O GLOBO - 03/05/12
O pessoal do petróleo, reunido em Houston, EUA, na Offshore Technology Conference, estima que supera US$ 500 milhões o prejuízo do consórcio Exxon/Hess Corp e Petrobras, que abandonou o bloco BS-M-22, na Bacia de Santos. Foram perfurados três poços secos, ao custo de US$ 150 milhões a US$ 200 milhões cada.
Aliás...
Em Houston, foi selada a paz entre os organizadores dessa OTC e o Instituto Brasileiro de Petróleo, para feiras no Brasil. Em outubro de 2011, os americanos tentaram fazer sozinhos uma no Rio, e não deu certo.
É muita grana
Charles Möeller e Cláudio Botelho, os badalados diretores do musical “Hair”, estão com novo projeto: “Rock in Rio, o musical”. O MinC autorizou a produtora Aventura a captar R$ 10.608.186, dinheiro, meu, seu, nosso.
Magoou
De Manoel Dias, secretário-geral do PDT, chateado com a nomeação de Brizola Neto para a pasta do Trabalho, a um amigo: — Dilma foi muito arrogante.
Santa sem teto
Ângela Gutierrez, em que pese a oposição do Iphan mineiro, decidiu insistir em levar para Tiradentes o museu dedicado a imagens de Sant’Ana. Atendeu ao apelo de gente do setor cultural, como o ex-ministro Sérgio Rouanet.
Rio na moda
A Macy’s, maior rede de lojas de departamentos do mundo, está com um espaço inteiro dedicado ao Brasil, em Nova York. Exibe vários produtos da estilista carioca Isabela Capeto, por exemplo. O piso imita o calçadão de Copacabana.
JULIANA ALVES, uma das musas da coluna, festeja hoje seus 30 anos. A bela estará logo mais em “As brasileiras”, a série de Daniel Filho, na TV Globo. Será Janice, uma taxista, no episódio “A mascarada do ABC”. Casada com Samuel (Ângelo Antônio), Janice, apesar da beleza generosa, não se cuida muito. Pelo menos até o dia em que, ao ajudar uma amiga, vai
parar num palco no papel de uma linda dançarina mascarada. Dança com eu.
Roubo do ‘Capital’
Semana passada, em Laranjeiras, no Rio, dois jovens alunos da UFRJ saíam de uma aula particular na casa do mestre Carlos Lessa, sobre Karl Marx, o ideólogo maior da esquerda, quando foram... assaltados à mão armada. Os bandidos, que levaram exemplares de “O capital” , devem estar até agora tentando entender o processo de acumulação primitiva da riqueza.
Por falar em Marx...
O barbudo deve ter dado voltas no túmulo depois que a CUT ajudou a “despolitizar” o 1, de maio, em São Paulo, promovendo um show do pagodeiro Belo.
Dilma+20
Dilma vai à Guiné Equatorial, no meio do mês, para a Cúpula América do Sul-África. Vai reiterar convite aos chefes de Estado africanos para virem à Rio+20.
Volta do Capitão Gay
Lembra o Capitão Gay (foto), personagem de humor de Jô Soares? Ganhará um filme produzido por José Henrique Fonseca e dirigido por Otávio Müller. O ator Leandro Hassum será o protagonista.
Pecado capital
A juíza Ana Luíza Mayon Nogueira vai ouvir, terça, no Rio, as testemunhas de defesa de presos na Operação Pecado Capital. Ao todo, são dez pessoas — entre as quais, Gilson Cantarino, ex-secretário de Rosinha Garotinho —, acusadas de desviar dinheiro público.
Sangue ferve
Ney Matogrosso incluiu um sucesso de Sidney Magal no show que fará dia 23 com Marília Bessy, no Rival, no Rio. Cantará “O meu sangue ferve por você”, hit dos anos 1970.
Fim das armas
O Exército começou a destruir ontem parte das 120 mil armas de fogo guardadas no depósito da Polícia Civil do Rio. Vão inutilizar 1.200 por dia.
Esquerda volver
Flávio Moreira da Costa, o premiado escritor gaúcho, estava outro dia no bistrô Cafeína, em Copacabana, quando viu cinco francesas. Perguntou: “Sarkozy ou François Hollande?” Quatro votarão em Hollande. Uma, em Sarkozy.
quinta-feira, maio 03, 2012
Rasgador de contrato - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 03/05/12
A Petrobras havia comprado duas refinarias da Bolívia, por US$ 102 milhões, no programa de privatização. E comprou por insistência do então governo boliviano, que não tinha como modernizá-las. No dia primeiro de maio de 2006, elas foram ocupadas com tropas do exército boliviano e expropriadas. Mas, no final, a Petrobras recebeu US$ 112 milhões e ainda tem um valor para receber de dividendos. A Bolívia poderia ter feito tudo diferente.
Os governos da Bolívia, Equador e Venezuela pagam pelas suas estatizações, que anunciam como nacionalizações justas, em meio a comícios e brados populistas. Em alguns casos, a empresa que é atacada não consegue receber o que acha justo porque tudo é feito como na Argentina com a YPF: é um tribunal local que vai arbitrar o preço. A YPF quer arbitragem neutra e internacional. Os dois lados ainda brigam.
Cada país é soberano para dizer o que acontece em seu solo, obviamente, mas paga-se um preço alto por quebra de contratos, atos espalhafatosos, ocupação de empresas com tropas, expulsão de executivos de suas salas e outras arbitrariedades.
Na Venezuela, as empresas foram forçadas a vender seus ativos para a PDVSA. A Exxon Mobil, segundo avaliação feita por Adriano Pires, do CBIE, acabou recebendo 10% do que pedia:
- A opção é sempre aceitar ou nunca ver a cor do dinheiro, tendo que brigar em tribunais internacionais.
Na Bolívia, o governo reestatizou campos de gás que tinham a participação da Petrobras e as duas refinarias. Mas a empresa brasileira diz que não se sente lesada, já que recebeu de volta o preço que pagou. A Petrobras investiu e recuperou as refinarias, mas também teve lucro durante o período em que a operou. A empresa brasileira é estatal e acaba aceitando o preço que o governo quer que ela aceite para não ter briga com vizinhos. Mas, de qualquer maneira, ela recebeu pelas refinarias.
No Equador, a Petrobras também recebeu US$ 217 milhões por uma concessão que foi cancelada. Na Província de Neuquén, na Argentina, a estatal brasileira enfrentou o mesmo problema: o cancelamento de uma concessão, e de forma intempestiva. A empresa está negociando, mas, como Neuquén tem autonomia, não depende tudo do governo federal.
A presidente da Petrobras, Graça Foster, está sendo dura. Falou em audiência na Câmara que o Brasil não rompe contrato e não vai aumentar investimento na Argentina. A Vale também anunciou a mesma coisa. O JBS fechou ou vendeu quatro das cinco unidades que tinha no país vizinho.
O caminho escolhido pela Bolívia, Argentina, Venezuela e Equador leva apenas ao descrédito, à redução do investimento de empresários nacionais e estrangeiros. Depois que se cria o ambiente de insegurança jurídica fica difícil recuperar a reputação de bom lugar para investimento.
A própria atitude de quem vai para um país assim é a de retirar o máximo de lucro no menor tempo possível, porque um fato como o deste primeiro de maio na Bolívia - que expropriou a empresa de transmissão de energia - pode acontecer de repente.
O Brasil deve evitar ser visto como parte de um movimento latino de recuperação dos ativos na lei ou na marra. Não há risco de atitudes assim por parte do governo brasileiro, mas o ideal é não demonstrar, por atos e palavras, apoio às decisões dos governos que estão expropriando bens privatizados.
O Brasil tem atraído investimento, e de longo prazo, de várias partes do mundo, até porque não há qualquer inclinação no governo de fazer uma insensatez dessas. Em má hora os vizinhos começam a tomar decisões tresloucadas. Nos últimos anos, a América Latina cresceu a um ritmo forte, por isso o melhor a fazer era aproveitar a onda.
O governo, em qualquer país, mesmo quando vende seus ativos em programas de privatização continua com muito poder. Ele nunca poderá abrir mão, por exemplo, do poder regulatório. Como muitas dessas empresas são concessionárias de serviço público - como no caso da empresa de transmissão de energia da Bolívia - bastava aprovar normas que a obrigassem a investir, se esse fosse o problema.
Nos primeiros dias logo após a ocupação das refinarias da Bolívia, o presidente Evo Morales fez as mais duras críticas à Petrobras. Hoje, já se sabe o fim da história: o governo boliviano indenizou a estatal brasileira. Na Venezuela, Hugo Chávez sempre fez espetáculos públicos nas expropriações das empresas e depois negociou o pagamento. Mas o que ficou foi a fama de governante que rasga contratos.
Como investidor, o Brasil precisa também se proteger, e às suas empresas, para reduzir o risco de eventos como os que têm envolvido a Petrobras e outras companhias brasileiras. Dias depois da expropriação da YPF, o governo argentino veio pedir ao Brasil mais investimento, e o ministro Edson Lobão deu demonstração de que aceitaria.
É um erro achar que se os vizinhos enxotarem empresas com maus modos nós poderemos ocupar o lugar delas com as nossas companhias. Quem rasga contrato uma vez rasga novamente. O Brasil precisa ser tão cauteloso quanto qualquer outro investidor nesse momento em relação aos rasgadores em série de contratos na América do Sul.
A Petrobras havia comprado duas refinarias da Bolívia, por US$ 102 milhões, no programa de privatização. E comprou por insistência do então governo boliviano, que não tinha como modernizá-las. No dia primeiro de maio de 2006, elas foram ocupadas com tropas do exército boliviano e expropriadas. Mas, no final, a Petrobras recebeu US$ 112 milhões e ainda tem um valor para receber de dividendos. A Bolívia poderia ter feito tudo diferente.
Os governos da Bolívia, Equador e Venezuela pagam pelas suas estatizações, que anunciam como nacionalizações justas, em meio a comícios e brados populistas. Em alguns casos, a empresa que é atacada não consegue receber o que acha justo porque tudo é feito como na Argentina com a YPF: é um tribunal local que vai arbitrar o preço. A YPF quer arbitragem neutra e internacional. Os dois lados ainda brigam.
Cada país é soberano para dizer o que acontece em seu solo, obviamente, mas paga-se um preço alto por quebra de contratos, atos espalhafatosos, ocupação de empresas com tropas, expulsão de executivos de suas salas e outras arbitrariedades.
Na Venezuela, as empresas foram forçadas a vender seus ativos para a PDVSA. A Exxon Mobil, segundo avaliação feita por Adriano Pires, do CBIE, acabou recebendo 10% do que pedia:
- A opção é sempre aceitar ou nunca ver a cor do dinheiro, tendo que brigar em tribunais internacionais.
Na Bolívia, o governo reestatizou campos de gás que tinham a participação da Petrobras e as duas refinarias. Mas a empresa brasileira diz que não se sente lesada, já que recebeu de volta o preço que pagou. A Petrobras investiu e recuperou as refinarias, mas também teve lucro durante o período em que a operou. A empresa brasileira é estatal e acaba aceitando o preço que o governo quer que ela aceite para não ter briga com vizinhos. Mas, de qualquer maneira, ela recebeu pelas refinarias.
No Equador, a Petrobras também recebeu US$ 217 milhões por uma concessão que foi cancelada. Na Província de Neuquén, na Argentina, a estatal brasileira enfrentou o mesmo problema: o cancelamento de uma concessão, e de forma intempestiva. A empresa está negociando, mas, como Neuquén tem autonomia, não depende tudo do governo federal.
A presidente da Petrobras, Graça Foster, está sendo dura. Falou em audiência na Câmara que o Brasil não rompe contrato e não vai aumentar investimento na Argentina. A Vale também anunciou a mesma coisa. O JBS fechou ou vendeu quatro das cinco unidades que tinha no país vizinho.
O caminho escolhido pela Bolívia, Argentina, Venezuela e Equador leva apenas ao descrédito, à redução do investimento de empresários nacionais e estrangeiros. Depois que se cria o ambiente de insegurança jurídica fica difícil recuperar a reputação de bom lugar para investimento.
A própria atitude de quem vai para um país assim é a de retirar o máximo de lucro no menor tempo possível, porque um fato como o deste primeiro de maio na Bolívia - que expropriou a empresa de transmissão de energia - pode acontecer de repente.
O Brasil deve evitar ser visto como parte de um movimento latino de recuperação dos ativos na lei ou na marra. Não há risco de atitudes assim por parte do governo brasileiro, mas o ideal é não demonstrar, por atos e palavras, apoio às decisões dos governos que estão expropriando bens privatizados.
O Brasil tem atraído investimento, e de longo prazo, de várias partes do mundo, até porque não há qualquer inclinação no governo de fazer uma insensatez dessas. Em má hora os vizinhos começam a tomar decisões tresloucadas. Nos últimos anos, a América Latina cresceu a um ritmo forte, por isso o melhor a fazer era aproveitar a onda.
O governo, em qualquer país, mesmo quando vende seus ativos em programas de privatização continua com muito poder. Ele nunca poderá abrir mão, por exemplo, do poder regulatório. Como muitas dessas empresas são concessionárias de serviço público - como no caso da empresa de transmissão de energia da Bolívia - bastava aprovar normas que a obrigassem a investir, se esse fosse o problema.
Nos primeiros dias logo após a ocupação das refinarias da Bolívia, o presidente Evo Morales fez as mais duras críticas à Petrobras. Hoje, já se sabe o fim da história: o governo boliviano indenizou a estatal brasileira. Na Venezuela, Hugo Chávez sempre fez espetáculos públicos nas expropriações das empresas e depois negociou o pagamento. Mas o que ficou foi a fama de governante que rasga contratos.
Como investidor, o Brasil precisa também se proteger, e às suas empresas, para reduzir o risco de eventos como os que têm envolvido a Petrobras e outras companhias brasileiras. Dias depois da expropriação da YPF, o governo argentino veio pedir ao Brasil mais investimento, e o ministro Edson Lobão deu demonstração de que aceitaria.
É um erro achar que se os vizinhos enxotarem empresas com maus modos nós poderemos ocupar o lugar delas com as nossas companhias. Quem rasga contrato uma vez rasga novamente. O Brasil precisa ser tão cauteloso quanto qualquer outro investidor nesse momento em relação aos rasgadores em série de contratos na América do Sul.
Pega na mentira - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 03/05/12
Entre os senadores, há uma vontade implícita de recuperar a imagem do Senado. Diante de tanta confusão e fios de meada na CPI de Carlos Cachoeira, o pedido de cassação de Demóstenes soará como um nós somos legais
Se depender do relatório do senador Humberto Costa (PT-PE) ao Conselho de Ética, o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) pode se preparar para, num futuro não muito distante, curtir as suas garrafas de Cheval Blanc sem se preocupar com as sessões do Senado no dia seguinte. Ou aproveitar para se dedicar a lições de gastronomia na cozinha nova de seu apartamento. Isso porque, a depender do que se dizia ontem nas conversas reservadas, Demóstenes cairá como todos aqueles que o antecederam e, sem o aval de seus respectivos partidos, terminaram cassados porque “faltaram com a verdade” na tribuna do Senado. Ao discursar, ainda em março, Demóstenes dissera não ter nada a ver com Carlos Cachoeira e, menos de uma semana depois, estava clara a ligação entre eles, coberta de presentes, inclusive um telefone celular.
Costa tomou ainda o cuidado de não usar as gravações que Demóstenes tentou anular por intermédio de seus advogados. Uma forma de tentar evitar que, a partir de hoje, o senador tente anular o relatório na Justiça. O cuidado é válido, mas é sempre bom lembrar que a Justiça nunca se meteu nesse campo de tentar segurar um mandato quando o Conselho de Ética considera que deve ser cassado. Ali, entre as excelências, o julgamento é político e o que serve de válvula de escape no mundo jurídico nem sempre funciona.
Todos os demais senadores que foram cassados ou que renunciaram para escapar do cadafalso estavam no ponto em que Demóstenes se encontra hoje: sem apoio dos partidos. No caso de Luiz Estevão, por exemplo, que foi cassado por conta das apurações da CPI do Judiciário, era quase como um zumbi. Ele disse ao plenário que não tinha nada a ver com a Incal, a empresa enrolada no caso do TRT de São Paulo. E, mais tarde, um contrato de gaveta o colocou no epicentro da trama. Por isso, perdeu o mandato. À época que Estevão ainda circulava pelos corredores, um de seus ex-colegas de partido chegou a me dizer certa vez que o então senador pelo PMDB precisa entender que a “roda da fortuna girou e ele foi espirrado”.
José Roberto Arruda, outro caso notório do Distrito Federal, não chegou a passar pela cassação. Renunciou antres disso, poupando trabalho aos senadores. Mas, seu processo de desgaste entre os colegas não foi diferente. Arruda foi à tribuna dizer que não tinha nada a ver com a violação do painel eletrônico. Jurou pelos filhos. No dia seguinte, estava lá de volta, mudando tudo o que dissera no dia anterior. Foi a conta. Não tinha clima para mais nada. O PSDB lhe mostrou a porta de saída do partido. Alguns que antes eram apenas sorrisos diante dele, fechavam a cara quando ele passava.
Por falar em fechar a cara…
Com Demóstenes não é diferente. Mesmo aqueles que o cumprimentam de forma cordial não deixam de soltar um comentário quando ele vira as costas. O mínimo que dizem é que ele vestia um personagem no Senado, mas, de fato, era outra pessoa. O próprio senador goiano chegou a dizer “não sou mais o Demóstenes”. Precisa mais, para se ter a certeza de que o parecer a ser apresentado hoje será em favor da cassação? Politicamente, neste momento, Demóstenes está liquidado. Digo neste momento porque, como dizia o ex-senador Heráclito Fortes (DEM-PI) ao ver Arruda governador anos depois, “em política, muitas vezes o fundo do poço tem mola”. Vejam aí Fernando Collor, hoje de integrante da CPI. Quem diria…
Entre os senadores, há uma vontade implícita de redenção. Diante de tanta confusão e fios de meada na CPI de Carlos Cachoeira, o pedido de cassação de Demóstenes soará como um “nós somos legais”, ou seja, não estão ali para acobertar A, B ou C. Bem… Pelo menos aqueles que não têm respaldo partidário ou que não foram flagrado contando uma versão a seus pares que não se sustentou. O líder do PMDB, Renan Calheiros, por exemplo, passou por um escândalo envolvendo seu nome. Em nenhum momento, Renan negou que houvesse feito o pagamento de uma pensão alimentícia por intermédio de um amigo, funcionário de uma construtora. Por manter a sua versão — e não a ver desmentida — ficou por ali. Perdeu a Presidência do Senado, mas não a solidariedade da Casa. Com Demóstenes, ao que tudo indica, não será assim. A partir de hoje, dizem muitos senadores, é só questão de contar os prazos para que ele seja um ex-senador com tempo para várias garrafas de Cheval Blanc. Vamos aguardar.
Cotas impróprias - EDMAR BACHA
O Globo - 03/05/12
Causou muito impacto a decisão do Supremo Tribunal Federal de considerar constitucional o sistema de cotas para admissão de alunos negros na Universidade de Brasília. A princípio, também fiquei surpreso. Depois, pensei. O Supremo apenas julgou as cotas constitucionais. Por que não o seriam? Desde a Oração aos Moços, de Rui Barbosa, em 1920, a doutrina jurídica brasileira - entronizada na Constituição de 1988 - é que a regra da igualdade consiste em tratar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. "Tratar com desigualdade a iguais, ou desiguais com igualdade seria desigualdade flagrante" e, portanto, inconstitucional, concluiria Rui, como concluíram unanimemente os ministro do Supremo.
Não há dúvida de que as raízes profundas da escravidão deixam os negros em condições inferiores aos brancos para competir pelas vagas nas universidades públicas. Mas será que as cotas são um instrumento apropriado para compensar essa desigualdade educacional?
Como economista e ex-presidente do BNDES, não resisto a uma comparação que me ajuda a raciocinar sobre o problema. Trata-se do requisito imposto pelo BNDES a todas as empresas que financia. Elas têm que comprar pelo menos 65% de seus insumos de fabricantes nacionais. Lembro-me que, quando fui presidente da instituição, quis acabar com essa cota discriminatória - e o mundo quase desabou sobre minha cabeça! Queria acabar com as cotas do BNDES não porque as achasse inconstitucionais, mas porque as achava inapropriadas. Com a roupagem elegante de promoverem a indústria nacional, o que fazem é garantir a permanência de monopólios e ineficiências na provisão de insumos industriais, aumentando o chamado custo Brasil. Economistas são capazes de desenhar mecanismos alternativos para ajudar temporariamente indústrias nascentes a ganharem escala e produtividade, sem a necessidade de cotas discriminatórias.
Assim também raciocino no caso das cotas da UnB. Reconheço os efeitos da desigualdade sobre a capacidade de entrada do negros na universidade. Admito que, se conseguissem entrar, muitos poderiam, ao longo dos quatro, cinco anos de estudos superiores, superarem as diferenças iniciais e se tornarem profissionais altamente produtivos. O ponto, entretanto, é que as cotas não identificam adequadamente aqueles que precisam de um "empurrãozinho" inicial, dado o ponto de partida ruim de que foram vítimas, para chegarem com sucesso à reta final. Melhor do que as cotas seria um sistema - à semelhança daquele adotado pela Universidade de Campinas desde 2005 - de dar um bônus na nota dos exames de admissão para os que se apresentam ao vestibular com deficiências educacionais, que herdaram por sua condição social desprivilegiada.
As cotas para negros não são, assim, o melhor meio de minorar a desigualdade educacional. Independentemente da cor, as pessoas têm diferentes oportunidades educacionais que não são resolvidas pelas cotas. No entanto, poderia argumentar-se que, além da desigualdade educacional, negros sofrem discriminação, e isso coloca empecilhos adicionais a seu desenvolvimento pessoal e educacional. Mas essa discriminação é racismo. E racismo é uma prática que constitui crime inafiançável e imprescritível em nossa Constituição, sujeita à pena de reclusão. Racismo se combate com o antirracismo. Introduzir a variável raça como critério de política pública não é praticar o antirracismo. Ao contrário, é legitimar um critério racial que não corresponde à nossa ambição como sociedade de assegurar os direitos civis para todos.
A guerra de Dilma. E a de Hollande - CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP - 03/05/12
O socialista francês politiza o combate que a brasileira prefere limitar à tecnicalidade
PARIS - Já têm algo em comum duas personalidades tão diferentes como Dilma Rousseff e François Hollande, o líder socialista francês que as pesquisas dão como vencedor das eleições de domingo.
Ambos estão em guerra com a banca. Está bem que Gilberto Carvalho, o secretário-geral da Presidência, diga que "não se trata de guerra", mas de "convencer o sistema financeiro de que cada um tem que dar sua cota para que o Brasil sobreviva num momento de crise".
Retórica à parte, é guerra, sim, senhor. Hollande nem trata de disfarçar: é guerra mesmo. Logo que se tornou candidato, deixou claro que seu "verdadeiro inimigo" é o sistema financeiro, que "não disputa eleições, mas governa".
A diferença entre a guerra de Dilma e a de Hollande se deve acima de tudo ao jeito de ser de cada um. Hollande é um animal político por excelência e, por isso, politiza o combate. Politizou-o, ademais, ao lado de dois outros líderes da social-democracia europeia, o alemão Sigmar Gabriel e o italiano Pierluigi Bersani, secretário-geral do Partido Democrático.
"Não aceitaremos que as finanças escapem ao controle da política", afirmaram os três quando se encontraram em janeiro.
Dilma, menos política e mais gerente, prefere circunscrever sua guerra à tecnicalidade dos juros, item relevante, mas que nem remotamente abarca a totalidade do confronto política-banca tal como colocado por Hollande e seus pares.
Se Dilma acha que o problema dos juros obedece a uma "lógica perversa", está dando a ele uma dimensão que deveria ir além da tecnicalidade.
É o que Hollande promete fazer: aumentar 15% o imposto que grava os lucros das entidades financeiras; obrigar os bancos a separar suas atividades tradicionais (captar dinheiro do público e emprestá-lo) de suas operações especulativas; proibir de forma expressa os produtos financeiros ditos "tóxicos" (grandes responsáveis pela crise de 2008); impedir que os bancos francesas tenham atividades em paraísos fiscais; e regular os bônus obscenos que recebem os executivos do setor.
Ou seja, o socialista francês não está seguindo o conselho do social-democrata Fernando Henrique Cardoso que disse à coluna Mercado Aberto desta Folha: "Tem de ir com jeito. Não pode encurralar o sistema financeiro".
Uma cautela que é o exato inverso da posição da social-democracia europeia, resumida na frase "não aceitaremos que as finanças escapem ao controle da política".
Pode parecer bravata, mas pôr efetivamente em prática a promessa é vital para a Europa e para a higidez econômica global. Não dá para esquecer que a crise de 2008 nasceu dos excessos do sistema financeiro e que sua fase atual na Europa -caracterizada pela preocupação com a dívida de tantos países- se deve precisamente ao fato de que os governos, tão criticados sempre, tiveram que socorrer a banca/setor privado, endividando-se até o pescoço por isso (exceto no caso da Grécia, que é outra história).
Tudo somado, Dilma deve estar torcendo para a vitória de Hollande, seu evidente aliado na guerra à "lógica perversa".
Ministro sem agenda - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 03/05/12
Cuidar do partido, não do Ministério, foi o primeiro objetivo anunciado pelo novo ministro do Trabalho, Brizola Neto, logo depois de confirmada sua escolha pela presidente Dilma Rousseff. "O fundamental é a unidade do partido e acabar com qualquer tipo de insatisfação", disse o pedetista que acabara de ser chamado para um posto no primeiro escalão do governo. "Não teremos grandes dificuldades para seguir o projeto de unidade do partido", assegurou. Projeto de governo, se existe algum, deve ser menos importante - tão irrelevante, de fato, quanto qualquer projeto ou plano de trabalho para o cargo.
Um dia depois, em seu primeiro discurso numa festa de Primeiro de Maio, o novo integrante da equipe federal confirmou, para quem ainda tivesse alguma dúvida, a pobreza de suas ideias e propostas para a ação ministerial. Mas seu evidente despreparo combina perfeitamente com o critério adotado para o preenchimento de vagas no primeiro nível da administração.
A presidente Dilma Rousseff pode ter desagradado a uma parte do PDT, mas foi fiel ao padrão de loteamento do governo. Manteve o Ministério do Trabalho sob a chefia do partido, reservando-se apenas a prerrogativa de escolher um nome. Respeitou também o ritual de dar satisfação ao comando partidário. Antes de tornar pública a nomeação de Brizola Neto, conversou em seu gabinete com o presidente do PDT, o ex-ministro Carlos Lupi. Defenestrado quando sua posição se tornou insustentável pelo acúmulo de denúncias, ele só deixou o governo depois de muito esperneio. Mas a presidente, apesar disso, julgou adequado prestar-lhe contas de sua escolha, como se a sua condição de líder pedetista o qualificasse para essa deferência, ou, mais que isso, para sancionar uma decisão presidencial.
Assim, a presidente Dilma Rousseff mantém incólume o sistema de loteamento da administração federal entre os partidos da base governista. Respeitou esse critério nas trocas anteriores de ministros, em geral motivadas por escândalos inaceitáveis, e nunca deixou de prestar homenagem às siglas da coalizão governamental.
Continua, portanto, agindo como se a nomeação de ministros não fosse um ato de responsabilidade exclusiva da Presidência, mas uma faculdade partilhada com os componentes da base governista. Por isso ainda tem sentido, em termos práticos, classificar este ou aquele Ministério como integrante da "cota presidencial". No Brasil, quem chefia o governo e é o responsável máximo pela gestão pública tem cota para nomeação de ministros e até de dirigentes de agências reguladoras e de estatais.
Nessas condições, a qualidade e os objetivos da administração pública se tornam irrelevantes para quem participa do banquete do poder - assuntos menores tanto para os partidos quanto para a Presidência. A presidente Dilma Rousseff pediu ao novo ministro do Trabalho uma "agenda positiva", segundo se informou logo depois de confirmada a escolha. Não houve menção ao conteúdo da agenda nem a programas e projetos. Uma agenda é positiva, na concepção corrente em Brasília, quando favorece a imagem do governo. Se contribui ou não para a solução de grandes problemas e para o desenvolvimento é questão secundária.
O discurso do novo ministro, em São Paulo, comprova essa percepção. Foi um palavrório vazio, sem qualquer ideia mais significativa do que a promessa de abrir uma discussão sobre a semana de trabalho de 40 horas. Sobre a manutenção de direitos trabalhistas ele não foi além de generalidades, próprias de quem não tem o que dizer.
No mesmo dia, em São Bernardo do Campo, o prefeito Luiz Marinho, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente da CUT, dedicou-se a questões concretas, recomendando ao novo ministro a retomada dos programas de qualificação e treinamento. "Temos vagas em aberto e pessoas em busca de emprego, o que sugere a falta de qualificação", disse Marinho. Questões como essa estão na pauta de empresários, sindicalistas e estudiosos do mercado de trabalho há alguns anos. Esse e outros problemas concretos comporiam uma boa agenda para um ministro, se ele tivesse sido nomeado por seus méritos administrativos, e não por ser neto do antigo guru da presidente da República.
Juros! A Dilma tá injuriada! - JOSÉ SIMÂO
FOLHA DE SP - 03/05/12
Agora entendi por que a Hillary falou que as filas do visto iam diminuir! Ela já conhecia o nosso Waterfall!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! OBA!
Tá tendo farra de vistos para os Estados Unidos! "Deputado usou cargo para agilizar vistos para grupo de Cachoeira."
Já imaginou a farra? "Qual família vai à Disney?". "A minha! A minha!". "Quem vai para Las Vegas?". "Eu! Eu aqui, ó!".
E o deputado falando para a mulher: "Querida, o visto da sua mãe fica para a próxima!". Sogra sempre vai por último. Sogra eles mandam para um cruzeiro na costa da Somália. Rarará!
Eu também quero visto! Vou pedir para o Cachoeira visto e VIP LOUNGE. Nada de barra de cereal! E só quero visto para Las Vegas se tiver incluso um show da Cher! Pronto: visto, VIP lounge e show da Cher! Rarará!
E naquele "surreality show", "A Fazenda", a drag Nany People perguntou para a Geisy Arruda: "Já conhece a Disney?". "Não.". "Mas tem visto?". "Tenho visto na TV."
Cachoeira, providencia um visto para a Geisy Arruda! Urgente! E agora eu entendi por que a Hillary falou que as filas do visto iam diminuir! Ela já conhecia o nosso Cachoeira, o Waterfall!
E esta mais bombástica: "Dilma ataca bancos". Quando eu li esta manchete "Dilma ataca bancos", quase desmaiei! Meteu o pezão na porta? Imaginei os gerentes dos bancos abraçados tremendo e a Dilma, a pitbúlgara dilaceradora de vísceras, invadindo com três porretes em cada mão!
A Dilma tá injuriada. Só fala em juros! Injuriada com os juros! E os juros do cheque especial estão tão altos que devia se chamar cheque ESPACIAL!
E sabe como os bancos declinam o verbo jurar? Eu juros, tu te ferras e nós escorchamos! Rarará!
E todo mundo agora fala em juros. Juros virou papo de boteco. Juros e futebol!
É mole? É mole, mas sobe!
O BRASILEIRO É CORDIAL! Olha esta placa num self-service em São Paulo: "Proibido fumar! Não mete o dedo na carne!". Rarará!
E esta num portão no interior do Rio: "No Parking! Ligo pro reboque!". Rarará!
E esta direto de Cascavel, Paraná: "Festa do trabalhador com 17 toneladas de costela". Como era o nome do assador do churrascão? Paulo Picanha! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO
FOLHA DE SP - 03/05/12
Demanda de energia fica estável na indústria
O crescimento do consumo industrial de energia ficou estacionado em março, de acordo com o indicador da gestora de energia Comerc Gestão.
Houve uma discreta elevação de 0,48% no consumo, quando comparado com o mês anterior.
O resultado reflete as dificuldades da indústria em ganhar competitividade, além dos impactos provocados pelo câmbio desfavorável e pela desindustrialização, segundo Cristopher Vlavianos, presidente da empresa.
"O aumento do consumo foi tímido. Alguns setores sofrem mais. E o governo já está atento ao que isso representa no setor industrial", afirma o executivo.
Na comparação com o mesmo mês do ano passado, a redução foi de 0,59%. Sete dos 15 setores analisados pelo levantamento da Comerc registram queda do consumo de energia em suas operações. As indústrias de alimentos, mineração e higiene e limpeza estão entre as de variação negativa no mês.
No grupo dos que tiveram crescimento, os resultados foram considerados modestos. A variação foi positiva para os setores têxtil, eletroeletrônicos, eletromecânica e embalagens.
O setor de material para a construção civil apresentou consumo 13,34% mais elevado no período.
"Para este segmento, março costuma mostrar crescimento devido à retomada de muitas obras. É quando as atividades esquentam", afirma Vlavianos.
marketing adiado
Já tem gente adiando planos de investimento em marketing esportivo para Copa e Jogos Olímpicos. Cerca de 15% dos gestores de marketing ouvidos em pesquisa da Amcham (Câmara Americana de Comércio) informam estar postergando projetos em razão do descumprimento de prazos de construção de estádios e de infraestrutura.
Outros 3% afirmam começar a revisar seus planejamentos. Mais de 80% dos gestores de marketing dizem, porém, que os atrasos no cronograma das obras ainda não têm levado a uma revisão da estratégia. Quase 70% têm planos de elevar os aportes nesse tipo de marketing nos próximos anos.
Fiscalização O Inmetro vai fazer entre 7 e 11 de maio a Operação Especial Dia das Mães no país para verificar, em produtos têxteis femininos, o cumprimento da exigência de informações obrigatórias, como dados do fabricante ou do importador, país de origem e outros -tudo em português.
Retomada O índice de confiança do comércio do Estado do Rio subiu 1,4% em março ante o mesmo mês de 2010. O ICC passou para 140,1 pontos. Foi o maior nível já apurado para o índice em um mês de março.
Boleia A Mercedes-Benz anuncia hoje a venda de 86 caminhões extrapesados Actros para a Coteminas.
compra alemã
A propensão a comprar na Alemanha caiu 11 pontos em abril. Segundo índice da empresa de pesquisas GfK, passou de 38,6 para 27,6 (em escala que varia de -100 a 100).
A expectativa de aumento dos preços e a tendência a economizar, por causa da preocupação com a crise, são apontados como responsáveis pela retração.
No Reino Unido, a confiança do consumidor permaneceu em -31 pontos.
Há um ano, o indicador flutua entre -29 e -31. Não há sinal de que a confiança irá melhorar no futuro próximo, de acordo com a empresa.
Marcação cerrada - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 03/05/12
PSDB sai em defesa de Leréia
Os tucanos estão divididos. Os partidários do senador Aécio Neves (PSDB-MG) acham que é preciso se livrar do deputado Carlos Leréia (PSDB-GO), por suas relações com o contraventor Carlos Cachoeira. Os aliados do governador Marconi Perillo (PSDB-GO) pressionaram para que Leréia pedisse licença do partido. Leréia rejeitou a proposta. Diante disso, o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), e o líder na Câmara, Bruno Araújo (PE), decidiram bancar Leréia. “Nós temos confiança de que ele será bem-sucedido”, disse Guerra. “A prudência manda que os colegas o ouçam”, complementou Bruno Araújo.
"O que a população quer saber é quando vamos ouvir os bandidos” — Fernando Francischini, deputado (PSDB-PR), na reunião que marcou para 15 de maio o depoimento do contraventor Carlos Cachoeira
A CRUZADA. A presidente Dilma incorporou o discurso do ex-vice José Alencar e vai fazer uma campanha pela redução dos juros. Ela pretende manter os banqueiros sob pressão. Hoje ela vai voltar ao tema junto às centrais sindicais e aos grandes empresários do país. Sua intenção é que essas entidades e personalidades se associem a essa cruzada, que os estrategistas consideram fundamental para o crescimento da economia.
Sinal dos tempos
Em outros tempos, o senador Demóstenes Torres (GO) não pensaria duas vezes ao entrar numa reunião de CPI. Ontem, indo em direção ao plenário do Senado, passou reto e rápido pela sala onde ocorria a reunião da CPI do Cachoeira.
PT dividido
Uma ala do PT queria que fossem marcadas ontem as datas para os governadores comparecerem à CPI. Os mais brandos levaram. Sugeriram que o relator, Odair Cunha (PT-MG), esperasse pelos sigilos bancário e telefônico de Cachoeira.
Trabalho: uma pasta desidratada
Ao assumir hoje, o ministro Brizola Neto vai encontrar um Ministério do Trabalho enfraquecido. O Pronatec foi para o MEC. Condições de trabalho na indústria da construção e na da cana-de-açúcar, desoneração da folha e a alteração na legislação para os domésticos estão em debate na Secretaria-Geral da Presidência. O governo ainda pode transferir o FAT para a Fazenda e criou no Planejamento a Secretaria de Relações de Trabalho.
Aerocachoeira
Numa conversa telefônica, em 2 de maio de 2011, sobre uma viagem de urgência, o diretor da Delta no Centro-Oeste, Cláudio Abreu, sugere ao contraventor Carlos Cachoeira: “Nós temos que comprar um avião para nós, bicho!”
Rebuliço
Agitação no Pará. Foi parar no YouTube a gravação de uma conversa telefônica do deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA) com uma namorada. O parlamentar a pressiona a praticar um crime: aborto. E diz que não tem como bancar um filho.
UM GRUPO de parlamentares do governo e da oposição está criando uma frente para evitar que os petistas e o senador Fernando Collor (PTB-AL) usem os trabalhos da CPI para atacar a imprensa.
ACORDO. O secretário-executivo do Ministério do Trabalho, Paulo Pinto, ligado ao ex-ministro Carlos Lupi, vai permanecer na pasta e deve ser nomeado para ocupar um cargo relevante.
O PRESIDENTE da Vale, Murilo Ferreira, recusou convite da Comissão de Direitos Humanos da Câmara para audiência pública. Ela iria tratar da criação de fundos sociais comunitários da mineração.
O fim da era Lula na economia - TONY VOLPON
Valor Econômico - 03/05/12
Acabou a mais recente "época de ouro" da economia brasileira? Depois de dez anos de desempenho surpreendente, há hoje muitas dúvidas sobre as perspectivas para os próximos anos. O governo certamente não concordaria com qualquer avaliação mais pessimista, mas o recente frenesi de medidas mostra que os ocupantes de Brasília estão preocupados.
A preocupação com o crescimento não é novidade. Desde agosto do ano passado o Banco Central (BC) tem proporcionado estímulo monetário; e a, na época, muita criticada decisão de iniciar um ciclo de cortes de juros agora parece acertada.
A estratégia adotada naquele momento foi bastante ortodoxa, enfatizando o afrouxamento monetário com política fiscal austera. Mas, recentemente, temos assistido a uma quase avalanche de medidas pontuais, direcionadas aos dois setores que mais preocupam: indústria e o mercado de crédito. O governo parece finalmente entender que o Brasil enfrenta fatores estruturais e domésticos que impedem um crescimento mais vigoroso. Que esses se manifestarão e foram potencializadas durante uma severa crise internacional não deveria ser nenhuma surpresa: deficiências estruturais sempre ficam mais evidentes em momentos de piora conjuntural.
Novo paradigma de crescimento tem que mudar a relação investimento, consumo e poupança
Os problemas da indústria têm sido explicados basicamente pela valorização contínua do real nesses últimos anos, mas essa é uma explicação parcial. Comparando os períodos pré e pós-crise, vemos que antes da crise, e apesar da forte valorização cambial, a indústria estava em franca expansão e investindo pesadamente. Depois da crise a história é outra, com fraco desempenho, baixos investimentos e queda de produtividade. A razão para esse desempenho distinto se encontra não nos movimentos do dólar, mas sim em dois fatores do período pós-crise.
Primeiro, enfrentando um mundo com baixo crescimento, as grandes potências industriais hoje varrem o globo procurando onde vender e acharam um mercado convidativo no Brasil. Isso na verdade não tem nada a ver com o mercado cambial, sendo um ajuste esperado nos competitivos mercados de bens internacionalmente transacionáveis.
O segundo fator que tem debilitado a nossa indústria tem sido o aumento contínuo no custo da mão de obra. De fato percebemos que o aumento do custo unitário de trabalho acelerou no período pós-crise. Forçado a contratar em um mercado de trabalho apertado pela demanda do setor de serviços e políticas salariais expansionistas, a indústria perdeu a corrida entre aumento de custos e produtividade. Mais do que uma "guerra cambial", o Brasil enfrenta e perde uma "guerra laboral".
Encarando a fortíssima concorrência de um lado e o aumento da folha de pagamento do outro, a indústria vê suas perspectivas piorarem e, por instinto de sobrevivência, corta custos, incluindo investimentos. Isso coloca a indústria em um círculo vicioso e autodestrutivo dado o impacto que isso tem sobre sua produtividade.
Igualmente preocupante é a dinâmica no mercado de crédito. Aqui o problema é claro: o ainda altíssimo custo na ponta do tomador. Depois de cair por muito tempo, o custo do crédito ao consumidor tem ficado relativamente estável desde 2009. É verdade que o sistema enfrenta o aumento da inadimplência nesse momento. Apesar das condições favoráveis do mercado de trabalho, o consumidor chegou ao limite prudente de endividamento. Empurrar mais crédito goela abaixo da pessoa física não vai resolver nada.
A questão da indústria e do mercado de crédito mostra que o que podemos chamar de "modelo Lula" de crescimento chegou a sua exaustão. Esse modelo procurou acelerar e multiplicar os ganhos de riqueza que começaram dez anos atrás com a forte alta de preço das nossas exportações devido ao crescimento espetacular da China. Os mecanismos foram privilegiar ganhos salariais e o aumento do crédito, assim expandindo a renda e o consumo. Por muitos anos o modelo teve sucesso exemplar, mas fica evidente que nos próximos anos os resultados não serão os mesmos.
Das medidas anunciadas até agora pelo governo algumas, como desoneração da folha, vão na direção certa, e outras, de cunho protecionista, na direção errada. Mas o seu conjunto, e nisso incluímos a queda na taxa de juros e a alta do dólar pela atuação do BC, nos parece insuficiente para mudar a dinâmica estrutural negativa que enfrentamos. Elas podem somente se justificar como uma ponte para mudanças mais profundas, porque o que precisamos é efetivamente um novo modelo.
O que poderia ser um novo modelo? Acreditamos que qualquer novo paradigma de crescimento tem que mudar de forma significativa a relação investimento-consumo-poupança. Basicamente continuamos a investir e poupar pouco e consumir muito, e há sim uma escolha a ser feita nessa relação: nem todo o consumo "puxa" investimento e poupança.
Para tal nossa política econômica tem que caminhar em duas direções novas. Primeiro temos que parar de querer sempre redobrar a aposta que mais consumo resolve tudo. Também temos que parar de confundir crédito com poupança. A falência do modelo atual reside essencialmente na triste verdade que uma ênfase exagerada em aumentar a demanda pode destruir a oferta. Menos consumo e mais produtividade deve ser o novo mantra.
Segundo, temos que identificar novas fontes de poupança doméstica. Está mais do que claro que a estrutura do nosso Estado de bem-estar social milita contra a formação de poupança doméstica. Devemos, politicamente, debater até que ponto vale a pena a troca entre crescimento e segurança social. Mas devemos também perceber que ainda existe dentro da economia um agente que poderia contribuir com mais poupança: o próprio Estado. Diminuído seu consumo e assim liberando recursos para investimentos públicos e privados, o Estado poderia dar forte contribuição para levar a economia a um novo equilíbrio. Tal mudança pode, a nosso ver, ser feita sem comprometer os avanços sociais desses últimos anos. Basta nossos governantes terem vontade e visão política para tal.
ALBERTO TAMER - Naufrágio europeu
O Estado de S.Paulo - 03/05/12
O desemprego na zona do euro chegou a 10,9%, a produção industrial desaba e mais países entram em recessão em consequência da severa política de ajuste fiscal sem qualquer incentivo ao crescimento. E ninguém faz nada. Ao contrário, diz o Nobel de Economia, Paul Krugman, os políticos europeus estão fazendo tudo para piorar: "É o suicídio da Europa".
Outro Nobel, Joseph Stiglitz, concorda. Para ele, austeridade fiscal sem incentivo ao crescimento "é o caminho do suicídio". Ele até ironiza, "nunca houve antes um programa de austeridade tão bem-sucedido...."
Os políticos europeus insistem que é preciso, primeiro, mais ajuste fiscal para superar a crise da dívida, mas esquecem que ninguém investe em economias em recessão. Os investidores privados se desfazem de títulos soberanos, fogem para países mais seguros.
Insanidade. "Tudo isso é muito insano," diz Krugman. Todos concordam. Aumentar impostos, cortar salários e gastos em economias deprimidas levam a déficits orçamentários e à deflação e aumentam o peso da dívida, exatamente o que os políticos europeus estão fazendo.
É grave? Sim. Gravíssimo porque a Europa não afunda sozinha. Dados oficiais mostram que ela representa 25% do PIB e 20% do comércio mundial. Isso explica por que o FMI reduziu a previsão de crescimento mundial para apenas 3,3%, este ano, puxado por uma recessão na zona do euro, menos 0,5%. Pode ser pior porque nada está sendo feito.
Mas a Alemanha mudou! Parecia, sim, mas não mudou. Diante de tanta pressão, Angela Merkel, a "xerife"da zona do euro, deu sinais, no sábado, que a Alemanha ia mudar. Afirmou que a União Europeia estava preparando uma agenda de crescimento. Mas três dias depois, seu ministro de Finanças, Wolfgang Schaeuble, desmentiu tudo e a Comissão Europeia concordou: não há nenhum plano nem estudo para garantir o crescimento na zona do euro. A prioridade continua sendo a consolidação fiscal, pois sem isso não há crescimento "sustentado".
Humor negro. Merkel e seu ministro falam em atrair investimento privado para o pouco ativo e menos capitalizado ainda Banco Europeu de Investimento, tão importante que ninguém se lembrou dele até agora. Deve ser humor negro, pois esse banco, constituído por capital privado e dos governos europeus, esteve recentemente com a nota de crédito ameaçada. Tem um capital de 50 bilhões e está atrasando liberações para os países atingidos pela crise.
Diante disso, o Parlamento Europeu aprovou projeto para alterar as regras. Os recursos do banco haviam sido usados para comprar títulos dos países em crise. Talvez seja isso a que Merkel se referia ao falar em "flexibilizar o uso dos recursos do banco", e aumentar em mais 10 bilhões seus recursos que, atentem, são captados em sua maior parte no mercado de capitais.
Ainda bem que o Brasil está se protegendo muito bem. Reservas crescentes, recursos líquidos trilionários no Banco Central e no Tesouro, equilíbrio fiscal, contas ajustadas, dívida sob controle e incentivo ao crescimento. Exatamente tudo que os europeus se recusaram a fazer.
Faust moderno - CONTARDO CALLIGARIS
FOLHA DE SP - 03/05/12
O sentimento é frequente, em adolescentes e adultos, de ter vendido a alma, de ter traído a si mesmos
Faz tempo que sonho em escrever e montar um "Faust". A peça aproveitaria as ideias das melhores versões do mito, desde as de Christopher Marlowe e de Goethe até a mais recente, que está em cartaz em São Paulo, no Sesc Santana: "Fogo-Fátuo", de Samir Yazbek (coautoria de Helio Cicero e montagem bonita de Antônio Januzelli).
Numa hora intensa, inteligente e, às vezes, francamente engraçada, a peça apresenta o encontro entre um Faust escritor em crise (disposto talvez a vender sua alma) e um Mefisto que se pergunta qual função ainda tem o diabo num mundo em que os homens não precisam dele para fazer o pior. Se você estiver em São Paulo ou passar por aqui até 27 de maio, confira como Faust e Mefisto encontram uma solução original aos males de ambos.
Volto ao meu sonho. Por que a história do homem que vende sua alma ao diabo me parece ser um mito crucial da modernidade?
Só topo vender a alma em troca de sucesso em minhas empreitadas terrenas se meu breve tempo de vida for, para mim, mais importante do que a eternidade no céu. Ou seja, Faust, para assinar o pacto, deve ser, se não ateu, suficientemente agnóstico para se preocupar mais com os homens do que com Deus.
Paradoxo: a aparição de Mefisto, interessado em comprar minha alma, confirma indiretamente a existência de Deus e torna o contrato impossível: eu venderia a alma ao Diabo à condição de não acreditar realmente nem na alma nem no Diabo.
Várias soluções desse paradoxo são possíveis. Será que Mefisto se daria o trabalho de oferecer mares e montes a Faust só pelo prazer de lhe infligir as penas do inferno? Talvez Mefisto compre almas não para aumentar o rebanho dos pecadores (para isso, mal é necessário pagar), mas para alistar novos diabos. E ser diabo, mesmo de segunda linha, pode ser uma séria tentação.
Outra possibilidade é que Faust seja um vigarista, capaz de enganar até Mefisto. Já ao assinar o pacto, ele saberia que Mefisto será privado de sua "justa" recompensa: bastará, para isso, que Faust se arrependa, na última hora.
De qualquer forma (nisto concordo com o Mefisto de Yzbek), o Faust que frequenta hoje os consultórios dos psicoterapeutas não precisa de diabo. Explico.
Hoje (mas a observação já começa a valer na época romântica, quando Goethe escreve seu "Faust"), o sentimento é frequente, em adolescentes e adultos, de ter vendido a alma, sem que por isso Mefisto tenha tentado comprá-la.
Diante de qualquer sucesso (inclusive nosso) agimos como se fosse coisa de empreiteira de obras públicas: levantamos a suspeita de que foi o fruto da venda da alma de quem se deu bem. Se conseguimos algum conforto (mesmo espiritual), é porque a gente se vendeu: traímos a nós mesmos.
Temos um casamento feliz? É porque renunciamos a procurar o amor de nossa vida. Somos prósperos? É porque topamos aquele emprego, em vez de tentar empreender por nossa conta. Temos paz de espírito? É porque desistimos de procurar a pedra filosofal -que era a única coisa que nos importava de verdade.
O Faust de hoje já vendeu sua alma: ele vive com o sentimento de que seu sucesso, por modesto que seja, custou-lhe a renúncia à sua vocação, ao seu desejo, ao seu ser.
As más línguas dirão que preferimos parecer covardes e vendidos a fracassarmos por incompetência na tentativa de realizar "nosso desejo". "Desisto da procura do Santo Graal para que meus filhos possam comer a cada dia" soa muito melhor do que "desisto porque cansei ou não sei procurar direito".
Mas não é só isso: o desejo, na nossa cultura, aparece quase sempre como uma coisa da qual desistimos, que fugimos, que reprimimos, ao menos em parte.
Claro, Freud tem razão: a vida em sociedade exige repressão e renúncias. Mas talvez a sensação constante de ter traído nosso desejo (sabe-se lá qual) expresse sobretudo a nostalgia de um mundo passado, em que era mais fácil saber quem éramos e por que estávamos no mundo.
Cada vez mais, somos livres para inventar nossas vidas. E o preço inevitável dessa liberdade é nossa indefinição. "Quem sou eu? Veremos: o futuro mostrará de que sou capaz." Quando o futuro chegar, a pergunta mudará: "Tudo bem, fiz isso e aquilo, até que me dei bem, mas será que fiz mesmo o que eu queria? Será que preenchi todo meu destino?".
Pois é, amigo, nunca vamos saber. Pois, justamente, o destino estava escrito naquela alma que a gente vendeu.
À beira da traição - JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SP - 03/05/12
O jogo de desgastes é essencial aos partidos, seja no conceito com o governo, seja na rinha eleitoral
O SIGILO do que já está ou logo será público, nas atividades centradas em Carlinhos Cachoeira, e a proteção a políticos sujeitos à convocação para depor -é disso que mais se ocupa a maioria da CPI. Na sala de reunião, nos telefones, na internet e, por certo, nos gabinetes e corredores.
A CPI está minada por coniventes com os incluídos no que deve ser esclarecido. E, a prevalecer tal ambiente, logo os coniventes passarão a agentes infiltrados, também conhecidos por traidores. No caso, traidores da CPI, do mandato e do seu eleitorado.
A fúria com que o senador Fernando Collor se bate pelo sigilo do inquérito policial, mandado em cópia à CPI pelo Supremo Tribunal Federal, só se explica por motivações emocionais. Não se inclui, portanto, naquelas condutas comprometedoras. Mas nem por isso se distingue das demais na incapacidade de anular o argumento, tão sucinto quanto agudo, do deputado Miro Teixeira: "O sigilo só beneficiaria os culpados".
A esperança dos defensores do sigilo é frágil, além do mais. É improvável que o Supremo Tribunal Federal, ao se ocupar do inquérito, não dê conhecimento do seu teor à população.
Muitos dos citados são eleitos e serão candidatos, e não seria justo deixar os inocentes sem tal reconhecimento público. Como seria injusto com o eleitorado o silêncio sobre os nomes dos culpados.
Com o STF, ainda há a Procuradoria-Geral da República. Seu chefe, Roberto Gurgel, está posto por vários parlamentares (e outros) como suspeito de esconder, por dois anos, a primeira parte do inquérito sobre Cachoeira & cia.
Em vista disso, sua conveniência é a de pedir a quebra do sigilo judicial e, ele próprio, abrir tudo e ir até onde consiga, atrás de constatações e comprovações.
O PT, o PMDB, o PSDB, o DEM, o PP, o PR, e ainda mais letras, estão todos no prontuário de Cachoeira. Por via telefônica ou por ação direta. Podem acobertar-se todos? Podem todos guardar silêncio uns sobre os outros?
Só se não houvesse as disputas regionais, mais encarniçadas com a proximidade das eleições municipais. O jogo de desgastes e desmoralizações é essencial aos partidos e aos grupos, seja no conceito junto ao governo, seja na rinha eleitoral.
É para reduzir o desgaste que o PT abandona o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, ao destino que tenha cavado. E o PMDB se debate para negociar uma armadura em volta do governo fluminense e do governador Sérgio Cabral. O qual, aliás, não facilita nada a intenção dos colegas e de parte do PT.
A mais recente criação do esforço peemedebista é argumentar que a exposição de Cabral na CPI enfraqueceria Eduardo Paes na busca da reeleição de prefeito. Mas tudo indica que Eduardo Paes, com o conceito alcançado, tornou-se mais importante para Cabral do que Cabral para Paes.
Apesar de tudo o que favoreça a CPI, os propósitos mais ativos ali, até agora, são nitidamente ruins ou são enganosamente aceitáveis. Mas a definição dos rumos não tem como tardar muito.
Som de Guizos - CELSO MING
O ESTADO DE S. PAULO - 03/05/12
Em meio a uma economia global prostrada pela recessão e pelo desemprego, a retórica da ênfase ao crescimento econômico ganha corpo - e cada vez mais apelo político. Bem mais complicado é definir o que fazer para transformar palavras, apostas e voluntarismo em resultado.
Quem quer substituir as dolorosas políticas de saneamento e austeridade pelos programas de crescimento econômico, especialmente na Europa, vem apresentando algumas propostas nessa direção.
A primeira é trocar o corte das despesas públicas e dos salários por investimento. De onde tirar os recursos para isso é que são elas. Na Europa, há o sempre mencionado Banco Europeu de Investimento, que conta com 200 bilhões de euros em recursos, ninharia para o tamanho da empreitada. Apenas uma empresa brasileira, a Petrobrás, tem investimentos programados quase nas mesmas proporções (172 bilhões de euros) até 2015.
Outra fonte são os financiamentos bancários. Mas é cada vez menor o interesse das instituições financeiras em despejar dinheiro em economias superendividadas, mais e mais sujeitas a calotes soberanos. Afora isso, grande número de bancos na Europa sofre de grandes desarranjos financeiros. Precisam urgentemente de reforço de capital. Por isso, já não conseguem aumentar suas operações de crédito.
Há, também, a sugestão recorrente da elevação de impostos, sobretudo sobre os ricos e sobre os bancos. O candidato socialista à presidência da França, François Hollande, por exemplo, avisou que vai puxar para 75% a alíquota do Imposto de Renda a ser cobrada dos que ganham mais de 1 milhão de euros por ano. Mas reconhece que vai atingir apenas 3 mil pessoas, se antes disso esses não tiverem transferido seu patrimônio para o exterior. A criação do Imposto sobre Transações Financeiras, uma espécie de IOF que atingiria determinadas operações bancárias, parece impraticável. Seria necessário que toda a Europa adotasse a novidade. E os principais centros financeiros não querem perder mercado para Nova York, Hong Kong ou, até mesmo, para Londres. Ademais, aumento de impostos numa economia em recessão parece contrassenso.
Diante das dificuldades ou impossibilidades anteriores, aumenta o clamor de que o Banco Central Europeu (BCE) feche os olhos para meia dúzia de cláusulas contratuais e se ponha a emitir moeda que se destine à compra de títulos públicos e, nessas condições, financie o crescimento com mais inflação. Essa é uma possibilidade reiteradamente negada, mas não inteiramente descartada - principalmente se a iminência de uma catástrofe não deixar outra opção. Mas, como diz o Salmo 41/42, "todo abismo chama outro abismo". E o abismo das emissões de moeda é particularmente perigoso - e não apenas porque os alemães têm ojeriza de inflação. Se for para cobrir rombos fiscais, para quanto o BCE terá de expandir seu balanço para além dos 3 trilhões de euros que já estão lá nos seus ativos?
Mas não bastaria resolver a questão dos recursos que financiassem a retomada. Mesmo se os políticos conseguissem montar essa equação, seria preciso resolver dois outros problemas.
Um deles é o pânico, fator que acentuaria o tamanho da encrenca. E, outra vez, a ideia é arrancar do BCE o compromisso de despejar recursos ilimitados sempre que um Estado soberano da área do euro apresentasse sinais de suspensão iminente de pagamentos.
Outro ponto é o desequilíbrio. De um lado, estão um ou dois países superavitários (que faturam mais do que gastam com os demais) e, de outro, os deficitários. Na prática, seria preciso arrancar da Alemanha, de economia altamente superavitária, políticas que reduzissem suas exportações e elevassem suas importações. Em outras palavras, seria preciso que a Alemanha se conformasse em perder a competitividade obtida com grande sacrifício de sua gente.
Suponhamos que, afinal, a Alemanha aceitasse deixar de ser formiga, se transformasse em cigarra e passasse a importar compulsivamente. Nesse caso, seria preciso evitar outro risco: o de que essa política beneficiasse não seus parceiros de bloco, mas a China.
Enfim, crescer para sair da crise com base no aumento do consumo é um lindo som de guizos. Seria bom que fosse mais do que isso.
Sem intermediários - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 03/05/12
Além de montar uma rede com inserção em toda a esfera pública, Carlinhos Cachoeira tinha um plano maior: fazer Demóstenes Torres (GO) chegar ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. Para isso, pressionou para que o senador se filiasse ao PMDB.
Em conversa captada pela Polícia Federal, Cachoeira questiona Flávia, mulher de Demóstenes: "Ele já foi para o PMDB, não?". Ela responde citando o líder Renan Calheiros (AL), que agora trabalha para salvá-lo da cassação: "Não, mas o Renan está num amor por ele que está assustando". Cachoeira conclui: "Tem que ir para o PMDB, até pra virar [ministro] do STF, né?".
Big Brother Em outra escuta, Demóstenes desabafa com Cachoeira: "Rapaz, você sabe que eu [sic] tô com uma sensação ruim de que tem alguém me seguindo? Não sei se estou ficando doido, meio maluco, estressado". O empresário o acalma: "Quando chego aí fico olhando e não tem ninguém, não".
Combo Tragada pelo Cachoeiragate, a Delta deve perder cerca de 400 obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) tocadas pelo Dnit. O governo estuda entregar em um "pacotão'' para as maiores construtoras os pequenos projetos de rodovias tocados pela empresa.
Onde pega O governo quer limpar logo os rastros da Delta no plano federal. Mas a proposta de rateio dos contratos esbarra no TCU (Tribunal de Contas da União), que pode orientar o governo a licitar novamente as obras.
Guardanapo... Pela primeira vez desde que seu nome apareceu na crise, o governador Sérgio Cabral (RJ) procurou ontem caciques do PMDB e do PSDB e o vice-presidente, Michel Temer. Preocupado com a repercussão do escândalo, ele pediu a solidariedade dos interlocutores.
... da humildade De um parlamentar peemedebista sobre o gesto de Cabral, considerado um outsider internamente: "Ele desceu do pedestal e veio falar com o partido".
Calendário Um observador da CPI fez a conta: o plano de trabalho proposto pelo relator, Odair Cunha (PT-MG), prevê a desaceleração de sessões e depoimentos em 60 dias, justamente quando começa a agenda eleitoral.
Degola Integrantes do governo afirmam que a saída de Ricardo Flores da Previ ocorrerá até o fim do mês. A briga entre Flores e o presidente do Banco do Brasil, Adelmir Bendine, também deve fazer outra vítima: o diretor do BB Ricardo Oliveira. O Planalto estuda realojá-los.
De saída Escalado para a campanha de Fernando Haddad (PT), o secretário de Regulação do Ensino Superior, Luís Fernando Massonetto, vai deixar o Ministério da Educação. Ex-chefe de gabinete de Haddad, vai coordenar a participação da comunidade acadêmica na elaboração do plano de governo.
Procura-se Aloizio Mercadante (Educação) procura substituto para a secretaria, que regula as relações com as universidades privadas. O ministro quer alguém que tenha formação jurídica.
Barbearia Depois de pagar R$ 500 mil pela barba do governador Jaques Wagner (PT-BA), a Gillette ofereceu R$ 200 mil pelo bigode de Mercadante. Ele recusou sob a alegação de que sua mulher não o deixa mudar o visual.
Por cima O ex-vereador de São Caetano Hamilton Lacerda, que deixou o PT no escândalo dos aloprados, em 2006, e retornou no ano passado, estrela inserções do partido em rádio e TV.
com SILVIO NAVARRO e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"O brasileiro tem o hábito de poupar. Se o governo decidir mexer na caderneta de poupança, gerará insegurança, especialmente aos pequenos investidores."
DO LÍDER DO PSDB NA CÂMARA, BRUNO ARAÚJO (PE), sobre a inclusão de mudanças na remuneração da caderneta de poupança nas medidas econômicas que devem ser anunciadas pelo governo para baixar os juros.
contraponto
Patrulha da moda
Responsável pela divulgação das fotos do governador Sergio Cabral (PMDB-RJ) com Fernando Cavendish na Europa, o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) teve de recorrer à mulher, a ex-governadora Rosinha Matheus, para identificar os caros sapatos que a primeira-dama Adriana Ancelmo exibiu em fotos durante a viagem.
-Eu liguei para Rosinha e disse: tem a sola vermelha e saltos altos, contou Garotinho a jornalistas, ontem.
-É o sapato que a Lady Gaga usa! É um Christian Louboutin, decifrou a ex-governadora.
Além de montar uma rede com inserção em toda a esfera pública, Carlinhos Cachoeira tinha um plano maior: fazer Demóstenes Torres (GO) chegar ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. Para isso, pressionou para que o senador se filiasse ao PMDB.
Em conversa captada pela Polícia Federal, Cachoeira questiona Flávia, mulher de Demóstenes: "Ele já foi para o PMDB, não?". Ela responde citando o líder Renan Calheiros (AL), que agora trabalha para salvá-lo da cassação: "Não, mas o Renan está num amor por ele que está assustando". Cachoeira conclui: "Tem que ir para o PMDB, até pra virar [ministro] do STF, né?".
Big Brother Em outra escuta, Demóstenes desabafa com Cachoeira: "Rapaz, você sabe que eu [sic] tô com uma sensação ruim de que tem alguém me seguindo? Não sei se estou ficando doido, meio maluco, estressado". O empresário o acalma: "Quando chego aí fico olhando e não tem ninguém, não".
Combo Tragada pelo Cachoeiragate, a Delta deve perder cerca de 400 obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) tocadas pelo Dnit. O governo estuda entregar em um "pacotão'' para as maiores construtoras os pequenos projetos de rodovias tocados pela empresa.
Onde pega O governo quer limpar logo os rastros da Delta no plano federal. Mas a proposta de rateio dos contratos esbarra no TCU (Tribunal de Contas da União), que pode orientar o governo a licitar novamente as obras.
Guardanapo... Pela primeira vez desde que seu nome apareceu na crise, o governador Sérgio Cabral (RJ) procurou ontem caciques do PMDB e do PSDB e o vice-presidente, Michel Temer. Preocupado com a repercussão do escândalo, ele pediu a solidariedade dos interlocutores.
... da humildade De um parlamentar peemedebista sobre o gesto de Cabral, considerado um outsider internamente: "Ele desceu do pedestal e veio falar com o partido".
Calendário Um observador da CPI fez a conta: o plano de trabalho proposto pelo relator, Odair Cunha (PT-MG), prevê a desaceleração de sessões e depoimentos em 60 dias, justamente quando começa a agenda eleitoral.
Degola Integrantes do governo afirmam que a saída de Ricardo Flores da Previ ocorrerá até o fim do mês. A briga entre Flores e o presidente do Banco do Brasil, Adelmir Bendine, também deve fazer outra vítima: o diretor do BB Ricardo Oliveira. O Planalto estuda realojá-los.
De saída Escalado para a campanha de Fernando Haddad (PT), o secretário de Regulação do Ensino Superior, Luís Fernando Massonetto, vai deixar o Ministério da Educação. Ex-chefe de gabinete de Haddad, vai coordenar a participação da comunidade acadêmica na elaboração do plano de governo.
Procura-se Aloizio Mercadante (Educação) procura substituto para a secretaria, que regula as relações com as universidades privadas. O ministro quer alguém que tenha formação jurídica.
Barbearia Depois de pagar R$ 500 mil pela barba do governador Jaques Wagner (PT-BA), a Gillette ofereceu R$ 200 mil pelo bigode de Mercadante. Ele recusou sob a alegação de que sua mulher não o deixa mudar o visual.
Por cima O ex-vereador de São Caetano Hamilton Lacerda, que deixou o PT no escândalo dos aloprados, em 2006, e retornou no ano passado, estrela inserções do partido em rádio e TV.
com SILVIO NAVARRO e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"O brasileiro tem o hábito de poupar. Se o governo decidir mexer na caderneta de poupança, gerará insegurança, especialmente aos pequenos investidores."
DO LÍDER DO PSDB NA CÂMARA, BRUNO ARAÚJO (PE), sobre a inclusão de mudanças na remuneração da caderneta de poupança nas medidas econômicas que devem ser anunciadas pelo governo para baixar os juros.
contraponto
Patrulha da moda
Responsável pela divulgação das fotos do governador Sergio Cabral (PMDB-RJ) com Fernando Cavendish na Europa, o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) teve de recorrer à mulher, a ex-governadora Rosinha Matheus, para identificar os caros sapatos que a primeira-dama Adriana Ancelmo exibiu em fotos durante a viagem.
-Eu liguei para Rosinha e disse: tem a sola vermelha e saltos altos, contou Garotinho a jornalistas, ontem.
-É o sapato que a Lady Gaga usa! É um Christian Louboutin, decifrou a ex-governadora.
Aviação regional sem plano de voo - JOSEF BARAT
O ESTADÃO - 03/05/12
Faz tempo que não temos políticas consistentes e de longo prazo para o setor aéreo. É uma falha grave, tratando-se de um setor que, pela complexidade e exigência de coordenação dos seus segmentos, necessita de políticas e diretrizes muito bem formuladas. Um dos aspectos mais negligenciados tem sido o da aviação regional, o que é surpreendente, em razão do seu grande potencial de desenvolvimento.
O Brasil, com sua extensão continental, a exemplo do que ocorreu nos EUA, expandiu aceleradamente suas fronteiras agrícolas, ocupando novas áreas e consolidando novas cadeias produtivas. O agronegócio foi um dos grandes responsáveis pelo crescimento econômico, promovendo tanto a redução dos desequilíbrios regionais como a maior inserção na globalização. Consequência importante foi a geração de fluxos não só de mercadorias, mas de pessoas que se deslocam em função das mudanças na configuração econômica do território. Ora, parte importante das pessoas que desbravam o território e alteram os parâmetros econômicos se desloca por meio da aviação regional, executiva e táxis aéreos. O problema é que as infraestruturas aeroportuárias e aeronáuticas não acompanharam, em termos de capacidade e equipamentos, o crescimento da demanda. Esse é um fator restritivo tanto ao desempenho do moderno agronegócio quanto do potencial de especializações regionais e formação de novas cadeias produtivas, polarizadas por cidades de porte médio, dispersas pelo País.
Porém, falta interesse privado em investir na exploração de aeroportos regionais nesses centros de porte médio. A União e os governos estaduais, por sua vez, não têm manifestado interesse em lançar um programa de grande envergadura para promover concessões e parcerias voltadas para a modernização dos aeroportos regionais. Da mesma forma, não existe uma política para a aviação regional que possa balizar este segmento no médio e no longo prazos. Evidentemente, tal política deve ser parte de políticas e diretrizes mais abrangentes para o setor aéreo como um todo.
E por que ela é necessária? Primeiro, em razão da competição predatória que afeta muitas empresas que operam a aviação regional. Aeronaves de grande porte de empresas de âmbito nacional se superpõem às rotas regionais. Beneficiam-se de seu baixo custo marginal para promover a competição com empresas que utilizam aeronaves menores em rotas regionais. Esse problema é particularmente grave para as empresas regionais que operam nas regiões de maior densidade econômica e de deslocamento das fronteiras agrícolas.
Outro aspecto do problema é a questão dos "slots" nos grandes aeroportos. Questão ainda em suspenso, uma vez que a distribuição continua beneficiando mais as empresas que operam rotas de âmbito nacional. Essa é uma grande barreira para que as empresas regionais possam operar o tráfego de coleta e distribuição nos aeroportos aglutinadores, os chamados "hubs".
Por fim, a aviação regional carece,ainda, de políticas tarifárias adequadas. É preciso ter a clareza quanto ao fato de existirem três tipos de aviação regional: 1) a que acompanha o deslocamento das fronteiras econômicas e orienta suas rotas pelo crescimento e potencial da demanda; 2)a que coleta ou distribui passageiros em âmbito mais restrito (um Estado, por exemplo) e que, também orientada pelo potencial de mercado, opera rotas de curto percurso; e 3) a que opera rotas na Amazônia, que nem sempre pode se valer do mercado, pois presta também serviços que podem ser considerados como essenciais e até de caráter social. Neste caso, podem ser necessárias eventuais concessões de subsídio para serviços específicos.
Após tantas atribulações, vivemos um bom momento para pensar na formulação de uma política abrangente para o setor aéreo. É importante contemplar a aviação regional e estabelecer com clareza os objetivos e prioridades do governo. No setor aéreo, parafraseando Millôr, pode-se criar um mundo inteiramente novo. Caos não falta...
A técnica e o mago - ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SP - 03/05/12
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff dá uma no cravo e outra na ferradura. Aumenta ainda mais os seus índices de popularidade ao comprar a briga com bancos e juros altos, mas se prepara para gastar um pouco desses índices ao mexer na caderneta de poupança.
Nos dois casos, Dilma age dentro da lógica de mercado: em tempos de paz financeira, sem ameaças de ataques especulativos, não faz o menor sentido manter juros estratosféricos; e, com a queda dos juros, o governo não pode assistir impassível à fuga dos investimentos para a poupança, que rende pouco, porém com baixo risco e sem taxas e impostos.
Mas há nos bancos um estigma e, na poupança, um dogma. Enfrentar "a lógica perversa" dos bancos é altamente popular, porque eles são o setor mais odiado e nunca lucraram tanto quanto no governo Lula e no início do governo Dilma. Já mudar as regras da poupança é altamente impopular, é mexer com bolsos e almas.
É se fortalecendo no combate contra os bancos e os juros que Dilma ganha "gordura" para queimar na mexida da poupança, que será certamente cercada de cuidados.
Um deles será o teto. Os maiores poupadores pagarão o pato, os pequenos serão preservados. O outro será o prazo. Provavelmente, as regras valerão apenas para os futuros depósitos -como no caso do Funpresp (o novo fundo de previdência privada para o funcionalismo).
Essa operação de bater nos juros e conter a poupança envolve um equilíbrio delicado -financeiro, gerencial e particularmente político, que exige conhecimento e sensibilidade de marketing. Ou seja, exige também um equilíbrio entre a "técnica" Dilma e o "mago" João Santana.
Se é para apostar, Dilma vai ganhar muito contra os bancos e perder pouco contra a poupança. Já tem o recorde de popularidade para esta fase de governo, caminha para ser endeusada. O recorde de 80% de Lula está seriamente ameaçado.
O ônus da prova - DORA KRAMER
O ESTADO DE S. PAULO - 03/05/12
Chega a ser inútil a discussão sobre tentativas de "blindagem" ou a conveniência de se chamar o governador Sérgio Cabral Filho à CPMI que tratará da triangulação entre crime organizado, políticos e parcerias comerciais público-privadas.
Diante do que se vê desde a última sexta-feira sobre os alegres passatempos do governador na companhia de secretários estaduais, do empreiteiro dono dos maiores contratos de obras no Rio de Janeiro (sem contar os negócios federais e em outros estados) e respectivas senhoras mundo afora, é óbvio que Sérgio Cabral deve explicações em qualquer foro.
Assim como é evidente a impossibilidade de o PMDB, o governo federal, o PT, a Assembleia Legislativa, a Câmara Municipal ou o santo padroeiro do governador lhe assegurar qualquer tipo de proteção.
O Ministério Público não poderá - ou estará negando suas funções de defensor do interesse da sociedade - ignorar o assunto.
E o governador, seja na CPMI ou fora dela, está obrigado a fornecer ao público mais do que as explicações frágeis já apresentadas. Até para se precaver do que certamente ainda vem por aí necessita se municiar de provas de que não foi nem é desonesto.
E o que vem por aí? Não se sabe, mas é de se supor que venha mais. Questão de lógica aliada a informações já em circulação de bastidor: quem passou o farto material fotográfico ao deputado, ex-governador, antigo aliado e hoje adversário de Cabral, Anthony Garotinho, que deflagrou o escândalo em seu blog, deu muito mais.
Nem o informante nem Garotinho escreveriam o capítulo inicial de uma narrativa dessa sem ter pronto o esboço do epílogo. Não entrariam na guerra para deixar o inimigo apenas levemente ferido e pronto para a desforra na primeira oportunidade mais adiante.
Só para início de conversa o governador deve, no mínimo, dirimir uma dúvida criada por sua assessoria.
Cabral, os secretários da Casa Civil, dos Transportes, de Governo e da Saúde estavam em férias quando fotografados e filmados na esbórnia parisiense de setembro de 2009?
A assessoria disse que não. Tratava-se de uma viagem oficial a respeito da qual foi apresentada longa agenda para divulgar o Guia Michelin Rio de Janeiro, fazer reuniões de trabalho para tratar da Olimpíada de 2016 e receber uma comenda.
Portanto, estavam no exercício da representação governamental e não poderiam se dar ao desfrute de farrear. Não apenas pela exigência de modos adequados ao cargo, mas também porque viajaram a expensas do dinheiro público.
Mas, logo em seguida a assessoria informou que os folguedos pertenciam à vida privada do governador. Muito bem: então o que faziam lá os secretários de Estado? E o empreiteiro camarada? Quem pagou aquela conta? Foi com dinheiro vivo ou há a fatura do cartão de crédito para comprovar?
A contradição exposta pela assessoria autoriza a conclusão de que a ação entre amigos seja vista com naturalidade como critério de governo. Algo explícito na fotografia do chefe da Casa Civil abraçado ao dono da construtora Delta, cujos contratos viria depois a auditar por determinação do governador
Isso falando apenas daquela ocasião em que a turma aparecia fantasiada com guardanapos amarrados à cabeça, numa cena que expõe ao ridículo os personagens e a sociedade que lhes deu com seus votos a oportunidade de ocuparem as posições que ocupam.
As imagens sugerem promiscuidade entre o público e o privado e remetem à necessidade de se buscar detalhes sobre as constantes e inúmeras viagens ao exterior feitas por Sérgio Cabral. Tantas que o vice-governador, Luiz Fernando Pezão, é visto como o governador de fato do Rio.
Começando por contabilizar quantos dias Cabral esteve fora do país, quais viagens eram de trabalho e quais relativas a férias de direito, a apresentação dessas agendas e confrontação de origem do pagamento de despesas.
Por essas e outras, o ônus da prova é do governador.
ACORDO DE BRASIL E TURQUIA COM IRÃ ERA 'INSUFICIENTE' - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 03/05/12
O embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, participou em São Paulo, no fim da semana, do lançamento do programa Mudança de Geração, que seleciona jovens muçulmanos para promover "intercâmbio entre as culturas". Ele falou à coluna:
Folha - Autoridades de Israel disseram recentemente que o Irã não trabalha para produzir a bomba atômica. Então Brasil e Turquia estavam certos quando negociaram o acordo nuclear com o país, em 2009?
Thomas Shannon - A negociação foi importante para mostrar a capacidade da comunidade internacional para tratar diplomaticamente com o Irã. Infelizmente, o acordo não foi suficiente naquele momento. Nossa intenção é usar a diplomacia, o engajamento e as sanções para assegurar que o Irã se sente na mesa de negociações e fale sobre os problemas de confiança que existem no mundo sobre seu programa nuclear. O Conselho de Segurança da ONU e a Agência Internacional de Energia Atômica [AIEA] mostraram claramente que o Irã não está cumprindo as regras internacionais.
O presidente Obama errou quando não respaldou o acordo negociado por Brasil e Turquia?
Ele não rejeitou o acordo, mas mostrou claramente que não foi o suficiente para evitar as sanções [ao Irã], que eram parte de um programa diplomático importante.
As sanções podem ser revogadas agora?
Ainda há muito para fazer.
O que muda neste momento e o que se pode fazer?
O Irã sabe bem o que tem que fazer. Isso passa pelas resoluções do Conselho de Segurança e os informes da AIEA, de maneira que eles [iranianos] estejam dispostos a cumprir com suas obrigações dentro de acordos que eles mesmos assinaram e se abra uma possibilidade de um entendimento com a comunidade internacional.
O porta-voz do presidente iraniano disse à Folha, em janeiro, que a presidente Dilma Rousseff "golpeou tudo o que Lula havia feito" na relação com o Irã. Houve mudanças?
A presidenta Rousseff falou diretamente sobre direitos humanos e o tratamento às mulheres. Foi simplesmente uma articulação de valores que são parte do Brasil.
Dilma tem sido melhor que o ex-presidente Lula na política externa?
O Brasil é um país em transformação e cada presidente tem seu papel nesse processo. O presidente Lula mudou muitas coisas no plano global, especialmente na relação com os EUA, mas sempre numa trajetória que vai para... para... [gesticula, buscando a palavra em português] cima. E a presidenta Rousseff está melhorando isso a cada dia.
DISTRITO ELETRÔNICO
A Polícia Civil de SP e a Secretaria Estadual da Justiça lançarão oficialmente na segunda quinzena deste mês o boletim eletrônico para ocorrências de homofobia. Poderão ser registrados crimes de calúnia, injúria e difamação sem que a vítima precise ir à delegacia -a menos em casos que envolvam lesão corporal.
PORTA DE ENTRADA
"Vai facilitar para uma população que sempre teve problemas em ir a uma delegacia", diz Heloisa Gama Alves, coordenadora de políticas para a diversidade sexual da Secretaria da Justiça. A ideia é que, futuramente, as denúncias registradas pela internet sejam encaminhadas à pasta, para abertura de processos administrativos baseados na lei estadual que criminaliza a homofobia.
MÃES À FRENTE
E a secretaria promoverá com outras pastas, no Dia das Mães, 13 de maio, caminhada contra a homofobia, da avenida Paulista até o largo do Arouche. Quer que o movimento Mães pela Igualdade, cujos filhos sofreram discriminação, lidere a mobilização. Vai disponibilizar também três ônibus para levar manifestantes para a marcha contra a homofobia, no dia 16, em Brasília.
FASANO FORA
Rogério Fasano diz que não ficou surpreso pelo fato de o Fasano ter saído da lista dos cem melhores restaurantes do mundo, divulgada na segunda. Em 2011, ele ficou em 59º lugar. "Já entramos e saímos dessa lista três vezes. Aquilo deveria ser um prêmio para chefs, porque premiam quem faz cozinha autoral. Quando transformam essa lista em ranking de restaurantes, fica polêmica. Nossa cozinha é clássica", diz Fasano.
MISSÃO DE PAZ
Cinco técnicos do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus) irão no dia 12 ao Haiti planejar a reconstrução do museu de arte naïf de Porto Príncipe, destruído no terremoto que atingiu o país no início de 2010. Eles discutirão a obra e a recuperação do acervo e ajudarão a formar profissionais haitianos para o trabalho.
MADAGASCAR
Um leão, um tigre e uma onça pintada que foram abandonados na cidade de Salete (SC) serão transferidos para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, em Cotia (SP).
A seguradora Porto Seguro emprestou três guinchos para a missão de resgate.
CAMINHO
O radiologista Francisco Carnevale vai orientar à distância uma cirurgia de embolização das artérias da próstata. O procedimento, menos invasivo para conter o crescimento da glândula em idosos, será apresentado hoje, por videoconferência, em simpósio em Nova York. De lá, dará instruções a uma equipe do Sírio-Libanês que demonstrará a técnica.
CENAS DA NOITADA
Os atores Bruno Fagundes, Caco Ciocler, Camila Biondan e Ricardo Monastero foram à festa Gambiarra, na The Week, na véspera do feriado. O DJ Miro Rizzo tocou na balada.
CURTO-CIRCUITO
A mostra "Jeans: Cotidiano e Subversão" inaugura hoje o espaço virtual Mimo (Museu da Indumentária e da Moda).
Dudu Tsuda lança o disco "Le Son par Lui Même", hoje, às 21h30, no Sesc Pompeia. 18 anos.
O arquiteto Arthur Casas venceu o concurso para a revitalização do Pelourinho, em Salvador.
A atriz Maria Fernanda Cândido apresenta a cerimônia de premiação da Semana ABC 2012, no dia 12, na Cinemateca Brasileira.
com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY
O embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, participou em São Paulo, no fim da semana, do lançamento do programa Mudança de Geração, que seleciona jovens muçulmanos para promover "intercâmbio entre as culturas". Ele falou à coluna:
Folha - Autoridades de Israel disseram recentemente que o Irã não trabalha para produzir a bomba atômica. Então Brasil e Turquia estavam certos quando negociaram o acordo nuclear com o país, em 2009?
Thomas Shannon - A negociação foi importante para mostrar a capacidade da comunidade internacional para tratar diplomaticamente com o Irã. Infelizmente, o acordo não foi suficiente naquele momento. Nossa intenção é usar a diplomacia, o engajamento e as sanções para assegurar que o Irã se sente na mesa de negociações e fale sobre os problemas de confiança que existem no mundo sobre seu programa nuclear. O Conselho de Segurança da ONU e a Agência Internacional de Energia Atômica [AIEA] mostraram claramente que o Irã não está cumprindo as regras internacionais.
O presidente Obama errou quando não respaldou o acordo negociado por Brasil e Turquia?
Ele não rejeitou o acordo, mas mostrou claramente que não foi o suficiente para evitar as sanções [ao Irã], que eram parte de um programa diplomático importante.
As sanções podem ser revogadas agora?
Ainda há muito para fazer.
O que muda neste momento e o que se pode fazer?
O Irã sabe bem o que tem que fazer. Isso passa pelas resoluções do Conselho de Segurança e os informes da AIEA, de maneira que eles [iranianos] estejam dispostos a cumprir com suas obrigações dentro de acordos que eles mesmos assinaram e se abra uma possibilidade de um entendimento com a comunidade internacional.
O porta-voz do presidente iraniano disse à Folha, em janeiro, que a presidente Dilma Rousseff "golpeou tudo o que Lula havia feito" na relação com o Irã. Houve mudanças?
A presidenta Rousseff falou diretamente sobre direitos humanos e o tratamento às mulheres. Foi simplesmente uma articulação de valores que são parte do Brasil.
Dilma tem sido melhor que o ex-presidente Lula na política externa?
O Brasil é um país em transformação e cada presidente tem seu papel nesse processo. O presidente Lula mudou muitas coisas no plano global, especialmente na relação com os EUA, mas sempre numa trajetória que vai para... para... [gesticula, buscando a palavra em português] cima. E a presidenta Rousseff está melhorando isso a cada dia.
DISTRITO ELETRÔNICO
A Polícia Civil de SP e a Secretaria Estadual da Justiça lançarão oficialmente na segunda quinzena deste mês o boletim eletrônico para ocorrências de homofobia. Poderão ser registrados crimes de calúnia, injúria e difamação sem que a vítima precise ir à delegacia -a menos em casos que envolvam lesão corporal.
PORTA DE ENTRADA
"Vai facilitar para uma população que sempre teve problemas em ir a uma delegacia", diz Heloisa Gama Alves, coordenadora de políticas para a diversidade sexual da Secretaria da Justiça. A ideia é que, futuramente, as denúncias registradas pela internet sejam encaminhadas à pasta, para abertura de processos administrativos baseados na lei estadual que criminaliza a homofobia.
MÃES À FRENTE
E a secretaria promoverá com outras pastas, no Dia das Mães, 13 de maio, caminhada contra a homofobia, da avenida Paulista até o largo do Arouche. Quer que o movimento Mães pela Igualdade, cujos filhos sofreram discriminação, lidere a mobilização. Vai disponibilizar também três ônibus para levar manifestantes para a marcha contra a homofobia, no dia 16, em Brasília.
FASANO FORA
Rogério Fasano diz que não ficou surpreso pelo fato de o Fasano ter saído da lista dos cem melhores restaurantes do mundo, divulgada na segunda. Em 2011, ele ficou em 59º lugar. "Já entramos e saímos dessa lista três vezes. Aquilo deveria ser um prêmio para chefs, porque premiam quem faz cozinha autoral. Quando transformam essa lista em ranking de restaurantes, fica polêmica. Nossa cozinha é clássica", diz Fasano.
MISSÃO DE PAZ
Cinco técnicos do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus) irão no dia 12 ao Haiti planejar a reconstrução do museu de arte naïf de Porto Príncipe, destruído no terremoto que atingiu o país no início de 2010. Eles discutirão a obra e a recuperação do acervo e ajudarão a formar profissionais haitianos para o trabalho.
MADAGASCAR
Um leão, um tigre e uma onça pintada que foram abandonados na cidade de Salete (SC) serão transferidos para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, em Cotia (SP).
A seguradora Porto Seguro emprestou três guinchos para a missão de resgate.
CAMINHO
O radiologista Francisco Carnevale vai orientar à distância uma cirurgia de embolização das artérias da próstata. O procedimento, menos invasivo para conter o crescimento da glândula em idosos, será apresentado hoje, por videoconferência, em simpósio em Nova York. De lá, dará instruções a uma equipe do Sírio-Libanês que demonstrará a técnica.
CENAS DA NOITADA
Os atores Bruno Fagundes, Caco Ciocler, Camila Biondan e Ricardo Monastero foram à festa Gambiarra, na The Week, na véspera do feriado. O DJ Miro Rizzo tocou na balada.
CURTO-CIRCUITO
A mostra "Jeans: Cotidiano e Subversão" inaugura hoje o espaço virtual Mimo (Museu da Indumentária e da Moda).
Dudu Tsuda lança o disco "Le Son par Lui Même", hoje, às 21h30, no Sesc Pompeia. 18 anos.
O arquiteto Arthur Casas venceu o concurso para a revitalização do Pelourinho, em Salvador.
A atriz Maria Fernanda Cândido apresenta a cerimônia de premiação da Semana ABC 2012, no dia 12, na Cinemateca Brasileira.
com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY
Os resistentes - LUIZ FERNANDO VERISSIMO
O GLOBO - 03/05/12
Não sucumbi ao telefone celular. Não tenho e nunca terei um telefone celular. Quando preciso usar um, uso o da minha mulher. Mas segurando-o como se fosse um grande inseto, possivelmente venenoso, desconhecido da minha tribo.
Eu não saberia escolher a musiquinha que o identifica. Aquela que, quando toca, a pessoa diz “É o meu!”, e passa a procurá-lo freneticamente, depois o coloca no ouvido, diz “alô” várias vezes, aperta botões errados, desiste e desliga, para repetir toda a função quando a musiquinha toca outra vez.
Não sei, a gente escolhe a musiquinha quando compra o celular?
– Tem aí um Beethoven?
– Não. Mas temos as quatro estações do Vivaldi.
– Manda a Primavera.
Porque a musiquinha do seu celular também identifica você. Há uma enorme diferença entre uma pessoa cujo celular toca, digamos, Take Five, e uma cujo celular toca Wagner. Você muitas vezes só sabe com quem realmente está quando ouve o seu celular tocar, e o som do seu celular diz mais a seu respeito do que você imagina. Se bem que, na minha experiência, a maioria das pessoas escolhe músicas galopantes – como a introdução da Cavalleria Rusticana ou a ouverture do Guilherme Tell – apenas para já colocá-la no adequado espirito de urgência, ou pânico controlado, que o celular exige.
Sei que alguns celulares ronronam e vibram, discretamente, em vez de desandarem a chamar seus donos com música. Infelizmente, os donos nem sempre mostram a mesma discrição. Não é raro você ser obrigado a ouvir alguém tratando de detalhes da sua intimidade ou dos furúnculos da tia Djalmira a céu aberto, por assim dizer. É como o que nos fazem os fumantes, só que em vez do nosso espaço aéreo ser invadido por fumaça indesejada, é invadido pela vida alheia. Que também pode ser tóxica.
Não dá para negar que o celular é útil, mas no caso a própria utilidade é angustiante. O celular reduziu as pessoas a apenas extremos opostos de uma conexão, pontos soltos no ar, sem contato com o chão. Onde você se encontra tornou-se irrelevante, o que significa que em breve ninguém mais vai se encontrar. E a palavra “incomunicável” perdeu o sentido. Estar longe de qualquer telefone não é mais um sonho realizável de sossego e privacidade – o telefone foi atrás.
Não tenho a menor ideia de como funciona o besouro maldito. E chega um momento em que cada nova perplexidade com ele torna-se uma ofensa pessoal, ainda mais para quem ainda não entendeu bem como funciona uma torneira.
Ouvi dizer que o celular destrói o cérebro aos poucos. Nos vejo – os que não sucumbiram, os últimos resistentes – como os únicos sãos num mundo imbecilizado pelo micro-ondas de ouvido, com os quais as pessoas trocarão grunhidos pré-históricos, incapazes de um raciocínio ou de uma frase completa, mas ainda conectados. Seremos poucos mas nos manteremos unidos, e trocaremos informações. Usando sinais de fumaça.
Não sucumbi ao telefone celular. Não tenho e nunca terei um telefone celular. Quando preciso usar um, uso o da minha mulher. Mas segurando-o como se fosse um grande inseto, possivelmente venenoso, desconhecido da minha tribo.
Eu não saberia escolher a musiquinha que o identifica. Aquela que, quando toca, a pessoa diz “É o meu!”, e passa a procurá-lo freneticamente, depois o coloca no ouvido, diz “alô” várias vezes, aperta botões errados, desiste e desliga, para repetir toda a função quando a musiquinha toca outra vez.
Não sei, a gente escolhe a musiquinha quando compra o celular?
– Tem aí um Beethoven?
– Não. Mas temos as quatro estações do Vivaldi.
– Manda a Primavera.
Porque a musiquinha do seu celular também identifica você. Há uma enorme diferença entre uma pessoa cujo celular toca, digamos, Take Five, e uma cujo celular toca Wagner. Você muitas vezes só sabe com quem realmente está quando ouve o seu celular tocar, e o som do seu celular diz mais a seu respeito do que você imagina. Se bem que, na minha experiência, a maioria das pessoas escolhe músicas galopantes – como a introdução da Cavalleria Rusticana ou a ouverture do Guilherme Tell – apenas para já colocá-la no adequado espirito de urgência, ou pânico controlado, que o celular exige.
Sei que alguns celulares ronronam e vibram, discretamente, em vez de desandarem a chamar seus donos com música. Infelizmente, os donos nem sempre mostram a mesma discrição. Não é raro você ser obrigado a ouvir alguém tratando de detalhes da sua intimidade ou dos furúnculos da tia Djalmira a céu aberto, por assim dizer. É como o que nos fazem os fumantes, só que em vez do nosso espaço aéreo ser invadido por fumaça indesejada, é invadido pela vida alheia. Que também pode ser tóxica.
Não dá para negar que o celular é útil, mas no caso a própria utilidade é angustiante. O celular reduziu as pessoas a apenas extremos opostos de uma conexão, pontos soltos no ar, sem contato com o chão. Onde você se encontra tornou-se irrelevante, o que significa que em breve ninguém mais vai se encontrar. E a palavra “incomunicável” perdeu o sentido. Estar longe de qualquer telefone não é mais um sonho realizável de sossego e privacidade – o telefone foi atrás.
Não tenho a menor ideia de como funciona o besouro maldito. E chega um momento em que cada nova perplexidade com ele torna-se uma ofensa pessoal, ainda mais para quem ainda não entendeu bem como funciona uma torneira.
Ouvi dizer que o celular destrói o cérebro aos poucos. Nos vejo – os que não sucumbiram, os últimos resistentes – como os únicos sãos num mundo imbecilizado pelo micro-ondas de ouvido, com os quais as pessoas trocarão grunhidos pré-históricos, incapazes de um raciocínio ou de uma frase completa, mas ainda conectados. Seremos poucos mas nos manteremos unidos, e trocaremos informações. Usando sinais de fumaça.