhã.

Portas fechadas

As lojas Soba e Andy’s, na Avenida Ataulfo de Paiva, no Leblon, no Rio, fecharam as portas. O que se diz é que os aluguéis estão altíssimos.

Lei Maria da Penha

A mulher de um famoso funkeiro do Rio foi à 16a- DP, na noite de quarta, registrar queixa contra o marido. Diz que, ao tentar impedir o cantor de dirigir bêbado, levou, meu Deus, um soco do companheiro. Na delegacia, contou que já tinha sido agredida antes.

Carta a uma amiga francesa - MILTON HATOUM


O Estado de S.Paulo - 06/01/12


Querida Françoise:

Você voltou a Paris com uma ótima impressão do Brasil. Ainda não me enviou uma mensagem, mas aqui você fez comentários elogiosos e, mais que isso, esperançosos sobre o País. Talvez por ser jovem demais, você ainda cultiva tanta esperança... Eu cultivo uma velha goiabeira no meu jardim diminuto.

Paris deve estar branca e gelada, com tons acinzentados de fachadas de edifícios e pontes antigos. Mas você sabe que depois da melancolia do inverno virá o esplendor da primavera. O clima de São Paulo se perverteu. O verão começou com frio e um pouco de chuva.

Não sei o que você fez no dia 28 de dezembro. Talvez tenha ido ao Mercado das Pulgas, à feira da rua Mouffetard ou àquele belo Café da Rue Cler, que tanto apreciamos. Talvez não tenha ido a nenhum lugar, pois uma caminhada sem rumo por Paris nos conduz a algum tipo de descoberta.

No dia 28 acordei cedo para renovar minha carteira nacional de habilitação: nome pomposo para uma simples carteira de motorista. Você não andou por Santo Amaro, nem por bairros pobres e favelas, só conheceu uma São Paulo que é promessa de uma cidade civilizada. Cheguei ao Poupatempo de Santo Amaro por volta das 8 da manhã e, quando vi a multidão séria e sonolenta, quase desisti de renovar minha carteira. Mas seria uma viagem desperdiçada, por isso decidi entrar na fila. Ir ao Poupatempo entre o Natal e o ano-novo é um desafio à paciência. Mesmo assim, é um espaço democrático, quase toda a pirâmide social paulistana está ali. Claro que não havia membros ilustres dos Três Poderes republicanos: nossas castas superiores, que vivem nas alturas, bem longe das adversidades do cotidiano.

Você viajou para a França antes da discussão áspera entre o Conselho Nacional de Justiça e o Poder Judiciário. Seria difícil explicar a uma francesa o significado dessa contenda, mas posso lhe adiantar que uma parte da cúpula do nosso Judiciário não aceita qualquer tipo de crítica. Alguns togados que interpretam as leis julgam-se acima da Lei. Mas se eles e certos políticos soubessem o que eu ouvi durante as nove horas de espera... Sim, nove horas para renovar uma maldita carteira de motorista. Só isso dá uma ideia de como sua visão do Brasil é um pouco fantasiosa, de como sua esperança é questionável.

Curiosamente, o assunto principal no Poupatempo era o Poder Judiciário. As palavras ofensivas dirigidas a esse poder fariam corar qualquer magistrado francês. Palavras de brasileiros humildes e de classe média. Nesse desabafo coletivo, nenhum dos poderes foi poupado, tamanha é a frustração das pessoas. As vozes indignadas na sala de espera não cessaram na plataforma da estação de Santo Amaro. Falavam tão alto que não seria absurdo ouvi-los em Paris. Eu, que prefiro ouvir a falar, acabei dizendo alguma coisa. Enquanto esperava o trem, dei uma olhada na paisagem. Vi um braço da represa de Guarapiranga que deságua no Rio Pinheiros. À minha esquerda, favelas entre muralhas de prédios. Uma leve ondulação na água me fez sonhar com peixes prateados, mas eram garrafas de plástico que flutuavam nas margens do Pinheiros. Dezenas, talvez centenas de garrafas e outros dejetos, brilhavam na superfície do rio agonizante.

É verdade que o consumo dos brasileiros aumentou. O lixo acumulado nos rios e nas ruas é testemunha disso. Você bem que notou essa euforia econômica, uma euforia que esconde problemas antigos. Milhões de pobres tornaram-se consumistas, mas não cidadãos. Uma sociedade de consumo sem cidadania. Será esse o triste destino da maioria dos brasileiros?

Você vê um futuro promissor para o meu país. Eu vivo no presente, onde vejo uma aberrante desigualdade social, promíscuas e tenebrosas transações e, o que é pior, impunidade. Agora mesmo um senador ficha-suja foi reempossado.

Chère Françoise, os três poderes não bastam para consolidar uma democracia. E o progresso, querida amiga - esse progresso que é sinônimo de consumo -, na maioria das vezes não passa de um conto de fadas. Apesar de tudo, sua esperança enorme me dá um pouco de ânimo... Agora vou aguar minha goiabeira, que parece murcha. Mande notícias do inverno parisiense.

Flor do recesso - DENISE ROTHENBURG


Correio Braziliense - 06/01/12

O gesto de Bezerra de viajar para o Rio de Janeiro e, ainda, conversar com o senador Aécio Neves sobre a situação dos municípios mineiros mostra que ele trabalha para permanecer no cargo e afastar a Integração do bolo da reforma ministerial



Quando deputado federal pelo antigo PFL, Heráclito Fortes, do Piauí, dizia existir um padrão de comportamento da mídia e da política no mês de janeiro: um assunto cresce, toma as manchetes e parece ser a pior desgraça que poderia acontecer no mundo da política. Com a volta dos políticos ao Congresso em fevereiro, o assunto volta a ocupar um espaço menor. Ele apelidou esse fenômeno de "flor do recesso", aquela que, quando os congressistas saem, vira uma árvore. Quando eles retomam as atividades, a flor murcha.

É assim que muitos políticos reagiram ontem quando alguém lhes perguntava sobre as notícias a respeito das liberações de recursos em maior volume para Pernambuco dentro da Integração Nacional, justamente, estado do ministro Fernando Bezerra Coelho. Os políticos dos mais diversos partidos diziam não ver problemas quanto à liberação em si, depois de lerem as explicações do ministro e assistirem às declarações em todos os telejornais.

O caso tem mesmo os sintomas de flor do recesso, mas isso só saberemos depois que a imprensa terminar a temporada de investigações sobre aquela área, assim como fez em outros seis ministérios do governo Dilma. O que temos agora é o ministro Fernando Bezerra Coelho dizendo que só liberou os recursos porque Pernambuco apresentou os projetos técnicos benfeitos. Ok. Até aí, nada demais, parabéns ao governo estadual que fez o dever de casa depois do desastre de 2010. Resta saber se outros estados ou municípios que hoje vivem o drama das enchentes — Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo — fizeram o mesmo. Se houver dezenas de bons projetos no ministério mofando na gaveta, esperando a liberação de verba, aí o ministro terá mais a explicar.

Pelas informações oficiais divulgadas até agora, esses projetos não foram apresentados. Talvez não tenham sido mesmo. Os políticos hoje estão acostumados a achar que, se o ministro é conterrâneo de determinado deputado, as emendas desse parlamentar têm prioridade. Foi assim nos Transportes no tempo do PR. Volta e meia os jornais são inundados com notícias sobre ministros que privilegiam seus estados na hora de distribuir recursos. E a maioria dos políticos considera esse procedimento normal, embora não devesse ser assim.

Em política, aliás, vale o ditado, farinha pouca, meu pirão primeiro. A esperança é que a presidente Dilma Rousseff, apontada como detentora de uma visão mais técnica do que política, consiga mudar essa mentalidade. Por enquanto, é cedo para dizer que haverá uma mudança de padrão, embora ela esteja com a faca e o queijo na mão para reformular essa prática.

Por falar em mudança...
Dilma não se mostra disposta a alterar tudo no governo este ano, nem fará uma reforma ministerial de peso. Ela trabalha na direção das trocas pontuais. Diz-se no governo que não sobrou muita coisa para mexer depois da saída de sete ministros. Fernando Bezerra Coelho continua contando com todo o apoio do Planalto. E, pela forma como se mostrou indignado na entrevista, não deu o menor sinal de que pretende deixar o cargo para concorrer à prefeitura de Recife.

O gesto de Bezerra ao, passada a entrevista com as explicações, viajar para o Rio de Janeiro e, ainda, conversar com o senador Aécio Neves sobre a situação dos municípios mineiros mostra que ele trabalha para permanecer no cargo e afastar qualquer especulação que envolva a Integração Nacional no bolo da reforma ministerial. E não é apenas isso.

Fernando Bezerra Coelho faz agora o que Orlando Silva não fez quando houve a saraivada de denúncias sobre o Ministério do Esporte no ano passado. Naqueles dias, o então ministro foi aconselhado a, passadas as explicações, sair de Brasília e dedicar o tempo a visitar obras dos estádios. Assim, esperaria passar o furacão fora do epicentro da crise. Orlando, entretanto, preferiu ficar em Brasília. Já seu colega da Integração Nacional se mostra disposto a dedicar os próximos dias a visitar os estados que abriram 2012 debaixo d"água. Não será surpresa ainda se visitar o Rio Grande do Sul. Assim, mostra serviço e fica longe, torcendo para que janeiro passe logo e essa árvore frondosa que faz sombra sobre ele vire uma inocente flor do campo. Se der errado, ainda tem o plano B da prefeitura.

Em dois segundos - RUY CASTRO

Folha de SP - 06/01/12

Meu neto João Ruy, que tem seis anos e mora em Lisboa, me pediu que, quando fosse visitá-lo, lhe levasse um apontador de lápis, daqueles de afixar à mesa, com um buraco para enfiar o lápis e uma manivela para girar a lâmina. Não sei de onde tirou essa ideia, mas achei ótima. Se me pedisse uma Superball nº 5 -uma bola de couro, de gomos costurados, contendo câmara de ar de pneu e biqueira-, eu teria de dar um pulo aos anos 50 para lhe conseguir uma.

O apontador de lápis foi fácil. Bastou encomendá-lo numa papelaria mais sofisticada e, em poucas semanas, eles acharam um modelo bem parecido -e não entenderam quando, delicadamente, dispensei um equivalente elétrico, muito mais prático e moderno, que tentaram me empurrar.

Lembro-me da primeira vez que vi um daqueles apontadores. Foi num filme em cinemascope, com Lauren Bacall ou Gloria Grahame. Para quem apontava seus lápis com gilete, ele me pareceu a última palavra. Não descansei enquanto não ganhei um, de plástico vermelho e manivela de metal, embora, já então, escrevesse à máquina quase tudo que tinha de escrever.

E é o que me intriga. Para que servem lápis ou apontadores nesta nossa era de smartphones, tablets, Androids, Siris e outras geringonças de que ouço falar e às quais só eu ainda não aderi e passo perfeitamente sem?

Não sei. Só sei que, outro dia, sem querer, criei um problema para o sistema eletrônico de composição desta coluna, ao sugerir que os sobrenomes dos escritores tchecos Karel Capek e Jaroslav Haek levassem aquele circunflexo invertido -Capek, Haek- que faz com que se pronunciem tcha-pek e ha-jek. Apesar de seus fabulosos recursos, o sistema levou horas para conseguir criar os simbolinhos. O que qualquer lápis, mesmo no cotoco, faria em dois segundos.

Não é bem assim - LUÍS EDUARDO ASSIS


O Estado de S. Paulo - 06/01/12


O Brasil fechou o ano com reservas internacionais na casa de US$ 320 bilhões. "Nunca na história deste país" as reservas foram tão altas. Isso também é verdade para várias outras economias, já que o mundo foi inundado pela liquidez injetada pelos bancos centrais dos países em crise, mas este dado acaba por corroborar a impressão de que vivemos numa economia pujante, agora a sexta do mundo.

É frequente a comparação das reservas brasileiras ao dinheiro que as famílias separam, ou "reservam", para enfrentar imprevistos. Nesta imagem, esses recursos representariam uma poupança, um valor economizado. Não é verdade. Claro que é uma boa notícia as reservas estarem crescendo de forma exuberante. No final de 2005, não faz muito tempo, as reservas brasileiras estavam em US$ 53,8 bilhões. Desde então, elas cresceram nada menos que 554%. Mais: desde o começo de 2009, e de forma crescente, as reservas superam a dívida externa total brasileira, para júbilo e gáudio dos mais patriotas. De devedor quebrado nos anos 80 a credor líquido do mundo agora, prestes a "emprestar" dinheiro ao Fundo Monetário Internacional (FMI) - nada mal. Tudo resolvido? Não exatamente.

É bom ter reservas. A história dos anos 80 teria sido muito diferente não fosse o nível pífio das reservas internacionais. Também o êxito do Plano Real deve muito ao fato de que as reservas quadruplicaram entre 1991 e 1994. Mas não só essas reservas têm um alto custo (já que o Banco Central, BC, neutraliza os reais emitidos através da colocação de dívida cara) como elas geram, em grande parte, uma contrapartida em reais que pode ser reconvertida em moeda estrangeira se a percepção dos investidores se alterar. Isso porque o BC assume, para um grande número de operações, um passivo - uma dívida - em moeda estrangeira. Ingressos de recursos para a bolsa de valores, por exemplo, aumentam as reservas. Mas elas podem ser reduzidas a qualquer momento, se os estrangeiros resolverem se livrar das ações. O mesmo ocorre com empréstimos que podem deixar de ser rolados e mesmo, em medida impossível de ser aferida com exatidão, com os investimentos estrangeiros, já que parte significativa dessa rubrica se refere também a empréstimos de empresas multinacionais que arbitram taxas de juros.

Ou seja, ao contrário do que ocorre com uma "reserva" de recursos no seu sentido usual, as reservas internacionais do Brasil têm como contraface exigíveis que dependem dos humores do mercado e da avaliação que os investidores internacionais fazem da economia brasileira. Boa parte das reservas brasileiras não é, por assim dizer, dos brasileiros. O conceito mais abrangente que mede a obrigação do Brasil com o exterior é o passivo externo bruto (PEB). O PEB adiciona à divida externa os investimentos diretos, os investimentos na bolsa e as aplicações em renda fixa feitas por domiciliados no exterior. De acordo com o Banco Central, o passivo externo alcançou no ano passado US$ 1,43 trilhão, cerca de 62% do PIB e quatro vezes mais que o total de reservas internacionais. Desde 2005, esse passivo praticamente triplicou, no rastro do crescente déficit em transações correntes. Nunca antes neste país o passivo externo foi tão alto.

A conclusão é simples. Não é o volume de reservas, mas o grau de confiança da comunidade financeira internacional que determina a resiliência da economia brasileira às turbulências. Essa credibilidade, por sua vez, depende da percepção pelos investidores estrangeiros da consistência intertemporal da política econômica, vale dizer, do equilíbrio entre medidas estruturais que desobstruam os gargalos que impedem o aumento contínuo do produto e da renda e iniciativas que apenas tiram proveito da conjuntura favorável de curto prazo. Um alto volume de reservas, apenas, não garante nada. O jogo não está ganho. O jogo nem começou.

Petróleo, indústria que se reinventa - RODOLFO LANDIM

FOLHA DE SP - 06/01/12

Quando era pequeno, ouvia falar do petróleo não só como uma fonte finita de recursos naturais, mas também como algo que estaria esgotado dentro de poucas décadas.

Alguns motivos davam suporte a essa crença. Diferentemente da maioria das indústrias, que, uma vez instaladas, passam a ter uma capacidade constante, a produção de um campo de petróleo sofre um declínio natural até o esgotamento de suas reservas.

Por outro lado, a avaliação do potencial petrolífero mundial era baseada nos paradigmas existentes àquela época, algo que acabava não computando uma enorme quantidade de oportunidades para o aumento das reservas petrolíferas.

Com o fortalecimento do cartel formado pelos países exportadores nos anos 1970, o preço do petróleo subiu, novas tecnologias passaram a ter o seu uso viabilizado e, apesar da enorme produção acumulada desde então, hoje temos reservas conhecidas em maior quantidade do que naquela época.

Os fatores que contribuíram para essa situação foram diversos. Alguns métodos especiais visando a recuperação de uma maior parcela do volume de óleo existente nas jazidas começaram a ser empregados em larga escala, alongando a vida produtiva dos campos de petróleo.

Outra mudança ocorrida foi a intensificação da exploração em bacias sedimentares marítimas. Inicialmente focada em águas rasas, a exploração marítima foi se estendendo com o uso intensivo de novas tecnologias até águas ultraprofundas, algo com que nem se sonhava há 30 anos. A produção mundial em águas profundas, hoje já de 2,8 milhões de barris por dia, deverá atingir 9 milhões em 2020.

No início dos anos 1980, depósitos de "tar sands" (areias betuminosas) localizados na província de Alberta, no Canadá, praticamente a céu aberto, começaram a ser aproveitados em um processo que muito mais parece mineração do que produção convencional de petróleo.

Hoje, a produção dessas jazidas é de 1,5 milhão de barris por dia, equivalente a três quartos de toda a produção brasileira. Se formos levar em conta as previsões para os próximos dez anos, a produção canadense deverá crescer mais 2 milhões de barris por dia, basicamente fruto do aumento da produção desses "campos de petróleo".

No entanto, talvez a maior revolução venha dos EUA. Apesar de ter tido sempre a indústria petrolífera mais ativa do mundo e de as bacias sedimentares americanas já terem sido intensamente exploradas, lá se vivencia um novo ciclo de desenvolvimento e de prosperidade.

Desta vez, o alvo são rochas sedimentares de grãos muito finos chamadas de "shale", impregnadas de gás e óleo muito leve. Mediante a aplicação de processos que envolvem a perfuração de poços que atravessam essas camadas horizontalmente associados à injeção de fluidos a altíssimas pressões, essas rochas são fraturadas e permitem que os poços passem a ter produções comercialmente viáveis. Esses tipos de rocha ocorrem em uma gigantesca extensão areal, atravessando diversos Estados americanos.

O consumo anual de gás nos EUA é de 22,5 TCF (trilhões de pés cúbicos) e as estimativas atuais são de que os EUA tenham mais de 2.500 TCF de reservas potenciais, ou seja, essa nova "descoberta" permitirá que o país tenha 110 anos a mais de suprimento local de gás.

O número de sondas de perfuração nos EUA voltou a crescer em 2011 e o ano fechou com 1.860 delas em atividade (o número total em todo o resto do mundo foi de 1.600).

Os indicadores associados aos projetos de "shale" são impressionantes. O número de empregos gerados por esses projetos foi de 600 mil em 2011 e deverá crescer para 870 mil até 2015. Já a contribuição para o PIB americano deverá passar de US$ 76 bilhões para US$ 118 bilhões em igual período. E já existem aqueles que projetam que a partir de 2020 os EUA poderão retornar ao status dos anos 1970, quando eram os maiores produtores globais de óleo e de gás natural.

Na realidade, o petróleo está longe de ser um recurso finito para as próximas gerações; seu poder de geração de riquezas é enorme e fomentar a sua indústria, uma decisão acertada.

Presidencialismo de embarcação - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 06/01/12


O DEM se tornou uma espécie de mico-leão-malhado da política brasileira. Nanico e ameaçado de extinção feito um mico, padece de dengue eleitoral hemorrágica há várias eleições. Depois de ter sido sangrado pelo PSD de Gilberto Kassab, passou a sofrer de anemia quase terminal.

No momento, o partido estuda se dissolver no PSDB ou no PMDB, relatava esta Folha na quarta-feira.

O DEM nasceu como PFL de uma costela oportunista do PDS, que um dia fora a Arena, "o maior partido do Ocidente", a tropa parlamentar da ditadura dos generais.

O PDS era o partido da ditadura moribunda, que queria eleger por voto indireto Paulo Maluf para presidente em 1985. O PFL partiu-se do PDS na undécima hora da ditadura a fim de aderir à "Nova República", como se chamava o primeiro governo civil depois de 1964. "Adesão" sempre foi o programa do DEM, qualquer que fosse o seu nome.

O PFL aderiu ao PSDB triunfante do Plano Real, em 1994. Em 2003, Lula eleito, parte dos pefelistas se bandeou para partidos nanicos por meio dos quais o PT terceirizava o inchaço do governismo. PTB e PL então dobrariam de tamanho.

O adesismo continuou, por vias tortas ou por atalhos que contornavam a norma de 2007 que pretendia dar cabo do dito "troca-troca partidário". Os casos mais explícitos de "venda de passe" rarearam, mas a lei não dá, nem poderia dar, conta das forças sociais e políticas que provocam tais mudanças.

Agora troca-se de partido no atacado; negociam-se a adesão ou alianças em termos mais rendosos. Kassab teve o tirocínio de perceber como funciona o novo "presidencialismo de embarcação": de embarque na canoa mais promissora.

"Presidencialismo de embarcação" é, claro, uma paródia de "presidencialismo de coalizão", termo inventado em 1988 pelo cientista político Sérgio Abranches para definir os arranjos de sobrevivência parlamentar de um governo presidencialista que lida com um Congresso muito fragmentado.

Politólogos muito se dedicam a estudar partidos, influenciados demais pela ciência política americana e seus cálculos para entender os resultados da atividade legislativa. Contam votos para saber se há fidelidade partidária no Congresso (uns acham que sim, outros que não).

Mas é disso que se trata? Os partidos brasileiros são essas instituições formais registradas com o nome de partidos ou outra coisa?

O PT parece (mas cada vez menos) um partido desses, com identidade. O PSDB também (mas ainda menos que o PT). E o resto?

Há o grande agenciador de adesões a governos, o PMDB. E despachantes menores, os nanicos, que inflam como carrapatos chupa-sangue a depender de quão bem mordem (aderem a) governos.

Que identidade ou fidelidade existe se a maioria dos partidos se funde, mistura, extingue em reação ao governo de turno e de acordo com a necessidade de rearranjos das sublegendas regionais sempre conservadoras (ou coisa ainda pior)?

Tais movimentos têm um fundo (lá no fundo) "social". A elite nordestina carcomida do DEM não soube se ajustar aos tempos do Estado de Bem-Estar Tropical (e é mesmo muito tosca). Eduardo Campos, do PSB, entendeu o novo jogo. Mas a politologia não dá conta de explicar a vida real dos partidos do país.

Na música, final é sempre o mesmo - WADIH DAMOUS


O Globo - 06/01/12


A Câmara dos Deputados aprovou, recentemente, o texto da chamada PEC da Música. A proposta de emenda constitucional segue agora para o Senado Federal.

Em suma, uma vez aprovada a proposta em seu conteúdo atual, será incluída alínea "e" no inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, estabelecendo imunidade tributária para fonogramas e videofonogramas, bem como os respectivos arquivos eletrônicos, desde que produzidos no Brasil e que contenham produção musical de compositores ou intérpretes brasileiros.

Segundo a exposição de motivos, a PEC tem como objetivos: (I) fortalecer a produção musical brasileira; (II) combater, ao menos de forma indireta, a pirataria e a transferência ilegal de arquivos digitais; (III) tornar a produção musical mais acessível para a população brasileira, especialmente de baixa renda, por conta da redução do valor final dos produtos fonográficos ao consumidor.

A proposta é boa e deve ser aprovada pelo Senado Federal. Não há como negar que os preços cobrados por CDs, DVDs e mídias correlatas no Brasil são altíssimos se comparados com outros países, seja em valores absolutos, seja levando em conta o poder aquisitivo médio da população. E também está fora de dúvida que esses altos preços estimulam a pirataria e os downloads ilegais de arquivos de música via internet.

No entanto, a nosso ver, a proposta tem como ser melhorada, a fim de satisfazer em medida mais intensa as finalidades para as quais foi criada.

Em primeiro lugar, se um dos objetivos é o de promover o acesso à cultura pela população com menor poder aquisitivo, não há que restringir a imunidade tributária apenas aos compositores e intérpretes brasileiros. A própria exposição de motivos da PEC menciona outro dispositivo semelhante, que concede imunidade tributária para livros, jornais, periódicos e para o papel utilizado em sua produção. Veja-se que, neste caso, não há diferenciação quanto à nacionalidade do autor da obra, nem mesmo quanto ao local da produção. Os produtos importados, que se enquadrem nas categorias mencionadas, são isentos até mesmo dos encargos de importação.

No caso das obras musicais estrangeiras, portanto, estas continuarão sendo vendidas a preços elevados, e permanecerá o estímulo à pirataria e ao download ilegal. Isso sem falar nas dificuldades hermenêuticas que possam surgir, especialmente quanto à nacionalidade dos autores da obra. Basta imaginar uma obra que tenha diversos compositores e/ou intérpretes, cada um deles de diferentes nacionalidades, e apenas um deles brasileiro; ou o caso de autor que seja brasileiro naturalizado.

Pode-se objetar a essa ressalva que os artistas nacionais são menos favorecidos do que os estrangeiros, de modo geral. Sabe-se que um artista americano pode fazer fortuna com apenas uma música de sucesso, enquanto artistas nacionais com inúmeros "hits" ao longo da carreira não sobrevivem dignamente se não se submeterem a uma intensa agenda de shows.

Mas será que a única solução é o paternalismo com relação às obras musicais nacionais? Será que resolve o problema da remuneração digna dos músicos brasileiros? Parece-nos que, sob esse ponto de vista, a causa dos problemas não reside nos preços dos fonogramas e, portanto, não será resolvido pela aprovação da PEC.

Duas são as principais causas desse problema: (I) os contratos leoninos com as gravadoras, assinados muitas vezes por tempo indeterminado, e que prevêem remuneração ínfima do artista por cópia vendida; (II) o obscuro e insuficiente método de distribuição de direitos autorais no Brasil.

Em ambos os casos, o resultado final é sempre o mesmo: as gravadoras abocanham a maior parcela dos lucros, e o artista, de cujo gênio emana a obra imaterial, recebe uma parcela ínfima do total auferido.

O que se quer chamar atenção é que a PEC não é capaz de atingir todos os fins a que se propõe. É verdade que desestimulará a pirataria e os downloads ilegais, bem como estimulará a difusão da produção musical brasileira. Mas é bem mais duvidoso que, caso aprovado, o texto atual promova a dignidade financeira dos artistas brasileiros, bem como o acesso à cultura musical em geral por parte da população brasileira.

Reitere-se: não sou contra a proposta, mas favorável à sua extensão para as demais obras musicais (estrangeiras), aliada a uma reformulação da sistemática de remuneração dos artistas brasileiros, estabelecendo-se um equilíbrio mais justo na proporção entre sua remuneração e o lucro auferidos pelas gravadoras com a comercialização de suas obras.

Evidências do problema do Custo Brasil - EDITORIAL O GLOBO


O Globo - 06/01/12


Os manufaturados vêm perdendo posição relativa na pauta brasileira de exportações. Ano passado, os produtos básicos responderam por 72% das exportações, enquanto alguns bens industrializados chegaram a recuar, como a venda de automóveis (menos 1,2%), principal item desta pauta, e calçados (queda de 13,3%).

A indústria nacional se queixa do câmbio, mas há também diversos outros fatores que pesam negativamente na capacidade de o país concorrer hoje não só no mercado internacional, mas até internamente com importações oriundas da Ásia.

Para reconquistar espaço, o Brasil precisa pôr em prática, urgentemente, uma agenda de competitividade. Há vários estudos, de fontes confiáveis, que apontam obstáculos e gargalos que reduzem a eficiência da economia brasileira. Genericamente, esses entraves são conceituados na expressão "Custo Brasil".

Carga tributária excessiva e inadequada (assombrosos 36% do PIB), taxas de juros em descompasso com os padrões do mercado externo, condições de crédito não tão favoráveis, legislação trabalhista esclerosada, onerosa, e burocracia são alguns desses fatores negativos sobre os quais as empresas têm pouca ou nenhuma ingerência, e dependem de políticas governamentais.

Mas há outras questões de estrutura no sistema produtivo que precisam ser observadas, entre as quais a de transportes. Um exemplo objetivo é o que a própria indústria brasileira tem alegado para não conseguir competir em igualdade de condições com os concorrentes asiáticos na licitação para a compra de 60 trens suburbanos pelo Estado do Rio de Janeiro: o frete ferroviário de São Paulo para o Rio sairia mais caro do que o valor cobrado no transporte desses veículos da China para o Brasil.

Tal exemplo, multiplicado por muitos outros, revela distorções que o chamado Custo Brasil provoca nos preços finais dos bens aqui produzidos. Nas licitações públicas, já se admite uma diferença de 15% em favor da indústria nacional. Seria uma forma de compensar os produtores brasileiros por esses fatores estruturais negativos. É uma margem elevada, e, se mesmo assim não tem sido útil para a indústria, o problema tem outra dimensão.

O governo federal espera anunciar em março um novo pacote de estímulo às exportações de manufaturados. Iniciativas que facilitem as exportações sempre serão bem-vindas. Porém, até já passou da hora de não se pensar em paliativos, mas em algo mais amplo, que envolva de fato uma agenda de competitividade.

Agir de forma tópica, de pacote a pacote setorial, não resolve o problema como um tudo, e ainda há o risco de se criarem distorções na economia. Além do que esta filosofia de atuação espasmódica e compartimentada tende a favorecer apenas setores com lobby eficiente nos gabinetes de Brasília.

Outro erro é imaginar que falta de competitividade de empresas nacionais se resolve com a construção de muralhas protecionistas e reservas de mercado. A falsa solução já foi tentada no Brasil e apenas produziu mais ineficiência e penalização do consumidor.

Ano novo, velhos desejos - NELSON MOTTA


O Globo - 06/01/12


Não é preciso ser Paulo Coelho para acreditar no poder das palavras e na força dos desejos. Nem Raul Seixas para cantar que "sonho que se sonha junto é realidade". Que meus desejos expressem os de muitos leitores, ou, ao menos, de alguns deles. E que as nossas palavras tenham o poder de realizá-los, pelo menos os mais óbvios.

Que o mensalão do PT e aliados, o do PSDB mineiro e o do DEM de Brasília sejam julgados e condenados. Assim como os juízes ladrões e os administradores e parlamentares corruptos.

Que sejam proibidas contribuições de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais, como propõe o ministro Dias Toffoli, do STF. Empresas não votam, são os cidadãos e os partidos, que já têm o horário eleitoral e os fundos partidários, que devem financiar as campanhas de seus candidatos. Com limite por CPF. Uma ruptura da promiscuidade entre governos e empresas, raiz da corrupção e do atraso.

Que seja abolido o voto obrigatório. Eleitores que só votam para não pagar multa não farão falta: são os que fazem as piores escolhas. Somos um dos últimos países do mundo com essa herança das ditaduras para "legitimá-las" nas urnas.

Que a Lei da Ficha Limpa valha para preenchimento de cargos em todos os níveis das administrações federal, estadual e municipal.

Que o Estado desista de ser babá do cidadão, de tentar proteger-nos de nós mesmos. E respeite mais nossa privacidade e nossas escolhas.

Que as ideias do professor Fernando Henrique Cardoso sobre descriminalização da maconha sejam discutidas.

Que Sarney se aposente com suas três aposentadorias. E, roído de culpa, em busca de redenção, doe todos os seus bens aos pobres do Maranhão. Mas aí também já é sonhar demais.

Que parem de telefonar para minha casa oferecendo coisas que não pedi.

Que a nova música de Belém do Pará faça o sucesso que merece.

Um novo disco de João Gilberto. Um show de Jorge Drexler.

Uma nova temporada de "Força Tarefa" na televisão. E, sem querer abusar, um novo romance de seu roteirista Marçal Aquino. Um novo livro de Reinaldo Morais, se possível, "Pornopopeia 2, qualquer coisa".

Desejar menos. Aceitar mais.

Falta também gerência - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 06/01/12

Não se podia esperar que um ministro com problemas para resolver em 27 unidades da Federação destinasse para seu próprio Estado 90% das verbas de um programa nacional sob sua responsabilidade. Não surpreende, portanto, que a chefe do ministro reaja como reagiu à revelação de mais esse escândalo em seu governo. Dilma Rousseff interrompeu as férias da ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e atribuiu-lhe a missão de coordenar com urgência a adoção de critérios técnicos na distribuição de recursos do Ministério da Integração para o combate e prevenção de desastres naturais. A lamentar, o fato de que, mais uma vez, a tranca é colocada depois de a porta arrombada.
Dos R$ 28,4 milhões liberados em 2011 pelo Ministério da Integração Nacional para obras de prevenção de desastres naturais em todo o País, o Estado de Pernambuco, terra natal do titular da pasta, Fernando Bezerra Coelho (PSB), ficou com R$ 25,5 milhões (89,7%). É o que apurou a ONG Contas Abertas com base em dados do Tesouro Nacional.
Mas em entrevista coletiva que concedeu na tarde da quarta-feira para se explicar, o ministro fez o que dele se poderia esperar: negou a manipulação política de recursos e procurou confundir os jornalistas com uma enorme profusão de dados e cifras sobre os programas de sua pasta e de ações conjuntas com outros Ministérios.
De qualquer modo, ao beneficiar seu próprio Estado, Fernando Bezerra não fez mais do que seguir o mau exemplo de seu antecessor no Ministério, o baiano Geddel Vieira Lima (PMDB), que no ano anterior destinara à Bahia 48% dos recursos disponíveis na pasta da Integração Nacional para o mesmo fim. Esse desmando já fora denunciado por este jornal um ano atrás (6/1/2011). Trata-se, portanto, de prática habitual, convalidada pelo Palácio do Planalto, para quem os partidos da base aliada têm todo o direito de recolher nos feudos que lhes são reservados as compensações pelo esforço de garantir a "governabilidade" do País. E certamente ajuda a compor esse cenário o fato de que o peemedebista Geddel Vieira Lima ambicionava eleger-se governador da Bahia, da mesma forma que, hoje, Fernando Bezerra é tido como possível candidato à prefeitura do Recife.
Tão grave quanto a lambança do ministro - mas aí a responsabilidade não é só dele - é verificar o quanto o governo federal tem negligenciado o provimento efetivo de recursos para o programa de "prevenção e preparação para desastres". Entre 2004 e 2011, segundo a Contas Abertas, as dotações autorizadas somaram R$ 2,8 bilhões, dos quais apenas R$ 695,4 milhões (24,5%) foram aplicados. É fazer economia à custa de flagelados, numa opção clara por investimentos em reparação de desastres, em vez de gastos com prevenção capazes de evitar sofrimento e maior prejuízo.
A tragédia fluminense de um ano atrás também contribuiu para o circo de horrores que habitualmente vem no rastro de calamidades semelhantes. A população serrana do Estado do Rio já descobriu que, até porque os recursos liberados são pequenos, foi feito muito pouco do prometido para prevenir a repetição das enchentes e deslizamentos de terra que ceifaram vidas e destruíram propriedades. E meses atrás já se havia constatado que administradores inescrupulosos se locupletaram com o desvio de recursos públicos e donativos privados destinados a enfrentar a calamidade.
É fácil explicar esse quadro dramático e absurdo apenas pela constatação resignada de que, infelizmente, tem muita gente que não presta em todo canto. O problema é que, se existe na vida pública muita falta de vergonha na cara, falta também, mais do que se poderia imaginar, capacidade de gerência.
Quando ostensivamente se subverte o interesse público com ações destinadas a atender objetivos pessoais ou partidários, é inadmissível que a autoridade maior só desperte depois que o escândalo vira notícia. Para garantir altos padrões de probidade e eficiência na administração pública, tanto quanto na luta contra desastres naturais, é mais importante prevenir do que remediar.

Dengue! Chegou o mosquiteló! - JOSÉ SIMÃO


FOLHA DE SP - 06/01/12


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Direto do País da Piada Pronta: "Polícia prende o maior estelionatário do Nordeste, José Felinto FURTADO". E mais um predestinado: sabe como se chama o funcionário da Defesa Civil responsável por resgatar desabrigados das enchentes? Juarez NOÉ!
E o chargista Jorge Braga revela um novo tipo de mosquito da dengue: o MOSQUITELÓ! "Ai, ai, se eu te pego. Ai, ai, se eu te pego."
E o mundo do futebol tá animado: Ronaldo pegou dengue, Ganso vai ser papai e o Corinthians contratou um chinês. Ou seja, o mundo TEM que acabar. Rarará!
E eu já falei que o Ronaldo pegou dengue porque esqueceu de secar os pneus. Pior, esqueceu de secar o umbigo, aquela caixa d'água. O umbigo do Ronaldo é um viveiro de dengue! Rarará!
E o Timão vai contratar um chinês. Um chinês? Eles compraram esse chinês na 25 de Março? "Pensando no mercado asiático, Corinthians contrata jogador Chen Zizhao."
O quê? CHEN CHEN? Chen Chen estádio e Chen Chen Libertadores! E quando chegar o Chen Chen como eles vão saber que é o Chen Chen mesmo? Porque todo chinês é cópia pirata de outro chinês. E o novo patrocinador do Timão é a Galeria Pajé? Rarará!
Socuerro! Me mate um bode! Todos para o abrigo! Chegou a conta do fogos. Depois do espetáculo pirotécnico vem o espetáculo fiscotécnico: IPTU, IPVA, IPI, IR, IH... ME FERREI! Rarará! É o IMF: Ih, Me Ferrei! E o IPVA é Imposto Para Vários Amigos, tem que fazer vaquinha, IPVAQUINHA!
E o Alckmin que entregou casas com vazamentos no teto, no interior de São Paulo? IPTU, Imposto Para Teto Úmido! Rarará! E sabe por que tributo se chama tributo? Porque os carnês vem de três em três. De manhã vem três, de tarde vem três e de noite, 33! É mole? É mole, mas sobe!
E o Ganso vai ser papai. Finalmente deu uma bola dentro. Rarará! Ganso vai ser papai. Trocadilho por um ano. E esta: "Ganso engravidou sem querer". O Ganso engravidou sem querer porque não deu aquela paradinha. Rarará!
E o diretor de marketing do Corinthians diz que o chinês é ruim de bola. Se é chinês, é pirata. E se é pirata, é perna de pau. Pirata perna de pau! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

O PR quer voltar - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 06/01/12


O PR quer substituir o ministro Paulo Sérgio Passos (Transportes) por um nome indicado pela bancada da Câmara. Na semana que antecedeu o feriado de Natal, o líder Lincoln Portela (MG) encaminhou a questão às ministras Ideli Salvatti (Relações Internacionais) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil). Ele criticou a gestão de Passos, reclamou que ele não fala com o PR e previu um caos nas estradas, depois das chuvas, por falta de manutenção.

PMDB quer manter Vaccarezza
Os partidos aliados, principalmente o PMDB, estão se contrapondo ao movimento de parcela da bancada petista e defendem a manutenção do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) na liderança do governo na Câmara. Uma ala do PT quer colocar em seu lugar o líder da bancada, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Os aliados lembram que o governo ganhou todas na Câmara no primeiro ano do governo Dilma. E sustentam que Vaccarezza funciona como um esteio para os deputados da base, que não se sentem prestigiados pela ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais). Eles alegam que Ideli é mais afinada com o Senado.

"Em momento algum pensamos em ‘tomar’ o Ministério da Integração do partido aliado, PSB” — Henrique Alves, líder do PMDB na Câmara (RN), ao se solidarizar com o ministro Fernando Bezerra

EM BANHO-MARIA. Anunciada pela presidente Dilma, no início do mandato, a criação do Ministério das Micro e Pequenas Empresas não saiu do papel até hoje. A empresária Luiza Trajano chegou a ser convidada para o cargo e aceitou a tarefa. A oficialização da criação da nova pasta e sua posse foram adiadas por causa de pendências trabalhistas. Trajano já fez acordos de ajustamento de conduta com o Ministério Público, mas ninguém fala mais de sua nomeação no Palácio do Planalto.

Lição
Mesmo que o ministro Mário Negromonte (Cidades) seja mantido pela presidente Dilma, os dirigentes do PP chegaram à conclusão que cometeram um erro ao impor seu nome e que teria sido melhor deixar a presidente à vontade.

Nova estrela
O PMDB prepara uma festa, na volta do recesso, em fevereiro, para filiar o senador Clésio Andrade (MG). Serão organizados atos de filiação do presidente da Confederação Nacional dos Transportes em Brasília e em Belo Horizonte.

Oposição a Cabral aposta na confusão
Os adversários do governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ) entraram em campo para tentar desestabilizar a sucessão estadual. A oposição decidiu insuflar o nome do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, que está em alta, por causa das UPPs. Uma das vantagens, caso ele seja picado pela mosca azul, é que ele não tem filiação partidária. O candidato de Cabral à sua sucessão é o vice-governador Luiz Fernando Pezão.

Lista suja
O Ministério do Trabalho divulgou ontem uma lista de 294 empresas e pessoas físicas que usam o trabalho escravo. Há na lista 52 novos infratores. Os integrantes da lista suja ficam impedidos de obter empréstimos em bancos oficiais.

Tucanada
O prefeito de Piracicaba (SP), o tucano Barjas Negri, acaba de editar decreto pelo qual os táxis da cidade são obrigados a usar adesivos quadriculados nas laterais e na traseira do carro nas cores amarelo e azul. São as cores do PSDB.

COMENTÁRIO do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), sobre a reforma ministerial que a presidente Dilma fará este mês: "Não vai ter reforma, ela já foi feita". Ele refere-se à substituição de sete ministros no primeiro ano de mandato.

ADVERSÁRIOS do ex-prefeito do Rio Cesar Maia (DEM) ironizavam pesquisa GPP, na qual ele tem 20% dos votos para o governo. Ocorre que ele fez apenas 11% para o Senado nas eleições de 2010.

O MOVIMENTO sindical do campo comemora: a ONU aprovou resolução, no final de dezembro, instituindo o Ano Internacional da Agricultura Familiar em 2014.

Silêncio dos coniventes - DORA KRAMER


O ESTADÃO - 06/01/12
Natural seria que a notícia sobre a concentração dos recursos destinados à prevenção e combate a enchentes no Ministério da Integração Nacional para Pernambuco, Estado de origem e domicílio eleitoral do ministro Fernando Bezerra, suscitasse alguma reação entre governadores de outros Estados.
Normal seria que chefes de executivos estaduais reclamassem um mínimo de isonomia na distribuição de verbas, mais não fosse para denotar interesse na defesa dos direitos de seus governados.
Mas, não. A nenhum deles ocorreu estranhar de público a desproporção. E não foi uma desproporção qualquer: trata-se de 90% das verbas destinadas a um só Estado.
No lugar de protestos, o que se vê é um obsequioso silêncio. Uma espécie de salvaguarda de normalidade a uma situação de patente anormalidade. Nisso estão junto governadores de partidos situacionistas e oposicionistas.
Como se temessem se confrontar com o governo federal ou, pior, como se adotassem uma atitude preventiva: aceitando hoje que um ministro privilegie de maneira tão explícita o Estado de seu interesse, ficam credenciados para amanhã, quando eventualmente estiverem no manejo de verbas semelhantes, também poderem fazer uso do ministério em prol de suas conveniências.
É o silêncio dos coniventes. Muito comum quando há interesse político em jogo.
Pelo mesmo motivo nem sempre as queixas à Justiça Eleitoral em épocas de campanha são instruídas de maneira consistente de forma a permitir ao juiz uma condenação.
Mas o exemplo que serve melhor à comparação é o da regra da fidelidade partidária, instituída por interpretação do Tribunal Superior Eleitoral e ratificada pelo Supremo Tribunal Federal, determinando a perda do mandato do político que troca de partido sem causa considerada "justa".
Raros são os casos de partidos que reivindicam a devolução dos mandatos quando há o pedido de desligamento. O habitual é que as representações contra os chamados trânsfugas sejam feitas pelo Ministério Público.
E por que isso? Porque não convém ao partido recorrer a uma legislação que amanhã ou depois pode ser usada contra ele. Vigora, então, uma espécie de norma segundo a qual uma mão lava a outra (ou seria mais adequado dizer, uma mão suja a outra?) cujo resultado é a transformação da lei em letra morta.
Guardadas as proporções, é a razão pela qual os governadores assistem impassíveis a ações como essa da concentração do dinheiro para enchentes no Estado do ministro que deveria ser responsável por todo o País.

Mão de gato.
O tucanato em geral, o senador Aécio Neves e área de influência no PSDB em particular pegaram leve, com críticas quase protocolares, no caso das consultorias de Fernando Pimentel porque o ministro da Indústria e Comércio foi e ainda é potencial aliado em Minas Gerais.
A fidalguia se repete com o ministro da Integração Nacional porque Fernando Bezerra é aposta eleitoral do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, sonho de consumo do PSDB e de quem o presidente do partido, Sérgio Guerra, é firme aliado.
Posto assim o cenário, o PSDB não tem moral para dizer que o PT atua com foco exclusivo na disputa eleitoral, contribuindo para a deterioração da prática política no tocante ao exercício democrático do contraditório.
O PT coopta e estrangula a oposição, é verdade. Mas a oposição se deixa docemente estrangular. Aposta na articulação de bastidor em detrimento da relação com a sociedade.
Mesmo do ponto de vista das artimanhas políticas essa é uma forma esquisita de se conduzir: divide-se internamente e, em relação aos governistas, prefere a composição à oposição.
Na sequência. A Comissão de Ética Pública decidiu que Carlos Lupi não servia para ser ministro.
Há agora um movimento no PDT para discutir se ele serve para continuar presidindo o partido.

Decisões para o amianto e para os transgênicos - WASHINGTON NOVAES


O Estado de S.Paulo - 06/01/12


Dois temas importantes para a economia e a saúde no Brasil - banimento (ou não) do amianto e do plantio de alimentos transgênicos no Brasil - parecem aproximar-se de decisões neste começo de ano.

No caso do amianto, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou ao Supremo Tribunal Federal parecer em que pede a declaração de inconstitucionalidade da Lei n.º 9.055/95, que permite a exploração, utilização industrial e comercialização do produto. Com base nela, muitos Estados permitem esse uso. Cinco outros - São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Mato Grosso - têm legislações que o restringem. A União Europeia proibiu a utilização desde 2005. Chile, Argentina e Uruguai já o baniram.

Diz a PGR que "uma infinidade" de documentos nacionais e internacionais "já avaliaram que todas as formas desse mineral provocam câncer e outras doenças", todas progressivas, que levam à morte. Segundo o documento, "não há índice de exposição segura ao amianto". Tanto assim que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em convenção, prevê eliminá-lo, total ou parcialmente, pois o responsabiliza por 100 mil mortes a cada ano - 65 países já o baniram. No Brasil, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) reconhece a sua periculosidade.

Também a Organização Mundial de Saúde (OMS) afirmou, no ano passado, que todas as formas de asbesto (inclusive a crisotila, produzida no Brasil) são "cancerígenas para o ser humano". E a exposição a elas também pode provocar asbestose (forma de fibroma pulmonar), placas e derrames pleurais. O Instituto Nacional do Câncer relaciona ao amianto (aí incluída a crisotila) maior incidência de câncer pulmonar, mesoteliomas pleurais e peritoniais, câncer da laringe e outras doenças.

Na Câmara dos Deputados brasileira, a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento sustentável recomenda a eliminação, citando o número anual de mortes na Grã-Bretanha (3.500), nos Estados Unidos (10 mil) e na Austrália (23 mil). Essa recomendação é avalizada por documentos da nossa Previdência Social e do Ministério da Saúde - além de uma lei do Estado de São Paulo.

Já existem substitutos para o amianto nos vários mercados nacionais, utilizados principalmente na construção. Resta um problema econômico-social, que o autor destas linhas já enfatizou em várias oportunidades neste espaço -, que é o de uma região de Goiás (Minaçu), onde se encontra a unidade industrial de extração e venda do amianto crisotila. Quase toda a cidade e a região dependem - na ocupação da mão de obra, no transporte, na alimentação, no processamento, etc. - dessa atividade. E é preciso formular e executar planos alternativos para o momento em que se efetive (se ocorrer) a decisão de banir qualquer uso no País. Os argumentos em defesa do amianto crisotila - que não seria prejudicial à saúde, ao contrário do outro - já foram derrubados por numerosos pareceres da ciência em todo o mundo e por decisões judiciais em dezenas de países.

No caso dos alimentos transgênicos, o panorama é o inverso. Em muitos países estão sendo feitos questionamentos ao plantio desse tipo de alimento. Mas no Brasil se caminha na direção oposta.

Desde que se iniciou o plantio de variedades transgênicas no País - soja, milho -, os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente reivindicaram, na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que autoriza ou não o uso de processos biotecnológicos, que as autorizações fossem precedidas de estudos de impacto ambiental - para verificar a possibilidade de contaminação e prejuízos à biodiversidade em áreas vizinhas, de um lado, e de estudos epidemiológicos sobre problemas para a saúde do consumidor, de outro. Foram invariavelmente vencidos, com o argumento de que se trata de "postura ideológica", que "se contrapõe à visão científica". Ou seja, atribuindo à primeira, que pede estudos científicos, uma visão ideológica e à segunda, que dispensa estudos científicos, uma "visão científica". Embora isso desrespeite também convenção internacional, de que o Brasil é signatário, que consagra a necessidade de se ater ao princípio da precaução sempre que houver qualquer possibilidade de ameaça à biodiversidade.

Apesar de todos esses argumentos, com o avanço dos transgênicos no País, uma resolução normativa da CTNBio autoriza as empresas produtoras de sementes transgênicas a pedir isenção de monitoramento no plantio, depois de liberado comercialmente. Segundo o agrônomo Gabriel Fernandes, "está em curso um processo de desmanche das regras de biossegurança no País" - embora uma resolução da própria Casa Civil da Presidência da República, em 2008, tenha recomendado que se instalasse um grupo de trabalho (nunca efetivado) para estudar o controle dos transgênicos.

Estamos, nesse terreno, na contramão de boa parte do mundo. A Hungria há poucos meses decidiu impedir o plantio de sementes transgênicas. A União Europeia prepara resolução para proibir a importação de carne de animais clonados. A própria Agência Ambiental dos EUA (onde 94% da soja é transgênica, assim como 70% do milho e do algodão) pediu (The Wall Street Journal, 22/11) às empresas produtoras de sementes de milho transgênico resistentes à lagarta de raiz que revejam suas técnicas de monitoramento, porque as sementes parecem estar perdendo eficácia diante de certas lagartas, nos Estados de Iowa, Illinois, Minnesota e Nebraska. Na França, uma Corte de Justiça derrubou decisão que proibia o plantio de milho transgênico. Mas o presidente Sarkozy já disse que o governo está preparando uma nova "cláusula de segurança" para proibir o plantio desse tipo de milho (AS-PTA, 2/12). De qualquer forma, seis outros países mantêm a mesma restrição: Alemanha, Áustria, Bulgária, Grécia, Hungria e Luxemburgo.

Não se trata de ser contra ou a favor de transgênicos. Trata-se de respeitar o princípio da precaução, em respeito à biodiversidade. E de promover estudos epidemiológicos que digam se há ou não riscos para o consumidor.

Dilema americano - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 06/01/12
Os primeiros sinais emitidos pelas primárias republicanas são de animar os democratas. O eleitorado republicano está pulverizado entre vários candidatos, o partido radicalizou tanto seu discurso que virou uma direita bizarra. A genuína representante do Tea Party está fora da disputa. Mesmo assim, Barack Obama tem que superar uma difícil marca histórica.
Nenhum presidente, desde o mitológico Franklin Delano Roosevelt, conseguiu se reeleger com uma taxa de desemprego tão alta quanto a atual. A economia começa a dar alguns sinais de melhora, mas eles são insuficientes, e os economistas continuam prevendo um ano de baixo crescimento. A popularidade do presidente está fora da zona de conforto para quem busca a reeleição.
A média das pesquisas mostra um índice de aprovação de 48% para Obama. É baixo, mas parece consagrador se comparado aos 13% de aprovação do Congresso. Mas o pior para o presidente é que 70% acham que o país está na direção errada. Obama tem contra si a taxa de desemprego alta, o baixo nível de atividade econômica, o fim do encanto com o "sim, nós podemos" da primeira campanha. Tem a seu favor o fato de que os republicanos estão agarrados a teses ultraconservadoras, e as urnas costumam favorecer quem caminha para o centro.
Com intensidades e preferências diferentes, os pré-candidatos da oposição defendem a mesma lista de ideias com data de validade vencida. Acham que os 12 milhões de imigrantes ilegais devem ser expulsos do país, mesmo que morem lá por décadas, e que os 48 milhões de pessoas sem planos de saúde devem ser simplesmente abandonados pelo setor público. Sustentam que a mudança climática é uma conspiração da esquerda, que a América Latina é liderada por Cuba e Venezuela, que deve ser abolido o casamento gay mesmo nos estados que votaram por isso. Para eles, a Agência de Proteção Ambiental, EPA, o Ibama dos EUA, deveria ser fechada, e as armas, liberadas. Ao alinhar essas opiniões, a revista "Economist" lamenta que está sem candidato. Não que a revista inglesa mude voto nos Estados Unidos, mas o lamento é sintomático. Disse que já anunciou em outras eleições apoio a candidatos republicanos, mas não tem como fazê-lo agora. A revista inglesa acha que falta na corrida presidencial um candidato de centro-direita com credibilidade e pró-business.
A lista de pré-candidatos é uma coleção de dinossauros de fazer inveja ao Jurassic Park. Pelo menos, Michelle Bachman saiu da disputa, ao ficar em sexto lugar em Iowa. Em um dos seus textos, que assinou com outros do Tea Party, defendeu que a chance de uma criança negra ser criada pelos seus pais era maior no tempo da escravidão do que agora. A tese, além de tudo, é falsa. O casamento de escravos era proibido.
O problema não é apenas a coleção de velharias que os pré-candidatos defendem, mas o fato de que eles não apresentam propostas confiáveis sobre como fazer o que promete o líder em Iowa, Mitt Romney, "pôr a economia americana de volta aos trilhos". Apenas para lembrar um detalhe da história recente, o trem descarrilou no governo republicano de George Bush.
Nos quatro anos do governo Obama ele de fato não conseguiu espantar o fantasma da crise. O país ainda patina em ambiente recessivo, a despeito de alguns dados favoráveis, como o do desemprego que saiu ontem mostrando queda dos pedidos de seguro-desemprego ao menor nível dos últimos três anos. A criação de empregos do setor privado no mês de dezembro veio mais forte do que o esperado, com novas 325 mil vagas. Ainda assim, os economistas olham esse número com desconfiança, porque, segundo dizem, ele é muito sensível à sazonalidade. A taxa de desemprego ainda está em 8,6%.
O preço das residências americanas fechou 2011 em queda de 3,5%, o que é bom diante das quedas de anos anteriores. A expectativa da consultoria Capital Economics é de que os preços parem de cair este ano, mas só voltem a subir em 2014. O crédito para o setor imobiliário continua escasso e o alto índice de despejos aumenta a oferta de residências no país. O índice de encomendas dos gerentes de compras - um dado que antecipa a atividade econômica - está em terreno positivo, em 53 pontos. Mesmo assim, há outros indícios de que os empresários estão investindo menos, e os bancos, preferindo deixar o dinheiro em títulos do Tesouro, que estão com taxas menores do que no início do ano.
O economista Roberto Prado, do Itaú BBA, disse que os dados mostram que a economia nos últimos três meses teve indicadores melhores do que o esperado. Houve aumento da produção para recompor estoques e a retomada do nível de produção de automóveis, que havia sido atingida pela falta de peças após o desastre nuclear japonês. Mesmo assim, o banco brasileiro não está apostando numa recuperação de 2,5% a 3% da economia. Acha que ela continuará entre 1,7% e 1,8%.
Sem uma recuperação mais forte da economia, e sem a criação de empregos de forma robusta, o presidente Barack Obama terá que contar apenas com as divisões e falta de musculatura dos candidatos do Partido Republicano. A oposição tem ajudado. Enquanto isso, Obama se prepara para a campanha dizendo que cumpriu o que prometeu: aprovou a reforma da saúde e determinou a retirada das tropas do Iraque. Isso é pouco para empolgar quem sonhou que sim, ele poderia fazer muito mais, principalmente na economia e na oferta de emprego.

PESO-LEVE - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 06/01/12
O UFC, principal evento da luta MMA, conhecida como "vale-tudo", já não vende como antigamente. Em sua segunda edição no Brasil, a apenas dez dias do confronto, ainda havia oferta de ingressos, ontem, em dois setores.

ESPAÇO VAZIO

Na primeira luta, em agosto, as 16.572 entradas esgotaram no primeiro dia, em menos de duas horas. Desta vez, com as vendas abertas há 24 dias (desde dezembro) e preços iguais aos de 2011 (de R$ 275 a R$ 1.600), havia até ontem bilhetes das cadeiras especiais da arena em que se realizará a luta. Preço: R$ 1.000.

PESO-PESADO

Uma das hipóteses levantadas por profissionais ligados ao esporte é que a transmissão pela TV Globo pode ter acomodado o público. Outro fato é que a luta anterior teve Anderson Silva. Ele é o mais popular lutador brasileiro de MMA. No meio deste ano, deve enfrentar o adversário Chael Sonnen em pleno estádio do Morumbi.

DA PORTA PRA FORA

A Secretaria da Justiça instaurou processo administrativo contra o restaurante Nonno Paolo, no Paraíso (SP), de onde um menino negro de seis anos teria sido expulso. O garoto, que nasceu na Etiópia e foi adotado por um casal espanhol que visitava o Brasil, estava sozinho enquanto os pais se serviam no bufê. Se for confirmado que ele sofreu discriminação, a casa pode ser multada em até R$ 55 mil.

DA PORTA PARA FORA 2

O restaurante nega discriminação. Diz que o menino saiu do lugar espontaneamente, depois de questionado se estava sozinho.

BOI NO ROLETE

Aos 46 anos, com seis filhos e seis netos, Tiririca comemora amanhã 15 anos de casamento com a atual mulher, Nana. O deputado receberá amigos em Fortaleza para um churrasco.

GLOBAL JÚNIOR

João Pedro Carvalho, 11, não será mais o repórter-mirim do "CQC". Ele estava em negociação com a Band, mas fechou contrato com a Globo. Estará na próxima novela das nove da emissora.

TREM DA ALEGRIA

Aos 37, a cantora Patricia Marx, que fez sucesso ainda criança nos anos 80, prepara um disco de "new soul" para o mercado internacional; ela quer lançar o CD até junho na Inglaterra, onde já morou

FERA FERIDA
Susto nas gravações do reality show "Amazônia", da TV Record. A ex-miss Brasil Natália Guimarães, uma das participantes, caiu num poço de areia movediça. Pisou num tronco, que bateu no rosto dela. Resultado: fez um corte de 10 cm e está tratando da cicatriz com peeling. O programa, da Amora Produções, estreia no domingo.

MADEIRA
O designer brasileiro Hugo França foi convidado pela Prefeitura de Nova York para desenvolver mobiliário público para os parques da cidade, feitos a partir de resíduos de madeira. França é conhecido por criar com troncos de árvores tombadas naturalmente, cortadas ou queimadas em operações de limpeza de terra.

BONS VENTOS
O museu de ciência Catavento, no Palácio das Indústrias, em SP, teve aumento de público de 46% em 2011. Recebeu 412 mil visitantes, contra 282 mil no ano anterior.

VERÃO NA PISTA
Fabiana Semprebom, Lucas Di Grassi, Giovana Campagnon e Stella Prado circularam pela Posh, em Florianópolis. André Sada, sócio da casa, estava lá.

CURTO-CIRCUITO

O restaurante Spot completa 18 anos hoje.

A peça "A Saga da Bruxa Morgana e a Família Real", com Rosi Campos, estreia no dia 14, às 16h, no teatro Raul Cortez. Livre.

O espetáculo "Hell", com Bárbara Paz, reestreia no dia 27, no teatro Eva Herz. Classificação: 14 anos.

A festa Gás Total é hoje no clube Inferno. Classificação etária: 18 anos.

O instrumentista Mario del Nunzio faz show no dia 11, às 20h30, no Sesc Vila Mariana. 12 anos.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

Pelo telefone - MERVAL PEREIRA


O Globo - 06/01/12


O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, recusa fortemente a acusação de que as verbas para enchentes recebidas pelo estado tenham a ver com uma política fisiológica, ou com o aparelhamento do Ministério da Integração Nacional, que seu partido, o PSB, ocupa por meio de Fernando Bezerra.

Ele telefona para reafirmar que todas as verbas foram autorizadas pela presidente Dilma Rousseff pessoalmente, logo no início de seu governo, quando uma das regiões mais pobres de Pernambuco foi atingida pela terceira enchente em dez meses, entre 2010 e 2011.

Na descrição do governador, as enchentes transformaram uma situação "dura e difícil socialmente" daquela região, "uma das mais pobres de Pernambuco", em um "quadro de guerra".

Mais de 80 mil pessoas foram atingidas, cerca de 25 mil ficaram sem moradia, 300 escolas foram destruídas pelas águas, linhas férreas, transformadas em montes de ferro.

Dezesseis cidades ficaram sem água e energia, foi realizado o maior resgate aéreo de todos os tempos e mil pessoas passaram mais de um ano vivendo em tendas.

Eduardo Campos diz que, se tivesse feito gestões pessoais junto ao Ministério da Integração Nacional para passar à frente de outros estados na obtenção de verbas, "estaria no meu papel de defender o estado, e a imprensa, no papel dela de denunciar o privilégio".

Mas ele garante que nada disso aconteceu, e que a decisão sobre a prioridade para as obras em Pernambuco saiu de uma conversa que teve com a presidente Dilma.

"Lembro perfeitamente da conversa que tivemos ao telefone", diz-me o governador, reproduzindo de memória o diálogo com a presidente, que fora empossada recentemente. A iniciativa de telefonar partiu dela, depois da terceira enchente:

- Outra vez, Eduardo - lamentou a presidente, que já lidara com os problemas das enchentes anteriores quando era chefe da Casa Civil no governo Lula.

- O que é preciso fazer? Quanto custa? - perguntou Dilma, de maneira direta.

- R$500 milhões - respondeu o governador.

Com a mesma rapidez, a presidente reagiu:

- É muito dinheiro, não tenho como ajudar. Estou tendo que cortar custos.

Foi na época em que o governo anunciou o corte de R$50 bilhões no Orçamento para equilibrá-lo. O governador Eduardo Campos fez uma proposta:

- A cada real que o governo colocar no projeto de prevenção de enchentes, o estado coloca outro.

Como consequência da conversa, o Palácio do Planalto divulgou uma nota oficial no começo de maio de 2011 anunciando que faria o projeto de prevenção de enchentes com o governo de Pernambuco.

Os estudos foram realizados pelo Instituto de Tecnologia de Pernambuco, utilizando a memória do que fora feito em Recife, que também sofreu muito com enchentes.

Entre 1966 e 1975, foram construídas quatro barragens, e a última foi concluída no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Para a região em causa, é preciso construir cinco barragens, além de casas populares, recomposição das matas ciliares, reconstrução de pontes.

O programa Minha Casa Minha Vida está construindo 16 mil casas, e o governo de Pernambuco subsidia as moradias para os que ganham de 0 a 3 salários.

Como diz Eduardo Campos, grande parte dos projetos está sendo financiada com dinheiro "azul e branco", as cores de Pernambuco.

Todo esse quadro indica, para o governador, uma mobilização para reformas estruturais necessárias à região que tem tudo a ver com a função do Ministério da Integração Nacional.

"As obras são de interesse também de Alagoas, que sempre sofre com as enchentes de Pernambuco", ressalta.

O que para muitos representa um acordo tácito do PSDB com o PSB com vistas a uma ação eleitoral coordenada em 2014, quando Eduardo Campos poderia apoiar a candidatura de Aécio Neves à Presidência da República, ocupando quem sabe a vice na chapa tucana, para o governador de Pernambuco nada mais é do que o entendimento das políticas públicas que estão sendo executadas.

O governador Teotônio Vilela, do PSDB, apoiou as obras porque beneficiam também Alagoas. O governador Antonio Anastasia, de Minas, também não reclamou porque sabe os problemas que Pernambuco enfrenta. E também Sergio Cabral, do Rio de Janeiro, não acusou Pernambuco de estar sendo beneficiado por métodos escusos.

Isto é, nenhum governador de outros estados também afetados pelas chuvas, como Minas e Rio de Janeiro, reclamou de um suposto privilégio de Pernambuco: "O Anastasia não reclamou, o Sergio Cabral não reclamou, o Teo Vilela apoiou. Eles sabem que não houve privilégios".

Para Eduardo Campos, o que há é muitos problemas e pouco dinheiro.

Na versão do governador, há um histórico de políticas fisiológicas no Ministério da Integração Nacional que contamina as decisões técnicas que estão sendo tomadas, mas ele rejeita a pecha de que esteja aparelhando o Ministério da Integração Nacional sob o comando de Fernando Bezerra.

Esse debate em torno de privilégios para Pernambuco está até mesmo trazendo dividendos eleitorais para seu governo, pois os eleitores acham que ele está defendendo os interesses do estado.

Ao mesmo tempo, Eduardo Campos teme que as críticas revolvam a percepção de um sentimento antinordestino que "não serve para o país".

Toda essa crise poderia ter sido evitada, admite Eduardo Campos, se o Palácio do Planalto tivesse desde o primeiro momento confirmado que as obras eram necessárias e tinham a autorização da presidente Dilma.

O mal-entendido não quer dizer que o governador, um dos mais importantes aliados do governo Dilma, tenha razões para mudar de posição. Mas a compreensão dos tucanos e a possibilidade de que Ciro Gomes - hoje adversário de Campos dentro do PSB - assuma um papel importante no governo Dilma só fazem ressaltar as difíceis relações do PSB com o PT.

Comida para pensar - FERNANDO GABEIRA


O Estado de S.Paulo - 06/01/12


O ano passado foi humilhante para os profetas. Quem esperava tudo aquilo? Em 2012 o estômago vem antes dos sonhos. Uma nova alta de alimentos ameaça a estabilidade de muitos pontos do globo. Os economistas afirmam que haverá uma transferência de renda para os que produzem alimentos. O Brasil está bem na foto. Mas o quadro geral não é nada animador.

Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o mundo entrou numa fase perigosa. O preço dos alimentos atingiu o nível mais alto desde a crise de 2008: nesse ano era de 213 a média ponderada do preço de alguns produtos (carne, cereais, lácteos, azeites e óleos), no fim de 2011 subiu para 215. Isso no ano em que passamos a ser 7 bilhões no planeta. Cerca de 70 milhões de novas bocas surgem a cada ano. Sem nenhum alarme, é preciso encarar o problema

Em Moçambique o preço do pão provocou uma revolta em setembro. Em todo mundo o aumento de quase 80% no trigo ao longo dos dois últimos anos foi um elemento, às vezes subavaliado, de instabilidade política.

Se olharmos a produção mundial com a perspectiva dos últimos 50 anos, custa-nos a entender como a crise chegou a esse patamar. Os alimentos foram tratados como qualquer mercadoria. O avanço tecnológico e a competição aumentaram a produtividade num ritmo animador. Os custos de alimentação caíram dramaticamente, a ponto de a produção mundial sobrepassar as necessidades calóricas per capita em 20%.

Paul Roberts, no seu livro O Fim da Comida, insinua que não foi casual o aumento da obesidade na década de 1980, quando o modelo de grandes volumes e baixo preço dos alimentos atingiu sua maturidade. Apesar do progresso, porém, ainda se atribuem à fome cerca de 36 milhões de mortes, sem contar a fadiga permanente, a atrofia física e intelectual causadas pela subnutrição.

Nesta conjuntura de alta de preços e consumo crescente na China e na Índia, é razoável duvidar do crescimento sustentável do modelo de produção de alimentos, que depende basicamente de três fatores: energia barata, estabilidade climática e água abundante. A China volta-se para o mercado de alimentos não apenas porque tem muita gente, mas também pela redução de recursos hídricos em algumas províncias, onde houve superbombeamento para garantir a safra de cereais.

Tais fatores estratégicos ainda passam ao largo porque a conjuntura configurou o que os especialistas chamam "perfeita tormenta": vários fatores combinados puxaram as expectativas para baixo. Na Rússia houve a maior seca dos últimos 50 anos. Nos EUA, Austrália e Canadá registram-se grandes inundações. Alguns alimentos, como o milho, estão sendo usados na produção do etanol. E por último, mas com grande peso, houve o aumento do petróleo, embora menor que em 2008.

Cientistas e técnicos de grandes empresas, como Monsanto e Dow, acreditam poder resolver os grandes problemas da comida via conhecimento e inovação. Ainda que isso ocorra, a ausência de água abundante, energia barata e estabilidade climática transforma o quadro em que se movem. A elevação da temperatura e as mudanças no regime de chuvas tendem, mesmo em estimativas conservadoras, a frear o crescimento da produção mundial de alimentos. Como atenuante, áreas liberadas do gelo perene passam a ser mais produtivas em regiões frias. O aumento do petróleo revela a cada instante como é um dos insumos mais importantes na produção de alimentos, hoje - tratores, transporte da mercadoria, insumos para fertilizantes e pesticidas, o óleo é usado em todas as frentes.

Analistas como Paul Roberts reconhecem que novos eixos de poder alimentar se estruturam no mundo, principalmente o que associa um grande comprador como a China a um grande produtor que é o Brasil. Mas ele questiona a sustentabilidade a longo prazo: os produtores podem, ao longo do processo, esgotar também parte dos seus recursos hídricos.

No momento, o Brasil vive uma importante experiência externa no campo alimentar: depois de mandar seus soldados ao Haiti e contribuir para a pacificação do país, está sendo chamado a ajudá-lo a produzir sua própria comida. Atendendo a apelo da FAO, que pretende deslocar, pós-terremoto, 600 mil haitianos para o interior, o País enviou US$ 2 milhões, alguma toneladas de sementes e técnicos da Embrapa, além de ministrar cursos para os haitianos plantarem com êxito. Desse êxito, o próprio The New York Times reconheceu, depende o futuro próximo do Haiti: na capacidade de produzir parte de seu alimento reside uma das saídas para seu problema econômico e social.

Dia 1.º um brasileiro, José Graziano, assumiu a direção da FAO, prometendo, como não podia deixar de ser, buscar soluções para as dificuldades alimentares globais. Mas a FAO precisa de financiamento e os grandes doadores, como os EUA, estão se retraindo, em parte porque houve muitos casos de mau uso do dinheiro.

O Itamaraty, na preparação da Rio+20, formulou a seguinte pergunta: que novos instrumentos podem ser propostos para que o planeta avance no desenvolvimento sustentável? A renovação de um instrumento já existente, como a FAO, pode ser uma resposta. O Brasil ocupa a direção, é um dos maiores produtores do mundo, sediará uma conferência internacional e tem como objetivo n.º 1 de governo reduzir a miséria. Equacionar a produção de alimentos com a preservação ambiental e erradicação da miséria poderia ser um dos pratos de resistência no debate planetário de 2012.

Inegavelmente, o mercado propiciou um grande salto na produção, mas sozinho não resolve o problema. Quanto mais valor se agrega à comida, mais distante ela fica de mercados como Bangladesh ou Etiópia. Se os ganhos com a alta de alimentos transferem renda para os grandes produtores, eles podem ricochetear nos consumidores internos ou mesmo derrubar governos que não podem mais pagar os subsídios.

Sem arriscar profecias: a alta dos alimentos, tão presente em 2011, é do tipo que não festeja o réveillon, pois se move num tempo mais elástico do que a simples virada do ano.

Enxurrada de descasos - MARINA SILVA


FOLHA DE SP - 06/01/12

As chuvas torrenciais chegam com o verão e de novo assistimos a cenas trágicas, com transbordamento de rios, queda de encostas e barreiras, alagamento de cidades inteiras. Até agora, três Estados foram fortemente atingidos, com milhares de pessoas desalojadas, dezenas de vítimas, municípios totalmente destruídos.

Em 2011, mais de 900 pessoas morreram só na região serrana do Rio. Salvo a criação do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, que cobre só uma parte dos municípios críticos, tudo seguiu como antes.

Os cientistas vêm alertando que o aquecimento global provoca uma maior frequência de eventos climáticos extremos. Sabemos que a ausência de planejamento na ocupação de áreas urbanas expõe um grande contingente da população a riscos na maior parte das cidades brasileiras.

Mas, apesar de termos instrumentos técnicos e recursos para avaliar os riscos e adotar medidas de prevenção, fatores políticos fazem com que nos atolemos na lama da imprudência e deixemos milhões de brasileiros sujeitos a se tornarem vítimas dessas catástrofes.

Agora, por exemplo, ficamos sabendo que a pouca verba existente para a prevenção de desastres ambientais é destinada quase toda (90% dela) ao Estado de origem do Ministro da Integração Nacional. Desta vez, Pernambuco, mas, em 2010, quando o então ministro era baiano, foi a Bahia.

E mais: as duas cidades que receberam a maior parte das verbas não constam na lista de prioritárias para recebimento dos recursos. Só 1,5% da verba de prevenção foi para municípios de áreas de risco, segundo a ONG Contas Abertas, que realizou o levantamento.

Sabemos que o volume de recursos para a prevenção de desastres naturais é insuficiente diante do tamanho do problema. Pequeno em termos absolutos, cerca de R$ 155 milhões desembolsados em 2011, e, sobretudo, em termos relativos. Em 2011, o governo gastou mais de R$ 1 bilhão na recuperação das áreas afetadas.

O pouco recurso, quando disponível, não é efetivamente aplicado. Segundo a Contas Abertas, de 2004 a 2011 foi autorizada no orçamento do Ministério da Integração Nacional uma dotação de R$ 3,3 bilhões, mas apenas R$ 1,8 bilhão foi empenhado. Disto, só R$ 790 milhões foram pagos. Ou seja, nos últimos oito anos, menos de um quarto dos recursos virou obra para a prevenção de riscos.

Quando o Congresso voltar a discutir oL CÓDIGO FLORESTA, também precisará corrigir no projeto a permissão prevista para mais ocupações em áreas de risco ambiental, especialmente encostas e margens de rios. Os governos ainda não mostraram efetiva disposição de enfrentar tais problemas e proteger a população exposta. O que mais precisa acontecer?

Crise gerencial - RENATA LO PRETE

FOLHA DE SP - 06:01:12


FÁBIO ZAMBELI (interino) 


Mais que a disputa por espaço entre os aliados PMDB e PSB, a caça às bruxas pela responsabilidade federal na prevenção a enchentes e deslizamentos expõe o desconforto da base de Dilma Rousseff com a ausência de coordenação de programas interministeriais.

Peemedebistas lembram que foram apeados da Integração Nacional após Geddel Vieira Lima privilegiar seu reduto baiano no repasse de verbas, situação análoga à experimentada agora por Fernando Bezerra (PSB-PE). Os dois partidos envolvidos na pendenga concordam num ponto: a liberação de recursos passa, em algum momento, pelo crivo da Casa Civil.

Flashback Governistas citam como exemplo de descontrole sobre ações preventivas o caso da tragédia na região serrana fluminense em 2010. À ocasião, vários ministérios foram mobilizados, mas o encaminhamento de soluções ficou muito aquém do esperado pelo Rio.

Meteorologia 1 Outra dúvida consome os aliados: como, num período para o qual havia previsão de chuvas intensas, tanto o ministro da Integração quanto o núcleo do Planalto estavam fora de Brasília? Se o governo não cogitou um plantão, o retorno às pressas para a capital seria apenas simbólico.

Meteorologia 2 Quem acompanha os movimentos pré-eleitorais em Pernambuco prevê Bezerra cada vez mais próximo da candidatura à Prefeitura de Recife, avalizada por Eduardo Campos.

Digitais Desde que uma operação da PF resultou em mais de 30 prisões no Turismo, em agosto, funcionários da pasta fogem da assinatura de documentos temendo responsabilização futura.

Palanque O PMDB gravará na semana que vem novo programa de TV, que vai ao ar dia 19. Desta vez, participarão candidatos a prefeito nas capitais: além de Gabriel Chalita (SP) e Eduardo Paes (Rio), Edson Giroto (Campo Grande), e Mário Kertesz (Salvador) devem aparecer.

Minha vez A visita de Fernando Haddad a Lula ontem no Sírio-Libanês não constava na agenda do ministro para a semana. Surpreendidos, petistas a associaram ao fato de Gilberto Kassab ter ido ao hospital na véspera.

Quero mais Recém-empossado no TJ-SP, Ivan Sartori pediu ontem a Barros Munhoz (PSDB), presidente da Assembleia paulista, a inclusão de oito projetos de interesse do Judiciário na pauta da Casa. Entre eles está o que transfere ao tribunal taxas judiciais e cartoriais, hoje recolhidas ao governo estadual.

Dou menos A proposta, que engordaria em R$ 2,5 bilhões o caixa do TJ, é vista com reservas no Bandeirantes. Geraldo Alckmin deve orientar sua bancada a brecá-la. Se ela prosperar, o governador pode dar o troco, fechando o cofre para o órgão.

Belezura Com a perspectiva cada vez mais remota de cumprir seu plano de metas em ano eleitoral, Kassab acaba de colocar nas ruas mutirões de varrição, manutenção e serviços de zeladoria. A limpeza teve início nos extremos sul e leste de São Paulo.

Lupa O Procon-SP fará blitz hoje em lojas do Magazine Luiza, rede varejista presidida por Luiza Trajano, candidata a assumir o novo Ministério da Micro e Pequena Empresa de Dilma. Os fiscais vão checar se preços e descontos conferem com o anunciado no saldão de Natal.

Escala O porto de Santos entrou na rota de cruzeiro para 15 mil mexicanos que acompanharão a Copa-2014.

com LETÍCIA SANDER e FLÁVIO FERREIRA

tiroteio

"As medidas até agora são positivas, mas é preciso ficar alerta para que elas não sejam o início de uma ação higienista, de tirar as pessoas na marra e pronto."

DO COORDENADOR DE INFÂNCIA E JUVENTUDE DO TJ-SP, ANTONIO CARLOS MALHEIROS, sobre a recém-lançada operação policial de retirada de usuários de drogas da região da Cracolândia, centro de São Paulo.

contraponto

Túnel do tempo

Durante o evento de lançamento do novo EcoSport, da Ford, na quarta-feira em Brasília, o ministro Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia) saudou o fato de que, no Brasil, o veículo será produzido na Bahia.

-Este carro vai levar a lambada para o mundo!

Ao ouvir o ministro, alguém da plateia comentou:

-Pelo jeito, faz muito tempo que ele não vai à Bahia. O ritmo baiano que está bombando é o axé! Lambada era sucesso nas décadas de 80 e 90...