Sarney tem mal-estar e está no posto médico do Senado
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), se sentiu mal nesta manhã e está sendo atendido no posto médico da Casa.
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), se sentiu mal nesta manhã e está sendo atendido no posto médico da Casa.
Correio Braziliense - 26/11/2009 | ||||
Gláucio Ary Dillon Soares -Sociólogo, pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) |
Correio Braziliense - 26/11/2009 |
A frase que não foi pronunciada
História de Brasília
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Você sabia que o que passa por sua cabeça tem poder de por em movimento ações concretas? Calma! Não vou falar de pensamento positivo, nem de autoajuda. Vou falar um pouquinho sobre a psicologia das expectativas. |
Folha de S. Paulo - 26/11/2009 |
Política de cortar impostos a fim de mitigar a crise de 2008 agora é apenas política, sem efeito econômico maior |
O GOVERNO Lula não dá ponto sem nó nas suas costuras com as empresas. Difícil se lembrar de um governo em que houve tantas parcerias público-privadas, digamos. Cada setor, para não dizer cada grande empresa, teve sua política especial de impostos, subsídios, empréstimos de bancos públicos, apoio de fundos paraestatais e outras tantas políticas públicas e por vezes nada públicas, mas estatais, como no caso do socorro a empresas falidas em aventuras financeiras. Pelo jeito, faltava amarrar alguns nozinhos. É o que se depreende da prorrogação de descontos de impostos e a instituição de outras isenções. Ontem, soube-se que móveis vão ter IPI zero até 31 de março de 2010 e que a isenção para material de construção continua até junho do próximo ano. Anteontem, o Ministério da Fazenda anunciara medidas parecidas para automóveis ditos "verdes", os flex, e caminhões. O sentido mais imediato da redução de impostos é auxiliar setores empresariais mais avariados pela crise. Nos últimos 12 meses, contados até setembro, a produção da indústria da madeira caiu 20%, segundo o IBGE (na média, a queda na indústria de transformação foi de 10%). Na indústria de móveis, a queda foi de 11,6% (inferior, porém, à queda dos fabricantes de calçados, de 14,6%). Houve casos piores. A de "material eletrônico, aparelhos e equipamentos de comunicações" caiu 31%, a de veículos, a de máquinas e equipamentos e a de metalurgia básica todas caíram na casa de 21%. As metalúrgicas não tiveram apoio direto, assim como a de eletrônicos, a maioria delas múltis que montam aparelhos na Zona Franca de Manaus, muitos para exportação, prejudicadas pelo colapso do comércio mundial. Mas está em estudo a redução de impostos sobre os computadores. No caso de madeira e móveis, a situação ficou apenas pior na crise. Em setembro de 2008, a produção da indústria de madeira em 12 meses já havia caído 7,7%, um dos raros setores industriais que estavam então encolhendo (além de fumo, perfumaria e limpeza, e calçados). Madeiras, móveis e calçados são as indústrias que mais têm encolhido no país, em parte por causa do real forte, parte devido a dumping chinês, parte devido a atraso tecnológico e parte devido à falta de escala. Apesar dos evidentes estragos nas indústrias de madeiras, móveis e calçados, da importância da indústria de carros e do incentivo à construção de casas, as isenções de impostos e outros auxílios recentes parecem cada vez mais arbitrários. Incentivos oficiais sempre o são. Nas emergências das crises, tais arbítrios podem ser mais aceitáveis. Agora, quando a economia já voltou a crescer e as presentes isenções têm efeitos marginais no consumo global, as medidas começam a parecer mais arbitragem de favores. Ou de nós em pontos políticos ainda desatados na comunidade empresarial. O sentido menos imediato dessas medidas todas é político. Dizer que são "eleitoreiras" já é um tanto exagerado. O eleitor não vai reparar em tais detalhes; de resto, há eleições no Brasil a cada dois anos. Metade dos anos, são, pois, "eleitorais". Porém, o governo torra mais um pouco do dinheiro -que já não tem- a fim de reforçar a grande coalizão luliana. |
Folha de S. Paulo - 26/11/2009 |
CASO A CALIFÓRNIA fosse independente, e não parte dos Estados Unidos, seria a décima maior economia do mundo. Mas a situação fiscal do Estado é caótica. O governador Arnold Schwarzenegger recentemente anunciou um deficit de arrecadação de US$ 26 bilhões. O sistema político é patentemente incapaz de enfrentar a crise. |
O Estado de S. Paulo - 26/11/2009 |
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, às vezes se notabiliza pela produção de justificativas esfarrapadas para algumas decisões que toma. Terça-feira, ele se superou ao defender o presentão de R$ 1,3 bilhão em renúncias tributárias para a indústria automobilística. |
Lula e o modelo da vaca por repolhos
FOLHA DE SÃO PAULO - 26/11/09
As três maiores invenções desde o começo da civilização foram o fogo, a roda e o banco central, segundo o humorista americano Will Rogers (1879-1935). Paul Samuelson usou essa frase, ou uma versão dela, como epígrafe de um capítulo de seu manual de introdução à análise econômica. A referência ao banco central foi uma evidente gozação, mas a moeda caberia numa lista das grandes criações. Muito antes de haver uma autoridade monetária, os homens foram capazes de reduzir, por meio de uma convenção, as complicações do escambo. Muito dura devia ser a vida de quem tinha vacas e precisava de trigo, mas não encontrava quem tivesse trigo e desejasse vacas. O problema seria resolvido se o plantador de trigo procurasse repolhos e o plantador de repolhos quisesse vacas. Faltaria resolver um detalhe: que fazer, se uma vaca valesse duas centenas de repolhos e o vaqueiro só precisasse de cem?
A vida ficou muito mais fácil para esses produtores quando se escolheu algum objeto conveniente para funcionar como unidade de conta e meio de troca. Esse mesmo objeto poderia servir como reserva de valor. Seria possível acumular numa caixa meios de compra correspondentes a muitas vacas ou carroças de trigo. Esse papel foi atribuído a vários objetos, por diferentes civilizações, ao longo de milênios, até se chegar à moeda abstrata. Desde a Antiguidade, no entanto, alguns tipos de moeda, especialmente o ouro e a prata, serviram para trocas não só no interior de um grupo, mas também entre produtores e comerciantes de nações diferentes. Modernamente, essa função mais ampla foi conferida a certas moedas nacionais de grande aceitação internacional. O dólar é hoje o exemplo mais notável.
Substituir o dólar por moedas nacionais de curso restrito, como o real e o peso argentino, é recuar na história e reaproximar o comércio internacional do escambo. Ninguém comercia com a maior parte do mundo usando dinheiro do Brasil, da Argentina, do Paraguai ou da Bolívia. A maior parte das moedas nacionais pode servir - e, mesmo assim, muito limitadamente - para o comércio bilateral. Pagamentos em reais e em pesos foram permitidos a empresas brasileiras e argentinas, mas os negócios com essas moedas mal se aproximam de 2% das trocas entre os dois países. Nada mais natural: indústrias brasileiras e argentinas precisam de divisas para transações com muitos outros países. Sem o dólar, estariam em situação pior que a dos primitivos produtores, embaraçados na hora de comerciar vacas, trigo e repolhos por meio do escambo.
Mas o governo brasileiro continua empenhado, como se isso fosse muito importante, em promover na América do Sul um comércio baseado em moedas nacionais. O objetivo principal, dizem os defensores da mudança, é facilitar o comércio para as empresas pequenas, livrando-as da complicação e dos custos das operações cambiais. Mas essas operações serão necessárias, de toda forma, se essas empresas precisarem comprar de terceiros países.
Além do mais, o custo e as complicações da burocracia cambial não são os obstáculos mais importantes à participação no comércio internacional. Se isso fosse verdade, um número muito maior de indústrias brasileiras já estaria envolvido na exportação e na importação. Se isso não ocorre, é porque os problemas são muito mais complicados: a logística é deficiente, o custo do capital é absurdo, o investimento é onerado por impostos, falta apoio financeiro a novos empreendimentos e a maior parte dos empresários carece de informações e de meios para formular e implementar estratégias de produção para o comércio exterior.
Resolver essas questões é bem mais difícil do que anunciar medidas cosméticas. Além disso, a diplomacia pouco tem defendido a indústria brasileira, grande, média ou pequena, quando negocia com os sul-americanos. Os acordos são muito mais favoráveis aos parceiros quando se trata, por exemplo, de cronogramas de redução de tarifas. Depois, a tolerância é grande quando se impõem barreiras a produtos brasileiros.
Mas a conversa a respeito de trocas em moedas nacionais tem também a ressonância de um grito de independência em relação ao dólar. Até ao governo chinês o presidente Lula já propôs a mudança da moeda no comércio bilateral. Mas os chineses não misturam comércio com romantismo e não parecem movidos pela nostalgia da vida primitiva - aquela nostalgia de quem tenta repetir o discurso dos anos 50, ressuscitar em 2009 a política de substituição de importações e implantar o atraso no lugar do agronegócio. Pelo menos, há certa coerência nessa pregação do retrocesso.
Em total sintonia
O ESTADO DE SÃO PAULO - 26/11/09
O resultado da eleição da direção nacional do PT era o ponto final que faltava no desmentido de uma tese tão difundida quanto inconsistente: o distanciamento crescente entre o presidente Luiz Inácio da Silva e seu partido.
No auge do sucesso de tal crença chegou-se a especular a respeito da saída de Lula do PT, algo totalmente sem sentido em se tratando de organismos interdependentes.
Lula é a alavanca do PT, mas o PT é o instrumento de Lula para fazer política, pelo menos enquanto a atividade for exercida por meio de partidos.
Estão juntos até quando parecem estar separados.
O PT só pode se dar a luxo de seguir a vida depois do escandaloso abalo de 2005 sem passar por um processo qualquer, mesmo leve, de troca de pessoas e procedimentos porque é o partido do presidente da República que a ele conferiu sustentação moral e política pela força do cargo e da popularidade.
Em contrapartida, prestou-lhe e continua prestando total obediência. Do ponto de vista exclusivamente pragmático, sem entrar em considerações de natureza ética, um "case" de excepcional competência em matéria de disciplina e resultados.
Não há nada igual entre os partidos brasileiros. O PT é a única agremiação a promover eleições diretas para a direção nacional e as seções regionais; é o partido com maior identificação popular, desde antes de chegar ao poder; exibe vida partidária rica, menos do que quando era oposição, mas muito mais que qualquer um dos outros; convive com divergências internas sem implodir seus projetos nacionais e, ainda assim, tem comando e objetivos nítidos.
Já foi mudar o Brasil e hoje é continuar mandando no Brasil. Goste-se ou não, trata-se de um partido com nitidez e transparência de propósitos, não obstante a obscuridade dos métodos. Reprovados por uns, aceitos pela maioria, nem por isso aceitáveis por unanimidade.
A eleição em primeiro turno do ex-senador e ex-presidente da Petrobrás José Eduardo Dutra para a presidência do partido mostra quem manda, como de resto já ficara sobejamente demonstrado na unção de Dilma Rousseff na condição de testa de ferro do chefe na primeira eleição sem o nome de Lula na cédula ou na tela da urna eletrônica.
A volta risonha e franca dos mensaleiros, a retomada de José Dirceu na linha de frente, tudo isso só acontece porque é Lula o fiador. Um avalista que, quando quer e lhe é conveniente, sabe reconhecer os seus limites.
Por exemplo, deixando prosperar em estratos médios do partido a tese do terceiro mandato até o momento de se render às evidências e ordenar o recolhimento geral das bandeiras e sua substituição pela causa oposta.
A proposta chegou ao Congresso por intermédio de um deputado da base aliada e foi morta na Comissão de Constituição e Justiça por um relatório de afirmação democrática da autoria do petista José Genoino.
Outro exemplo: a candidatura de Antonio Palocci ao governo de São Paulo. Lula queria, mas as pesquisas qualitativas mostravam que não passaria pelo controle de qualidade do paulista. Mudou os planos radicalmente e foi buscar Ciro Gomes no Ceará. O partido abomina a ideia, mas aceitará se assim tiver de ser feito para a felicidade da nação petista, cuja fonte de energia é Lula quem alimenta.
Mesmo quando ameaça enquadrar o partido nos Estados e pedir que seus correligionários abram mão de seus palanques, Lula faz que vai, mas não vai.
Prova é que agora mesmo o presidente anunciou que prefere a negociação à imposição. O PMDB percebeu há tempos que aquela promessa de fazer o PT desistir de concorrer onde fosse importante o palanque exclusivo para o aliado era só uma componente no jogo da sedução.
O presidente jamais investiria no esvaziamento de seu partido, se esse fosse o preço da aliança. Por isso o PMDB se apressou e apresentou em outubro a outra fatura para assegurar a vaga de vice na chapa presidencial, entendendo que em primeiro lugar estará sempre o PT.
Esquisito é o governo patrocinar a tese oposta.
Francamente
O governador Aécio Neves escreve para explicar sua posição diante de pesquisas que medem a aceitação de chapa presidencial em composição com o governador José Serra.
"Minha sincera irritação com a pesquisa atribuída ao PSDB se deu unicamente pela divulgação parcial da mesma. A pesquisa de ontem (segunda-feira), ao contrário, considerou diversos cenários, todos eles tornados públicos. A meu ver, a visão do conjunto nos fornece informações importantes para a compreensão do atual quadro político."
Mineiramente, Aécio fala em pesquisa "atribuída" ao PSDB, evita adiantar se esse tipo de consulta tem ou terá influência sobre sua posição e não detalha os citados "diversos cenários", mas certamente se refere aos 31% de aceitação a uma chapa Aécio-Serra. A formação Serra-Aécio recebeu quase o mesmo, 35%.
Aliança no pré-sal RENATA LO PRETE FOLHA DE SÃO PAULO - 26/11/09 No meio da reunião PT-PMDB para mapear a perspectiva de aliança nos Estados, o deputado peemedebista Eduardo Cunha (RJ) lançou um alerta sobre o potencial efeito negativo da partilha dos royalties do pré-sal, tal como desenhada pelo Planalto e endossada pelos petistas na Câmara, sobre as chances de reeleição do governador do Rio, Sérgio Cabral. O líder da bancada, Henrique Alves (RN), cortou o discurso na hora. Disse que o assunto ali era outro. Mas, na disputa pelo dinheiro do pré-sal, deputados fluminenses fazem questão de lembrar diariamente aos líderes governistas que o Rio é o Estado com mais peso (10% dos votos) na convenção que formalizará ou não o apoio do partido a Dilma Rousseff. Corda esticada - Durante a reunião, Ricardo Berzoini pediu “paciência” nos Estados onde a aliança não fecha, dada a existência de candidatos do PT e do PMDB. Henrique Alves devolveu: “Temos que resolver sem paciência mesmo, senão quem vai perder a paciência é o eleitor”. Calendário - Caberá ao deputado Geraldo Magela (DF) apresentar a proposta de antecipar a posse da nova direção do PT, que se daria em fevereiro, como forma de acelerar as articulações da candidatura de Dilma. A ideia tem a simpatia do presidente eleito, José Eduardo Dutra, e antipatia do atual, Berzoini. De uma vez - Diferentemente do ministro Patrus Ananias, que se manifesta favorável às prévias, o outro pré-candidato do PT ao governo de Minas, Fernando Pimentel, defende que a questão seja resolvida agora, no segundo turno da eleição do diretório estadual. “Um dos candidatos me apoia, o outro apoia o Patrus. O resultado vai sinalizar o caminho do partido”, diz o ex-prefeito de BH. Time - O PT escalou Ary Vannazi, administrador de São Leopoldo (RS) e próximo de Dilma, para fazer a ponte entre prefeitos e a campanha. Como você - Em encontro nesta semana, José Serra (PSDB) pediu a Jarbas Vasconcelos (PMDB) que dispute o governo de Pernambuco. Ele respondeu que fará como o tucano: decidirá em março. Bordão - O novo alvo do PT na Assembleia paulista é a autorização obtida pelo governo para vender a Cosesp (Companhia de Seguros do Estado de São Paulo). “Só falta vender uma parte da Cesp, que ninguém quer”, diz o deputado petista Roberto Felício. Agenda livre 1 - O avião da FAB que levou Lulinha e 15 acompanhantes de São Paulo a Brasília aterrissou na madrugada de 10 de outubro, um sábado com feriado na segunda. O último item na agenda de Lula para o dia 9, sexta, foi às 15h30. Depois, ele passou três dias “sem compromissos oficiais”. Segundo o Planalto, o grupo era formado por “convidados do presidente”. Agenda livre 2 - Na sexta, Lula iria a uma feira na Marina da Glória, mas cancelou devido ao mau tempo no Rio. Pilão - E segue o entusiasmo de Lula com o programa de aceleração de seu regime. Em reunião com ministros, o presidente exibiu orgulhoso a folga na cintura da calça do terno usado na posse, em 2003. A postos A história foi contada pelo sociólogo Francisco de Oliveira no evento comemorativo dos 40 anos do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). Durante o regime militar, Ulysses Guimarães foi a Sergipe para um encontro do então MDB. Em sua palestra, comparou a trajetória da oposição brasileira à ‘Odisseia’, poema clássico de Homero sobre o retorno do herói Ulisses à terra natal. Na plateia, formada majoritariamente por funcionários da Prefeitura de Aracaju, muitos caíram no sono. Até que o palestrante elevou a voz: - Agamenon! - gritou, referindo-se ao rei de Micenas. Acordado de súbito, um dos presentes se ergueu: - Pronto, doutor! FHC em DC - Em palestra no dia 12 no instituto de Diálogo Interamericano, em Washington, o ex-presidente tucano falará da evolução das relações EUA-América Latina e da crescente influência do Brasil no hemisfério. Tiroteio O encontro pró-candidatura própria do PMDB é o maior Cavalo de Troia da política brasileira. Dentro só tem inimigo. Do deputado ANDRÉ VARGAS (PT-PR), sobre reunião promovida no sábado passado em Curitiba pelo governador do Paraná, Roberto Requião, para se contrapor à tese de adesão imediata do partido à candidatura de Dilma Rousseff. |
Assimetria
O ESTADO DE SÃO PAULO - 26/11/09
Pascal Lamy, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), diagnosticou no seu relatório anual que, de modo geral, "a economia global está quase tão aberta ao comércio hoje quanto antes do início da crise" e conclamou as nações a "anunciar estratégias de saída para remover as restrições ao comércio e os subsídios à produção que introduziram temporariamente a fim de neutralizar os efeitos da crise". Lamy finge desconhecer que o câmbio funciona como o principal preço na economia mundial. Por isso seu diagnóstico é ilusório e sua conclamação, uma perigosa utopia.
O ciclo de crescimento global anterior à crise assentou-se sobre o eixo de desequilíbrio EUA-China. A poupança forçada do oceano de camponeses pobres chineses financiou o consumo exuberante da classe média americana. A assimetria refletiu-se sob as formas complementares dos crescentes saldos em conta corrente da China e dos monumentais déficits americanos. O motor das altas finanças simulou um equilíbrio virtual, apoiado na rotação acelerada dos capitais especulativos, que perdurou até o colapso do Lehman Brothers. Hoje, ao fim de um ano de crise, a política cambial chinesa restaura o desequilíbrio prévio, mas sem as molas de amortecimento que conferiram longevidade à expansão econômica.
Sete meses atrás, num comunicado retumbante, o banco central chinês apresentou o programa de uma reforma do sistema monetário internacional baseada na substituição do dólar por "uma moeda de reserva internacional de valor estável" emitida pelo FMI. A leitura otimista do comunicado sugeria que os chineses estavam prontos a trocar sua política cambial mercantilista pela participação num condomínio de gestão do sistema monetário internacional. Hoje, só Lamy simula não entender que aquilo não passava de chantagem. A China colou sua moeda ao dólar, operando de fato uma desvalorização do yuan em relação ao euro e às divisas dos países emergentes.
No dia seguinte ao comunicado célebre, o presidente do Banco da China pronunciou um outro discurso, pouco comentado, mas revelador. Zhou Xiaochuan falou por hipérboles, mas efetivamente atribuiu os elevados níveis de poupança chineses aos valores "antiextravagância" do confucionismo e alertou que "não é a hora certa" para a ampliação da poupança nos EUA. Aquelas palavras eram a senha para decifrar a política chinesa de reiteração do jogo da assimetria ao longo da crise, exportando os custos da recuperação econômica global.
A política cambial chinesa descreve oscilações cíclicas, mas obedece a uma lógica de longo prazo destinada a conservar a suposta virtude confucionista da poupança forçada. A depreciação do yuan, que atingiu o máximo em 1994, foi o pano de fundo da crise asiática de 1997 e a plataforma para a etapa atual de ascensão chinesa no comércio mundial. A última oscilação para cima do yuan iniciou-se em 2006, mas foi interrompida após o colapso financeiro nos EUA, frustrando as expectativas americanas de uma expansão sustentada do consumo chinês. Na sua visita a Pequim, Barack Obama ouviu de Hu Jintao um sonoro não à sua demanda de valorização da moeda chinesa.
O totalitarismo chinês já exibe fendas e rachaduras, mas conserva sua natureza fundamental. É o sistema político da China, não um projeto abstrato de desenvolvimento nacional, que dita a continuidade de sua estratégia mercantilista. Numa ponta, o crescimento significativo do consumo interno tem como requisitos a criação de direitos trabalhistas, a implantação de mecanismos de seguridade social e a expansão do crédito, que, por sua vez, exige a consolidação dos direitos de propriedade, até mesmo sobre a terra agrícola. Na outra ponta, o crescimento da renda média implica aumento das desigualdades sociais e das pressões reivindicatórias. Nada disso é compatível com o monopólio do poder político pelo partido-Estado.
O dogma do yuan fraco está no cerne do capitalismo de Estado chinês. No passado recente, quando a China ainda era um ator periférico, a sua estratégia mercantilista podia ser absorvida pela economia mundial. O cenário mudou desde o início do século, mas a incompatibilidade foi reciclada temporariamente pelas engrenagens combinadas da especulação financeira e da política fiscal expansionista dos EUA. Há um ano tais engrenagens emperraram e agora, independentemente da vontade de Zhou Xiaochuan, o mercado americano não pode drenar o excesso de poupança da China. O dumping cambial chinês converteu-se numa substância tóxica de efeitos globais.
A recuperação americana patina, pois a inevitável contração das importações não foi acompanhada por uma expansão das exportações. A apreciação generalizada das moedas dos países emergentes em relação ao dólar (e, portanto, ao yuan) provocou retração das exportações e perda de mercados de bens industriais para os chineses, ameaçando o equilíbrio das contas externas. Nos grandes produtores de commodities, como o Brasil, as exportações para a China ainda disfarçam os efeitos da assimetria global. Entretanto, o custo desse disfarce é pago pelo setor industrial, que tende a encolher sob o impacto da concorrência chinesa.
Quando disparou a sirene da crise mundial, o Ministério do Comércio da China declarou que seu país "é contra qualquer forma de protecionismo" e está comprometido com os princípios sagrados de livre-comércio. A gestão cambial praticada pelos chineses, contudo, representa uma forma radical de subsídio, disponível apenas para uma ditadura totalitária capaz de negar os direitos básicos de cidadania numa nação de renda média. Não é casual que pela primeira vez se discuta a hipótese de adoção de uma tarifa comum internacional para contrabalançar o dumping cambial da China.
Isso não consta do relatório de Lamy nem de nenhum manual de livre-comércio. Mas, agora, o nome do jogo é assimetria sem amortecedores.
Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em Geografia
Humana pela USP. E-mail: demetrio.magnoli@terra.com.br
Vai mal a coisa
FOLHA DE SÃO PAULO - 26/11/09
BRASÍLIA - As relações do Brasil com o Irã vão de vento em popa, mas não se pode dizer o mesmo das relações do Brasil com os EUA.
Depois de o chanceler Amorim dizer à Folha que há "uma frustração" com os EUA e cobrar "maior franqueza" do governo Barack Obama, agora é o assessor internacional de Lula, Marco Aurélio Garcia, quem manifesta "decepção".
No meio disso, a carta de Obama para Lula soa como inventário dos pontos de discórdia. Alguns são antigos, como o fracasso da Rodada de Doha, a derradeira sacada brasileira na área de comércio, depois do enterro da Alca e do aborto de acordos bilaterais com os EUA.
Outros são bem mais recentes, como a saída para a crise de Honduras. O Brasil lidera o movimento para rejeitar o presidente eleito no próximo domingo, sem que Manuel Zelaya seja reconduzido antes. Já os EUA têm apoio de velhos aliados incondicionais, como a Colômbia, para acatar o resultado das urnas e ponto final.
Vai mal a coisa, e cedo. Obama acaba de ser empossado, tem enormes dificuldades internas, nem sequer obteve a aprovação de todos os assessores no Congresso (nem o embaixador no Brasil, aliás) e não consegue avançar no Oriente Médio, no Afeganistão, na aproximação com a América Latina. E o mais curioso é o desequilíbrio do comércio bilateral: superavit de US$ 4 bi para os EUA, um aumento de 284%. Perguntar não ofende: então o Brasil é comprador, em vez de vendedor para o maior e mais disputado mercado do planeta?
Segundo o embaixador Mauro Vieira (que assume em janeiro a embaixada em Washington), isso é sinal da importância que produtores e exportadores norte-americanos dão ao Brasil mesmo na crise. Ok, mas não seria melhor que os produtores e exportadores brasileiros é que se dessem bem? O próximo round será em Copenhague, com EUA e China de um lado, França e Brasil do outro.