domingo, julho 03, 2016

Paralisações agravam situação do ensino no país - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 03/07

A greve é direito constitucional, mas as aspirações de reajuste não podem ser atendidas por um Estado estrangulado pela grave crise fiscal



O ensino público no Brasil sofre de diversos males que não estão ligados, a priori, à capacidade cognitiva dos estudantes. Temos alunos motivados, como a carioca Lorrayne Isidoro, do Colégio Pedro II, classificada para representar o país na 16ª Olimpíada Internacional de Neurociência, na Dinamarca. Inteligências como a dela, certamente, são desperdiçadas por condições adversas dentro e fora das salas de aula. Faltam ao país uma política efetiva de atração e retenção de bons professores, baseada na meritocracia; material de apoio adequado; cuidados na primeira infância; definição de metas claras; e acompanhamento contínuo de desempenho, entre outras carências.

O resultado é um desempenho ruim em testes internacionais. No Pisa, por exemplo, apenas 1,4% dos brasileiros chega aos níveis 5 e 6 (os mais altos), sendo que a média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 13,8%, e a de Cingapura, 42,4%.

O que dizer, então, quando à precariedade estrutural se juntam greves longas, acompanhadas de ocupações que não permitem aos professores dar aula? Na Unicamp, alunos invadiram a sala para impedir o professor Serguei Popov de lecionar.

A greve é um direito constitucional, mas as aspirações salariais não podem ser atendidas por um Estado estrangulado pela grave crise fiscal. Antes de serem legítimas, são reivindicações fora da realidade.

A degradação do sistema teve uma contribuição decisiva dos governos Lula e Dilma Rousseff, que privilegiaram um programa de expansão do ensino universitário baseado em obras (novos prédios, novos campus) e crédito educativo sem limite. O dinheiro acabou, e agora demonstra-se que a gestão de boa parte das universidades é desastrosa.

Enquanto isso, estudantes deixam de aprender. Para se ter uma medida do estrago causado, a paralisação na rede estadual fluminense já inviabilizou o semestre letivo de cerca de 70 mil alunos.

Não é o caso de se dizer que a reposição das aulas — quando ocorre— amenize o problema, porque a interrupção do calendário escolar dispersa os estudantes e vai contra o caráter gradativo e permanente do aprendizado.

O pagamento dos dias parados — porque os governantes têm interesses político-eleitorais — só agrava a situação, contribuindo para tornar permanente a situação de greve. É mais um caso em que, pela leniência do administrador público, o interesse corporativo se sobrepõe ao coletivo.

A sociedade paga duplamente. Primeiro, para manter um sistema de ensino que não funciona; depois, para sustentar greves contra seu interesse, a melhoria da qualidade da educação no país.


Nenhum comentário:

Postar um comentário