ZERO HORA - 23/01
Suicídio não casa bem com dias de verão, mas hoje acordei sem saber como preencher a tela em branco e, não possuindo o talento de Rubem Braga, de quem se dizia “quando ele tem assunto, é ótimo, e quando está sem assunto, é fenomenal”, me rendi a esse tema delicado, difícil, mas que também faz parte da vida.
Dois acontecimentos me trazem até aqui. O primeiro foi ter assistido ao impactante Amor, filme do qual já se celebrou tudo: a excepcional atuação do casal protagonista, o realismo da história e a transcendência de um sentimento que não se revela apenas nas trocas de carinho, mas na compreensão profunda um do outro.
Anne, interpretada pela magnífica Emmanuelle Riva (fará 76 anos no dia da entrega do Oscar, que lhe deem esse merecido presente), sofre um derrame e fica com um lado do corpo paralisado, e a doença se agrava com o passar dos dias, degradando-a, retirando dela não apenas os movimentos, mas também boa parte da consciência. Só lhe resta esperar pela morte, enquanto vê seu marido dedicar dias e noites a atendê-la em todas as suas necessidades, absolutamente todas.
Quem não desejaria, nessa situação, antecipar o desfecho? Sem nem mesmo conseguir expressar-se pela fala, ela decide fechar a boca e recusar o alimento que lhe dão, numa atitude patética, mas ao mesmo tempo política: é seu ato solitário de protesto. Que, claro, não funciona, por falta de resistência. A morte exige uma bravura mais radical.
Tão radical quanto a de que foi capaz o grande Walmor Chagas, um homem de forte personalidade que conduziu sua vida sem fazer concessões, e que saiu dela atendendo sua própria vontade, como lhe era peculiar. Aos 82 anos, enxergando muito mal, já precisando de ajuda para realizar tarefas corriqueiras, fez sua opção. Com toda a consideração ao sentimento dos familiares e amigos, reconheçamos: em casos bem específicos, como o dele, há uma certa dignidade no suicídio.
Não estou encorajando ninguém ao ato. É uma tragédia. Principalmente quando realizado por jovens, que geralmente o fazem por uma dor momentânea que os leva ao impulso, sem conjecturar sobre a longa existência pela frente. Quando falo em “casos bem específicos”, me refiro à tentativa da personagem Anne, ao Walmor Chagas e até ao próprio Rubem Braga, que, aos 77 anos, sabedor de que tinha um tumor na laringe, preferiu não operar nem tratar quimicamente.
Dias antes da sua morte, recebeu os amigos mais chegados em casa, e logo depois morreu sedado num quarto de hospital – sozinho, como pediu. Não foi uma morte provocada, mas teve a participação do principal envolvido, que se deu o direito de escolha.
Nenhuma morte é bonita. E é nosso dever tentar impedir ações deliberadas de partir, se estiver ao nosso alcance. Não estando, só nos resta respeitar aqueles que o fizeram não por tristeza, não por covardia, não por desequilíbrio emocional, mas, estando com uma idade avançada, sentindo o corpo e a mente deteriorarem-se e perdendo a capacidade de tomarem conta de si mesmos, o fizeram por pudor.
quarta-feira, janeiro 23, 2013
É pavê ou pacomê?! - ANTONIO PRATA
FOLHA DE SP - 23/01
"Bem-aventurados os do 'pavê ou pacomê', pois verão a face de Deus", diria Jesus, se na Galileia já houvesse pavê
Tem gente que se irrita, que suspira e vira os olhos como um filósofo vendo TV ou um cientista lendo o horóscopo, mas eu, não. Eu sorrio feliz e contente toda vez que escuto alguém perguntar, diante de um pavê, com a certeza do primeiro ser humano tocado pela luz da inspiração: "É pavê ou pacomê?!".
Que coragem. Veja, vivemos sob a égide do grande Deus Photoshop. Começamos tirando as celulites das bundas, passamos a cortar as estrias dos discursos e, hoje, removemos manchinha por manchinha de nossas facebúquicas personalidades. Nesta era da performance, em que cada ideia é cuidadosamente escanhoada antes de ser posta no mundo, em que cada julgamento é miligramicamente pesado para se avaliar os seus efeitos -seus likes, deslikes e retuítes-, enfim, nestes tempos bicudos em que a canalhice é perdoada, mas a ingenuidade, não, o cidadão me sai com essa: "É pavê ou pacomê?!". Que coragem.
Trata-se, evidentemente, de um espírito superior. Um homem acima da moral de sua época, que não tem vergonha de baixar a guarda e mostrar-se desprotegido, como aqueles peladões que, antigamente, surgiam correndo no meio de um jogo de futebol.
Como eram felizes os peladões de antanho, livres e despropositados, ziguezagueando entre jogadores perplexos e policiais furibundos. Agora, os peladões têm objetivos, estratégias, método. Desnuda-se pelo fim da corrupção, pelos golfinhos, pela bicicleta. Tudo bem, é sempre melhor ver ativistas ucranianas em pelo (ou sem pelo nenhum) defendendo uma causa nobre do que ruralistas (vestidos, felizmente) atacando as leis ambientais.
Sejamos anarquistas ou sojicultores, despidos ou de burca, contudo, fomos todos cooptados pela cartilha do cálculo. No século 21, até adestrador de cachorro tem assessor de imprensa, pipoqueiro faz coaching, refém de assalto a banco imagina, com uma arma na cabeça, como vai capitalizar a experiência, saindo dali: palestra motivacional? Biografia? Autoajuda? Só nosso amigo do pavê não pensa nos efeitos e consequências de seu ato: simplesmente segue o impulso. É o último romântico, filho temporão de Jacques Tati, neto do Charlie Chaplin, lutando contra as catracas do bom (sic) gosto, da etiqueta, da inteligência.
Ah, a inteligência, superestimada virtude! Goebbels, Stalin, Kalashnikov e o inventor do telemarketing eram todos inteligentíssimos e o mundo passaria bem melhor se, em seus lugares, tivéssemos um punhado de figuras capazes de desafiar a família, os amigos, os chefes e colegas de trabalho, sem medo do ridículo ou de retaliações, em nome de uma piada (dita) infame.
"Bem-aventurados os do 'pavê ou pacomê', pois verão a face de Deus", diria Jesus, na Galileia, se na Galileia já houvesse pavê. Não havia -mal havia pacomê-, de modo que os bravos iconoclastas seguem na luta sem o beneplácito de Deus, enfrentando com a cara e a coragem o desdém da sociedade. Não desanimem, irmãos: saibam que, se não têm o testemunho de Mateus, contam ao menos com o apoio deste modesto cronista, sempre disposto a responder, com a colher em riste e a fé no futuro: "Pacomê!".
Bem-aventurados os puros de coração.
"Bem-aventurados os do 'pavê ou pacomê', pois verão a face de Deus", diria Jesus, se na Galileia já houvesse pavê
Tem gente que se irrita, que suspira e vira os olhos como um filósofo vendo TV ou um cientista lendo o horóscopo, mas eu, não. Eu sorrio feliz e contente toda vez que escuto alguém perguntar, diante de um pavê, com a certeza do primeiro ser humano tocado pela luz da inspiração: "É pavê ou pacomê?!".
Que coragem. Veja, vivemos sob a égide do grande Deus Photoshop. Começamos tirando as celulites das bundas, passamos a cortar as estrias dos discursos e, hoje, removemos manchinha por manchinha de nossas facebúquicas personalidades. Nesta era da performance, em que cada ideia é cuidadosamente escanhoada antes de ser posta no mundo, em que cada julgamento é miligramicamente pesado para se avaliar os seus efeitos -seus likes, deslikes e retuítes-, enfim, nestes tempos bicudos em que a canalhice é perdoada, mas a ingenuidade, não, o cidadão me sai com essa: "É pavê ou pacomê?!". Que coragem.
Trata-se, evidentemente, de um espírito superior. Um homem acima da moral de sua época, que não tem vergonha de baixar a guarda e mostrar-se desprotegido, como aqueles peladões que, antigamente, surgiam correndo no meio de um jogo de futebol.
Como eram felizes os peladões de antanho, livres e despropositados, ziguezagueando entre jogadores perplexos e policiais furibundos. Agora, os peladões têm objetivos, estratégias, método. Desnuda-se pelo fim da corrupção, pelos golfinhos, pela bicicleta. Tudo bem, é sempre melhor ver ativistas ucranianas em pelo (ou sem pelo nenhum) defendendo uma causa nobre do que ruralistas (vestidos, felizmente) atacando as leis ambientais.
Sejamos anarquistas ou sojicultores, despidos ou de burca, contudo, fomos todos cooptados pela cartilha do cálculo. No século 21, até adestrador de cachorro tem assessor de imprensa, pipoqueiro faz coaching, refém de assalto a banco imagina, com uma arma na cabeça, como vai capitalizar a experiência, saindo dali: palestra motivacional? Biografia? Autoajuda? Só nosso amigo do pavê não pensa nos efeitos e consequências de seu ato: simplesmente segue o impulso. É o último romântico, filho temporão de Jacques Tati, neto do Charlie Chaplin, lutando contra as catracas do bom (sic) gosto, da etiqueta, da inteligência.
Ah, a inteligência, superestimada virtude! Goebbels, Stalin, Kalashnikov e o inventor do telemarketing eram todos inteligentíssimos e o mundo passaria bem melhor se, em seus lugares, tivéssemos um punhado de figuras capazes de desafiar a família, os amigos, os chefes e colegas de trabalho, sem medo do ridículo ou de retaliações, em nome de uma piada (dita) infame.
"Bem-aventurados os do 'pavê ou pacomê', pois verão a face de Deus", diria Jesus, na Galileia, se na Galileia já houvesse pavê. Não havia -mal havia pacomê-, de modo que os bravos iconoclastas seguem na luta sem o beneplácito de Deus, enfrentando com a cara e a coragem o desdém da sociedade. Não desanimem, irmãos: saibam que, se não têm o testemunho de Mateus, contam ao menos com o apoio deste modesto cronista, sempre disposto a responder, com a colher em riste e a fé no futuro: "Pacomê!".
Bem-aventurados os puros de coração.
Infraero 3 _ A revanche - ARTUR XEXÉO
O GLOBO - 23/01
Eu sei que prometi não voltar ao assunto. Escrevi isso meio frustrado, mas promessa é promessa. Na verdade, a carta do presidente da Infraero em resposta a minha coluna de 15 dias atrás era tão grande que, se eu acrescentasse algum comentário sobre ela, teria que cortá-la mais ainda e tudo ficaria sem sentido. Preferi me calar. Mas os leitores me ignoraram. Foram em frente. Assim, se abri espaço para o presidente da Infraero, Antônio Gustavo Matos do Vale, relatar as maravilhas que ele vê no
Galeão, nada mais justo que ceda a coluna também para que os usuários do aeroporto façam suas queixas. Começo com o leitor Eduardo Teixeira:
“Levando em conta que todas as informações dadas pelo presidente da Infraero, Antonio Gustavo Matos do Vale, são verdadeiras, podemos tirar duas conclusões: mesmo depois de tantas melhorias, o Galeão continua um lixo, e, se isso tudo foi feito no período
2011/2012, o Galeão deveria ter sido interditado em 2010, pois era ainda pior. Socorro!”
No caso de Dusi Marcelo, temos uma experiência particular:
“Você já reparou na prepotência dessas pessoas quando estão em cargo de chefia? Olha, não conheço todos os aeroportos do mundo. Só conheço alguns. Aqui no Brasil, conheço muitos. A competição é difícil, viu? É difícil dizer qual é o pior. Um pequeno exemplo do que aconteceu comigo. Vim de Ilhéus num domingo de manhã. Combinei com meu irmão para me buscar. Como moro
no Flamengo, disse a ele que, assim que o avião pousasse, eu o avisaria. Bom, fiz isso. Sabe qual foi minha espera das malas no Galeão? Duas horas. Que tal? Duas inacreditáveis horas! Meu irmão chegou em 15 minutos. A espera das malas foi maior que o tempo de voo. Realmente deve estar muito boa a administração da Infraero.”
Com a palavra Ana Lucia Neves:
“Cheguei ontem dos Estados Unidos depois de uma estada de 35 dias em Orlando, Flórida. Partimos, eu e minha família, no dia 11 de dezembro, com voo previsto para as 22h40m. Portanto, chegamos ao aeroporto, como manda o figurino, com quatro horas de antecedência para não corrermos nenhum risco. Foram as piores horas passadas em espera da minha vida. O calor insuportável, bebedouros sem água, pessoas em pé por falta de lugares suficientes para sentar, banheiros danificados, escadas rolantes interditadas... Reafirmo: o problema do ar condicionado não é pontual, mas sim crônico nos dias de mais calor. O pior de tudo isso, meu amigo, é que, na faixa dos 60, pude conhecer esse aeroporto quando ainda era um espetáculo de limpeza e
organização.”
Esta é a opinião de Mario Victor de Faria Nogueira:
“Sou profissional liberal e, devido à minha atividade, viajo com uma freqüência, às vezes, acima do que gostaria. Para o interior do Brasil e o exterior. Não só capitais, mas também para cidades menores nos países estrangeiros.Tenho, portanto, horas e horas de espera e utilização em aeroportos dos cinco continentes. O Galeão, para minha tristeza e vergonha absolutas, carioca adotivo e empedernido que sou, pode não ser o pior aeroporto do mundo, já que, como disse o presidente da Infraero, não conheço todos. Mas, sem dúvida, é o pior aeroporto de todos os que eu conheço. E eu conheço muitos. Incluidos aí, os brasileiros.”
Heliana Calmon não gostou de o presidente da Infraero dizer que, na noite do apagão, nenhum voo atrasou mais de uma hora:
“Somente falando do meu voo, o 250 da American Airlines para Dallas e que deveria ter partido do Galeão às 11h45m do dia 26 de dezembro. Ele decolou à 01h30m da madrugada do dia 27. Bem mais de uma hora de atraso, portanto. E causou a mim e à maioria esmagadora dos passageiros a perda de inúmeras conexões que tínhamos em Dallas. Vamos combinar que pouca gente voa para Dallas e fica por lá. Famílias inteiras começando suas férias tiveram que ser realocadas em novos voos de conexão. E ter voos disponíveis para realocação de passageiros no final do ano é tarefa árdua. Vi famílias que teriam que pernoitar no aeroporto de Dallas do dia 27 para o dia 28 porque perderam suas conexões e não havia nenhuma conexão de reposição. Eu mesma tinha três horas de intervalo entre o voo chegando do Rio e o outro, porém perdi a minha conexão e somente voei para
Salt Lake City (meu destino final) com meu filho mas separada do meu marido no voo das 15h15m, pois não havia três lugares na nova conexão. Meu marido voou às 19h15m, apesar de ter chegado no aeroporto de Dallas pela manhã. E, segundo a agente da American Airlines de Dallas, ele teve muita sorte de achar este único lugar livre neste voo. Soubemos que Stevie Wonder estava no Galeão na noite do apagão e, pelo que também soubemos, o voo dele para Nova Iorque teve que ser cancelado e parece que ele foi reacomodado naquela madrugada num voo para Dallas.”
Vou ficar por aqui. Teria mais algumas dezenas de e-mails para reproduzir. Mas isso só reforçaria a ideia de que o presidente da Infraero é uma Alice, e o Galeão é seu país das maravilhas. E agora é pra valer: não se fala mais nisso.
Eu sei que prometi não voltar ao assunto. Escrevi isso meio frustrado, mas promessa é promessa. Na verdade, a carta do presidente da Infraero em resposta a minha coluna de 15 dias atrás era tão grande que, se eu acrescentasse algum comentário sobre ela, teria que cortá-la mais ainda e tudo ficaria sem sentido. Preferi me calar. Mas os leitores me ignoraram. Foram em frente. Assim, se abri espaço para o presidente da Infraero, Antônio Gustavo Matos do Vale, relatar as maravilhas que ele vê no
Galeão, nada mais justo que ceda a coluna também para que os usuários do aeroporto façam suas queixas. Começo com o leitor Eduardo Teixeira:
“Levando em conta que todas as informações dadas pelo presidente da Infraero, Antonio Gustavo Matos do Vale, são verdadeiras, podemos tirar duas conclusões: mesmo depois de tantas melhorias, o Galeão continua um lixo, e, se isso tudo foi feito no período
2011/2012, o Galeão deveria ter sido interditado em 2010, pois era ainda pior. Socorro!”
No caso de Dusi Marcelo, temos uma experiência particular:
“Você já reparou na prepotência dessas pessoas quando estão em cargo de chefia? Olha, não conheço todos os aeroportos do mundo. Só conheço alguns. Aqui no Brasil, conheço muitos. A competição é difícil, viu? É difícil dizer qual é o pior. Um pequeno exemplo do que aconteceu comigo. Vim de Ilhéus num domingo de manhã. Combinei com meu irmão para me buscar. Como moro
no Flamengo, disse a ele que, assim que o avião pousasse, eu o avisaria. Bom, fiz isso. Sabe qual foi minha espera das malas no Galeão? Duas horas. Que tal? Duas inacreditáveis horas! Meu irmão chegou em 15 minutos. A espera das malas foi maior que o tempo de voo. Realmente deve estar muito boa a administração da Infraero.”
Com a palavra Ana Lucia Neves:
“Cheguei ontem dos Estados Unidos depois de uma estada de 35 dias em Orlando, Flórida. Partimos, eu e minha família, no dia 11 de dezembro, com voo previsto para as 22h40m. Portanto, chegamos ao aeroporto, como manda o figurino, com quatro horas de antecedência para não corrermos nenhum risco. Foram as piores horas passadas em espera da minha vida. O calor insuportável, bebedouros sem água, pessoas em pé por falta de lugares suficientes para sentar, banheiros danificados, escadas rolantes interditadas... Reafirmo: o problema do ar condicionado não é pontual, mas sim crônico nos dias de mais calor. O pior de tudo isso, meu amigo, é que, na faixa dos 60, pude conhecer esse aeroporto quando ainda era um espetáculo de limpeza e
organização.”
Esta é a opinião de Mario Victor de Faria Nogueira:
“Sou profissional liberal e, devido à minha atividade, viajo com uma freqüência, às vezes, acima do que gostaria. Para o interior do Brasil e o exterior. Não só capitais, mas também para cidades menores nos países estrangeiros.Tenho, portanto, horas e horas de espera e utilização em aeroportos dos cinco continentes. O Galeão, para minha tristeza e vergonha absolutas, carioca adotivo e empedernido que sou, pode não ser o pior aeroporto do mundo, já que, como disse o presidente da Infraero, não conheço todos. Mas, sem dúvida, é o pior aeroporto de todos os que eu conheço. E eu conheço muitos. Incluidos aí, os brasileiros.”
Heliana Calmon não gostou de o presidente da Infraero dizer que, na noite do apagão, nenhum voo atrasou mais de uma hora:
“Somente falando do meu voo, o 250 da American Airlines para Dallas e que deveria ter partido do Galeão às 11h45m do dia 26 de dezembro. Ele decolou à 01h30m da madrugada do dia 27. Bem mais de uma hora de atraso, portanto. E causou a mim e à maioria esmagadora dos passageiros a perda de inúmeras conexões que tínhamos em Dallas. Vamos combinar que pouca gente voa para Dallas e fica por lá. Famílias inteiras começando suas férias tiveram que ser realocadas em novos voos de conexão. E ter voos disponíveis para realocação de passageiros no final do ano é tarefa árdua. Vi famílias que teriam que pernoitar no aeroporto de Dallas do dia 27 para o dia 28 porque perderam suas conexões e não havia nenhuma conexão de reposição. Eu mesma tinha três horas de intervalo entre o voo chegando do Rio e o outro, porém perdi a minha conexão e somente voei para
Salt Lake City (meu destino final) com meu filho mas separada do meu marido no voo das 15h15m, pois não havia três lugares na nova conexão. Meu marido voou às 19h15m, apesar de ter chegado no aeroporto de Dallas pela manhã. E, segundo a agente da American Airlines de Dallas, ele teve muita sorte de achar este único lugar livre neste voo. Soubemos que Stevie Wonder estava no Galeão na noite do apagão e, pelo que também soubemos, o voo dele para Nova Iorque teve que ser cancelado e parece que ele foi reacomodado naquela madrugada num voo para Dallas.”
Vou ficar por aqui. Teria mais algumas dezenas de e-mails para reproduzir. Mas isso só reforçaria a ideia de que o presidente da Infraero é uma Alice, e o Galeão é seu país das maravilhas. E agora é pra valer: não se fala mais nisso.
Tempo de Kindle - MARCELO COELHO
FOLHA DE SP - 23/01
É muito chato ler qualquer livro em que o texto tem a invariável aparência de um documento do Word
Ando meio cansado dos tradicionais elogios ao livro impresso. Aquela conversa de "adoro cheiro de livro" não me convence muito; de tão repetitiva, parece perder a sinceridade que possa ter tido, tornando-se talvez só um clichê.
Não sei se muita gente apreciava de fato o cheiro do livro antes de surgir a ameaça do Kindle e outros formatos eletrônicos.
São raros, aliás, os livros que têm cheiro de fato, a não ser que você afunde o nariz dentro deles, atividade dificilmente compatível com a da leitura propriamente dita. Tudo bem, alguns livros da infância trazem esse tipo de memória guardada nas páginas.
Mas a encadernação ou a cola podem até produzir um odor próximo do amargo e do enjoativo: algumas edições de arte, com papel brilhante e pesado, estão nessa categoria. Além de apresentarem o defeito de refletir a luz, se a lâmpada for forte demais.
Quanto ao contato da pele do dedo com o papel, não sei que prazer se tira disso. Já me cortei com as bordas de edições muito perfeitas. O papel mais macio, por sua vez, pode exigir uma lambida nos dedos de vez em quando, coisa que na minha opinião fere um pouco a etiqueta de qualquer escritório ou biblioteca. Um pouco mais e estaremos todos mexendo os lábios durante a leitura.
É que todo esse apelo à "fisicalidade" do livro tende a ser uma traição, acho, do que há de mais espiritual no ato de ler. Não é prazer que deva ser contaminado por apelos táteis, olfativos ou, pronunciemos a palavra, gastronômicos.
O livro impresso, quando se manifesta na conversa sobre tato e perfume, inscreve-se no mesmo capítulo que mobiliza os adeptos da "slow food", os especialistas em charutos, os que percebem notas de canela e mirtilo no vinho não sei das quantas. É vontade de refinamento, decorada e repetida num esforço de autoconvencimento.
Quanto à praticidade, tenho também minhas dúvidas. Não é fácil segurar nas mãos uma boa edição de "Guerra e Paz". A versão encadernada pesa muito. Em formato de bolso, é raramente resistente aos meses de investida. Em dois volumes? Aí não vale.
Tenho livros baratos que se despedaçaram antes de eu chegar ao final. Livros mais caros, de capa dura, resistem obtusamente à informalidade e ao conforto de um uso cotidiano. O papel antigo fica amarelo e ganha manchas. O papel de luxo, tipo bíblia, cria orelhinhas e se rasga facilmente. Um dicionário grande, editado em volume único (penso no "Houaiss") é objeto de alto risco. Em vários volumes? Sempre erro ao calcular a ordem alfabética.
Resultado: comprei um Kindle, numa viagem, há coisa de dois anos. O produto agora está disponível no Brasil.
Fica o testemunho: nunca uso a geringonça. A ausência de cheiro é o de menos. Os problemas são outros. Em primeiro lugar, é muito chato ler qualquer livro em que o texto tem a invariável aparência de um documento do Word. Será incompetência minha ou toda a arte da tipografia desaparece com o Kindle?
E as capas? Não existirão mais? Voltamos ao século 19 com essa novidade eletrônica. Além disso, não me conformo em pagar, digamos, quarenta reais apenas pelo direito abstrato de baixar um arquivo literário na máquina.
A abstração do Kindle tem outra consequência, mais grave do que a questão do cheiro do papel. É que, como em toda tecnologia contemporânea, o espaço entra em vias de desaparecimento, sendo substituído pelo tempo. Não ficam mais evidentes a página de trás, a página da frente, a página par, a página ímpar, a grossura do livro que estamos lendo, ou o seu lugar na prateleira.
Tudo passa a se situar numa névoa temporal, entre o "agora" e o "não ainda", sem o "para trás" ou o "mais adiante". Por isso se fala na "memória" do computador, e não no seu "armário" ou no seu "depósito". Última vitória do tempo, o sistema de arquivos em "nuvem" eliminou o problema do "espaço em disco".
Com o Kindle, você nem precisa de marcador de livro: ele liga sozinho na página em que você interrompeu a leitura. Só que, assim, você também deixa de folhear o livro e reler por acaso alguma passagem.
Claro que vão inventar, um dia desses, a "função folhear", e um comando de produção de odores, assim como os computadores imitam o barulho de páginas sendo viradas. Mas aí eu já não estarei, provavelmente, lendo mais coisa nenhuma. Mais uma vitória do tempo, aliás.
É muito chato ler qualquer livro em que o texto tem a invariável aparência de um documento do Word
Ando meio cansado dos tradicionais elogios ao livro impresso. Aquela conversa de "adoro cheiro de livro" não me convence muito; de tão repetitiva, parece perder a sinceridade que possa ter tido, tornando-se talvez só um clichê.
Não sei se muita gente apreciava de fato o cheiro do livro antes de surgir a ameaça do Kindle e outros formatos eletrônicos.
São raros, aliás, os livros que têm cheiro de fato, a não ser que você afunde o nariz dentro deles, atividade dificilmente compatível com a da leitura propriamente dita. Tudo bem, alguns livros da infância trazem esse tipo de memória guardada nas páginas.
Mas a encadernação ou a cola podem até produzir um odor próximo do amargo e do enjoativo: algumas edições de arte, com papel brilhante e pesado, estão nessa categoria. Além de apresentarem o defeito de refletir a luz, se a lâmpada for forte demais.
Quanto ao contato da pele do dedo com o papel, não sei que prazer se tira disso. Já me cortei com as bordas de edições muito perfeitas. O papel mais macio, por sua vez, pode exigir uma lambida nos dedos de vez em quando, coisa que na minha opinião fere um pouco a etiqueta de qualquer escritório ou biblioteca. Um pouco mais e estaremos todos mexendo os lábios durante a leitura.
É que todo esse apelo à "fisicalidade" do livro tende a ser uma traição, acho, do que há de mais espiritual no ato de ler. Não é prazer que deva ser contaminado por apelos táteis, olfativos ou, pronunciemos a palavra, gastronômicos.
O livro impresso, quando se manifesta na conversa sobre tato e perfume, inscreve-se no mesmo capítulo que mobiliza os adeptos da "slow food", os especialistas em charutos, os que percebem notas de canela e mirtilo no vinho não sei das quantas. É vontade de refinamento, decorada e repetida num esforço de autoconvencimento.
Quanto à praticidade, tenho também minhas dúvidas. Não é fácil segurar nas mãos uma boa edição de "Guerra e Paz". A versão encadernada pesa muito. Em formato de bolso, é raramente resistente aos meses de investida. Em dois volumes? Aí não vale.
Tenho livros baratos que se despedaçaram antes de eu chegar ao final. Livros mais caros, de capa dura, resistem obtusamente à informalidade e ao conforto de um uso cotidiano. O papel antigo fica amarelo e ganha manchas. O papel de luxo, tipo bíblia, cria orelhinhas e se rasga facilmente. Um dicionário grande, editado em volume único (penso no "Houaiss") é objeto de alto risco. Em vários volumes? Sempre erro ao calcular a ordem alfabética.
Resultado: comprei um Kindle, numa viagem, há coisa de dois anos. O produto agora está disponível no Brasil.
Fica o testemunho: nunca uso a geringonça. A ausência de cheiro é o de menos. Os problemas são outros. Em primeiro lugar, é muito chato ler qualquer livro em que o texto tem a invariável aparência de um documento do Word. Será incompetência minha ou toda a arte da tipografia desaparece com o Kindle?
E as capas? Não existirão mais? Voltamos ao século 19 com essa novidade eletrônica. Além disso, não me conformo em pagar, digamos, quarenta reais apenas pelo direito abstrato de baixar um arquivo literário na máquina.
A abstração do Kindle tem outra consequência, mais grave do que a questão do cheiro do papel. É que, como em toda tecnologia contemporânea, o espaço entra em vias de desaparecimento, sendo substituído pelo tempo. Não ficam mais evidentes a página de trás, a página da frente, a página par, a página ímpar, a grossura do livro que estamos lendo, ou o seu lugar na prateleira.
Tudo passa a se situar numa névoa temporal, entre o "agora" e o "não ainda", sem o "para trás" ou o "mais adiante". Por isso se fala na "memória" do computador, e não no seu "armário" ou no seu "depósito". Última vitória do tempo, o sistema de arquivos em "nuvem" eliminou o problema do "espaço em disco".
Com o Kindle, você nem precisa de marcador de livro: ele liga sozinho na página em que você interrompeu a leitura. Só que, assim, você também deixa de folhear o livro e reler por acaso alguma passagem.
Claro que vão inventar, um dia desses, a "função folhear", e um comando de produção de odores, assim como os computadores imitam o barulho de páginas sendo viradas. Mas aí eu já não estarei, provavelmente, lendo mais coisa nenhuma. Mais uma vitória do tempo, aliás.
PM de saia - ANCELMO GOIS
O GLOBO - 23/01
E mais...
Desse total, oito mulheres estão no comando de batalhões ou de diretorias da corporação.
Um milhão de dólares
Racismo no Brasil começa a pesar no bolso. A 16ª Câmara Cível do Rio mandou reajustar, ontem, de R$l,5 milhão para R$ 2 milhões o valor da multa imposta à Sony Music, ainda por causa daquela música do deputado Tiririca, “Veja os cabelos dela”, lançada em 1996. É a que tem um verso que diz: “Essa nega fede, fede de lascar. Bicha fedorenta, fede mais que gambá.”
Papel Noel em janeiro
O Tesouro Nacional, no meio desta polêmica com o STF, repassou, este ano, num espaço de dez dias, duas parcelas do Fundo de Participação aos estados e municípios. Apesar da queda de arrecadação da Receita, os valores das parcelas, com reajustes iguais (uma coincidência estranha), são 20,993% maiores que as repassados
no mesmo período do ano passado.
A volta de Julio César
Ricardo Teixeira, quando ainda era presidente da CBF, comentou com amigos que, por ele, Julio César não voltaria à seleção. Não engolia a falha do goleiro no jogo contra a Holanda, na Copa de 10.
MORADORES EXIGEM RESPEITO
Craque do humor, Bruno Mazzeo, protagonista do filme “E aí, comeu?”, perdeu a graça com a Alsco Toalheiro Brasil. Ele não consegue estacionar na Rua Marquês de Sabará, no Jardim Botânico, onde mora a namorada, a diretora Joana Jabace. Nem ele, nem os moradores do lugar. Repare nas fotos feitas pelo ator. O espaço é tomado de dia e de noite por veículos da multinacional, que tem uma unidade ali. A Associação de Moradores e Amigos do Jardim Botânico vai pedir ajuda ao Ministério Público. Em tempo: a Alsco apregoa em seu site a palavra “respeito” como um dos seus valores.
Fator Odebrecht
O chanceler Antônio Patriota recebe hoje seu colega da Guiné Equatorial, Agapito Mba Mokuy. Terá direito a tapete vermelho. É que as grandes empreiteiras brasileiras sonham em participar da construção de Djiblolo, a nova capital do país africano.
Segue...
A Guiné foi colonizada pelos portugueses. Mas Portugal repassou o território para a Espanha em 1778. Em troca, os espanhóis desistiram da Ilha de Santa Catarina e de quase todo o Rio Grande do Sul, ambos no Brasil.
Podia ser melhor...
Aliás, a visita de Lula a Moçambique, em novembro passado, a serviço da empreiteira Camargo Corrêa, que tem interesse no país, ficou aquém das expectativas.
É que...
Lula, como se sabe, continua atuando, na África, como uma espécie de mascate de empresas brasileiras.
Zona Franca
A escritora Mirna Brasil Portella lança “Carnavalança”, hoje, na Travessa de Ipanema. O livro vem acompanhado de um CD com canções da folia nas vozes de Maíra Freitas, Martinho da Vila, Chico Buarque, Maria Rita e outros feras, sob a batuta de Mart’nália.
A Escola da Magistratura do Estado do Rio terá aula magna com o ministro Carlos Ayres Britto, dia 1º agora, às 16h, no Auditório Antonio Carlos Amorim.
Yacy Nunes e Daniel Zarvos exibiram, em Brasília, o trailer de “Os herdeiros de Vargas ”, com apoio do Copacabana Praia Hotel e da Força Sindical.
Preta Gil, Arlindo Cruz, AfroReggae e Aviões do Forró vão se apresentar de graça na Feijoada da Grande Rio, dia 2, no Barra Music. Os recursos da festa vão ajudar a produzir o desfile da escola.
Vem Cá Me Dá esolhe seu samba, hoje, às 19h, no Parque das Rosas, na Barra da Tijuca.
Bicho na Sapucaí
Moisés, ex-presidente da Vila Isabel, marcou presença no ensaio técnico da Vila Isabel, domingo, na Sapucaí. Estava feliz da vida. Preso em 2010 suspeito de ter ligação com o jogo do bicho, ele foi solto em maio do ano passado.
Aliás...
Os bicheiros não têm dado as caras nessas apresentações no Sambódromo carioca.
O censor sou eu
O livro “Roberto Carlos em detalhes”, a biografia não autorizada pelo rei, tem edições piratas circulando por aí. O conteúdo da “obra” é o original, mas, na capa, são omitidos o nome do autor, Paulo César de Araújo, e o da Editora Planeta. Está sendo vendido por R$ 100 em alguns sebos.
Como se sabe...
A Justiça proibiu a venda a pedido do próprio Roberto Carlos.
Adriano e o Google
A 5ª Câmara Cível do Rio negou o pedido de indenização por danos morais feito por Ana Cristina da Silva Carlúcio, apontada como pivô da separação de Adriano, o ex-craque, e de Joana Machado, em 2010. Ela processou o Google alegando que teve a imagem atingida e associada a de uma garota de programa por causa de um falso perfil num site de relacionamento sob responsabilidade da empresa.
Ratos no Fórum
Inaugurado no final de 2012, o prédio anexo do Fórum de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, está interditado. O motivo: uma grande infestação de ratos que põe em risco a saúde de quem passa pelo edifício, onde funcionam cinco varas judiciais.
PINTAR PAREDES - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 23/01
IMPÉRIO DOS SENTIDOS
A Orquestra Imperial, da qual fazem parte Nina Becker, Kassin e Wilson das Neves, comemorou dez anos e lançou novo álbum, com show no fim de semana. A videomaker Nina Cavalcanti esteve na plateia da choperia do Sesc Pompeia.
A INSULINA É NOSSA
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anuncia hoje a retomada da produção nacional de insulina humana, principal medicamento usado por diabéticos. O remédio será produzido no Brasil por meio de uma PPP (parceria público-privada), que inclui o Laboratório Farmanguinhos, da Fiocruz, e uma empresa ucraniana, detentora de tecnologia para a fabricação da substância.
MAIS INSULINA
A produção nacional de insulina foi interrompida em 2001, quando a brasileira Biobrás foi vendida para uma multinacional dinamarquesa. Com a PPP, o Brasil vai fabricar mais de oito milhões de frascos de insulina por ano, suficientes para a assistência aos 7,6 milhões de diabéticos brasileiros. Cerca de 900 mil usuários obtêm o remédio no SUS.
FORA DO AR
A TAM vetou parte da campanha do Creci-SP (Conselho Regional dos Corretores de Imóveis), veiculada em todos os seus voos neste mês, por fazer referência a pilotos. "Para viajar com rapidez e segurança, você confia em um piloto de avião. Na hora de conduzir um negócio imobiliário, você também precisa do profissional certo", dizia a campanha produzida pela Área Comunicação.
FORA DO AR 2
No ar também na TV, o vídeo foi adaptado. "Para cuidar da saúde, você confia no médico", diz o novo comercial exibido antes da decolagem. A TAM diz que informações a bordo relativas à aviação devem ser definidas pela companhia para evitar "desconforto aos passageiros".
POR UM TRIZ
Gilberto Kassab não estará no Brasil em seu primeiro aniversário de SP como ex-prefeito. Retorna após périplo mundial pelas cidades que disputam com a capital paulista sediar a Expo 2020.
ALFORRIA JÁ
A Secretaria da Justiça de São Paulo resgatou 59 trabalhadores em situação análoga à escravidão em 2012. No dia 31, realizará debate para discutir as diretrizes da Carta Compromisso contra a Escravidão, assinada por Fernando Haddad, Geraldo Alckmin e Dilma Rousseff.
Estarão presentes a ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos) e a secretária da Justiça Eloisa Arruda.
FAXINA
Após a saída de Carlos Wendel, seu diretor-executivo desde 2002, a Cinemateca deve regularizar boa parte do pessoal. Segundo Leopoldo Nunes, secretário do Audiovisual, em torno de 80% de 200 funcionários em SP são pessoas jurídicas, e não servidores concursados.
DE FRANJA
Durante a posse de Barack Obama, anteontem, quem ligava para o cabeleireiro da primeira-dama em Chicago ouvia o seguinte recado: "Aqui é o Johnny Wright, e eu não posso falar sobre o novo cabelo de Michelle Obama, que ficou ótimo".
RITA, 50 ANOS AQUI
Rita Lee fará turnê em comemoração dos 50 anos de carreira. A celebração começa com o show que a roqueira faz na sexta no vale do Anhangabaú. A advogada Silvia Venna é a nova empresária da cantora.
A MÃO DO MESTRE
Baianas da Companhia Tribo de Dança vão fazer a lavagem da escultura "Mão", de Oscar Niemeyer, no Memorial da América Latina, na sexta, aniversário de São Paulo, num gesto simbólico de purificação da cidade. Um cortejo sairá do Auditório Simón Bolívar, ao som de uma bateria formada por 50 integrantes de escolas de samba.
CURTO-CIRCUITO
O Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil inaugura hoje a exposição "A História da Imigração Através de Retratos".
O Instituto Vladimir Herzog promove a cantata "O Diário de Anne Frank", na sexta, na catedral da Sé.
O restaurante Gusto, no Itaim Bibi, abrirá 24h por dia a partir de amanhã.
O projeto "Cabaret Volátil" estreia hoje no Studio SP da Augusta. 18 anos.
Gabriel Gava toca hoje na Wood's. 18 anos.
A Galeria do Avesso, com exposições de "street art", abre hoje no shopping Casa & Móvel, em Pinheiros.
O ator Henri Stroeter integra o elenco da peça "O Terraço", em cartaz no teatro Nair Bello. 10 anos.
Move like Jagger - SONIA RACY
O ESTADÃO - 23/01
Como surgiu a ideia de fazer a festa Jezebel?
Jezebel é meu nome do meio e meu alterego, meu lado mais ousado. Pensei nisso há dez anos, em Ibiza. Estava cansada de ouvir sempre a mesma coisa e quis fazer algo diferente. Deu certo.
E por que o Brasil?
Fomos convidados pela Privilège, o clube mais incrível que já vi. Aceitamos, inclusive, por também se tratar de uma ilha – a exemplo de Ibiza, onde tudo começou. Ficamos muito felizes com o resultado e queremos voltar.
É sua primeira vez aqui?
Já estive no Brasil há muito tempo. É um país lindo e incrível, com grande diversidade e muito mais espécies de plantas do que eu poderia imaginar. Defendo proteger a Amazônia da invasão de madeireiros e construtores. Devemos respeitar os que habitam a floresta.
Costuma tocar Rolling Stones nas festas Jezebel?
Tudo pode tocar na pista – desde que te faça dançar.
Você se inspira na banda para criar suas joias?
Sem dúvida, meu pai é uma grande inspiração. Ele me deu peças maravilhosas, como um colar filigree, que inspirou as peças da coleção Superstyle – quando eu era diretora criativa da Garrard. Agora, que tenho minha própria marca, ele continua me apoiando. Eu me baseio muito em arte e também na natureza para criar.
Em que está trabalhando atualmente?
Na coleção Arrow – usando a flecha, que considero um símbolo importante.
Canta ou toca algum instrumento musical?
Na verdade, não. Já toquei um pouco de piano, mas nunca fui muito musical.
E como é a relação com o seu pai?
Ótima. Nós somos muito próximos. Admiro a tenacidade do seu trabalho. /SOFIA PATSCH
Multa neles
Montadoras que produzirem carros poluentes – que não resistam a pelo menos quatro anos de rodagem – serão multadas, segundo fonte próxima ao prefeito Haddad.
Esta é a formula encontrada para isentar carros, até esta “idade”, da inspeção veicular. Trata-se do prazo médio de garantia de fábrica concedido a veículos comprados no País. Ao fim desse período, eles terão de passar pelo procedimento de dois em dois anos – até completarem dez anos.
Mas sem a cobrança da atual taxa, de R$ 44,36.
Timing
José Américo, presidente da Câmara Municipal, pretende colocar o assunto em votação assim que terminar o recesso.
Hedge poluição
As grandes montadoras não temem a multa. A GM, por exemplo, gastou US$ 18 milhões em pista circular para averiguar o nível de emissão de poluentes de seus veículos.
Os protótipos rodam ali cerca de 80 mil quilômetros.
Prato frio
Amigos de Juvenal Juvêncio não têm dúvidas: o cartola são-paulino se sentiu vingado ao exigir de José Maria Marin, em troca de apoio na CBF, que a entidade parasse de pagar salário a Ricardo Teixeira.
Lembrete: foi Teixeira quem barrou o Morumbi como estádio-sede da Copa de 2014.
Pré-estreia
Celso Russomanno terá papel de destaque no programa que o PRB levará ao ar no dia 31. Potencial candidato em 2014, ele usará seu tempo para explicar por que ficou neutro no segundo turno das eleições em São Paulo.
O PRB repetirá a fórmula da campanha eleitoral, exibindo um “depoimento do Brasil” em primeira pessoa.
Tempo, tempo
E o goleiro Bruno recorreu ao STF reclamando da demora de Roberto Gurgel para opinar sobre processo contra ele – acusado de ser mandante do assassinato de Eliza Samudio.
Ricardo Lewandowski, presidente interino do Supremo, acabou despachando o caso para… o próprio procurador-geral da República.
Brasil olímpico
Corre que a meta do Ministério do Esporte é construir o maior centro paralímpico do mundo em São Paulo.
Pausa das artes
José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, incluiu Minas Gerais em seu roteiro brasileiro.
Chegou ontem a Belo Horizonte, visitou a Pampulha e vai a Ouro Preto e Inhotim. Tudo antes de se encontrar com Dilma.
Poliartista
A Nenê de Vila Matilde convidou o Oficina, de Zé Celso, para desfilar na ala Canudos – e contar o massacre da cidade baiana.
Para comemorar o convite, o teatro pilota festa, sexta, com direito a efeitos especiais do desfile.
Cinco décadas
Ana Estela Haddad busca espaço na agenda do prefeito para acomodar os parabéns da família e dos amigos. Haddad faz 50 anos no mesmo dia do aniversário da cidade de São Paulo.
Mayday
E o aeroporto internacional de Viracopos quase paralisou o tráfego de cargas no fim de semana. É que o único caminhão de combate a incêndios estava em manutenção.
Ueba! Obama é coisa nossa! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 23/01
Obama defende os gays e os imigrantes. Só falta liberar o visto! Já viram a fila do visto americano?
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Manchete do Piauí Herald: "Governo paulista inicia internação compulsória de viciados em iPhone". NÃÃÃO! A casa caiu!
Fugindo em 3, 2, 1! Fugindo pras colinas! Iphodeu! E o tratamento? Terrível! O tratamento é uma praia deserta em Fernando de Noronha, sem wi-fi e convivendo com pessoas reais sem filtro de Instagram! Ou seja, um inferno! Rarará!
E este classificado de sexo: "Abigail, 19 anos, virgem. Só para brincar". Será que ela sabe jogar bafo? E amarelinha? Eu quero pular amarelinha com a Abigail! Rarará!
E o Obama? Incrível o discurso do Obama. Adorei! "Obama toma posse defendendo gays e imigrantes"! E um gay postou no Twitter: "Obama defende os gays e ainda bota a Beyoncé pra cantar o hino, como não amar?". Só faltou a Bionça tá de oncinha!
Um amigo foi para um congresso na Flórida e começou a discursar em inglês, quando gritaram: "Speak spanish, please! You are in the United Sates of America!". "Fale espanhol, por favor. Você está nos EUA."
Obama defende os gays e os imigrantes. Só falta liberar o visto! Já viram a fila do visto americano? Parece fuga em massa! O Obama é coisa nossa, parece filho do Bezerra da Silva! E este devia ser o seu discurso de posse, aliás, foi mais ou menos isso que ele quis dizer: "Malandro é malandro e mané é mané".
Eu já falei isso mil vezes: o Obama é brasileiro. Bota uma bermuda e uma Havaianas nele! Ele devia ir pro "Esquenta" da Regina Casé! "Aqui em casa todo mundo samba, todo mundo dança, todo mundo Obama!"
E diz que o Obama vai ter dificuldades para governar porque os deputados são de oposição. Chama o Delúbio e o Dirceu, que eles resolvem rápido! MENSALATION!
E o Zizao, gente? Olha o Zizao explicando a famosa jogada: "Playstation, né?! Alavanca, meia lua pla dileita e botão da esquerda". Esse Cala Sou Eu! Rarará!
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Placa num salão de beleza em Salvador: "Salão Duas Irmães/ Prancha e escova!". Acho que uma se chama Prancha e a outra Escova! Rarará!
E esse banner de um restaurante em Curitiba: "Mineira Gostosa! Hoje Rabada". Rarará! E em Barretos tem uma avícola: "Ovos e Aves Alves". Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Obama defende os gays e os imigrantes. Só falta liberar o visto! Já viram a fila do visto americano?
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Manchete do Piauí Herald: "Governo paulista inicia internação compulsória de viciados em iPhone". NÃÃÃO! A casa caiu!
Fugindo em 3, 2, 1! Fugindo pras colinas! Iphodeu! E o tratamento? Terrível! O tratamento é uma praia deserta em Fernando de Noronha, sem wi-fi e convivendo com pessoas reais sem filtro de Instagram! Ou seja, um inferno! Rarará!
E este classificado de sexo: "Abigail, 19 anos, virgem. Só para brincar". Será que ela sabe jogar bafo? E amarelinha? Eu quero pular amarelinha com a Abigail! Rarará!
E o Obama? Incrível o discurso do Obama. Adorei! "Obama toma posse defendendo gays e imigrantes"! E um gay postou no Twitter: "Obama defende os gays e ainda bota a Beyoncé pra cantar o hino, como não amar?". Só faltou a Bionça tá de oncinha!
Um amigo foi para um congresso na Flórida e começou a discursar em inglês, quando gritaram: "Speak spanish, please! You are in the United Sates of America!". "Fale espanhol, por favor. Você está nos EUA."
Obama defende os gays e os imigrantes. Só falta liberar o visto! Já viram a fila do visto americano? Parece fuga em massa! O Obama é coisa nossa, parece filho do Bezerra da Silva! E este devia ser o seu discurso de posse, aliás, foi mais ou menos isso que ele quis dizer: "Malandro é malandro e mané é mané".
Eu já falei isso mil vezes: o Obama é brasileiro. Bota uma bermuda e uma Havaianas nele! Ele devia ir pro "Esquenta" da Regina Casé! "Aqui em casa todo mundo samba, todo mundo dança, todo mundo Obama!"
E diz que o Obama vai ter dificuldades para governar porque os deputados são de oposição. Chama o Delúbio e o Dirceu, que eles resolvem rápido! MENSALATION!
E o Zizao, gente? Olha o Zizao explicando a famosa jogada: "Playstation, né?! Alavanca, meia lua pla dileita e botão da esquerda". Esse Cala Sou Eu! Rarará!
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Placa num salão de beleza em Salvador: "Salão Duas Irmães/ Prancha e escova!". Acho que uma se chama Prancha e a outra Escova! Rarará!
E esse banner de um restaurante em Curitiba: "Mineira Gostosa! Hoje Rabada". Rarará! E em Barretos tem uma avícola: "Ovos e Aves Alves". Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Transição escancarada - PAULO PAIVA
O Estado de S.Paulo - 23/01
As decisões de política econômica dependem da articulação e do peso da influência dos diferentes agentes - políticos, empresários, trabalhadores, opinião pública, mídia - e do ambiente onde ocorrem as complexas relações entre economias. Nesse contexto, opções são tomadas, caminhos são traçados e mudanças ocorrem. Desde o governo Itamar Franco, a política econômica se organizou sobre o pilar do controle da inflação, admitindo-se a estabilidade monetária como condição necessária tanto para o crescimento sustentado como para garantir o poder de compra dos salários, contribuindo para a criação de empregos e para a redução das desigualdades. Essa estratégia foi consolidada no governo FHC, com reformas econômicas, e mantida no governo Lula.
Não que não houvesse mudanças ao longo desses 16 anos. Ao contrário, no início do segundo mandato de FHC ocorreu uma transição na estratégia de controle da inflação, ao decidir-se (ou ser levado a) abandonar a âncora cambial. Nesse momento, adotou-se o regime de metas de inflação com âncora fiscal na geração de superávits primários necessários para a redução da razão dívida pública/PIB e, simultaneamente, permitiu-se a flutuação da taxa de câmbio. Foi mantido o princípio básico de que a inflação deveria ficar sob controle. Com a eclosão da crise financeira em 2008, o ambiente externo se alterou e novas mudanças foram feitas, principalmente visando ao estímulo ao consumo no curto prazo, conservando o compromisso com a busca da meta de inflação. Um aspecto comum nesses momentos de transição foi a transparência na informação à sociedade e ao mercado, quer na divulgação do Programa de Ação Imediata (PAI), em 1993, quer na apresentação do tripé macroeconômico em 1999, quer, ainda, na carta do então candidato Lula ao povo brasileiro, em 2002.
Ao flexibilizar o controle da inflação, o atual governo iniciou uma nova transição na política econômica, de forma "envergonhada", se posso tomar emprestados neste artigo os adjetivos que Elio Gaspari utilizou nos títulos de seus livros sobre a ditadura. Nenhum esclarecimento sobre a mudança foi tornado público. Já por três anos consecutivos a inflação superou o centro da meta. Como demonstra Informe Especial da A.C. Pastores & Associados divulgado este mês, o Banco Central está comprometido com a meta de 5,5%, e não de 4,5%, como preestabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. Também não há mais um sério compromisso com a geração de superávits primários e a política cambial tenta manter o valor do dólar no intervalo de R$ 2 a R$ 2,10.
Segundo declarações recentes de autoridades da área econômica do governo, a transição na política econômica agora está "escancarada". O pilar do controle da inflação foi substituído pelo do desenvolvimento econômico que é sinônimo de crescimento industrial, como no passado. O principal instrumento para estimular a produção (competitividade?) da indústria é a desvalorização da moeda. De volta à velha política de administração do câmbio para promover o crescimento. Tenta-se compensar seus efeitos sobre a inflação através do controle dos preços administrados, como dos derivados do petróleo, da energia e das tarifas de ônibus, onde há impacto sobre a coleta dos preços para medir a inflação. Prática dos tempos negros da ditadura. A disciplina fiscal foi abandonada. A dívida pública bruta cresce para permitir que o BNDES ofereça crédito subsidiado à indústria e mecanismos não ortodoxos são adotados para forjar o superávit primário.
Ademais, o Estado volta a intervir nas atividades econômicas por meio da criação de empresas estatais e da crescente participação na oferta e no direcionamento do crédito. Há uma forte evidência de déjà vu na administração da política econômica. Diferentemente dos tempos de Itamar, FHC e Lula, a transição se faz sem a transparência e sem as práticas de gestão que poderiam fortalecer a credibilidade e estimular os investimentos. Temo sobre o final dessa mudança: inflação em alta e crescimento lento. Estará, então, a transição "encurralada"?
O problema é outro - TOSTÃO
FOLHA DE SP - 23/01
A principal razão da não classificação da seleção brasileira sub-20 foi o péssimo futebol coletivo
Aprendi com alguns mestres na medicina que, se um exame, para definir um diagnóstico, tem 50% de falso positivo (50% das pessoas com exame positivo não terão a doença) ou 50% de falso negativo (50% com exame negativo terão a doença), esse exame não serve para nada.
Lembrei disso porque Arnaldo Tirone, então presidente do Palmeiras, declarou, na semana passada, que Riquelme tinha 50% de chance de jogar no clube. É o mesmo que dizer que há 50% de chance de chover.
Seedorf, acostumado a jogar para grandes plateias, não consegue entender, mesmo muito bem informado sobre o futebol brasileiro, o número tão pequeno de pessoas no estádio. Ele também não compreende por que o mesmo clássico tem mais rivalidade no Estadual que no Brasileirão, se esta competição é mais importante.
Houve novidades, mas nenhuma grande surpresa na convocação de Felipão. Com exceção de Neymar e Thiago Silva (contundido), há vários bons jogadores, no mesmo nível, em todas as outras posições. Cada técnico tem sua preferência. Entre Kaká e Ronaldinho, Felipão escolheu Ronaldinho.
A seleção tem agora um típico centroavante (Fred ou Luis Fabiano). Felipão vai escalar apenas Paulinho e Ramires no meio-campo ou vai colocar mais um na marcação (Hernanes ou Arouca)? Neste caso, não haveria lugar para Oscar,
Lucas e Hulk. O ataque teria Ronaldinho, na ligação, mais Neymar e um centroavante. Felipão admitiu ainda que poderá usar, como opção, David Luiz de terceiro volante ou de terceiro zagueiro.
São Paulo e Grêmio começam hoje a Libertadores. Ney Franco barrou Ganso, com razão. Jadson é hoje melhor e não tem estilo para atuar pela direita, no lugar de Lucas. Entra Aloísio. Nenhum grande time do mundo joga com dois meias, como Ganso e Jadson.
Ao contrário do que diz a maioria, os grandes armadores, do passado e do presente, atuavam em uma posição distinta da de Ganso, como Didi, Gerson, Xavi, Iniesta e outros.
A não classificação da seleção brasileira sub-20 para o Mundial fará bem a esses jogadores, para aprenderem a ter autocrítica. Entre dez participantes sul-americanos, o Brasil ficou em nono lugar, apenas à frente da Bolívia. Pior, esta é a base da seleção olímpica sub-23 para os Jogos do Rio, em 2016.
Emerson Ávila disse que faltou comprometimento aos jogadores. Essa é uma antiga desculpa, que serve para diminuir a responsabilidade do técnico e encobrir outros problemas, como o péssimo futebol coletivo mostrado pela seleção. A deficiência não é apenas de Emerson. É dos técnicos brasileiros. O time não trocava três passes.
O Brasil muitas vezes ganha, em todas as categorias -tem sido menos frequente-, porque possui alguns jogadores especiais e porque se ganha e se perde de várias maneiras, até com chutões e correria desorganizada.
A principal razão da não classificação da seleção brasileira sub-20 foi o péssimo futebol coletivo
Aprendi com alguns mestres na medicina que, se um exame, para definir um diagnóstico, tem 50% de falso positivo (50% das pessoas com exame positivo não terão a doença) ou 50% de falso negativo (50% com exame negativo terão a doença), esse exame não serve para nada.
Lembrei disso porque Arnaldo Tirone, então presidente do Palmeiras, declarou, na semana passada, que Riquelme tinha 50% de chance de jogar no clube. É o mesmo que dizer que há 50% de chance de chover.
Seedorf, acostumado a jogar para grandes plateias, não consegue entender, mesmo muito bem informado sobre o futebol brasileiro, o número tão pequeno de pessoas no estádio. Ele também não compreende por que o mesmo clássico tem mais rivalidade no Estadual que no Brasileirão, se esta competição é mais importante.
Houve novidades, mas nenhuma grande surpresa na convocação de Felipão. Com exceção de Neymar e Thiago Silva (contundido), há vários bons jogadores, no mesmo nível, em todas as outras posições. Cada técnico tem sua preferência. Entre Kaká e Ronaldinho, Felipão escolheu Ronaldinho.
A seleção tem agora um típico centroavante (Fred ou Luis Fabiano). Felipão vai escalar apenas Paulinho e Ramires no meio-campo ou vai colocar mais um na marcação (Hernanes ou Arouca)? Neste caso, não haveria lugar para Oscar,
Lucas e Hulk. O ataque teria Ronaldinho, na ligação, mais Neymar e um centroavante. Felipão admitiu ainda que poderá usar, como opção, David Luiz de terceiro volante ou de terceiro zagueiro.
São Paulo e Grêmio começam hoje a Libertadores. Ney Franco barrou Ganso, com razão. Jadson é hoje melhor e não tem estilo para atuar pela direita, no lugar de Lucas. Entra Aloísio. Nenhum grande time do mundo joga com dois meias, como Ganso e Jadson.
Ao contrário do que diz a maioria, os grandes armadores, do passado e do presente, atuavam em uma posição distinta da de Ganso, como Didi, Gerson, Xavi, Iniesta e outros.
A não classificação da seleção brasileira sub-20 para o Mundial fará bem a esses jogadores, para aprenderem a ter autocrítica. Entre dez participantes sul-americanos, o Brasil ficou em nono lugar, apenas à frente da Bolívia. Pior, esta é a base da seleção olímpica sub-23 para os Jogos do Rio, em 2016.
Emerson Ávila disse que faltou comprometimento aos jogadores. Essa é uma antiga desculpa, que serve para diminuir a responsabilidade do técnico e encobrir outros problemas, como o péssimo futebol coletivo mostrado pela seleção. A deficiência não é apenas de Emerson. É dos técnicos brasileiros. O time não trocava três passes.
O Brasil muitas vezes ganha, em todas as categorias -tem sido menos frequente-, porque possui alguns jogadores especiais e porque se ganha e se perde de várias maneiras, até com chutões e correria desorganizada.
Figuras - ROBERTO DAMATTA
O GLOBO - 23/01
Façamos um teste — responda rápido: qual é o nomecompleto de sua empregada doméstica?
Vivemos de figuras de todo tipo, como a de inocentes e de criminosos. De poetas e políticos — uns mentem falando a verdade; os outros são viciados em tratar da verdade mentindo.
A palavra "figura" agasalha muitos sentidos. O mapa do Brasil é uma figura na forma de presunto como dizia Lima Barreto. Todo mundo sabe quem o come, mas "figura" que não sabe. Eis um outro sentido para essa imensa palavra: o fingir ou esquecer.
Todo ser imaginário é uma figura que é carta de baralho e configuração geométrica. A pirâmide serve como uma boa representação de um Brasil onde poucos governam ganhando muito e onde muitos são governados recebendo pouco.
"Figura" também significa aspecto, emblema, alegoria. Até ante ontem, a figura de uma pessoa negra etiquetava um escravo; hoje, uma consciência maior da nossa alergia à igualdade, faz o uniforme branco das babás virar um problema anunciado em pelo pelos duas colunas importantes: a do Ancelmo Gois e o da Miriam Leitão.
E, no entanto, o branco é uma representação do limpo e do transparente. Símbolo da paz não deixa de ser curioso como o branco se relaciona com os fantasmas envoltos em nevoa. Esse nevoeiro de um Brasil escravocrata que escondemos, no qual o branco figurava como uma personificação da propriedade pessoas.
Uniformizar, como disse Max Weber, faz parte do mundo moderno onde médicos, garçons, policiais, engenheiros, cientistas e operários estão uniformizados. A questão é o uso obrigatório e simbólico da roupa para distinguir as babás nesses clubes de elite. Ser de elite dispensa para cima; já o uso obrigatório do uniforme distingue para baixo. Uma presumida superioridade dada pela riqueza, pelo poder ou pela celebrização extingue a culpa, do mesmo modo que o emprego doméstico deve lembrar — pela roupa usada como cicatriz ou estigma — a origem escravocrata do serviço que promove a intimidade mas (e ai está o ponto) não pode conduzir a igualdade. Ora, uma intimidade (o dar a mão) sem igualdade (o não tomar o braço) tem sido o princípio estruturante de toda a nossa vida social.
Uma das babás diz ao jornal (O Globo) que elas não tem nome. São "babás": o papel social de anjos da guarda dos filhinhos amados de suas bem postas patroas, promove o sumiço de suas cidadanias. Sempre foi assim. Façamos um teste — responda rápido: qual é o nome completo de sua empregada doméstica?
Entre a escravidão na casa e o pseudomoderno emprego doméstico quase não há hiato. A continuidade foi feita abafando a igualdade mas mantendo a intimidade que humaniza a todos não liquidando, porém, as subordinações. No fundo, o problema não são somente das babás mas das patroas receosas de serem confundidas com suas "criadas" na medida em esses serviços se profissionalizam e trazem à tona esses dilemas.
Há aqui um sintoma da silenciosa mas permanente, revolução igualitária que se realiza hoje no Brasil. Ela surge na indignação com administradores públicos corruptos e ineficientes; com o populismo calhorda que aristocratiza roubando, e é profundamente anti-igualitário porque deseja a exceção e o retorno do poder como instrumento de aristocratização; e passa por essas barbaridades de assassinar em lugares públicos como ruas e restaurantes porque o "outro" não sabe com quem está falando. Ai temos crimes cometidos em nome de uma desavença pessoal interpretada como falta de respeito porque o se desconhecido se não se comportar como um inferior ele vira um inimigo.
Toda reação contra a regra da lei para todos revela esse nosso temor de uma impessoalidade que conduz ao igualitarismo contrário a boa e velha hierarquia que nos indicava com quem falávamos. É terrível ver sumir o mundo de exclusividades e testemunhar a raia miúda frequentando locais e usando roupas privativas dos grã-finos.
O surto de uniformizar para distinguir para baixo faz parte dessa reação a igualdade que chega para calibrar a liberdade excessiva dos que tem muito. Como distinguir para baixo se todo mundo está ficando muito parecido? Como saber com quem se está falando se não se sabe mais quem é a mãe ou a babá da criança?
Eu seria favorável ao uso compulsório do uniforme branco nos clubes se os bandidos também fossem obrigados a usar as mascaras típicas de suas figuras. Mas ai o (des)mascarar seria equivalente a revolução que tanto queremos e — eis a questão — não queremos. Senão não seriamos campeões mundiais de empregadas domésticas.
Façamos um teste — responda rápido: qual é o nomecompleto de sua empregada doméstica?
Vivemos de figuras de todo tipo, como a de inocentes e de criminosos. De poetas e políticos — uns mentem falando a verdade; os outros são viciados em tratar da verdade mentindo.
A palavra "figura" agasalha muitos sentidos. O mapa do Brasil é uma figura na forma de presunto como dizia Lima Barreto. Todo mundo sabe quem o come, mas "figura" que não sabe. Eis um outro sentido para essa imensa palavra: o fingir ou esquecer.
Todo ser imaginário é uma figura que é carta de baralho e configuração geométrica. A pirâmide serve como uma boa representação de um Brasil onde poucos governam ganhando muito e onde muitos são governados recebendo pouco.
"Figura" também significa aspecto, emblema, alegoria. Até ante ontem, a figura de uma pessoa negra etiquetava um escravo; hoje, uma consciência maior da nossa alergia à igualdade, faz o uniforme branco das babás virar um problema anunciado em pelo pelos duas colunas importantes: a do Ancelmo Gois e o da Miriam Leitão.
E, no entanto, o branco é uma representação do limpo e do transparente. Símbolo da paz não deixa de ser curioso como o branco se relaciona com os fantasmas envoltos em nevoa. Esse nevoeiro de um Brasil escravocrata que escondemos, no qual o branco figurava como uma personificação da propriedade pessoas.
Uniformizar, como disse Max Weber, faz parte do mundo moderno onde médicos, garçons, policiais, engenheiros, cientistas e operários estão uniformizados. A questão é o uso obrigatório e simbólico da roupa para distinguir as babás nesses clubes de elite. Ser de elite dispensa para cima; já o uso obrigatório do uniforme distingue para baixo. Uma presumida superioridade dada pela riqueza, pelo poder ou pela celebrização extingue a culpa, do mesmo modo que o emprego doméstico deve lembrar — pela roupa usada como cicatriz ou estigma — a origem escravocrata do serviço que promove a intimidade mas (e ai está o ponto) não pode conduzir a igualdade. Ora, uma intimidade (o dar a mão) sem igualdade (o não tomar o braço) tem sido o princípio estruturante de toda a nossa vida social.
Uma das babás diz ao jornal (O Globo) que elas não tem nome. São "babás": o papel social de anjos da guarda dos filhinhos amados de suas bem postas patroas, promove o sumiço de suas cidadanias. Sempre foi assim. Façamos um teste — responda rápido: qual é o nome completo de sua empregada doméstica?
Entre a escravidão na casa e o pseudomoderno emprego doméstico quase não há hiato. A continuidade foi feita abafando a igualdade mas mantendo a intimidade que humaniza a todos não liquidando, porém, as subordinações. No fundo, o problema não são somente das babás mas das patroas receosas de serem confundidas com suas "criadas" na medida em esses serviços se profissionalizam e trazem à tona esses dilemas.
Há aqui um sintoma da silenciosa mas permanente, revolução igualitária que se realiza hoje no Brasil. Ela surge na indignação com administradores públicos corruptos e ineficientes; com o populismo calhorda que aristocratiza roubando, e é profundamente anti-igualitário porque deseja a exceção e o retorno do poder como instrumento de aristocratização; e passa por essas barbaridades de assassinar em lugares públicos como ruas e restaurantes porque o "outro" não sabe com quem está falando. Ai temos crimes cometidos em nome de uma desavença pessoal interpretada como falta de respeito porque o se desconhecido se não se comportar como um inferior ele vira um inimigo.
Toda reação contra a regra da lei para todos revela esse nosso temor de uma impessoalidade que conduz ao igualitarismo contrário a boa e velha hierarquia que nos indicava com quem falávamos. É terrível ver sumir o mundo de exclusividades e testemunhar a raia miúda frequentando locais e usando roupas privativas dos grã-finos.
O surto de uniformizar para distinguir para baixo faz parte dessa reação a igualdade que chega para calibrar a liberdade excessiva dos que tem muito. Como distinguir para baixo se todo mundo está ficando muito parecido? Como saber com quem se está falando se não se sabe mais quem é a mãe ou a babá da criança?
Eu seria favorável ao uso compulsório do uniforme branco nos clubes se os bandidos também fossem obrigados a usar as mascaras típicas de suas figuras. Mas ai o (des)mascarar seria equivalente a revolução que tanto queremos e — eis a questão — não queremos. Senão não seriamos campeões mundiais de empregadas domésticas.
Tio Sam e nós - IGOR GIELOW
FOLHA DE SP - 23/01
BRASÍLIA - É interessante ver como Barack Obama é quase uma unanimidade no Brasil. Pesquisas davam conta de uma "intenção de voto" ao democrata que lhe garantiria uma vitória aqui muito maior do que a que obteve ano passado em casa.
Claro, há o fator simpatia. Bush era associado a políticas belicistas e tal. Texano branco e bronco, não tem o apelo cosmopolita do negro de nome muçulmano/africano, ainda que Obama tenha passado também pelas forjas da elite americana.
Mas o fato é que o Brasil foi lateral na política externa do primeiro mandato de Obama, talvez pela falta da afinidade anímica que havia entre Bush e Lula, e ainda não há indicações de que isso será alterado.
Houve, sim, uma distensão devido à saída dos antiamericanos mais estridentes de posições centrais do Itamaraty, após a chegada de Dilma em 2011, e a avanços pontuais.
A relação econômica segue firme, mas sem exatamente um salto qualitativo. Obama fez um dos governos mais anticapitalistas recentes, no particular do livre-comércio, e Dilma prefere uma visão setentista de protecionismo a campeões nacionais (para usar o eufemismo vigente).
É possível argumentar, algo folcloricamente, que é bom para o Brasil estar fora do radar de um país que viola diariamente a soberania de outros com o uso de aviões-robôs. Lulistas e dilmistas sempre correm a dizer que os EUA já não nos importam tanto só porque variamos o cardápio da balança comercial.
Erros grosseiros. O Ocidente, para bem e para mal, é liderado por
Washington. Assim, é bom enxugar as lágrimas que derramou pelo discurso docemente progressista (como se "drones" o fossem) da posse de Obama, caro humanista de Facebook.
É muito mais a dinâmica da complexa relação com o Tio Sam, e não os frutos ainda instáveis da relação Sul-Sul ou os ditames mercantilistas de Pequim, que nos molda hoje e no futuro próximo como atores globais.
BRASÍLIA - É interessante ver como Barack Obama é quase uma unanimidade no Brasil. Pesquisas davam conta de uma "intenção de voto" ao democrata que lhe garantiria uma vitória aqui muito maior do que a que obteve ano passado em casa.
Claro, há o fator simpatia. Bush era associado a políticas belicistas e tal. Texano branco e bronco, não tem o apelo cosmopolita do negro de nome muçulmano/africano, ainda que Obama tenha passado também pelas forjas da elite americana.
Mas o fato é que o Brasil foi lateral na política externa do primeiro mandato de Obama, talvez pela falta da afinidade anímica que havia entre Bush e Lula, e ainda não há indicações de que isso será alterado.
Houve, sim, uma distensão devido à saída dos antiamericanos mais estridentes de posições centrais do Itamaraty, após a chegada de Dilma em 2011, e a avanços pontuais.
A relação econômica segue firme, mas sem exatamente um salto qualitativo. Obama fez um dos governos mais anticapitalistas recentes, no particular do livre-comércio, e Dilma prefere uma visão setentista de protecionismo a campeões nacionais (para usar o eufemismo vigente).
É possível argumentar, algo folcloricamente, que é bom para o Brasil estar fora do radar de um país que viola diariamente a soberania de outros com o uso de aviões-robôs. Lulistas e dilmistas sempre correm a dizer que os EUA já não nos importam tanto só porque variamos o cardápio da balança comercial.
Erros grosseiros. O Ocidente, para bem e para mal, é liderado por
Washington. Assim, é bom enxugar as lágrimas que derramou pelo discurso docemente progressista (como se "drones" o fossem) da posse de Obama, caro humanista de Facebook.
É muito mais a dinâmica da complexa relação com o Tio Sam, e não os frutos ainda instáveis da relação Sul-Sul ou os ditames mercantilistas de Pequim, que nos molda hoje e no futuro próximo como atores globais.
O risco de a previsão da OIT estar certa - RICARDO GALUPPO
BRASIL ECONÔMICO - 23/01
Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta o risco de queda do nível de emprego no Brasil. Pelas estimativas, cerca de 500 mil trabalhadores deverão ser demitidos nos próximos meses, o que elevaria o número de desempregados para 7 milhões.
Pode ser que nada disso aconteça. Mas, se as previsões da OIT estiverem corretas, será o pior dos cenários.
Nos últimos anos, o crescimento pífio do PIB brasileiro se deveu única e exclusivamente aos níveis elevados de consumo - e a condição essencial para o consumo em níveis estatisticamente relevantes é a renda conferida pelos salários e, mais do que isso, a expectativa de manutenção do emprego pelos meses de duração do carnê.
O próprio ministro Guido Mantega argumenta (com razão) que, a despeito de muitos de seus aliados considerarem os programas de distribuição de renda o principal motor da inclusão social no país, o que garantiu o ingresso de milhões de brasileiros na chamada "nova classe média" foi a expansão da oferta de empregos.
Um retrocesso nesse indicador seria como cravar uma estaca no coração daquele que é o maior feito da administração petista. E o governo, é claro, fará de tudo para impedir que isso aconteça.
O problema é que, tudo indica, existe um descasamento entre a intenção do governo em manter os empregos e a prática que se reflete nas condições de operação da indústria (que foi, é e continuará sendo ainda por muito tempo o principal gerador de empregos de qualidade).
Ontem, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, no interior de São Paulo, recorreu ao irritante recurso de fechar a Via Dutra com uma manifestação que tenta proibir a montadora GM de demitir 1.500 trabalhadores de uma linha de montagem que está sendo desativada.
O sindicato afirma que, como a GM recebeu isenção fiscal nos últimos anos, deveria ser proibida de demitir. É lógico que esse tipo de argumento anacrônico só pode ser levado a sério por quem ainda vê a indústria como um inimigo disposto a esfolar o trabalhador até a última gota de sangue.
O problema é que os 1.500 postos que a GM precisa eliminar porque a linha de montagem perdeu competitividade são do tipo que farão falta ao Brasil - e, mais ainda, às famílias atingidas pelo corte.
O país precisa, sim, de empregos de qualidade. Mas eles só serão oferecidos em quantidade suficiente no dia em que o governo (não especificamente o da presidente Dilma Rousseff, mas qualquer governo que se instale em Brasília) entender que é impossível ter uma indústria competitiva com as condições fiscais e o clima de confronto que existe no Brasil.
Se nada for feito enquanto é tempo, não haverá Via Dutra em quantidade suficiente para ser fechada pelas manifestações de protesto que se verão daqui por diante.
Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta o risco de queda do nível de emprego no Brasil. Pelas estimativas, cerca de 500 mil trabalhadores deverão ser demitidos nos próximos meses, o que elevaria o número de desempregados para 7 milhões.
Pode ser que nada disso aconteça. Mas, se as previsões da OIT estiverem corretas, será o pior dos cenários.
Nos últimos anos, o crescimento pífio do PIB brasileiro se deveu única e exclusivamente aos níveis elevados de consumo - e a condição essencial para o consumo em níveis estatisticamente relevantes é a renda conferida pelos salários e, mais do que isso, a expectativa de manutenção do emprego pelos meses de duração do carnê.
O próprio ministro Guido Mantega argumenta (com razão) que, a despeito de muitos de seus aliados considerarem os programas de distribuição de renda o principal motor da inclusão social no país, o que garantiu o ingresso de milhões de brasileiros na chamada "nova classe média" foi a expansão da oferta de empregos.
Um retrocesso nesse indicador seria como cravar uma estaca no coração daquele que é o maior feito da administração petista. E o governo, é claro, fará de tudo para impedir que isso aconteça.
O problema é que, tudo indica, existe um descasamento entre a intenção do governo em manter os empregos e a prática que se reflete nas condições de operação da indústria (que foi, é e continuará sendo ainda por muito tempo o principal gerador de empregos de qualidade).
Ontem, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, no interior de São Paulo, recorreu ao irritante recurso de fechar a Via Dutra com uma manifestação que tenta proibir a montadora GM de demitir 1.500 trabalhadores de uma linha de montagem que está sendo desativada.
O sindicato afirma que, como a GM recebeu isenção fiscal nos últimos anos, deveria ser proibida de demitir. É lógico que esse tipo de argumento anacrônico só pode ser levado a sério por quem ainda vê a indústria como um inimigo disposto a esfolar o trabalhador até a última gota de sangue.
O problema é que os 1.500 postos que a GM precisa eliminar porque a linha de montagem perdeu competitividade são do tipo que farão falta ao Brasil - e, mais ainda, às famílias atingidas pelo corte.
O país precisa, sim, de empregos de qualidade. Mas eles só serão oferecidos em quantidade suficiente no dia em que o governo (não especificamente o da presidente Dilma Rousseff, mas qualquer governo que se instale em Brasília) entender que é impossível ter uma indústria competitiva com as condições fiscais e o clima de confronto que existe no Brasil.
Se nada for feito enquanto é tempo, não haverá Via Dutra em quantidade suficiente para ser fechada pelas manifestações de protesto que se verão daqui por diante.
Naufrágio tributário - IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
FOLHA DE SP - 23/01
Considerar que a função das empresas é gerar receita tributária emperra o país. Dilma deve impor concepção desenvolvimentista à Receita
Talvez um dos principais fatores do fracasso econômico do governo Dilma Rousseff em seus dois primeiros anos -com alta inflação, baixo PIB, um dos últimos lugares em crescimento na América Latina, pouco investimento, perda de competitividade internacional e crescimento da esclerosada máquina burocrática- seja o confuso, arcaico e oneroso sistema tributário.
Mediante ciclópicos autos de infração, a produção de complexas normas auxilia a fragilizar as empresas.
Militando há 55 anos na área fiscal e tendo convivido com os pais do Direito Tributário brasileiro, à época em que as leis eram feitas por juristas e não por "regulamenteiros", tenho acompanhado a deterioração do sistema.
O cidadão, jamais consultado, vê-se de mais em mais envolvido num emaranhado de leis, portarias, instruções normativas, soluções de consulta. A única certeza que se apresenta é a insegurança jurídica.
Pretende a presidente Dilma atrair investimentos, mas a Receita Federal auxilia a afastá-los, considerando operações suspeitas fusões, incorporações e outras formas de agregação de sociedades. Isso tisna a agilidade competitiva das empresas brasileiras perante aquelas de outros países.
A famosa norma antielisão (LC 104/01), que ainda não foi regulamentada, é, sob disfarces diferentes, amplamente utilizada para inviabilizar tais operações, sob a alegação de que, ao escolher entre duas soluções rigorosamente legais, deve o contribuinte sempre adotar a que se apresentar tributariamente mais onerosa.
Não discuto a idoneidade dos agentes fiscais, mas, sim, a errônea filosofia de que a função da empresa é gerar receita tributária e não provocar o desenvolvimento econômico e social do país. Essa filosofia está emperrando, definitivamente, o governo da presidente Dilma, não só com medíocre performance econômica, mas também com a desestabilização do terceiro setor -que faz o que o governo deveria fazer com nossos tributos-, sendo perseguido pelo poder público como se fosse fonte de receita tributária e não de assistência social e educação.
Participei da comissão de especialistas nomeada pelo Senado para propor uma reformulação do pacto federativo e do sistema tributário. Éramos 13 e, após seis meses de intensos trabalhos, apresentamos 12 propostas de emendas constitucionais, leis complementares, resoluções do Senado e leis ordinárias. Entregues em 30/10/2012 ao presidente do Senado, elas continham soluções para o equacionamento da guerra fiscal, novos critérios para os fundos de participação dos Estados e municípios, para os royalties do petróleo e para a reformulação da partilha tributária.
Apenas no que concerne à guerra fiscal, o governo federal aproveitou as sugestões.
Como o mandato não foi renovado, não pudemos continuar o trabalho para uma reforma tributária completa. Enquanto isso, o país naufraga num sistema que o próprio governo reconhece de há muito ultrapassado.
Na década de 60, no Canadá, a "Royal Comission of Taxation" se voltou a promover justiça social e desenvolvimento por meio de uma política tributária correta, que privilegia esses objetivos em lugar da mera arrecadação. Seu incremento decorre, necessariamente, do atingimento de ambos.
Creio que, se a presidente Dilma não impuser uma filosofia desenvolvimentista à Receita Federal, baseada no modelo canadense, dificilmente sairemos dos últimos lugares de desenvolvimento e seu governo continuará a ostentar um dos piores índices da América Latina, com baixo crescimento e alta inflação.
Considerar que a função das empresas é gerar receita tributária emperra o país. Dilma deve impor concepção desenvolvimentista à Receita
Talvez um dos principais fatores do fracasso econômico do governo Dilma Rousseff em seus dois primeiros anos -com alta inflação, baixo PIB, um dos últimos lugares em crescimento na América Latina, pouco investimento, perda de competitividade internacional e crescimento da esclerosada máquina burocrática- seja o confuso, arcaico e oneroso sistema tributário.
Mediante ciclópicos autos de infração, a produção de complexas normas auxilia a fragilizar as empresas.
Militando há 55 anos na área fiscal e tendo convivido com os pais do Direito Tributário brasileiro, à época em que as leis eram feitas por juristas e não por "regulamenteiros", tenho acompanhado a deterioração do sistema.
O cidadão, jamais consultado, vê-se de mais em mais envolvido num emaranhado de leis, portarias, instruções normativas, soluções de consulta. A única certeza que se apresenta é a insegurança jurídica.
Pretende a presidente Dilma atrair investimentos, mas a Receita Federal auxilia a afastá-los, considerando operações suspeitas fusões, incorporações e outras formas de agregação de sociedades. Isso tisna a agilidade competitiva das empresas brasileiras perante aquelas de outros países.
A famosa norma antielisão (LC 104/01), que ainda não foi regulamentada, é, sob disfarces diferentes, amplamente utilizada para inviabilizar tais operações, sob a alegação de que, ao escolher entre duas soluções rigorosamente legais, deve o contribuinte sempre adotar a que se apresentar tributariamente mais onerosa.
Não discuto a idoneidade dos agentes fiscais, mas, sim, a errônea filosofia de que a função da empresa é gerar receita tributária e não provocar o desenvolvimento econômico e social do país. Essa filosofia está emperrando, definitivamente, o governo da presidente Dilma, não só com medíocre performance econômica, mas também com a desestabilização do terceiro setor -que faz o que o governo deveria fazer com nossos tributos-, sendo perseguido pelo poder público como se fosse fonte de receita tributária e não de assistência social e educação.
Participei da comissão de especialistas nomeada pelo Senado para propor uma reformulação do pacto federativo e do sistema tributário. Éramos 13 e, após seis meses de intensos trabalhos, apresentamos 12 propostas de emendas constitucionais, leis complementares, resoluções do Senado e leis ordinárias. Entregues em 30/10/2012 ao presidente do Senado, elas continham soluções para o equacionamento da guerra fiscal, novos critérios para os fundos de participação dos Estados e municípios, para os royalties do petróleo e para a reformulação da partilha tributária.
Apenas no que concerne à guerra fiscal, o governo federal aproveitou as sugestões.
Como o mandato não foi renovado, não pudemos continuar o trabalho para uma reforma tributária completa. Enquanto isso, o país naufraga num sistema que o próprio governo reconhece de há muito ultrapassado.
Na década de 60, no Canadá, a "Royal Comission of Taxation" se voltou a promover justiça social e desenvolvimento por meio de uma política tributária correta, que privilegia esses objetivos em lugar da mera arrecadação. Seu incremento decorre, necessariamente, do atingimento de ambos.
Creio que, se a presidente Dilma não impuser uma filosofia desenvolvimentista à Receita Federal, baseada no modelo canadense, dificilmente sairemos dos últimos lugares de desenvolvimento e seu governo continuará a ostentar um dos piores índices da América Latina, com baixo crescimento e alta inflação.
O oligopsônio do aço no Brasil - ANDRÉ DE ALMEIDA
CORREIO BRAZILIENSE - 23/01
Oligopsônio é a situação de mercado em que há um número pequeno de compradores de determinado produto, em determinado território. Algumas vezes confundido com oligopólio, dele se difere pois essa é a situação de mercado em que a oferta é controlada por pequeno número de vendedores. Ou seja, há oligopsônio quando há poucos compradores para determinado produto e há oligopólio quando há poucos vendedores de determinado produto.
Tanto o oligopsônio quanto o oligopólio são maléficos ao funcionamento da economia, pois alijam o poder de barganha e escolha - natural das regras de livre mercado - do consumidor ou do fornecedor, e faz com que os que já são fortes se fortaleçam cada vez mais.
Não necessariamente a existência de oligopólios e oligopsônios são ilegais, mas a literatura jurídica do Brasil e do exterior é vasta ao descrever quão sensíveis se tornam os mercados dominados por poucos agentes, seja na compra ou na venda. O rito maléfico de atuação desse tipo de concentração é sempre o mesmo em todo o mundo. Como concentram muita força, seja na venda ou na compra, tendem a, mais cedo ou mais tarde, se ombrearem e agirem coordenadamente em detrimento dos agentes mais fracos da relação econômica. Tais atuações fazem, por consequência, os já fortes ainda mais fortes, perpetuando a concentração econômica, as altas margens, o poder político, jurídico e social.
O setor do aço no Brasil é um exemplo de oligopsônio. Há não mais que quatro grandes grupos econômicos que concentram a produção de aço no país (nem sempre foi assim, pois havia mais de 20 em 1975). Levando em consideração que a matéria-prima do aço é a sucata ferrosa ou o ferro-gusa, nota-se que todos os fornecedores de ambos os produtos estão submetidos ao poder econômico, comercial e político do oligopsônio do aço brasileiro.
O poder econômico do setor do aço é notado na forma desinibida com que demanda benefícios fiscais e regalias normativas. O poder comercial do mesmo segmento se nota pela compra de suas matérias-primas, pois, cientes de que oligopsônicos são, fazem uso de tal "status" para garantir as altas margens. Já o poder político é revelado sempre que o setor requer regalias de tratamento ao Poder Público, algo cada vez mais frequente.
De acordo com dados do Instituto Nacional das Empresas de Sucata de Ferro e Aço (Inesfa) e do Sindicato da Indústria de Ferro no Estado de Minas Gerais (Sindifer), há milhares de fornecedores de sucata ferrosa e de gusa no Brasil, mas há não mais que quatro grupos produtores de aço. O resultado é que as milhares de pequenas e médias empresas do setor de sucata ferrosa, na maior parte das vezes pequenos grupos familiares, cooperativas e catadores, se veem submetidos a venderem seus produtos há apenas poucos compradores nacionais.
Ocorre que a economia é mais ágil que os oligopsônios, e, para fugir do poder de poucos a que estão submetidos, as empresas de sucata ferrosa e de gusa brasileiras buscaram saídas fora do país para encontrar outros compradores, e assim escaparem da concentração de mercado que existe no Brasil. Daí que as exportações brasileiras de sucata ferrosa saltaram de 0,14% para 2,5%, em relação ao consumo interno, entre os anos de 2005 e 2012. Ou seja, não se submetendo à força econômica implacável das aciarias, centenas de empresas do setor de sucata ferrosa hoje exportam seus produtos a todo o mundo, escapando dos incertos humores da indústria brasileira do aço.
No entanto, a indústria do aço no Brasil, ciosa de sua força política, deseja fazer com que o governo federal crie taxas à exportação da sucata ferrosa, para fazer com que seus fornecedores voltem a depender unicamente das siderúrgicas nacionais. Tanto que, recentemente, solicitaram de modo formal ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) que o governo brasileiro adote medidas de restrição e taxação da exportação da sucata ferrosa brasileira. Ou seja, o setor do aço já concentrado deseja ajuda governamental para não permitir que seus fornecedores de matéria-prima vendam seus produtos para o exterior. Uma medida que pode anular o desenvolvimento de um mercado que congrega 1,5 milhão de trabalhadores, entre catadores, cooperativas, micro e pequenas empresas. São ou não perigosos os oligopsônios?
Tanto o oligopsônio quanto o oligopólio são maléficos ao funcionamento da economia, pois alijam o poder de barganha e escolha - natural das regras de livre mercado - do consumidor ou do fornecedor, e faz com que os que já são fortes se fortaleçam cada vez mais.
Não necessariamente a existência de oligopólios e oligopsônios são ilegais, mas a literatura jurídica do Brasil e do exterior é vasta ao descrever quão sensíveis se tornam os mercados dominados por poucos agentes, seja na compra ou na venda. O rito maléfico de atuação desse tipo de concentração é sempre o mesmo em todo o mundo. Como concentram muita força, seja na venda ou na compra, tendem a, mais cedo ou mais tarde, se ombrearem e agirem coordenadamente em detrimento dos agentes mais fracos da relação econômica. Tais atuações fazem, por consequência, os já fortes ainda mais fortes, perpetuando a concentração econômica, as altas margens, o poder político, jurídico e social.
O setor do aço no Brasil é um exemplo de oligopsônio. Há não mais que quatro grandes grupos econômicos que concentram a produção de aço no país (nem sempre foi assim, pois havia mais de 20 em 1975). Levando em consideração que a matéria-prima do aço é a sucata ferrosa ou o ferro-gusa, nota-se que todos os fornecedores de ambos os produtos estão submetidos ao poder econômico, comercial e político do oligopsônio do aço brasileiro.
O poder econômico do setor do aço é notado na forma desinibida com que demanda benefícios fiscais e regalias normativas. O poder comercial do mesmo segmento se nota pela compra de suas matérias-primas, pois, cientes de que oligopsônicos são, fazem uso de tal "status" para garantir as altas margens. Já o poder político é revelado sempre que o setor requer regalias de tratamento ao Poder Público, algo cada vez mais frequente.
De acordo com dados do Instituto Nacional das Empresas de Sucata de Ferro e Aço (Inesfa) e do Sindicato da Indústria de Ferro no Estado de Minas Gerais (Sindifer), há milhares de fornecedores de sucata ferrosa e de gusa no Brasil, mas há não mais que quatro grupos produtores de aço. O resultado é que as milhares de pequenas e médias empresas do setor de sucata ferrosa, na maior parte das vezes pequenos grupos familiares, cooperativas e catadores, se veem submetidos a venderem seus produtos há apenas poucos compradores nacionais.
Ocorre que a economia é mais ágil que os oligopsônios, e, para fugir do poder de poucos a que estão submetidos, as empresas de sucata ferrosa e de gusa brasileiras buscaram saídas fora do país para encontrar outros compradores, e assim escaparem da concentração de mercado que existe no Brasil. Daí que as exportações brasileiras de sucata ferrosa saltaram de 0,14% para 2,5%, em relação ao consumo interno, entre os anos de 2005 e 2012. Ou seja, não se submetendo à força econômica implacável das aciarias, centenas de empresas do setor de sucata ferrosa hoje exportam seus produtos a todo o mundo, escapando dos incertos humores da indústria brasileira do aço.
No entanto, a indústria do aço no Brasil, ciosa de sua força política, deseja fazer com que o governo federal crie taxas à exportação da sucata ferrosa, para fazer com que seus fornecedores voltem a depender unicamente das siderúrgicas nacionais. Tanto que, recentemente, solicitaram de modo formal ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) que o governo brasileiro adote medidas de restrição e taxação da exportação da sucata ferrosa brasileira. Ou seja, o setor do aço já concentrado deseja ajuda governamental para não permitir que seus fornecedores de matéria-prima vendam seus produtos para o exterior. Uma medida que pode anular o desenvolvimento de um mercado que congrega 1,5 milhão de trabalhadores, entre catadores, cooperativas, micro e pequenas empresas. São ou não perigosos os oligopsônios?
Mais política em Davos - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 23/01
O Fórum Econômico Mundial que começa hoje em Davos, na Suíça, é talvez o mais político dos últimos anos e terá como centro das discussões o papel da sociedade civil num novo mundo que está se formando, longe das hegemonias e com mudanças tecnológicas e demográficas que exigem dos líderes, tanto políticos como empresariais, novas posturas, bem definidas na pesquisa "O futuro papel da sociedade civil". Divulgada ontem, ela mostra que essas mudanças representam uma pressão crescente sobre as instituições para que elas promovam justiça social e responsabilidade.
Todos os participantes das ações, sejam tradicionais atores ou emergentes, devem experimentar novos modelos de engajamento e manter uma postura de "desafio construtivo" da situação atual. A pesquisa demonstra que a sociedade civil nunca na História foi tão importante e influente quanto agora, como indicam os recentes protestos de representantes da sociedade em diversos pontos do mundo, especialmente através das novas redes de relacionamento na internet. Elas estão criando populações crescentemente conectadas, mais educadas e responsáveis, em tempos de incertezas econômicas e políticas. A reunião de Davos se realiza no que está sendo considerada "a mais complexa, interdependente e interconectada" era da História da Humanidade, quando grandes desafios de mudanças e oportunidades de transformação confrontam os líderes e exigem organizações capazes de comandar estratégias ágeis e construir estruturas capazes de resistir aos riscos.
Não por acaso o documento do fórum que traça um panorama da agenda para este ano destaca que a capacidade de liderança é considerada o maior desafio daqui para a frente. Segundo Martina Gmür, que coordena o trabalho, a maioria dos líderes em ação em nossos dias cresceu em um mundo completamente diferente. Também o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, que faz parte do grupo que analisa a agenda global, diz que temos necessidade de uma "governança global" que tenha as necessárias capacidades, poder e energia para criar ambiente de negociação internacional em nível mais elevado.
Ao mesmo tempo em que tenta antecipar a agenda global, esse grupo do fórum faz uma pesquisa sobre o índice de confiança no mundo. Embora tenha melhorado do ano passado para cá, o índice continua abaixo do que seria o "território otimista". Subiu de 0,38 para 0,43 numa escala do 0 a 1, com a percentagem de líderes que temem uma crise econômica catastrófica caindo de 53% para 48%, sendo que a retomada da confiança é mais marcante entre os empresários dos Estados Unidos.
O número de empresários e líderes com visão pessimista caiu de 56% para 43%, e a percentagem de otimistas subiu de 17% para 23|%. Este é o segundo nível mais elevado de confiança econômica desde que o índice começou a ser pesquisado, há cerca de dois anos, e o índice de pessimismo é o mais baixo já registrado até hoje. Mas há ainda sinais de insegurança, como demonstram os 51% que não acreditam que a governança mundial esteja preparada para enfrentar a crise, e os 45% que não acreditam numa cooperação mundial para solucionar a crise econômica.
É esse sentimento misto de alívio e preocupação que vai dominar em Davos, que terá como motivação central a capacidade da União Europeia (UE) de superar a crise. Com a sensação de que a parte mais aguda já passou sem que a UE sofresse dissidências, agora as preocupações se voltam para a capacidade de manutenção de uma agenda de restrições para que os países mais afetados, como Grécia e Portugal, consigam se recuperar plenamente.
Há a preocupação de que os resultados obtidos até agora estimulem nos líderes europeus um sentimento de complacência, como se todas as questões estivessem resolvidas. Os principais líderes europeus, como a alemã Angela Merkel, o britânico David Cameron e o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, serão as estrelas do encontro, inclusive porque os Estados Unidos não estão mandando qualquer autoridade do primeiro escalão para a reunião.
O Fórum Econômico Mundial que começa hoje em Davos, na Suíça, é talvez o mais político dos últimos anos e terá como centro das discussões o papel da sociedade civil num novo mundo que está se formando, longe das hegemonias e com mudanças tecnológicas e demográficas que exigem dos líderes, tanto políticos como empresariais, novas posturas, bem definidas na pesquisa "O futuro papel da sociedade civil". Divulgada ontem, ela mostra que essas mudanças representam uma pressão crescente sobre as instituições para que elas promovam justiça social e responsabilidade.
Todos os participantes das ações, sejam tradicionais atores ou emergentes, devem experimentar novos modelos de engajamento e manter uma postura de "desafio construtivo" da situação atual. A pesquisa demonstra que a sociedade civil nunca na História foi tão importante e influente quanto agora, como indicam os recentes protestos de representantes da sociedade em diversos pontos do mundo, especialmente através das novas redes de relacionamento na internet. Elas estão criando populações crescentemente conectadas, mais educadas e responsáveis, em tempos de incertezas econômicas e políticas. A reunião de Davos se realiza no que está sendo considerada "a mais complexa, interdependente e interconectada" era da História da Humanidade, quando grandes desafios de mudanças e oportunidades de transformação confrontam os líderes e exigem organizações capazes de comandar estratégias ágeis e construir estruturas capazes de resistir aos riscos.
Não por acaso o documento do fórum que traça um panorama da agenda para este ano destaca que a capacidade de liderança é considerada o maior desafio daqui para a frente. Segundo Martina Gmür, que coordena o trabalho, a maioria dos líderes em ação em nossos dias cresceu em um mundo completamente diferente. Também o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, que faz parte do grupo que analisa a agenda global, diz que temos necessidade de uma "governança global" que tenha as necessárias capacidades, poder e energia para criar ambiente de negociação internacional em nível mais elevado.
Ao mesmo tempo em que tenta antecipar a agenda global, esse grupo do fórum faz uma pesquisa sobre o índice de confiança no mundo. Embora tenha melhorado do ano passado para cá, o índice continua abaixo do que seria o "território otimista". Subiu de 0,38 para 0,43 numa escala do 0 a 1, com a percentagem de líderes que temem uma crise econômica catastrófica caindo de 53% para 48%, sendo que a retomada da confiança é mais marcante entre os empresários dos Estados Unidos.
O número de empresários e líderes com visão pessimista caiu de 56% para 43%, e a percentagem de otimistas subiu de 17% para 23|%. Este é o segundo nível mais elevado de confiança econômica desde que o índice começou a ser pesquisado, há cerca de dois anos, e o índice de pessimismo é o mais baixo já registrado até hoje. Mas há ainda sinais de insegurança, como demonstram os 51% que não acreditam que a governança mundial esteja preparada para enfrentar a crise, e os 45% que não acreditam numa cooperação mundial para solucionar a crise econômica.
É esse sentimento misto de alívio e preocupação que vai dominar em Davos, que terá como motivação central a capacidade da União Europeia (UE) de superar a crise. Com a sensação de que a parte mais aguda já passou sem que a UE sofresse dissidências, agora as preocupações se voltam para a capacidade de manutenção de uma agenda de restrições para que os países mais afetados, como Grécia e Portugal, consigam se recuperar plenamente.
Há a preocupação de que os resultados obtidos até agora estimulem nos líderes europeus um sentimento de complacência, como se todas as questões estivessem resolvidas. Os principais líderes europeus, como a alemã Angela Merkel, o britânico David Cameron e o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, serão as estrelas do encontro, inclusive porque os Estados Unidos não estão mandando qualquer autoridade do primeiro escalão para a reunião.
Dez anos de petismo no poder - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
GAZETA DO POVO - 23/01
Na última década, melhorias nos indicadores sociais conviveram com um rebaixamento das instituições democráticas nunca antes visto neste país
O Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao poder há dez anos. Elegeu Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 e o reelegeu em 2006. Em 2010, a sigla garantiu pelo menos mais quatro anos na Presidência ao eleger Dilma Rousseff. Dizia-se então que, se Lula tivesse lançado um poste para sucedê-lo, o povo teria preferido o poste no lugar de quem quer que fosse o adversário, tais o prestígio e o alto índice de aprovação popular que alcançara nos seus oito anos no Palácio do Planalto.
Se tanto sucesso político fosse fruto tão somente do suposto elevado nível de acertos do partido na condução do país, nada a contrapor. De fato, não há como deixar de reconhecer a existência de inúmeros fatores que pesaram fortemente para favorecer o ânimo com que o eleitorado foi às urnas para manter o PT no poder. Dentre tais fatores, sem dúvida, um dos principais – se não o principal – é o Bolsa Família, programa de distribuição de renda que tirou milhões de brasileiros da miséria e da fome.
Outro foi a fidelidade com que Lula manteve os fundamentos econômicos lançados por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, que estabilizou a moeda. A partir de 1993, com a criação do Plano Real, a eliminação da inflação e a abertura da economia à participação privada deram ao país os dois principais sustentáculos para o crescimento experimentado na era Lula, berço do surgimento da chamada nova classe média e da inclusão de 30 milhões de brasileiros na sociedade de consumo.
Entretanto, em meio a tais indubitáveis virtudes – no fundo, herdadas da política fundada pelo antecessor –, o PT sobrevive no comando quase hegemônico do país graças também a práticas nada recomendáveis. Aliás, tais práticas, de tão condenadas e combatidas pelo petismo histórico em seus primórdios, transformaram o partido em arauto da moralidade e da ética e o levaram a conquistar a confiança popular e a alcançar a Presidência pela primeira vez há dez anos.
Foram, porém, tais bandeiras as mais conspurcadas pelo PT quando se viu detentor do mando político e administrativo do país. O saldo é perverso: foi sob seu governo que o país assistiu ao escândalo do mensalão; e, de escândalo em escândalo, chegamos agora ao ápice com a descoberta de que uma simples secretária, amiga íntima de Lula, era capaz de influir sobre os destinos da república e de traficar seu poder para favorecer atos explícitos da mais deslavada corrupção.
Alianças políticas as mais heterodoxas (como as que uniram o PT a alguns símbolos do passado que combateu, como Paulo Maluf e José Sarney) alicerçam também o poder quase imperial que o partido hoje exerce. O oportunismo, o fisiologismo e todas as demais conveniências de ocasião – dentre as quais estas que levarão ao comando do Congresso as figuras rotas de Renan Calheiros e Henrique Alves – constituem o modus operandi do PT para realizar seu projeto de perpetuação, nem que, para tal, seja preciso aniquilar a oposição, como hoje ocorre.
Do ponto de vista administrativo, o que vimos nestes dez anos de petismo foi um país que, aos olhos do mundo, parecia destinado a ser um paradigma de transformação social e econômica. Internamente, porém, a percepção é outra – a de um país que não soube aproveitar a oportunidade de investir no próprio futuro. Nesse sentido, vimos cada vez mais claramente quão pífias foram as ações visando dotar o Brasil de uma infraestrutura logística capaz de torná-lo competitivo e, ao mesmo tempo, de tornar sustentáveis o desenvolvimento e a justiça social. Justiça social que não se faz apenas com garantia de renda mínima aos mais pobres, mas sobretudo com a criação de oportunidades para que seus beneficiários libertem-se, pela educação e pelo trabalho, da indigna dependência.
Enfim, ao PT cabe, neste momento em que se lembra de seu décimo aniversário no poder e dos seus 32 anos de fundação como partido, rever seus métodos, repensar seu destino e colocar-se realmente a serviço dos ideais éticos que pregou e, ao mesmo tempo, modernizar sua visão de mundo, desfazendo-se completamente dos preconceitos ideológicos ainda tão identificados com o atraso e com o autoritarismo.
Na última década, melhorias nos indicadores sociais conviveram com um rebaixamento das instituições democráticas nunca antes visto neste país
O Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao poder há dez anos. Elegeu Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 e o reelegeu em 2006. Em 2010, a sigla garantiu pelo menos mais quatro anos na Presidência ao eleger Dilma Rousseff. Dizia-se então que, se Lula tivesse lançado um poste para sucedê-lo, o povo teria preferido o poste no lugar de quem quer que fosse o adversário, tais o prestígio e o alto índice de aprovação popular que alcançara nos seus oito anos no Palácio do Planalto.
Se tanto sucesso político fosse fruto tão somente do suposto elevado nível de acertos do partido na condução do país, nada a contrapor. De fato, não há como deixar de reconhecer a existência de inúmeros fatores que pesaram fortemente para favorecer o ânimo com que o eleitorado foi às urnas para manter o PT no poder. Dentre tais fatores, sem dúvida, um dos principais – se não o principal – é o Bolsa Família, programa de distribuição de renda que tirou milhões de brasileiros da miséria e da fome.
Outro foi a fidelidade com que Lula manteve os fundamentos econômicos lançados por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, que estabilizou a moeda. A partir de 1993, com a criação do Plano Real, a eliminação da inflação e a abertura da economia à participação privada deram ao país os dois principais sustentáculos para o crescimento experimentado na era Lula, berço do surgimento da chamada nova classe média e da inclusão de 30 milhões de brasileiros na sociedade de consumo.
Entretanto, em meio a tais indubitáveis virtudes – no fundo, herdadas da política fundada pelo antecessor –, o PT sobrevive no comando quase hegemônico do país graças também a práticas nada recomendáveis. Aliás, tais práticas, de tão condenadas e combatidas pelo petismo histórico em seus primórdios, transformaram o partido em arauto da moralidade e da ética e o levaram a conquistar a confiança popular e a alcançar a Presidência pela primeira vez há dez anos.
Foram, porém, tais bandeiras as mais conspurcadas pelo PT quando se viu detentor do mando político e administrativo do país. O saldo é perverso: foi sob seu governo que o país assistiu ao escândalo do mensalão; e, de escândalo em escândalo, chegamos agora ao ápice com a descoberta de que uma simples secretária, amiga íntima de Lula, era capaz de influir sobre os destinos da república e de traficar seu poder para favorecer atos explícitos da mais deslavada corrupção.
Alianças políticas as mais heterodoxas (como as que uniram o PT a alguns símbolos do passado que combateu, como Paulo Maluf e José Sarney) alicerçam também o poder quase imperial que o partido hoje exerce. O oportunismo, o fisiologismo e todas as demais conveniências de ocasião – dentre as quais estas que levarão ao comando do Congresso as figuras rotas de Renan Calheiros e Henrique Alves – constituem o modus operandi do PT para realizar seu projeto de perpetuação, nem que, para tal, seja preciso aniquilar a oposição, como hoje ocorre.
Do ponto de vista administrativo, o que vimos nestes dez anos de petismo foi um país que, aos olhos do mundo, parecia destinado a ser um paradigma de transformação social e econômica. Internamente, porém, a percepção é outra – a de um país que não soube aproveitar a oportunidade de investir no próprio futuro. Nesse sentido, vimos cada vez mais claramente quão pífias foram as ações visando dotar o Brasil de uma infraestrutura logística capaz de torná-lo competitivo e, ao mesmo tempo, de tornar sustentáveis o desenvolvimento e a justiça social. Justiça social que não se faz apenas com garantia de renda mínima aos mais pobres, mas sobretudo com a criação de oportunidades para que seus beneficiários libertem-se, pela educação e pelo trabalho, da indigna dependência.
Enfim, ao PT cabe, neste momento em que se lembra de seu décimo aniversário no poder e dos seus 32 anos de fundação como partido, rever seus métodos, repensar seu destino e colocar-se realmente a serviço dos ideais éticos que pregou e, ao mesmo tempo, modernizar sua visão de mundo, desfazendo-se completamente dos preconceitos ideológicos ainda tão identificados com o atraso e com o autoritarismo.
O poder sem pudor - ROSÂNGELA BITTAR
Valor Econômico - 23/01
Um dos fatos que mais incomodam os senadores com biografia, na rentrée 2013, é o caráter clandestino da candidatura de Renan Calheiros a presidente do Senado, posto a que pretende voltar depois de tê-lo abandonado às pressas para não sucumbir à perda do mandato por falta de decoro. Em dezembro, no coquetel de fim de ano que o atual presidente José Sarney ofereceu aos seus pares, Renan foi abordado por um grupo de senadores e Cristovam Buarque (PDT-DF) perguntou-lhe sobre planos para reestruturação, moralização e administração do Senado, ouvindo como resposta apenas que não sabia ainda se seria candidato. É o que ainda diz, hoje, faltando dez dias para a eleição em que pretende ser ungido sem pedir um único voto e sequer declarar-se na disputa. Um escárnio.
Senadores da República estão diante de um presidente virtualmente eleito, com o apoio total do governo federal, que não pode sequer admitir a candidatura porque se sair de baixo da cama tem medo de ser alvejado por denúncias. Renan, certamente, está seguindo o conselho de algum especialista em gestão de crise, tipos que devem tê-lo atendido quando foi obrigado a renunciar ao cargo, que agora exige de volta, por ter suas contas pessoais pagas por uma empreiteira.
Renan Calheiros será eleito e o ônus para o futuro do Senado, e do país, fica muito na conta do Palácio do Planalto, do governo federal e do PT, embora senadores de vários partidos façam uma autocrítica que não os isenta de responsabilidade no estado calamitoso a que chegou a Casa.
Anticandidatura é referendo à clandestinidade
É verdade que um grupo vem tentando um reparo político à sociedade pelas mazelas ali vividas, mas não logrou êxito. De diferentes partidos, de governo e oposição, senadores rebelaram-se a esse prato mal feito no Senado. Em reuniões, ora na casa de um, ora na de outro, às vezes em restaurante, vinham debatendo a situação do poder que integram e procurando uma saída. A presidente Dilma Rousseff parecia querer uma solução afinada com o grupo ético. Chegou a oferecer a Renan apoio à sua candidatura ao governo de Alagoas, convidou o ministro Edison Lobão (PMDB) a deixar o cargo para ser o presidente do Senado na sucessão de Sarney, mas em determinado momento rendeu-se à vontade de Renan, que já dobrara o PMDB, de cambulhão o vice-presidente Michel Temer e José Sarney. Dilma capitulou.
Um dos senadores do grupo ético era Luiz Henrique (PMDB-SC), que tinha condições de disputar a presidência e até vencer, porque com ele iria parte do PMDB. Dilma levou-o a tiracolo, numa viagem à Rússia, e de lá ele voltou informando aos colegas que perdera condições de candidatar-se.
Com a desistência, os senadores engajados no projeto de futuro desistiram de lutar e passaram a elaborar planos de resgate a serem propostos à nova mesa. Na eleição optariam pela abstenção.
Até que, contra a conselho do grupo, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), resolveu lançar a sua anticandidatura. Ele argumentou que a abstenção seria um protesto tímido. Mas é mais efetivo. A abstenção, no contraponto a uma candidatura clandestina, seria um protesto real. A anticandidatura, porém, referenda o candidato voluntarista.
Se o anticandidato receber 20 votos, terá perdido feio com um quarto dos votos do Senado. Se a abstenção tiver 20 votos, é um protesto considerável, em um colégio de 81, contra o acinte que o governo, o PMDB e o PT protagonizam no Poder Legislativo. Para Renan Calheiros é melhor ter um adversário pequeno que um número grande de abstenções. Nessas se evidencia uma disputa entre ele e seu dossiê.
O senador Randolfe não entendeu assim e confirma-se outro anticandidato, o senador Pedro Taques (PDT-MT). Os dois pertencem ao grupo que se reunia para tentar um caminho novo para o Senado, têm pretensões de assumir logo uma liderança política no seu Estado (Randolfe levou o PSOL à Prefeitura de Macapá, começando a ocupar o curral eleitoral do senador José Sarney).
"Não sei se é por omissão, conivência ou incompetência, mas não estamos conseguindo fazer o Senado debater o seu futuro", afirma Cristovam Buarque. Ele fez uma carta a 43 senadores expondo ideias e caminhos de sobrevivência. Até enviou sua carta a alguns senadores, poucos, do PT, embora nenhum do partido do governo tenha comparecido às reuniões de quem pretende tirar o Senado das chamas.
Os senadores estão sendo usados, são votos de cabresto e vão eleger um presidente que sequer admite a eles sua candidatura. Embora o grupo dos éticos se preocupe em manter o respeito da sociedade, não consegue adquirir força política, competência.
O que se diz é que, ao escolher o senador Jorge Viana, do PT do Acre, para ser o vice de Renan, o PMDB amarrou os votos do PT e do governo. Se impedido o presidente por alguma razão possível e provável, o partido do governo assume. Mas é um jogo não informado aos eleitores. Eduardo Suplicy, um petista considerado independente, não foi a nenhuma conversa do grupo pluripartidário que gostaria de transformar a Casa. Walter Pinheiro, da Bahia, José Pimentel, do Ceará, sequer foram chamados para não se constrangerem.
Resta aos senadores que ainda querem insistir nas suas propostas, tornar mais difícil o uso da Casa como serventia de poucos.
Muitos senadores que frequentam as reuniões de debate dizem sentir "vergonha". Mas não têm forças. Na Câmara o candidato favorito para vencer também não prima pela biografia, mas ali, pelo menos, está havendo uma campanha real, disputa de votos.
Como o Senado chegou a esse estado de indigência política, intelectual, legislativa? "Primeiro, nós fomos perdendo poder e depois fomos perdendo pudor", diz Cristovam. A perda de poder chegou com a imposição do Executivo, que escolhe o presidente e a agenda, tudo decide por medida provisória. Já enfraquecido, foi perdendo poder também para o Judiciário, por incompetência. O senador culpa a todos, inclusive a si próprio, pela falta de debate, por ninguém ouvir quando o outro fala, pelo voto com o corpo (quem está de acordo fique como está), pelo excessivo poder dos líderes que decidem tudo.
"Uma das propostas que coloco na minha carta é mudar a consultoria jurídica ou dar independência a ela. A consultoria autoriza o Senado a passar por cima de decisões do Supremo. Caímos na falta do pudor, de fazer qualquer coisa".
O Congresso é um poder subtraído por todos, não fala e não ouve. Um grupo fechado monopoliza esse poder. E assim continua, por mais esta Legislatura, quem sabe a próxima e a seguinte, para todo o sempre.
Um dos fatos que mais incomodam os senadores com biografia, na rentrée 2013, é o caráter clandestino da candidatura de Renan Calheiros a presidente do Senado, posto a que pretende voltar depois de tê-lo abandonado às pressas para não sucumbir à perda do mandato por falta de decoro. Em dezembro, no coquetel de fim de ano que o atual presidente José Sarney ofereceu aos seus pares, Renan foi abordado por um grupo de senadores e Cristovam Buarque (PDT-DF) perguntou-lhe sobre planos para reestruturação, moralização e administração do Senado, ouvindo como resposta apenas que não sabia ainda se seria candidato. É o que ainda diz, hoje, faltando dez dias para a eleição em que pretende ser ungido sem pedir um único voto e sequer declarar-se na disputa. Um escárnio.
Senadores da República estão diante de um presidente virtualmente eleito, com o apoio total do governo federal, que não pode sequer admitir a candidatura porque se sair de baixo da cama tem medo de ser alvejado por denúncias. Renan, certamente, está seguindo o conselho de algum especialista em gestão de crise, tipos que devem tê-lo atendido quando foi obrigado a renunciar ao cargo, que agora exige de volta, por ter suas contas pessoais pagas por uma empreiteira.
Renan Calheiros será eleito e o ônus para o futuro do Senado, e do país, fica muito na conta do Palácio do Planalto, do governo federal e do PT, embora senadores de vários partidos façam uma autocrítica que não os isenta de responsabilidade no estado calamitoso a que chegou a Casa.
Anticandidatura é referendo à clandestinidade
É verdade que um grupo vem tentando um reparo político à sociedade pelas mazelas ali vividas, mas não logrou êxito. De diferentes partidos, de governo e oposição, senadores rebelaram-se a esse prato mal feito no Senado. Em reuniões, ora na casa de um, ora na de outro, às vezes em restaurante, vinham debatendo a situação do poder que integram e procurando uma saída. A presidente Dilma Rousseff parecia querer uma solução afinada com o grupo ético. Chegou a oferecer a Renan apoio à sua candidatura ao governo de Alagoas, convidou o ministro Edison Lobão (PMDB) a deixar o cargo para ser o presidente do Senado na sucessão de Sarney, mas em determinado momento rendeu-se à vontade de Renan, que já dobrara o PMDB, de cambulhão o vice-presidente Michel Temer e José Sarney. Dilma capitulou.
Um dos senadores do grupo ético era Luiz Henrique (PMDB-SC), que tinha condições de disputar a presidência e até vencer, porque com ele iria parte do PMDB. Dilma levou-o a tiracolo, numa viagem à Rússia, e de lá ele voltou informando aos colegas que perdera condições de candidatar-se.
Com a desistência, os senadores engajados no projeto de futuro desistiram de lutar e passaram a elaborar planos de resgate a serem propostos à nova mesa. Na eleição optariam pela abstenção.
Até que, contra a conselho do grupo, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), resolveu lançar a sua anticandidatura. Ele argumentou que a abstenção seria um protesto tímido. Mas é mais efetivo. A abstenção, no contraponto a uma candidatura clandestina, seria um protesto real. A anticandidatura, porém, referenda o candidato voluntarista.
Se o anticandidato receber 20 votos, terá perdido feio com um quarto dos votos do Senado. Se a abstenção tiver 20 votos, é um protesto considerável, em um colégio de 81, contra o acinte que o governo, o PMDB e o PT protagonizam no Poder Legislativo. Para Renan Calheiros é melhor ter um adversário pequeno que um número grande de abstenções. Nessas se evidencia uma disputa entre ele e seu dossiê.
O senador Randolfe não entendeu assim e confirma-se outro anticandidato, o senador Pedro Taques (PDT-MT). Os dois pertencem ao grupo que se reunia para tentar um caminho novo para o Senado, têm pretensões de assumir logo uma liderança política no seu Estado (Randolfe levou o PSOL à Prefeitura de Macapá, começando a ocupar o curral eleitoral do senador José Sarney).
"Não sei se é por omissão, conivência ou incompetência, mas não estamos conseguindo fazer o Senado debater o seu futuro", afirma Cristovam Buarque. Ele fez uma carta a 43 senadores expondo ideias e caminhos de sobrevivência. Até enviou sua carta a alguns senadores, poucos, do PT, embora nenhum do partido do governo tenha comparecido às reuniões de quem pretende tirar o Senado das chamas.
Os senadores estão sendo usados, são votos de cabresto e vão eleger um presidente que sequer admite a eles sua candidatura. Embora o grupo dos éticos se preocupe em manter o respeito da sociedade, não consegue adquirir força política, competência.
O que se diz é que, ao escolher o senador Jorge Viana, do PT do Acre, para ser o vice de Renan, o PMDB amarrou os votos do PT e do governo. Se impedido o presidente por alguma razão possível e provável, o partido do governo assume. Mas é um jogo não informado aos eleitores. Eduardo Suplicy, um petista considerado independente, não foi a nenhuma conversa do grupo pluripartidário que gostaria de transformar a Casa. Walter Pinheiro, da Bahia, José Pimentel, do Ceará, sequer foram chamados para não se constrangerem.
Resta aos senadores que ainda querem insistir nas suas propostas, tornar mais difícil o uso da Casa como serventia de poucos.
Muitos senadores que frequentam as reuniões de debate dizem sentir "vergonha". Mas não têm forças. Na Câmara o candidato favorito para vencer também não prima pela biografia, mas ali, pelo menos, está havendo uma campanha real, disputa de votos.
Como o Senado chegou a esse estado de indigência política, intelectual, legislativa? "Primeiro, nós fomos perdendo poder e depois fomos perdendo pudor", diz Cristovam. A perda de poder chegou com a imposição do Executivo, que escolhe o presidente e a agenda, tudo decide por medida provisória. Já enfraquecido, foi perdendo poder também para o Judiciário, por incompetência. O senador culpa a todos, inclusive a si próprio, pela falta de debate, por ninguém ouvir quando o outro fala, pelo voto com o corpo (quem está de acordo fique como está), pelo excessivo poder dos líderes que decidem tudo.
"Uma das propostas que coloco na minha carta é mudar a consultoria jurídica ou dar independência a ela. A consultoria autoriza o Senado a passar por cima de decisões do Supremo. Caímos na falta do pudor, de fazer qualquer coisa".
O Congresso é um poder subtraído por todos, não fala e não ouve. Um grupo fechado monopoliza esse poder. E assim continua, por mais esta Legislatura, quem sabe a próxima e a seguinte, para todo o sempre.
Boa decisão - ELOI FERNÁNDEZ Y FERNÁNDEZ
O GLOBO - 23/01
A decisão do governo de autorizar a realização da 11ª Rodada de Licitações de áreas para exploração e produção foi extremamente bem recebida pelos agentes econômicos envolvidos com setor de petróleo e gás.
Sem novas rodadas desde 2008 as áreas concedidas para atividades exploratórias vinham diminuindo aceleradamente. As consequências sobre os investimentos pela falta de novas áreas de exploração são conhecidas e se agravam com o passar do tempo. A redução das atividades exploratórias hoje é a redução do desenvolvimento de novos campos produtores no futuro.
A regularidade das licitações, mantida desde a primeira rodada até 2008, orienta os investimentos não só das empresas de petróleo, mas também de toda a cadeia de fornecedores. A ausência de leilões por tantos anos alimenta dúvidas e gera insegurança quanto à política para o setor, inibindo investimentos não só das empresas de petróleo, mas também do segmento fornecedor.
É reconhecida também a necessidade, para os fornecedores nacionais, de incorporação e fortalecimento de um conjunto diversificado de empresas de petróleo em atividade no país e de oferta permanente de novos blocos para exploração.
Esta diversidade inclusive ajuda a aliviar a excessiva pressão sobre a Petrobras, como responsável praticamente exclusiva pelas encomendas à indústria nacional. Sem perder de vista a relevância de seu papel e apesar do seu histórico compromisso com o desenvolvimento do país, a empresa tem de trabalhar com um conjunto de objetivos que limitam sua atuação como agente da política industrial para o setor.
Para o fornecedor local, a pluralidade de clientes dilui riscos, aumenta a sustentabilidade e estimula a busca por maior competitividade, além de potencializar a estruturação de plataformas de exportação pela maior interação com empresas de atuação global.
Deve-se também fortalecer o papel dos produtores nacionais independentes, com foco de atuação nos campos marginais em terra, como mecanismo de criar uma cultura empresarial nacional de empresas de petróleo. Para este setor deve ser formulada uma política mais agressiva de leilões específicos, conforme recomendação legal e do próprio CNPE.
No momento em que o país discute diversos mecanismos voltados para a retomada do crescimento econômico em patamares mais elevados, o setor de petróleo e gás tem um importante papel a desempenhar, e novas oportunidades precisavam ser oferecidas. Neste sentido, a realização da 11ª Rodada vem ao encontro deste objetivo, fomentando o investimento privado no setor e na sua cadeia produtiva.
A ANP está preparada. As empresas de petróleo estão aguardando, mas mirando também outros mercados. Espera-se, com esta decisão, a retomada contínua dos leilões e novas oportunidades ainda este ano, conforme declaração oficial, em áreas do polígono do pré-sal. A indústria nacional com certeza irá responder positivamente a estas oportunidades.
Inflação - ANTONIO DELFIM NETTO
FOLHA DE SP - 23/01
A taxa de inflação é como um "radiador" que dissipa o calor produzido pela inércia. Exemplificando sem exaurir:
1º) Por todos os atritos naturalmente produzidos pela demora necessária para ajustar as demandas setoriais (choques de oferta, mudança de hábitos) com as respectivas ofertas;
2º) Pela deficiência da infraestrutura;
3º) Pelos obstáculos institucionais e políticos que retardam os ajustes da oferta dos insumos básicos;
4º) Pelos exageros cometidos pelo poder incumbente quando perde o senso e se entrega ao voluntarismo populista, que ignora as restrições físicas impostas pelas identidades da contabilidade nacional;
5º) Pelo próprio governo quando tenta proteger sua receita pela indexação automática de impostos, preços, tarifas ou salários da própria inflação que está criando;
6º) Pelo estímulo ao crédito quando não há mais fatores de produção disponíveis em proporção adequada e a acumulação do deficit em conta-corrente não permite importá-los;
7º) Quando os salários reais crescem acima da produtividade física do trabalho.
A taxa de inflação é, por-tanto, um indicador duvidoso da demanda global. Ela é, simultaneamente, causa e efeito da redistribuição das rendas. No fundo, é a imagem invertida no espelho do nível de produtividade da economia que cresce à medida que se reduzem os mesmos "atritos" que a produzem.
A redução da taxa de inflação brasileira -que, há oito anos, permanece em torno de 5,2% ao ano e que, como em todos os países com "metas inflacionárias" com bandas, namora o seu teto- não é, obviamente, uma tarefa apenas do BC. É uma missão de todo o governo, que envolve o aumento da sua eficiência apoiada em reformas microeconômicas bem "focadas" que precisam do apoio da sociedade.
Por exemplo, um mercado de trabalho bem organizado, que respeita os direitos constitucionais dos trabalhadores e onde a livre negociação salarial dentro da empresa (e não do setor), sob as vistas de uma comissão de fábrica eleita e com representatividade, pretere os efeitos legais acumulados pelo corporativismo ao longo dos anos, é poderoso instrumento para o aumento da "produtividade" do trabalho e, ao mesmo tempo, a redução dos atritos que se dissipam como pressões inflacionárias.
Por outro lado, quando há um desajuste entre a disponibilidade da mão de obra e suas habilidades em relação às necessidades da economia, é extremamente custoso corrigi-lo cortando a demanda global pela política monetária. São necessárias medidas estruturais que aumentem a oferta e a qualidade da mão de obra: rápida educação profissional e imigração!
A taxa de inflação é como um "radiador" que dissipa o calor produzido pela inércia. Exemplificando sem exaurir:
1º) Por todos os atritos naturalmente produzidos pela demora necessária para ajustar as demandas setoriais (choques de oferta, mudança de hábitos) com as respectivas ofertas;
2º) Pela deficiência da infraestrutura;
3º) Pelos obstáculos institucionais e políticos que retardam os ajustes da oferta dos insumos básicos;
4º) Pelos exageros cometidos pelo poder incumbente quando perde o senso e se entrega ao voluntarismo populista, que ignora as restrições físicas impostas pelas identidades da contabilidade nacional;
5º) Pelo próprio governo quando tenta proteger sua receita pela indexação automática de impostos, preços, tarifas ou salários da própria inflação que está criando;
6º) Pelo estímulo ao crédito quando não há mais fatores de produção disponíveis em proporção adequada e a acumulação do deficit em conta-corrente não permite importá-los;
7º) Quando os salários reais crescem acima da produtividade física do trabalho.
A taxa de inflação é, por-tanto, um indicador duvidoso da demanda global. Ela é, simultaneamente, causa e efeito da redistribuição das rendas. No fundo, é a imagem invertida no espelho do nível de produtividade da economia que cresce à medida que se reduzem os mesmos "atritos" que a produzem.
A redução da taxa de inflação brasileira -que, há oito anos, permanece em torno de 5,2% ao ano e que, como em todos os países com "metas inflacionárias" com bandas, namora o seu teto- não é, obviamente, uma tarefa apenas do BC. É uma missão de todo o governo, que envolve o aumento da sua eficiência apoiada em reformas microeconômicas bem "focadas" que precisam do apoio da sociedade.
Por exemplo, um mercado de trabalho bem organizado, que respeita os direitos constitucionais dos trabalhadores e onde a livre negociação salarial dentro da empresa (e não do setor), sob as vistas de uma comissão de fábrica eleita e com representatividade, pretere os efeitos legais acumulados pelo corporativismo ao longo dos anos, é poderoso instrumento para o aumento da "produtividade" do trabalho e, ao mesmo tempo, a redução dos atritos que se dissipam como pressões inflacionárias.
Por outro lado, quando há um desajuste entre a disponibilidade da mão de obra e suas habilidades em relação às necessidades da economia, é extremamente custoso corrigi-lo cortando a demanda global pela política monetária. São necessárias medidas estruturais que aumentem a oferta e a qualidade da mão de obra: rápida educação profissional e imigração!