sexta-feira, janeiro 06, 2012
Flor do recesso - DENISE ROTHENBURG
Correio Braziliense - 06/01/12
O gesto de Bezerra de viajar para o Rio de Janeiro e, ainda, conversar com o senador Aécio Neves sobre a situação dos municípios mineiros mostra que ele trabalha para permanecer no cargo e afastar a Integração do bolo da reforma ministerial
Quando deputado federal pelo antigo PFL, Heráclito Fortes, do Piauí, dizia existir um padrão de comportamento da mídia e da política no mês de janeiro: um assunto cresce, toma as manchetes e parece ser a pior desgraça que poderia acontecer no mundo da política. Com a volta dos políticos ao Congresso em fevereiro, o assunto volta a ocupar um espaço menor. Ele apelidou esse fenômeno de "flor do recesso", aquela que, quando os congressistas saem, vira uma árvore. Quando eles retomam as atividades, a flor murcha.
É assim que muitos políticos reagiram ontem quando alguém lhes perguntava sobre as notícias a respeito das liberações de recursos em maior volume para Pernambuco dentro da Integração Nacional, justamente, estado do ministro Fernando Bezerra Coelho. Os políticos dos mais diversos partidos diziam não ver problemas quanto à liberação em si, depois de lerem as explicações do ministro e assistirem às declarações em todos os telejornais.
O caso tem mesmo os sintomas de flor do recesso, mas isso só saberemos depois que a imprensa terminar a temporada de investigações sobre aquela área, assim como fez em outros seis ministérios do governo Dilma. O que temos agora é o ministro Fernando Bezerra Coelho dizendo que só liberou os recursos porque Pernambuco apresentou os projetos técnicos benfeitos. Ok. Até aí, nada demais, parabéns ao governo estadual que fez o dever de casa depois do desastre de 2010. Resta saber se outros estados ou municípios que hoje vivem o drama das enchentes — Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo — fizeram o mesmo. Se houver dezenas de bons projetos no ministério mofando na gaveta, esperando a liberação de verba, aí o ministro terá mais a explicar.
Pelas informações oficiais divulgadas até agora, esses projetos não foram apresentados. Talvez não tenham sido mesmo. Os políticos hoje estão acostumados a achar que, se o ministro é conterrâneo de determinado deputado, as emendas desse parlamentar têm prioridade. Foi assim nos Transportes no tempo do PR. Volta e meia os jornais são inundados com notícias sobre ministros que privilegiam seus estados na hora de distribuir recursos. E a maioria dos políticos considera esse procedimento normal, embora não devesse ser assim.
Em política, aliás, vale o ditado, farinha pouca, meu pirão primeiro. A esperança é que a presidente Dilma Rousseff, apontada como detentora de uma visão mais técnica do que política, consiga mudar essa mentalidade. Por enquanto, é cedo para dizer que haverá uma mudança de padrão, embora ela esteja com a faca e o queijo na mão para reformular essa prática.
Por falar em mudança...
Dilma não se mostra disposta a alterar tudo no governo este ano, nem fará uma reforma ministerial de peso. Ela trabalha na direção das trocas pontuais. Diz-se no governo que não sobrou muita coisa para mexer depois da saída de sete ministros. Fernando Bezerra Coelho continua contando com todo o apoio do Planalto. E, pela forma como se mostrou indignado na entrevista, não deu o menor sinal de que pretende deixar o cargo para concorrer à prefeitura de Recife.
O gesto de Bezerra ao, passada a entrevista com as explicações, viajar para o Rio de Janeiro e, ainda, conversar com o senador Aécio Neves sobre a situação dos municípios mineiros mostra que ele trabalha para permanecer no cargo e afastar qualquer especulação que envolva a Integração Nacional no bolo da reforma ministerial. E não é apenas isso.
Fernando Bezerra Coelho faz agora o que Orlando Silva não fez quando houve a saraivada de denúncias sobre o Ministério do Esporte no ano passado. Naqueles dias, o então ministro foi aconselhado a, passadas as explicações, sair de Brasília e dedicar o tempo a visitar obras dos estádios. Assim, esperaria passar o furacão fora do epicentro da crise. Orlando, entretanto, preferiu ficar em Brasília. Já seu colega da Integração Nacional se mostra disposto a dedicar os próximos dias a visitar os estados que abriram 2012 debaixo d"água. Não será surpresa ainda se visitar o Rio Grande do Sul. Assim, mostra serviço e fica longe, torcendo para que janeiro passe logo e essa árvore frondosa que faz sombra sobre ele vire uma inocente flor do campo. Se der errado, ainda tem o plano B da prefeitura.
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